PROCD-28-11-03 Ivan Valente
278.1.52.O Sessão Ordinária - CD 27/11/2003-14:34
Publ.: DCD - 28/11/2003 - 64642 IVAN VALENTE-PT -SP
CÂMARA DOS DEPUTADOS PEQUENO EXPEDIENTE PEQUENO EXPEDIENTE
DISCURSO
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Sumário
Tentativa de isolamento diplomático do Brasil pelos Estados Unidos da América, no tocante às negociações sobre a Área de Livre Comércio das Américas. Importância do fortalecimento do MERCOSUL para a prevalência dos interesses comerciais brasileiros no continente. Impossibilidade de implementação da ALCA sem a adesão do País. Consolidação da liderança brasileira entre países em desenvolvimento.
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O SR. IVAN VALENTE (PT-SP. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Deputados, na semana passada, estivemos em Miami, em missão especial, representando a Câmara dos Deputados na reunião ministerial que analisou as questões relativas à Área de Livre Comércio das Américas.
Pudemos sentir, in loco, que a posição brasileira em relação aos blocos comercias, tanto em Cancún, na reunião da Organização Mundial do Comércio, como em Trinidade e Tobago, calou fundo por causa dos Estados Unidos, pois a posição americana foi dura com relação à Área de Livre Comércio. Eles estabelecem o livre comércio como algo que interessa a eles, para negociar questões de seu interesse imediato, como propriedade intelectual, compras governamentais e investimentos no campo da ALCA. Também interessa a eles negociar no campo da OMC, área em que são mais vulneráveis, leis antidumping e agricultura.
O fato de o Brasil ter aglutinado mais de 20 países e liderado o processo junto com a Índia, a China e a África do Sul deixou possessa a diplomacia norte-americana. Certamente, eles vinham com a intenção de isolar o País.
A reunião da ALCA em Miami não poderia ser uma nova derrota para os americanos. Foi por isso que eles convocaram antecipadamente o nosso Embaixador a ir a Washington, a fim de encontrarem uma solução, um consenso pelo menos, mesmo que os Estados Unidos tivessem que fazer algumas concessões, como respeitar o ritmo, a economia interna e a sensibilidade de cada país e aceitar que cada um possa ter diferentes níveis de compromisso.
A proposta original em relação à ALCA era colocar países de assimetrias tão grandes — desenvolvimento econômico, científico e tecnológico, economia de escala — em igualdade de condições para competir, abrindo seus mercados. Isso é inaceitável. A proposta original americana é de anexação da América Latina.
Sr. Presidente, a situação não é fácil para o nosso País. Obtivemos algumas vitórias, mas tivemos que fazer também algumas concessões. Os Estados Unidos jogam nossa posição para o isolamento. Primeiro, porque já têm, junto com o Canadá e o México, o Acordo de Livre Comércio da América do Norte — NAFTA. Segundo, porque fazem imensa pressão sobre países de economia frágil da América Central para isolar a posição brasileira. Entre esses países estão El Salvador, a Nicarágua, Honduras e a Guatemala, que começam a ter uma posição pró-americana devido às suas fragilidades, ou seja, acabam topando qualquer acordo para terem acesso a algum espaço no mercado norte-americano. Terceiro, porque na própria América do Sul há países mais fragilizados e mais do que nunca pró-americanos, como é o caso da Colômbia e do Peru. E mesmo no MERCOSUL há algumas defecções que podem causar problemas, como é o caso do Uruguai, que foi assediado pelos Estados Unidos, mesmo fazendo parte do MERCOSUL, para que aderisse à sua posição.
A posição brasileira de liderança, de co-presidência da ALCA, coloca-nos na situação seguinte. Aos Estados Unidos não interessava o fracasso da reunião de Miami, porque haverá eleições no país no ano que vem, e o Presidente George Bush quer se reeleger e para isso não vai contra produtores locais, principalmente da Flórida, onde está a laranja e cujo Governador é exatamente seu irmão, Jeff Bush. Não interessava a eles naquele momento uma derrota política. Por isso, fizeram concessões. Mas não desistiram da proposta original: uma ALCA dura, a chamada ALCA heavy. Para eles interessava dizer: "A ALCA andou. Depois recuperamos terreno através de pressões isoladas".
Sr. Presidente, vivemos momento importantíssimo neste País. Há necessidade de fortalecer o MERCOSUL e estabelecer relações irmãs fortes com a Argentina e a Venezuela. Embora os Estados Unidos viessem com a bravata de que fariam a ALCA sem o Brasil, uma coisa é certa: não existe ALCA sem o Brasil. Cerca de 80% do comércio americano é feito através do NAFTA, o Brasil teria de 9% a 10% dos 20% que restam. Se somarmos a Argentina e a Venezuela, teríamos 14%. Logo, não haveria necessidade de uma área de livre comércio, se já existem as reuniões bilaterais entre esses países.
Precisamos avançar, ficar alerta nessa questão, apoiar a posição do Itamaraty e dizer: não há possibilidade de isolamento do Brasil. Não devemos aceitar a chantagem. É forte a posição brasileira na liderança de um grupo de países na Organização Mundial do Comércio, países do porte da China, da Índia, do México e da África do Sul. A globalização e o livre comércio, que só interessam a grandes empresas transnacionais e a países ricos, não são mais possíveis neste século.
A Área de Livre Comércio das Américas tem de servir à promoção do desenvolvimento, ao desenvolvimento autônomo e soberano dos países, à promoção da igualdade social, à transferência tecnológica, à inovação de valores, à defesa dos direitos humanos, ao livre trânsito das pessoas, aos direitos dos trabalhadores. Daí a necessidade de avançarmos para a Reunião de Puebla numa posição ainda mais forte da diplomacia brasileira.
Muito obrigado.