PROCD-10-02-04 Vander Loubet

024.3.52.E Sessão Ordinária - CD 09/02/2004-16:09
Publ.: DCD - 10/02/2004 - 4957 VANDER LOUBET-PT -MS
CÂMARA DOS DEPUTADOS GRANDE EXPEDIENTE GRANDE EXPEDIENTE
DISCURSO

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Sumário
Perplexidade ante o assassinato de auditores fiscais do trabalho, no Município de Unaí, Estado de Minas Gerais. Expectativa de esclarecimento do caso pelas autoridades competentes. Necessidade de preparação de infra-estrutura operacional no País, sobretudo no desenvolvimento de logística em transportes. Prioridade no transporte ferroviário pelo Governo Luiz Inácio Lula da Silva. Importância de criação da rota bioceânica Santos/Antofagasta para acesso aos mercados mundiais, especialmente da Ásia e Oceania. Realização, pelo Governo do Estado de Mato Grosso do Sul, de encontro internacional sobre o tema. Previsão de recuperação da Ferrovia Bauru-Corumbá.


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O SR. VANDER LOUBET (PT-MS. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, volto à tribuna para insistir no otimismo e na esperança por um novo Brasil. E essa esperança se renova, mesmo num instante em que nosso coração pulsa também de dor e de revolta ante a barbárie de Unaí, em que fiscais do Ministério do Trabalho foram assassinados quando cumpriam seu dever.
A tragédia não apenas enlutou famílias, comoveu amigos e chocou a opinião pública. Foi um extremado acinte ao Estado e às instituições. E, por isso, nenhuma voz de qualquer democrata, de qualquer cidadão ou cidadã de bem, haverá de se calar.
As autoridades vão esclarecer o que aconteceu e punir os responsáveis, tenho certeza. Seja empreita de encomenda, seja latrocínio, o crime vitimou servidores públicos que estavam encarregados de assegurar direitos fundamentais e justiça nas relações de trabalho.
E a palavra justiça é a bússola de todas as expectativas da sociedade moderna, especialmente ao apontar para a ambição mais justa do ser humano, que é a felicidade.
Este é o norte para o qual deve rumar o novo modelo de desenvolvimento nacional, com auto-sustentação e soberania, na esteira de acúmulos éticos e democráticos, num horizonte de bem-estar coletivo.
Se a inclusão social e o combate à fome constituem palavras de ordem do Governo Lula e das forças que o apoiaram, a busca do desenvolvimento está no núcleo desse processo.
São objetivos que se associam e reclamam ações determinantes. Não pela via deteriorada do "crescimentismo" convencional de mercado, mas pela afirmação de uma economia vigorosa no conteúdo social e na agregação de valores conceituais da cidadania.
Não podemos pensar em desenvolvimento interno sem levar em conta a nossa capacidade de articulação externa, sem potencializar a presença brasileira no mercado e nas relações internacionais. Uma das condições essenciais é pavimentar os caminhos que nos aproximam de antigos e novos parceiros.
É certo que dependemos também de ajustes comerciais e tarifários, de procedimentos comuns para operar os mais variados e contraditórios interesses plurinacionais. Mas resolver tudo isso é praticamente nada se o Brasil não estiver realmente preparado para competir — e esse preparo depende da infra-estrutura operacional, com destaque para a logística de transportes.
Maior poder de competição teremos à medida que os outros países se convencerem de que dispomos das melhores alternativas para uma das fases mais agudas do custo de mercado, que é a sua demanda operacional. As grandes distâncias e as dificuldades para vencê-las pesam muito mais nessa relação do que a grande potencialidade produtiva do nosso solo e nossas vocações empreendedoras.
O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou 2004 como o ano da ferrovia no Brasil. Acrescento a essa estimulante previsão a certeza de que o ano será favorável ao resgate da multimodalidade. As hidrovias e rodovias ajudam a compor um desenho privilegiado, tanto para a unidade federativa quanto para a integração externa, a partir da compactação do bloco comercial da América Latina.
O MERCOSUL, com Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, estende-se por uma superfície de 11 milhões e 863 mil quilômetros quadrados, envolvendo uma população de quase 214 milhões de pessoas. Se incluirmos Chile e Bolívia, passaremos para 13 milhões e 700 mil quilômetros quadrados e 236 milhões de habitantes.
Nesses itens de território e população perderíamos para o bloco dos mercados da NAFTA e da União Européia. Ocorre que o bloco latino-americano ainda não traduziu esse potencial em participação convincente na grade econômica e financeira do comércio internacional. É como se as porteiras do restante do planeta estivessem fechadas para o nosso continente.
A saída está no encurtar distâncias, no pavimentar caminhos, enfim, no sedimentar o planejamento estratégico de infra-estrutura e logística de transportes. Um desses caminhos está hoje em evidência na conjuntura da América Latina: é a rota bioceânica, que tem por Mato Grosso do Sul um de seus mais viáveis acessos ao Pacífico, a ponte do intercâmbio com os maiores mercados do mundo, especialmente a Ásia e a Oceania, consumidores emergentes, ávidos e interessados em aproveitar o filão desse corredor de produtos e bens a preços e custos irresistíveis.
Está aí uma das razões do meu otimismo. Vemos agora que a louvável obstinação do Governador Zeca do PT em consolidar a rota bioceânica encontrou acolhida. Na semana passada, por iniciativa do Governo de Mato Grosso do Sul, a Capital, Campo Grande, foi palco do primeiro encontro internacional para debater e formatar as providências que vão implementar a rota bioceânica.
Projeta-se a mais completa utilização dos sistemas intermodais. O suporte é o corredor ferroviário já existente, que parte de Santos, em São Paulo, e atravessa 4 países, depois de cruzar o Pantanal sul-mato-grossense, escalar a Cordilheira dos Andes, vencer o deserto de Atacama e chegar a Antofagasta, no Chile.
São 4.270 quilômetros, o primeiro corredor ferroviário bioceânico do continente, redescoberto por uma equipe técnica do Ministério dos Transportes, que viajou mais de uma semana de trem para checar e, depois, aprovar a viabilidade de priorizar essa grande alternativa.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, a rota bioceânica significa mais que um simples condutor comercial para o transporte de mercadorias. É a ponte para o mais amplo intercâmbio de pessoas e de atividades saudáveis no contexto econômico, social e cultural.
Vislumbra-se a abertura de um novo e promissor veio turístico a alimentar o progresso sustentável. Ali será plantado um dos sistemas mais nervosos de escoamento da produção do continente. Um sistema que vai acoplar as hidrovias e rodovias e capacitar as estruturas portuárias dos países andinos para acessar os blocos asiáticos.
Quando se fala em encurtar distâncias, posso citar dados oficiais. Por exemplo, a distância do Brasil, a Índia e a China, que vai ser reduzida em mais de 7 mil quilômetros.
Faço um eco às autoridades sul-mato-grossenses, muito preocupadas com a precária condição de alguns trechos da ferrovia, notadamente entre Bauru e Corumbá, no nosso Estado.
A propósito, esse trecho está por ser socorrido pelo consórcio de empresas liderado pela Brasil Ferrovias que, juntamente com a Rio Tinto, a Vale do Rio Doce, a Cargil e a Odebrecht, investirá 80 milhões de reais este ano.
É uma rota de magnífica perspectiva para redução de custos por meio da redução de distâncias. Basta ver o aviltamento de custos e preços que acossam o produtor brasileiro, que é obrigado a cruzar o litoral nordestino e atravessar o Canal do Panamá para entrar no Pacífico rumo à Ásia.
É uma verdadeira aventura, além de contraproducente, como bem retrata a reportagem do jornalista João Prestes, publicada pela Agência Popular de Notícias, do Governo de Mato Grosso do Sul:
"Só na costa brasileira o navio percorre mais de seis mil quilômetros, partindo de Santos até o extremo do Amapá. De lá a embarcação continua costeando as Guianas, Suriname, Venezuela, Colômbia, cruza o Canal do Panamá e desemboca no Pacífico, jornada de outros cinco mil quilômetros".
Cito ainda a qualificada observação do Procurador Heitor Miranda dos Santos, especialista no assunto, ao afirmar que só o encurtamento dessa distância justificaria os investimentos na recuperação da ferrovia. Ele destaca também, como todos nós, atento a anseios seculares de paz e justiça entre os povos, o sonho da integração latino-americana, tão antigo quanto a descoberta do continente.
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, está prevista para este ano a inauguração do trecho recuperado da ferrovia Bauru-Corumbá, com a presença do Presidente Lula. S.Exa., em boa hora, voltou os olhos para alguns detalhes preciosos ao desenvolvimento nacional, que até então estavam relativamente esquecidos.
O Centro-Oeste é um desses detalhes. Não falo de esquecimento político nem institucional. Refiro-me ao grau de importância estratégica para o País com que a região vinha sendo medida. A rota bioceânica, por exemplo, já deveria estar sendo usufruída por toda a América Latina, a par, principalmente, da notável capacidade produtiva do nosso Brasil.
O levantamento sistemático da produção agrícola, do IBGE, estima que, em 2004, a produção de grãos atingirá 132 milhões e 200 mil toneladas, um salto de 7,31% acima da safra anterior, com um crescimento de área plantada de quase 7%. Na cultura de soja, somente o Centro-Oeste vai produzir 28 milhões e 500 mil toneladas, o maior e melhor desempenho entre as macrorregiões brasileiras.
Os atuais indicadores econômicos apontam o deslanche do incremento da indústria na região, com destaque para nosso Mato Grosso do Sul, que foi o Estado de maior índice de crescimento econômico na passagem de 2001 para 2002.
Entretanto, minha esperança e meu otimismo não se limitam aos números da economia e do empreendedorismo. Não estou fixado no cenário estanque da produção de mercado, mas naquilo que esse processo pode incorporar de valores sociais, ambientais, culturais e científicos.
Vejo aí o reforço consistente da cidadania e da confirmação de direitos coletivos e individuais, do equilíbrio das relações socioeconômicas, da criação de alternativas para que o desenvolvimento seja de fato sinônimo de justiça, de soberania, de modernidade.
Mais do que nunca, acredito, o Brasil tem a chance de se redescobrir como Nação capaz de propiciar oportunidade a todos os seus habitantes, na cidade e no campo, em todas as escalas de produção e subsistência. Esta é a chance da geração de emprego e renda, da ocupação econômica, da erradicação da fome e da miséria como causas da violência.
Nossas riquezas, abundantes e diversificadas, podem prover o mercado interno e abastecer o mundo, por meio de uma economia forte e soberana, mas justa e confiável. Nesse contexto, reitero, é fundamental fortalecer e qualificar nossa presença no mosaico latino-americano. É o ponto de partida — e de chegada — para que os governos e a sociedade civil possam preservar e realizar seus sonhos de felicidade, com democracia e dignidade.
Muito obrigado.