PROCD-16-09-03 Luiz Couto
184.1.52.O Sessão Ordinária - CD 15/09/2003-16:00
Publ.: DCD - 16/09/2003 - 47008 LUIZ COUTO-PT -PB
CÂMARA DOS DEPUTADOS GRANDE EXPEDIENTE GRANDE EXPEDIENTE
DISCURSO
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Sumário
Participação do orador em debate sobre a recriação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste, em João Pessoa, Estado da Paraíba. Comprometimento do Governo petista com os direitos humanos e com a área social. Importância das ações de combate à tortura adotadas pelo Ministério da Justiça e pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República. Expectativa de lançamento, pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Plano de Ação da Criança e do Adolescente. Atividades desenvolvidas pela Subcomissão Permanente do Sistema Prisional, Grupos de Extermínio, Tortura e Trabalho Forçado. Conveniência da criação, na proposta de reforma do Poder Judiciário, de varas especiais de direitos humanos. Encaminhamento de projeto de lei sobre a competência do Ministério Público para a investigação de crimes praticados por policiais. Esperança no esforço conjunto e no compromisso dos segmentos majoritários da sociedade para a promoção do respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais.
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O SR. LUIZ COUTO (PT-PB. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, honra-me ocupar esta tribuna para formular algumas idéias acerca da atual conjuntura, dos avanços e desafios postos para o Governo Lula em todas as suas áreas.
No final da semana passada, mais precisamente sábado, dia 13 de setembro, em companhia do Deputado Zezéu Ribeiro, Relator do projeto de recriação da nova SUDENE, realizamos em João Pessoa, na sede do SEBRAE-PB, grande debate sobre as perspectivas e esperanças que se abrem com a recriação da nova agência.
Contamos com a participação do Governo do Estado, de duas Secretarias de Estado - Planejamento e Indústria e Comércio -, da direção do SEBRAE, das Federações da Indústria e do Comércio, das Associações de Produtores Rurais e de Trabalhadores na Agricultura, de representantes de universidades, da Comissão Pastoral da Terra, da CUT, do Banco do Nordeste, do Banco do Brasil e de inúmeras outras entidades representativas dos setores produtivos do Estado da Paraíba.
Foi um debate de alto nível, que demonstrou a vontade de participação e a atitude de colaboração com as iniciativas que, verdadeiramente, vão ao encontro dos interesses do povo. Inúmeras sugestões e idéias foram apresentadas, e o Relator, certamente, as levará em consideração quando da apresentação do seu parecer.
Faço este registro para demonstrar o quanto de confiança os vários segmentos da sociedade brasileira depositam neste Governo, por sua definição democrática, por sua prática transparente e por sua vontade de construir as bases do desenvolvimento do País, discutindo suas ações com a sociedade. Não é por acaso que o PPA é resultado dessa discussão e que o Orçamento está sendo discutido também pelas diversas entidades representativas do nosso País.
A recriação da SUDENE é mais uma das grandes decisões do Governo Lula e se insere na linha de concretizar o planejamento do desenvolvimento e viabilizar a participação do Estado nesse processo.
Quando elaborou a proposta de Orçamento para 2004, o Governo Lula alocou um volume de recursos na ordem de R$ 42,37 bilhões para investimentos na área social. É bom registrar que são R$ 7 bilhões a mais do previsto para o ano em curso. Cerca de R$ 29 bilhões estão sendo destinados à Saúde e R$ 7,8 bilhões à Educação.
Os aportes de recursos totais à área social, na verdade, são em torno de R$ 70 bilhões, considerando investimentos em habitação, abastecimento d'água, saneamento, etc. Ou seja, no primeiro Orçamento elaborado pelo nosso Governo, pelo Governo Lula, já temos a real demonstração de que este Governo realmente tem compromisso com o social.
O fortalecimento de programas como o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério - FUNDEF, o Bolsa-Escola, o Bolsa-Alimentação, bem como a unificação de vários outros pelo Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar - MESA, responsável pelo Fome Zero, evidenciam que as promessas estão sendo cumpridas.
As constantes e seguras quedas nas taxas de juros e implementação de políticas de queda e controle das taxas inflacionárias, além da adoção de políticas que favorecem a obtenção de crédito aos micros e pequenos empreendedores, induzem ao crescimento da atividade econômica sustentada.
Podemos, então, Sr. Presidente, com segurança, afirmar que estamos no caminho certo e que logo, logo estaremos trilhando o desenvolvimento com crescimento econômico, com aumento da oferta de emprego, melhor distribuição de renda e redução da exclusão social.
A determinação firme do nosso Governo de enfrentar os desafios das reformas, principalmente a previdenciária e a tributária, não o fez descuidar-se do dever de casa. Está governando com transparência e abrindo condições para a participação popular nas ações e programas de Governo. Abrem-se, assim, as possibilidades de afirmação da cidadania.
Na verdade, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Parlamentares, este não é um Governo que apenas se diz democrático e transparente, ele realmente é democrático e transparente. A mudança de paradigma na concepção do processo de desenvolvimento, ao assumir o entendimento de que o planejamento é vital para se ter um projeto de país, é decisivo para garantir um futuro virtuoso à nossa Nação. E não estamos falando no vazio ou em planos mirabolantes. O PPA 2004/2007 não é obra de ficção, mas, sim, uma construção segura e consciente, e representa a vontade do povo na busca do seu caminho.
É claro que as dificuldades do País são imensas. O serviço da dívida nos amarra, as barreiras tributárias e os subsídios aos produtos agrícolas, praticados por alguns países da União Européia e EUA, limitam nossa capacidade produtiva e participação na economia mundial pela via das exportações.
A escassez de capitais para investimentos em alta tecnologia e produção de bens de maiores valores agregados restringe nossas expectativas de crescimento. Mas é bom que se diga que não nos impede de lutar com determinação e vontade de superar todos esses problemas e caminhar rumo aos nossos objetivos. Temos Governo para isso. E temos um povo que não teme em construir sua soberania. A mudança já começou!
Assim, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, para concluir essa abordagem conjuntural, foi com esse espírito, com essa motivação que saí da reunião sobre a recriação da nova SUDENE. A esperança deu lugar à decisão de participar, contribuir, colaborar. É o povo se juntando ao Governo para construir o País.
Na área dos direitos humanos, o Brasil também começa a perceber os progressos que o Governo Lula vem implementando. O País deu um grande salto em sua política internacional, por meio do acordo celebrado na semana passada com a Argentina, quando o Ministro-Chefe da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, e o Secretário de Direitos Humanos da Argentina, Eduardo Luis Duhalde, acertaram os primeiros passos para a criação da Comissão de Direitos Humanos do MERCOSUL.
Trata-se de ato extremamente significativo. Argentina e Brasil se unem agora para promover os direitos humanos, 3 décadas depois da famigerada Operação Condor, que integrou os serviços de repressão política dos países do Cone Sul, nos Governos militares, e foi responsável pela tortura, morte e desaparecimento de centenas de pessoas.
O documento assinado em Buenos Aires expressa a determinação política para a criação de um organismo internacional, no âmbito da América do Sul, com a participação também de representantes do Poder Executivo e Chancelarias do Paraguai, Uruguai, Bolívia, Peru e Chile.
A Comissão irá tratar de assuntos relacionados não só às vítimas dos regimes ditatoriais. Terá papel importante também no que diz respeito ao combate à exploração sexual infantil e ao tráfico de crianças e mulheres que assola nosso País e toda a América Latina; vai olhar para a situação dos milhares de trabalhadores ilegais nas regiões de fronteira, muitas vezes em condições de semi-escravidão, sob a ótica dos direitos universais da pessoa.
No plano interno, a Secretaria Especial de Direitos Humanos, que não por acaso ganhou status de Ministério no Governo Lula, está em fase final de elaboração do Plano de Ação Pela Criança e o Adolescente, que envolve todos os Ministérios da área social.
O Plano é uma das ações previstas no termo de compromisso do projeto Presidente Amigo da Criança, assinado pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha eleitoral, e está sendo coordenado diretamente pela Secretaria. A própria sociedade civil irá monitorar o cumprimento das metas do plano apresentado pelo Governo.
O Presidente inicia o resgate - porque é só o começo e há muito o que fazer nesta área - de um dos seus mais sérios e maiores compromissos com o povo brasileiro, firmado durante a campanha, quando disse que iria fazer cumprir as 21 metas estabelecidas pelo documento Um Mundo pelas Crianças, da Organização das Nações Unidas para a área da infância.
Entre elas estão: reduzir as taxas de mortalidade infantil e materna; melhorar o ensino público; proteger as crianças de todas as formas de abuso, negligência, exploração e violência; e também desenvolver ações de prevenção para reduzir a prevalência do HIV entre a população infanto-juvenil.
Outro grande desafio para este Governo é criar uma nova concepção sobre direitos humanos perante os agentes públicos, principalmente àqueles cujo trabalho se insere na área da segurança pública, e desfazer o paradigma de que direitos humanos são direitos de bandidos. Essa visão distorcida reinante no País, corroborada por muitos setores do Poder Público, mata milhares de pessoas todos os dias, vítimas da tortura e das execuções sumárias que se verificam nas delegacias, penitenciárias e em outras ações da Polícia junto às populações pobres principalmente.
Há um entendimento tácito entre nossas forças policiais, consentido por nós, que parte do pressuposto preconceituoso e discricionário de que os suspeitos - em sua grande maioria negros e pobres -, as pessoas procuradas pela Polícia ou mesmo os criminosos comprovados são cidadãos de segunda categoria e não merecem ter direitos. Como se direitos fossem benesses concedidas apenas àquelas pessoas inseridas no conceito subjetivo de cidadãos de bem, e não uma prerrogativa básica de todo o ser humano, independentemente de sua situação perante a Justiça, condição social, raça, gênero, orientação sexual, opção política ou religiosa.
O Sr. Chang, comerciante chinês naturalizado brasileiro, provavelmente morreu nas condições absurdas e desumanas divulgadas pela imprensa - extorsão mediante tortura - porque essa visão distorcida acerca dos direitos humanos contribui para incutir nos agentes públicos, responsáveis pela aplicação das leis, a certeza da impunidade.
Boa parte das nossas Polícias age à revelia da Constituição, sabendo que dificilmente será responsabilizada pelos seus atos ilegais. A Arquidiocese de Manaus, por intermédio do seu Centro de Direitos Humanos, nos entregou processos sobre 10 casos de tortura praticada por policiais militares e civis do Estado do Amazonas. O fato comprova que hoje a tortura, na maior parte das vezes, é praticada por agentes públicos que deveriam combater a violência, mas usam a insígnia, a força e seu poder para arrancar informações das pessoas ou até conseguir benefício materiais. A questão deve ser enfrentada imediata e incansavelemente pelo Governo.
A respeito desse tema, ontem mesmo, o programa Fantástico, da Rede Globo, veiculou ampla reportagem sobre tortura e impunidade no Brasil, mostrando que policiais comprovadamente responsáveis por sessões de tortura continuam soltos, trabalhando normalmente, aterrorizando suas vítimas. Infelizmente, essa realidade não é novidade para nós da Subcomissão Permanente do Sistema Prisional, Grupos de Extermínio, Tortura e Trabalho Forçado, nem para aqueles que militam na área dos direitos humanos.
A referida subcomissão, que é por nós presidida, dentro de suas limitações, em audiências reservadas, está ouvindo relatos de vítimas e parentes de vítimas das ações de torturadores e grupos de extermínio no Entorno do Distrito Federal, no Município de São Gonçalo, Estado do Rio de Janeiro, no interior paulista, no Recôncavo Baiano, nos Estados de Minas Gerais, Goiás, Maranhão, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Tocantins, Amazonas, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, para citar alguns casos notórios. As últimas denúncias recebidas desnudam as bárbaras práticas das Polícias do Ceará e do Paraná. É quase o País inteiro. Daí a importância do combate à tortura, em geral associada à impunidade, à corrupção e à prática de extorsão por muitos agentes públicos.
Por isso, é preciso saudar as manifestações do Ministro da Justiça e do Secretário Especial de Direitos Humanos, que já se pronunciaram a respeito dos abusos policiais e estão mobilizando suas Pastas, de acordo com as respectivas competências, para que essas práticas sejam enfrentadas energicamente e não fiquem impunes.
O Brasil tem oportunidade histórica, com este Governo, de mudar essa realidade trágica, herança cultural do colonialismo centenário, reforçada pelas suas mais recentes experiências autoritárias. A implantação da Rede Nacional de Proteção aos Direitos Humanos será um avanço fundamental e precisa ter ritmo mais acelerado.
Ouço, com prazer, o aparte do nobre Deputado Mauro Benevides.
O Sr. Mauro Benevides - Deputado Luiz Couto, estava há pouco, em meu gabinete, com líderes empresariais do Ceará que vieram solicitar audiência com os Ministros da Agricultura e do Desenvolvimento e ouvíamos o pronunciamento de V.Exa. que na parte vestibular se reportava à SUDENE. Tendo participado de debate na Paraíba, V.Exa. fez precisas observações sobre um órgão que esperamos possa atender efetivamente aos anseios de desenvolvimento regional. Posso testemunhar que a impressão que calou no espírito dos empresários presentes e no meu próprio foi a de que o nobre Deputado fez observações lúcidas em torno de uma autarquia cuja extinção deixou perplexa a opinião pública nordestina. A SUDENE foi extinta no embalo dos escândalos da SUDAM. E, graças aos esforços despendidos pelas lideranças regionais, assistimos à sua reaparição numa modernizante roupagem. Esperamos que essa superintendência cumpra seus objetivos institucionais. Como antigo membro do seu Conselho Deliberativo, espero ver a SUDENE renascendo das cinzas, como uma fênix, para realizar trabalho ainda mais proveitoso em favor do Polígono das Secas.
O SR. LUIZ COUTO - Obrigado, Deputado Mauro Benevides. Tenha certeza de que o aparte de V.Exa. faz com que nosso simples pronunciamento tenha força maior, por sua palavra e competência, assim como pelo trabalho que V.Exa. tem empreendido ao longo de sua vida como cidadão, Vereador, Deputado Estadual, Governador do Estado do Ceará, Senador e Deputado Federal. E em toda sua prática, sempre com o compromisso de cuidar para que nosso País tenha mais dignidade e nosso povo melhores condições de vida.
Continuo, Sr. Presidente. as forças-tarefas criadas pela Secretaria para investigar as denúncias de abusos policiais, não obstante às dificuldades burocráticas, devem entrar em ação imediatamente.
Entretanto, mais do que a investigação rigorosa por parte do Governo e a punição na forma da lei, pelo Judiciário, aos autores dessas atrocidades, é fundamental que os recentes casos denunciados pela imprensa, antes de saírem da pauta diária dos jornais e caírem no esquecimento, levem nossa sociedade e Todos os Poderes constituídos da República a profunda reflexão a respeito de seus próprios valores éticos e morais.
O ato da tortura é uma das violações mais atrozes da dignidade humana. Destrói a dignidade, mutila as pessoas física e emocionalmente, prejudicando a capacidade de suas vítimas de retomarem a vida e as atividades normais. Os esforços para erradicar a tortura e outras formas de tratamento ou punições cruéis, desumanas e degradantes devem, acima de tudo, concentrar-se na prevenção, qualificando-se e remunerando-se dignamente os agentes públicos, e no combate incessante à impunidade.
A reforma do Judiciário, oportunamente proposta pelo Presidente Lula, é também um momento precioso para amplo e corajoso debate com toda a sociedade, rediscutido o ordenamento jurídico do País, de forma que os tratados, acordos e protocolos internacionais consignados pelo nosso País - por exemplo, a Declaração de Viena, de 1993 - passem efetivamente a ser acatados e respeitados. A Conferência sobre Direitos Humanos, que resultou na referida declaração, assinala especialmente a importância de os países adotarem medidas administrativas, legislativas e judiciárias para garantir o cumprimento das normas estabelecidas pelo Direito Internacional Humanitário.
Neste sentido, encaminhamos à Comissão encarregada de debater o tema sugestão para que sejam criadas varas especiais de direitos humanos. Estamos propondo ainda, por meio de projeto de lei, que as investigações criminais sejam competência do Ministério Público, a exemplo do que ocorre na maioria das democracias. Essa última medida vai propiciar que as investigações dos crimes praticados pelos policiais não sejam efetuadas pelos seus colegas, o que normalmente produz inquéritos propositadamente mal elaborados e muitas vezes falsos, sem os elementos necessários a um julgamento isento.
Em face dessa realidade dramática, esperamos, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, que a morte do Sr. Chang e as outras denúncias recentes feitas pela imprensa, além de punidas na forma da lei, sirvam para fortalecer a certeza de que somente o esforço conjunto e o compromisso inabalável dos segmentos majoritários da sociedade podem promover o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais, única forma para que a paz, a democracia e o Estado de Direito deixem de ser letra morta nos solenes acordos internacionais e passem a permear de fato nossas relações como seres humanos.
Era o que eu tinha a dizer.
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides) - Esta Presidência cumprimenta o nobre Deputado Luiz Couto pelo oportuno pronunciamento em que enfocou aspectos importantes da realidade brasileira, não apenas a questão da SUDENE, que me coube destacar no aparte que me foi oferecido, mas sobretudo a defesa dos direitos humanos. Esse tema merece nosso posicionamento decidido e firme, porque se insere nos princípios cristãos que S.Exa. tem sabido defender ardorosamente não apenas na vida pública, mas também no púlpito e nos debates parlamentares desta Casa do Congresso Nacional.