PROCD-04-06-03 Antonio Carlos Mendes Thame
080.1.52.O Sessão Ordinária - CD 15/05/2003-19:08
Publ.: DCD - 04/06/2003 - 25155 ANTONIO CARLOS MENDES THAME-PSDB -SP
CÂMARA DOS DEPUTADOS COMUNICAÇÕES PARLAMENTARES COMUNICAÇÃO PARLAMENTAR
DISCURSO
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Sumário
Violação do Tratado de Assunção representada pela decisão do congresso nacional argentino de instituição de sobretaxa na importação do açúcar brasileiro. Conveniência de aprovação, pelo Congresso Nacional, de projetos sobre importação de trigo e de produtos industrializados argentinos com mais de 10% de açúcar.
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O SR. ANTONIO CARLOS MENDES THAME (PSDB-SP. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, no início de março, o Congresso da Argentina aprovou projeto de lei que torna permanente uma sobretaxa sobre o preço do açúcar importado. Com isso, o açúcar brasileiro, único produto que ainda continua totalmente fora das regras de comércio integrado do MERCOSUL, em flagrante violação ao Tratado da Assunção, perde qualquer possibilidade de vir a ser exportado para a Argentina, porque à sobretaxa, em valor móvel hoje superior a 15%, se somará uma alíquota de 18% a que o açúcar já está sujeito.
A decisão do Congresso argentino está na contramão do processo desejado de transição ordenada para o pleno livre comércio do MERCOSUL. Não é a primeira vez que a Argentina faz isso: durante a gestão Menem, foi votada lei, depois vetada pela Presidência da República, cujo veto foi derrubado pelos Parlamentares, proibindo a integração do açúcar às normas do MERCOSUL, enquanto "o Brasil não desmontasse os mecanismos de subsídios do PROALCOOL". A alegação era que os produtores do açúcar brasileiro, tendo a alternativa de produzir álcool, ficaram em vantagem extraordinária, contra a qual a agroindústria argentina não podia competir. Agora fizeram o mesmo. A lei foi vetada pelo Presidente Duhalde, e o veto derrubado. Tudo ensaiado, combinado entre o Executivo e Legislativo portenhos.
E qual é a posição do Governo brasileiro? A postura do Governo Lula ainda está indefinida: o Ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, afirma que "foi o Legislativo argentino que criou a barreira tarifária sobre o nosso açúcar, por isso seria interessante que o nosso Legislativo tomasse a iniciativa da retaliação, até porque libera o Executivo da decisão política".
No entanto, o Ministério das Relações Exteriores desaprova qualquer reação em relação à Argentina. Diz que a lei que eles acabam de aprovar foi motivada pela campanha política presidencial. Quando passarem as eleições, o diálogo sobre a incorporação do açúcar voltará à mesa das tratativas, e o Itamaraty poderá discutir novamente a questão.
Nossa posição coincide com a do Ministro da Agricultura. Apresentamos à Câmara dos Deputados dois projetos, um deles em co-autoria com a Deputada Kátia Abreu.
O primeiro refere-se ao trigo: estende a todos os países a condição privilegiada de que hoje goza a Argentina de poder exportar trigo para o Brasil com alíquota zero. O outro projeto taxa os produtos industrializados argentinos importados pelo Brasil que contenham em sua composição mais de 10% de açúcar (doces, balas e outros produtos) com as mesmas alíquotas que eles impõem à importação do nosso açúcar. As importações brasileiras de produtos provenientes da Argentina que utilizam açúcar como matéria-prima são modestas: perfizeram apenas US$ 44 milhões em 2002. Não é o caso do trigo. Importamos 70% do trigo consumido no Brasil, sendo que 90% das importações provêm da Argentina. Este impressionante volume anual de quase 7 milhões de toneladas perfaz um valor FOB em torno de US$ 850 milhões e corresponde a 40% do volume total de trigo exportado pela Argentina. Aliás, é bom ressaltar que os argentinos consideram o Brasil como mercado cativo para o trigo. Tanto que nas últimas semanas de março, enquanto o preço do trigo caía nas bolsas de todo o mundo, o trigo argentino subiu US$ 5 por tonelada, atingindo US$ 154 por tonelada FOB, para embarque em março. Os preços do trigo canadense ou americano (mesmo com o pagamento de alíquota de importação de 10% e com maiores custos de transporte) estão em torno de US$ 158. Se pudessem exportar para o Brasil sem a cobrança da alíquota de 10% (privilégio de que hoje só goza a Argentina), desbancariam boa parte do trigo argentino nas exportações para o Brasil.
Por tudo isso, aprovar esses dois projetos que apresentamos constitui a forma altiva de o Parlamento brasileiro responder ao Congresso argentino, não no sentido de retaliar, mas para propiciar maior poder de barganha ao Itamaraty nas negociações. Transformados em leis esses projetos, esperamos que sejam apenas temporárias, porque ninguém deseja criar empecilhos à consolidação do MERCOSUL. Ao contrário, precisamos prestigiá-lo, porque seu fortalecimento nos ajuda a enfrentar as pressões e imposições dos Estados Unidos com relação à constituição da ALCA.
Além disso, esta é uma questão que não diz respeito somente ao setor açucareiro. As restrições que a Argentina vem impondo à importação do nosso açúcar estão dificultando as negociações para derrubar as barreiras tarifárias impostas aos produtos agroindustriais brasileiros pela Europa e pelos Estados Unidos. Vão afetar as próximas negociações em Doha, ou seja, a proteção conferida pela Argentina ao açúcar está deixando de ser um problema sub-regional, para tornar-se sério empecilho às negociações internacionais dos nossos produtos agroindustriais .
Quando esteve no Brasil pela última vez, o Sr. Pascoal Lamy, que representa a União Européia nas negociações junto à Organização Mundial do Comércio, disse ironicamente "Vocês reclamam das barreiras européias aos produtos brasileiros, mas não conseguem sequer resolver os problemas do açúcar no âmbito do MERCOSUL". Fica claro que precisam ser tomadas, pelo Brasil, medidas e posições mais efetivas para resolver os problemas que dificultam o comércio com os países vizinhos.
Por tudo isso, uma firme resposta do Congresso brasileiro com relação a esse impasse com a Argentina contribuirá muito para ajudar a consolidação do mercado internacional para nossos produtos agroindustriais. Produtos que vêm sendo, no momento, os grandes responsáveis pelo superávit na balança comercial brasileira.