PROCD-11-08-05-Orlando Fantazzini
194.3.52.O Sessão Ordinária - CD 03/08/2005-15:06
Publ.: DCD - 11/08/2005 - 38413 ORLANDO FANTAZZINI-PT -SP
CÂMARA DOS DEPUTADOS GRANDE EXPEDIENTE LÍDER
FALA DO PRESIDENTE
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Sumário
Saudação, na condição de Representante do Líder da Maioria, ao Deputado Josep Borrell Fontelles, Presidente do Parlamento Europeu por ocasião de sua visita oficial à Casa. Conveniência da utilização do modelo da União Européia para consolidação do MERCOSUL. Apoio à criação de área de livre comércio entre o MERCOSUL e a União Européia.
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O SR. ORLANDO FANTAZZINI (PT-SP) - Sr. Presidente Severino Cavalcanti, Sras. e Srs. Deputados, saúdo V.Exas. Exmo. Sr. Deputado Josep Borrell Fontelles, Presidente do Parlamento Europeu, para nós é uma grande honra e satisfação recebê-lo em nosso País e um prazer imenso tê-lo em nossa Casa.
Gostaria de lembrar e de destacar que a União Européia representa a grande fonte de inspiração do MERCOSUL, projeto de grande relevância estratégica e geopolítica para o Brasil.
Com efeito, a União Européia, ao contrário da proposta da ALCA e de outras áreas de livre comércio, contempla não apenas a integração comercial, mas também a integração social, política e cultural dos países que a compõem. O MERCOSUL, embora ainda em fase embrionária, pois é, no presente, somente uma área de livre comércio e uma união aduaneira incompleta, pretende converter-se, no futuro, em um verdadeiro mercado comum, com livre circulação de trabalhadores e instituições supranacionais.
Ao longo do processo de integração da União Européia, que durou décadas, tomou-se o cuidado de criar-se fundos comunitários para a equalização das assimetrias econômicas e sociais existentes entre as nações européias.
Ademais, houve também a preocupação em se desenvolver instituições supranacionais, que norteariam um processo de integração transparente e democrático.
Entre tais instituições supranacionais, destaca-se, por sua importância e dinamismo, o Parlamento Europeu, do qual V.Exa. é o Presidente.
O Parlamento Europeu exerce um controle rigoroso sobre a Comissão (órgão executivo da União Européia), podendo, inclusive, por meio de uma moção de censura, destituir todos os seus membros. Além disso, aprova o orçamento da Comunidade, podendo reformulá-lo completamente. De fato, o poder do Parlamento Europeu é de tal ordem que ele já obrigou o próprio Conselho de Ministros (órgão máximo da União Européia) a rever algumas de suas políticas.
E é nesse modelo que queremos nos inspirar também para o futuro Parlamento do MERCOSUL.
O recém-criado Parlamento do MERCOSUL, uma evolução da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL, ainda dista muito de ter os poderes e as prerrogativas amplas do Parlamento Europeu, pois pode apenas fazer recomendações aos órgãos executivos do Mercado Comum do Sul. De qualquer forma, representa avanço democrático importante no âmbito regional.
No que tange especificamente à cooperação com a União Européia, com vistas, em última instância, à criação de área de livre comércio MERCOSUL/UE, ainda em negociação, consideramos, em princípio, que ela é muito bem-vinda.
De fato, a relação com a União Européia não tem, por assim dizer, a carga hegemônica que está indubitavelmente presente no projeto da ALCA. O nosso convívio com a Europa sempre foi mais pacífico e respeitoso do que nossa relação com os EUA, maculada por um histórico inacreditável de intervencionismo e subjugação, quer pela via mais sutil da dependência econômica e política, quer pela via crua dos golpes e intervenções militares.
Além disso, reconhecemos que a Europa desempenhou e desempenha, no mundo, papel civilizador que os Estados Unidos distam muito de ter.
Outra razão pela qual vemos com bons olhos a integração com a União Européia diz respeito ao fato de que o Brasil é um global player no comércio mundial. Com efeito, o nosso País tem relações comerciais bastante equilibradas. Do total de suas exportações em 1998, o Brasil destinou 28,8% para a UE, cerca de 20% para os EUA (48% para os países da ALCA como um todo) e 17,4% para o MERCOSUL, sendo que o restante se distribuiu para as demais nações.
Esta é uma característica positiva do nosso desempenho comercial, que deve ser mantida. Evidentemente, a conformação da ALCA poderá fazer-nos perder tal característica, daí a necessidade de uma negociação séria com a União Européia.
Entretanto, apesar de reconhecermos, a priori, a aliança com a União Européia como algo muito desejável, até mesmo como elemento de contraposição à ALCA, julgamos também que ela teria de balizar-se por diretrizes políticas e estratégicas que conflitam com os princípios economicistas e neoliberais que têm conduzido, normalmente, as negociações comerciais nos foros multilaterais.
Do nosso ponto de vista, o colapso do modelo neoliberal - especialmente na periferia do sistema - e a notória ampliação das desigualdades entre os países demonstram que é chegada a hora de conduzirmos as nossas negociações sob a égide do "direito ao desenvolvimento" e não mais submersos na lógica falaciosa do mercado como provedor onisciente dos recursos e indutor único ou privilegiado do desenvolvimento e da superação dos desníveis econômicos e sociais.
Isto implica construir uma agenda positiva "direcionada no sentido de colocar todos os temas e matérias em negociação em termos das prioridades e preocupações relativas ao desenvolvimento", tal como propôs o embaixador Rubens Ricupero para a Rodada do Milênio da Organização Mundial do Comércio. Sob nossa ótica, esta deveria ser a diretriz geral das negociações MERCOSUL/União Européia.
Encerro, Sr. Presidente, dizendo que, para nós, é importantíssima a oportunidade de aprofundar esse diálogo com o Presidente do Parlamento Europeu, na perspectiva de elaborar a agenda positiva e estreitar cada vez mais os laços entre Brasil, MERCOSUL e União Européia, principalmente em razão de uma concepção de mundo onde não prevaleça - como não tem prevalecido na União Européia - apenas os interesses comerciais, mas acima de tudo a dignidade da pessoa humana.
Mais uma vez, boas-vindas a V.Exa. e que tenha uma boa estada em nosso País.
Muito obrigado.