Notas Taquigráficas Manhã
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
COMISSÃO PARLAMENTAR CONJUNTA DO MERCOSUL
EVENTO: Seminário N°: 1092/04 DATA: 2/9/2004 | INÍCIO: 09h31min TÉRMINO: 11h51min DURAÇÃO: 02h20min | TEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h20min PÁGINAS: 42 QUARTOS: 28 |
DEPOENTES/CONVIDADOS - QUALIFICAÇÃO
JOSÉ ANTÔNIO MARCONDES DE CARVALHO - Diretor do Departamento de Integração do Ministério das Relações Exteriores.
JORGE FONTOURA - Consultor Legislativo do Senado Federal.
MARIA CLÁUDIA DRUMMOND - Consultora Legislativa do Senado Federal.
SUMÁRIO: Seminário Internalização de Normas do MERCOSUL.
O SR. APRESENTADOR (Umberto Pinheiro)
- Senhoras e senhores, bom dia.
A representação brasileira na Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL sente-se honrada em dar início ao Seminário Internalização de Normas do MERCOSUL, cujo objetivo principal é, de um lado, discutir as dificuldades de incorporação das normas do MERCOSUL pelos países-membros e, de outro, propor mecanismos que possam agilizar o processo de internalização dessas normas aos respectivos ordenamentos jurídicos nacionais.
Dando início à solenidade, informo que estão convidados a participar como palestrantes: o Sr. Senador Mozarildo Cavalcanti, representando o Presidente do Senado Federal, Senador José Sarney; o Deputado Dr. Rosinha, Presidente Pro Tempore da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL; Embaixador José Antônio Marcondes de Carvalho, Diretor do Departamento de Integração, do Ministério das Relações Exteriores; o Sr. Antônio Paulo Cachapuz de Medeiros, Consultor Jurídico do Itamaraty; o Sr. Jorge Fontoura, Consultor Legislativo do Senado Federal; a Sra. Maria Cláudia Drummond, Consultora Legislativa do Senado Federal; o Sr. João Ricardo Carvalho de Souza, Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados; o Sr. Márcio Garcia, Diretor-Adjunto do Departamento de Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça; o Sr. Valdir Vicente de Barros, Coordenador da Seção Brasileira do Fórum Consultivo Econômico-Social.
Como mediadores, teremos: o Ministro Bruno de Risios Bath, Chefe da Divisão do MERCOSUL, do Itamaraty; o Sr. Eugênio Arcanjo, Consultor Legislativo do Senado Federal.
Estamos iniciando nosso seminário com os seguintes componentes da Mesa: Senador Mozarildo Cavalcanti, representando o Presidente do Senado Federal, o Senador José Sarney, e Deputado Dr. Rosinha, Presidente Pro Tempore da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL. Também convido para compor a Mesa o Embaixador José Antônio Marcondes de Carvalho, Diretor do Departamento de Integração do Ministério das Relações Exteriores.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha)
- Bom dia. Na qualidade de Presidente da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL, desejo boas-vindas a todos e espero que o dia de hoje seja bastante profícuo, porque o tema é atraente, provocador e envolve todos os setores do nosso Governo, tanto o Poder Executivo, como os setores do Legislativo, o que é extremamente importante para nós.
Teremos um debate bastante intenso hoje no âmbito do MERCOSUL sobre a internalização de normas que nos vai levar, depois, a debate em âmbito internacional, pois queremos que cada Estado-Parte do MERCOSUL realize internamente essa discussão e posteriormente o realizemos em âmbito internacional.
Essa fase nacional conta com vários assessores e consultores do Itamaraty e é importante termos isso na Câmara Federal.
Registro a presença do Dr. Wilfrido Fernández de Brix, Árbitro Titular do Tribunal Permanente de Revisão do Tribunal Arbitral do MERCOSUL. V.Sa. é bem-vindo; é um prazer tê-lo conosco.
Passo a palavra ao Embaixador José Antônio, para sua saudação de abertura.
O SR. JOSÉ ANTONIO DE CARVALHO
- Muito obrigado. Bom dia a todos. É com enorme satisfação que vemos tema tão importante e tão central na construção do MERCOSUL em discussão, que, cremos, será profunda e cujos resultados seguramente contribuirão para esse debate interno a que se referiu o Deputado Dr. Rosinha.
O MERCOSUL encontra-se numa fase de especial peculiaridade. Politicamente, há grande apoio, há uma coincidência de mandatos políticos em seu interior, mas, em alguns momentos, temos algumas dificuldades com essa questão de internalização de normas. Há enorme acúmulo de normas que nunca foram internalizadas e não se converteram em normas do MERCOSUL, e há intenso trabalho no âmbito do Mercado Comum e do Conselho de Ministros do MERCOSUL no sentido de criar condições para tratamento mais expedito e diminuição desse acúmulo de normas não-internalizadas.
Assim, saúdo a Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL pela iniciativa deste Seminário. Esperamos que os resultados contribuam para esse debate.
Muito obrigado, Deputado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha)
- Passo a palavra ao Senador Mozarildo Cavalcanti, que está representando o Presidente do Senado Federal, Senador José Sarney, foi convidado para esta solenidade de abertura.
O SR. SENADOR MOZARILDO CAVALCANTI
- Deputado Dr. Rosinha, saúdo o Embaixador José Marcondes e todos os presentes, principalmente os técnicos e consultores que, há muito tempo, trabalham nesse ambicioso e importante projeto, que é o MERCOSUL.
Quero dizer da minha dupla satisfação de estar hoje nesta reunião, primeiramente como membro da Comissão Conjunta do MERCOSUL. Venho acompanhando o brilhante trabalho do Deputado Dr. Rosinha à frente desta Comissão, lógico que com muitas dificuldades para realizar as reuniões. Há realmente acúmulo de Comissões no Congresso, e, muitas vezes, temos de agir como se estivéssemos em uma sessão espírita. Mas o certo é que S.Exa. tem realizado trabalho brilhante.
Tenho também a honra de estar hoje, designado pelo Presidente Sarney, representando-o neste evento que S.Exa. considera muito importante, pois que é um entusiasta do projeto do MERCOSUL. Esperamos que esse projeto se consolide, ganhe maior velocidade e possa efetivamente se expandir incluindo novos membros.
Na qualidade de Senador da Amazônia, especificamente de Roraima, torço para que a Venezuela urgentemente não apenas participe como associada, mas também como membro do MERCOSUL, pois a considero grande parceira nesse projeto, assim como seria de vital importância, tanto para meu Estado como para o Estado do Amazonas, que é vizinho, e para a Região Norte como um todo.
Saúdo a todos e agradeço a oportunidade de estar presente a esta reunião, representando com muita honra e com dificuldade o Presidente José Sarney.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha)
- Obrigado, Senador. A preocupação e o desejo demonstrados por V.Exa. são extremamente importantes, porque a integração da América do Sul é fundamental, hoje, para nós. Creio que, a partir do MERCOSUL, realizaremos efetivamente essa integração. A partir dos quatro Estados que hoje compõem o MERCOSUL, agregando, primeiro, países associados e, depois, como plenos do bloco, acredito que faremos e construiremos um bloco da América do Sul.
O desejo demonstrado pelo Presidente Hugo Chávez em Puerto Iguazú e a entrada da Venezuela no bloco foram fundamentais para isso.
O fato é que precisamos integrar, e a presença de Senador da Região Norte nesta Comissão me deixa satisfeito, pois tira a impressão que se tem por vezes de que o MERCOSUL somos somente nós, os Estados do sul do País.
Ao assumir a Presidência desta Comissão, encomendei estudo sobre como eram as relações comerciais dentro do MERCOSUL, levando em consideração os Estados brasileiros. Com exceção de Rondônia, todos os Estados tinham relações comerciais de compra e venda dentro do próprio bloco, quando sabemos que o objetivo não é dele. Ainda assim, aquelas relações demonstravam que o MERCOSUL vive e, se tem dificuldades, uma delas é justamente a internalização dessas normas, razão de nosso seminário de hoje.
Tenho acompanhado as negociações do Governo brasileiro encabeçadas pelos Embaixadores Marcondes e Macedo Soares e mesmo pelo Ministro Celso Amorim e tenho constatado que o Brasil tem de ser o carro-chefe de todo o processo de integração, porque, no âmbito mundial, somos uma economia pobre, porém, no âmbito da América do Sul, é uma economia diferente das outras e considerada em melhores condições do que a de outros países. E mesmo a representatividade política do Brasil é maior ou mais levada em consideração na política externa mundial. Então, o Brasil tem de ser esse carro-chefe da integração da América do Sul, e esta Comissão está trabalhando para isso. O Senador participa conosco, e estamos agora fazendo um debate do Parlamento. Acredito que, em 2006, teremos constituído o Parlamento do MERCOSUL, com uma porta aberta para o Parlamento da América do Sul.
Nossos agradecimentos ao Senador Mozarildo Cavalcanti e ao Embaixador José Antônio Marcondes de Carvalho.
Por fim, o nobre Deputado João Paulo Cunha, ausente deste evento por encontrar-se, neste momento, em visita ao Estado do Espírito Santo, aqui estará na parte da tarde.
Obrigado.
O SR. APRESENTADOR (Umberto Pinheiro)
- Neste momento, desfazemos a Mesa para darmos início ao primeiro painel.
Convidamos o Sr. Eugênio Arcanjo, Consultor Legislativo do Senado Federal, a compor a Mesa de Honra e a coordenar o painel. (Pausa.)
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Bom dia a todos.
Dando início ao primeiro painel do seminário, convido a compor a Mesa o Deputado Dr. Rosinha, a Sra. Maria Cláudia Drummond, Consultora Legislativa do Senado Federal, e o Sr. Jorge Fontoura, Consultor Legislativo do Senado Federal. (Palmas.)
Este seminário organizou-se em 2 painéis, um de manhã e outro à tarde, cada um voltado à discussão de um tema. O painel da manhã discutirá normas que necessitam de aprovação congressual, e o da tarde discutirá normas que não necessitam de aprovação congressual — os discutidos acordos executivos ou outros nomes que possam ter.
Talvez seja uma divisão um pouco arbitrária, mas o tema é muito polêmico, e é difícil discernir o que necessita do que não necessita de aprovação congressual. Talvez este seminário sirva para tratar a questão de maneira ainda mais aguda e profunda, lançando novas bases de discussão.
Estamos iniciando o seminário um pouco antes do horário previsto pela organização, que seria às 10h. Assim, proponho que concedamos a cada expositor até 30 minutos. As perguntas poderão ser feitas após o término das 3 exposições, por escrito ou pelo microfone.
Àqueles que apresentarem questões por escrito solicito incluírem, se possível, endereço de e-mail — eventualmente questões que não possam ser aqui debatidas poderão ser respondidas pelos expositores depois do seminário.
Passo a palavra ao Sr. Jorge Fontoura, cuja palestra tem por título "Aplicação das normas do MERCOSUL no plano interno".
O SR. JORGE FONTOURA
- Bom dia a todos. É grande minha satisfação em estar aqui nesta sala emblemática do Legislativo brasileiro. Acredito que estamos no lugar certo para fazer a discussão certa.
Nas minhas atividades de pensar o MERCOSUL tenho feito uma divisão entre o MERCOSUL real e o MERCOSUL imaginário. Infelizmente, vemos o MERCOSUL imaginário caminhar mais velozmente, sem os descaminhos do MERCOSUL real. Um dos problemas desse descompasso é justamente discutir o tema certo no lugar certo, com a institucionalidade certa.
Meus cumprimentos ao Deputado Dr. Rosinha, a quem já admirava e tenho aprendido a admirar cada vez mais em sua missão de presidir a Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL; aos ilustres colegas participantes da Mesa; aos professores presentes e à comunidade acadêmica.
Como nota introdutória gostaria de dizer que aqui estamos como pensadores acadêmicos, aqui exercemos o direito da liberdade de cátedra, aqui dizemos aquilo que imaginamos seja correto — não, evidentemente, com a certeza da correção da idéia, mas com o posicionamento maiêutico de podermos estar errados, porém ousando pensar o que deve caracterizar a atividade acadêmica.
A primeira nota concreta de minha comunicação é uma nota otimista. Eu gostaria de lembrar que nunca o MERCOSUL esteve politicamente tão forte como hoje, embora, nos jornais, encontremos notas desconcertadas a respeito dos descaminhos econômicos, das guerras comerciais, das guerras das geladeiras com a Argentina — o Brasil falando da Argentina e a Argentina falando do Brasil.
Isso é fruto da inexperiência da América Latina de maneira geral no comércio internacional. Só temos conflitos comerciais com países amigos, e devemos tratar nossos adversários comerciais fundamentalmente como aliados políticos. Só há comércio entre aliados políticos — os 2 países politicamente mais próximos hoje no mundo, não só pela geografia mas também pelos desígnios da História, talvez sejam Canadá e Estados Unidos, que são os grandes contendores comerciais do mercado internacional.
Nossa imprensa precisa aprender que adversidades comerciais, contrastes de entendimento comercial ou adversidades tributárias são normais na relação entre países amigos, e que somos, na América Latina, fundamentalmente amigos, e mais amigos hoje porque temos conflitos comerciais, porque temos comércio, conflitos que não tínhamos antes porque éramos amigos de retórica, amigos de palavras, porém não tínhamos comércio.
O tom positivo do início de minha comunicação diz respeito também ao fato de o Brasil não estar negociando a ALCA, de a Argentina não estar negociando a ALCA — o MERCOSUL negocia a ALCA. Estamos exercendo a personalidade jurídica permitida juridicamente pelo fato de sermos uma união aduaneira nesta negociação, e isso, evidentemente, preocupa muito aqueles que têm de negociar conosco.
Não hesitaria em dizer que a América Latina entrou na agenda internacional porque nela existe um bloco que é um partner, um interlocutor válido das relações comerciais internacionais.
Lembro ainda que nessas negociações da ALCA — também em relação à União Européia, mas não com tanta intensidade — o MERCOSUL se expressa com uma só voz, enquanto nossos parceiros do NAFTA se expressam individualmente como Estado: o Canadá fala pelo Canadá, os Estados Unidos falam pelos Estados Unidos, e assim por diante.
Gostaria de dizer ainda que seria muito temerário desistirmos desta convicção, desta hegemonia das idéias que caracteriza hoje a integração e que pode ser vista com muita clareza no processo de eleição em curso no Uruguai, onde, apesar da eleição presidencial efetivamente polarizada em ideologias, nenhum dos contendores hesita em dizer que o MERCOSUL é uma prioridade — claro que cada um com suas leituras, muitas vezes ideológicas, que ainda sobrevivem na América Latina. O fato é que têm ambos compromisso com a integração.
Um bloco econômico é fundamentalmente uma comunidade de leis, e essa é uma deficiência muito grande do MERCOSUL. Aqui entramos naquela idéia do MERCOSUL imaginário.
O MERCOSUL imaginário em nenhuma hipótese é uma cópia, uma mimese da União Européia, como se imagina na academia. Acredito que admiramos sabiamente a União Européia e exortamos seus valores, mas sabemos que ela não é a solução de todos os problemas, que não é a virtude da democracia sem os vícios da República; a União Européia é uma comunidade, um bloco composto de homens, com todos os vícios e virtudes que caracterizam a condição humana.
Na União Européia há corrupção, há descaminhos políticos, há clientelismo, há empreguismo, enfim, todos os vícios que podemos encontrar em muitas partes do mundo, inclusive na América Latina. E não é esse modelo que irá mudar o mundo, porque se modelos mudassem blocos econômicos, a Comunidade Andina de Nações, que importou o modelo da União Européia, seria um sucesso estrepitoso de comércio, estabilidade política, progresso e bem-estar social, quando todos nós sabemos que, infelizmente, isso não ocorre.
O MERCOSUL procura seguir seu próprio caminho, na minha opinião muito bem escolhido. O que nos permite estar aqui, 12 ou 13 anos depois, discutindo o MERCOSUL, é o fato de ele ser uma estrutura intergovernamental. O MERCOSUL é, juridicamente, Direito Internacional Clássico, e tudo o que imaginarmos que não seja isso é o MERCOSUL imaginário, que não dará certo, apesar de ser um belo discurso, uma bela lei, porque temos uma formatação jurídica — os Estados são frutos jurídicos de seu passado, de sua história. Todos os países que compõem o MERCOSUL são repúblicas presidencialistas cientes de sua história presidencialista, gostam do Presidencialismo; todos os 15 Estados que compõem a União Européia são cepas, modelos diferentes de Parlamentarismo.
Todos os países da América Latina são profundamente vinculados ao conceito de soberania — ouso chamá-los "soberanófilos" e "estatólatras", porque a história nos ensinou assim. A soberania foi nosso último escudo; fomos espoliados, fomos saqueados, fomos roubados, não só por piratas de navios, que vieram e vêm à América Latina, e nosso último bastião, nossa defesa última sempre foi a soberania. Amamos a soberania, e, evidentemente, imaginar um bloco econômico no modelo europeu, onde há o compartilhar da soberania...
Os europeus nos perguntam por que não relativizamos isso. Não relativizamos porque temos história, temos nossa cepa, nossa tradição jurídica. E isso, claro, muitas vezes cria problemas à institucionalização de um bloco, como aquele que existe na Europa e este, nosso vizinho, da Comunidade Andina.
Então, começar a falar do MERCOSUL — e isso é fundamental — é começar a falar de sua persona. O MERCOSUL tem uma persona intergovernamental, porque os negociadores do Tratado de Assunção quiseram assim e porque, sabiamente, os governos, pela sua idéia "soberanófila", por sua "estatolatria" e por sua tradição, querem que as coisas continuem assim.
Pode haver discurso que diga que precisamos avançar, precisamos de instituições supranacionais, que é o outro lado da intergovernabilidade. O que significaria isso? Que precisamos ser como a União Européia, onde há — e a expressão é deliciosa — a "alta autoridade", que decide acima da autoridade do Estado.
Mas é óbvio que, na nossa cepa, na reunião em que discutíssemos como as decisões seriam tomadas, acabaria a integração, porque teríamos de adotar modelo segundo o qual existisse a tomada de decisões por maioria, e não a tomada de decisões que caracteriza o modelo intergovernamental e que é a compatibilidade de todas as vontades, tudo se decidindo por oportunidade do momento político e também por unanimidade dos votos.
A partir disso, passamos a abordar o problema da internalização das normas, e entramos em um vazio semântico, se olhamos a questão pelo prisma político.
Trago ao debate decisão recente que está sendo objeto de discussão dos fóruns políticos e acadêmicos e que diz respeito à norma proveniente das autoridades do MERCOSUL, que são autoridades intergovernamentais, ou seja, decidem tudo aquilo que for interesse comum — o que significa que tudo se decide com o oportunismo do momento político, com a presença de todos os membros, pelo interesse da decisão em um determinado processo. Em nenhum momento se pode imaginar uma decisão da maioria sobre a minoria, até porque, se assim fosse, os Estados se retirariam da integração.
Essa decisão diz respeito ao fato de procurarmos imitar a União Européia. Porque temos problemas de internalização, vamos então imitar a União Européia? Esse foi o caminho escolhido, na minha opinião de grande fragilidade institucional. Vejamos por quê.
Diz a decisão que normas que não requeiram aprovação legislativa deverão ser incorporados, quase que com efeito direto, como no Direito Comunitário europeu — que não existe, em nenhum momento, no MERCOSUL. Uma forma, portanto, supranacional.
O vazio semântico diz respeito ao fato de nós não sabermos exatamente o que sejam normas que não requerem aprovação legislativa, porque este tema não é um tema de Direito de Integração, mas um tema de Direito Constitucional de cada um dos países que compõem o bloco.
O Prof. João Ricardo, aqui na frente, que já estudou as assimetrias constitucionais do MERCOSUL, sabe que o problema está justamente no livrinho, na Constituição, e não iremos mudar isso apenas com a vontade do momento a que acabei de me referir.
Então, aqui, surge também um problema de lógica. O documento que trago á colação é uma decisão que estabelece um efeito direto para as normas que não requeiram aprovação legislativa; esta decisão "decide sobre ela mesma" — entre aspas.
E aqui temos este vazio semântico: normas que não requerem aprovação legislativa terão incorporação direta aos ordenamentos jurídicos nacionais, derrogarão as normas que lhe forem contrárias, serão hierarquicamente superiores às normas que lhe forem contrárias, tudo como no modelo europeu, no mundo ideal de Bruxelas.
Porém, normas do MERCOSUL, assim ditas, não têm existência no ordenamento jurídico brasileiro, porque o que existe nele é o art. 59 da Constituição Federal, que fala do processo legislativo.
Uma ordem de serviço de uma autoridade pública brasileira é hierarquicamente superior a essas propaladas normas que não requerem aprovação legislativa e que seriam objeto dessa decisão. Mais uma vez estamos em uma chuva de palavras e um deserto de idéias, como, infelizmente, foi a integração da América Latina.
A construção de blocos econômicos é uma tarefa eminentemente jurídica. Não se constrói um bloco econômico com o discurso político. A vontade política é fundamental. A base econômica é o plasma da integração. O comércio é o sangue da integração. Porém, o trabalho de construção institucional é eminentemente jurídico e os operadores do direito — não gostam da expressão, mas ela está em voga — sabem que faremos a integração mudando nossos direitos internos, preparando os nossos países para a integração? Não importando modelos que não darão em nenhuma hipótese certo.
Os argentinos podem nos dar lições em relação a isso. Eles mudaram a sua Constituição recentemente, em 1994, mas, antes de fazê-lo, se submeteram a uma lenta jurisprudência da Corte Suprema em relação à abertura institucional, à abertura da Argentina para o mundo — uma série de decisões da Suprema Corte, entre elas principalmente o caso Cafés la Virginia, decidido em 1992, para se chegar finalmente à reforma constitucional de 1994, que permitiu evidentemente à Argentina aderir a instituições internacionais, submeter-se, mediante reciprocidade, a altas autoridades — a Argentina já estaria pronta para a supranacionalidade.
No Brasil, temos uma série de dificuldades institucionais que se explicam pela nossa história institucional. Explica-se pelo fato de sermos uma federação de 3 andares. Os argentinos não conseguem entender — e enquanto não conseguirem entender essa diferença estaremos em dificuldades institucionais — a diferença entre estadual e estatal. Aliás, no Brasil, muitas vezes também não entendemos essa diferença.
Temos as nossas dificuldades institucionais. E, apenas para encerrar e suscitar o debate na expectativa de ouvir a Dra. Maria Cláudia, gostaria de dizer que as histórias conformam os povos. Temos nessa conformação coisas certas e erradas. Hoje, o Brasil é muito acusado por ser pré-histórico em relação ao modelo de incorporação de tratados.
Vejam que, enquanto discutimos a incorporação das normas do MERCOSUL, esquecemos que temos um problema maior, a própria incorporação dos tratados. O Brasil ainda não ratificou a Convenção de Viena sobre o direito dos tratados, o tratado dos tratados. Porém, isso é fruto da nossa história. Temos razões, temos porquês. Esse é um problema político e, quando instado a falar sobre ele na presença de colegas de outros climas, de outras falas, de outras culturas comunitárias, costumo dizer que cada povo tem a tessitura do seu passado. E talvez tenhamos esse apreço pela soberania pela mesma razão que os europeus têm um apreço pela política agrícola comunitária. Porém, não há a menor dúvida que a política agrícola comunitária é muito mais lesiva ao mundo, causa muito mais miséria, muito mais sofrimento, muito mais pobreza do que o apego que temos no Brasil pela soberania.
Precisamos mudar com o nosso próprio modelo e sem modelos de outras falas.
Muito obrigado.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Obrigado, Dr. Jorge Fontoura.
Convido as pessoas que estão chegando que venham tomar assento nas filas da frente, pois há muito espaço vazio na frente.
O Dr. Jorge Fontoura foi bastante econômico no tempo, liberou o prazo para o Deputado Dr. Rosinha fazer uso da palavra.
Já vemos uma perspectiva bastante interessante nas discussões do Jorge, talvez um pouco conservadora no sentido do avanço da internalização das normas.
Passo a palavra à Dra. Maria Cláudia Drummond, que falará sobre a atuação da Comissão Parlamentar Conjunta na aprovação dos acordos do MERCOSUL.
A Dra. Cláudia tem até meia hora para a sua palestra.
Reitero o aviso de que o debate será feito ao final das 3 apresentações e que perguntas poderão ser feitas por escrito ou pelo microfone. Peço que coloquem o endereço eletrônico para as respostas posteriores, se não houver tempo durante o debate.
Muito obrigado.
A SRA. MARIA CLÁUDIA DRUMMOND
- Muito obrigada, Eugênio.
Bom dia a todos. Quero agradecer a Comissão Parlamentar Conjunta, seção brasileira, na pessoa do Deputado Dr. Rosinha, pelo convite e felicitar a Comissão por essa iniciativa de promover o debate sobre um tema que representa hoje uma das maiores debilidades do MERCOSUL: a incorporação de normas.
Acho que vou fazer um contraponto às palavras do meu querido amigo Jorge Fontoura, porque estarei me referindo à experiência européia, mas sempre tendo em mente que não devemos mimetizar um modelo que difere do nosso e vem de uma história, motivos e razões bastante diferentes daquelas que motivaram a formação do bloco do MERCOSUL.
Iniciarei fazendo uma pequena introdução. Estamos vivendo um momento histórico bastante peculiar no MERCOSUL. Há vontade política da parte dos governos dos dois maiores integrantes do bloco, Argentina e Brasil, no sentido de se avançar na questão da institucionalidade do MERCOSUL. Essa vontade política se manifestou, e vem se manifestando, de muitas maneiras, mas eu diria que, principalmente, quando os Presidentes Lula e Kirchner propuseram a criação de um Parlamento do MERCOSUL.
Vim de um seminário recente, há dois dias, em Montevidéu, quando se falou muito em um possível Ouro Preto 2, no momento em que o Protocolo de Ouro Preto, que criou a estrutura institucional do MERCOSUL, completa 10 anos. Então, em 17 de dezembro próximo o Protocolo de Ouro Preto e toda a estrutura institucional do MERCOSUL, criada por ele, completam 10 anos.
Os governos já pensam em um Ouro Preto 2, que não seria para dezembro agora. Acho que seria impossível negociar uma reforma profunda do Protocolo de Ouro Preto nesse momento, mas o simples fato de já se falar nessa possibilidade já aponta para algum tipo de aprofundamento institucional do MERCOSUL.
Quero lembrar, também, que a fragilidade maior do MERCOSUL, a que me referi antes, a questão do déficit de incorporação de normas, talvez aponte para uma disfunção das instituições tais como elas estão hoje. Não diria que necessitamos de instituições supranacionais neste momento, porque seria irreal, seria uma fantasia, como muito bem assinalou o Prof. Jorge Fontoura, mas — talvez isso já tenha sido falado — dar alguma permanência ao Grupo Mercado Comum, transformá-lo em um órgão mais permanente, visto que o Grupo Mercado Comum reúne-se, parece-me, duas vezes por semestre.
Os negociadores europeus do possível Acordo União Européia/MERCOSUL estranham não haver um interlocutor permanente que fale pelo MERCOSUL. Eles procuram um foco, mas não encontram esse foco do MERCOSUL com quem dialogar.
Então, acho que estamos caminhando — e aqui também tomo emprestada uma expressão do jargão europeu que é: petit pas, os pequenos passos. Estamos caminhando em pequenos passos para o aprofundamento das instituições do MERCOSUL.
Qual é a grande disfunção do MERCOSUL neste momento? Qual o ônus que isso acarreta para o MERCOSUL? A questão do déficit de incorporação de normas. E isso gera tremenda insegurança jurídica entre os operadores econômicos.
Mesmo que encarássemos o MERCOSUL como um simples bloco econômico, o que não é o caso, pois ele tem dimensões políticas claras e estratégicas, mesmo assim ele estaria disfuncional nesse momento, porque a falta de incorporação de normas impede que os empresários e operadores econômicos em geral possam planejar a longo prazo a inserção de suas empresas no bloco. Eles ouvem falar que o Conselho do Mercado Comum aprovou norma "x" em determinado momento e já fazem seus planos com base nesse fato. Daí a 2 ou 3 anos aquela norma ainda não está em vigor nos 4 Estados-Partes. Isso é um grande problema para o MERCOSUL.
Bem, e como se situa a Comissão Parlamentar Conjunta em relação a esse tema? Gostaria de voltar um pouco no tempo e lembrar que essa dimensão parlamentar existe na integração desde o início; está no art. 24 do Tratado de Assunção, que não outorga nenhuma função à Comissão Parlamentar Conjunta naquele momento, 1991. E é curioso observar que ela está no último artigo do tratado como se fosse uma lembrança tardia dos negociadores. A partir daí até o Protocolo de Ouro Preto, em 1994 — isso é uma evolução, com certeza —, passa a integrar a estrutura institucional do bloco. Ela está enumerada como um dos órgãos não decisório mas consultivo do MERCOSUL.
No Tratado de Ouro Preto já se outorgam funções à Comissão Parlamentar Conjunta. Como, por exemplo, enviar recomendações ao Conselho do Mercado Comum, função meramente consultiva, função de harmonização de normas do MERCOSUL. Gostaria de destacar uma outra função, que acho que é o fulcro. Talvez ela tenha estado por detrás da lógica de inserir a Comissão Parlamentar Conjunta no Protocolo de Ouro Preto. Trata-se da função de acelerar a aprovação das normas do MERCOSUL dentro dos Congressos Nacionais.
Ora, como uma Comissão Parlamentar Conjunta, quadripartite, onde estão quatro países, que figuram no tratado internacional, pode acelerar alguma coisa dentro do Congresso Nacional?
Então, já de início, essa função é altamente questionável do ponto de vista constitucional, porque ela traz à mente uma certa interferência ou ingerência de um outro Poder, que é o Poder Executivo, no Poder Legislativo. Quer dizer, o Poder Executivo cria uma Comissão Parlamentar e manda que ela acelere alguma coisa dentro do Parlamento. Então, aquela Comissão passa a se assemelhar muito a um lobby que vai funcionar dentro do Parlamento para a aprovação das normas do MERCOSUL.
Mas, por que essa incongruência? Por que essa dimensão parlamentar, ao invés de sanar o déficit democrático — sempre presente nos processos de integração —, na verdade, configura, como está no Protocolo de Ouro Preto, até uma ingerência de um Poder sobre outro? Porque não se deu à Comissão Parlamentar Conjunta naquele momento uma função eficaz no processo decisório, em nível da integração, em nível do bloco; porque isso não aconteceu naquele momento da negociação dos tratados, que é quando apenas os Poderes Executivos atuam, depois mandam que se acelere aquilo que eles decidiram dentro do Parlamento.
De qualquer maneira a Comissão se deparou com uma grande dificuldade. Primeiro, como acelerar esses instrumentos do MERCOSUL dentro dos Congressos Nacionais se não havia um mecanismo institucional para isso? E segundo, elas não estavam constituídas em cada um dos Congressos Nacionais. Elas figuravam no protocolo, no tratado internacional.
Então foi necessário, em primeiro lugar, aprovar algum tipo de instrumento jurídico dentro dos Congressos Nacionais para inserir essa Comissão dentro de cada um. No caso da Comissão Parlamenta Conjunta, seção brasileira, logrou-se em 1996 aprovar a Resolução nº 1, do Congresso Nacional, que criou a Comissão dentro do Congresso com uma atribuição.
Havia uma certa susceptibilidade das Comissões de Relações Exteriores, pois elas é que tinham a competência regimental para examinar as normas do MERCOSUL. Então, como retirar delas aquela competência naquele momento e atribuí-la à Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL? Em 1996, conhecia-se muito pouco o MERCOSUL dentro dos Congressos Nacionais. O MERCOSUL tinha pouca presença ainda na imprensa. E a solução que se encontrou foi que a Comissão do MERCOSUL, seção brasileira, produziria um relatório sobre toda matéria de interesse do MERCOSUL que viesse para o Congresso Nacional — aqui incluídos também projetos de leis.
Por exemplo, houve uma proposta famosa de plebiscito em relação à ALCA, para saber se o Brasil deveria ou não negociar a ALCA. Essa proposta foi primeiro à Comissão do MERCOSUL, porque a ALCA é do interesse do MERCOSUL. E todas as normas negociadas no âmbito da integração também são enviadas em primeiro lugar à Comissão do MERCOSUL, que produz um relatório e indica às demais Comissões que vão examinar aquela norma se ela deve ou não ser aprovada pelo Congresso Nacional. Mais do que isso, ela indica a dimensão do MERCOSUL, porque muitas Comissões não têm presente essa dimensão, ou seja, o fato de que o Brasil está em um processo de integração. É preciso que isso esteja sempre presente. A maioria da população não tem isso em mente, e realmente faz uma diferença. É importante saber que estamos num processo de integração.
Bem, a Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL atua dessa maneira. Ela produz um relatório, indicando se o instrumento MERCOSUL deve ou não ser aprovado pelo Congresso Nacional, indicando a sua importância, a dimensão que tem no processo de integração. E, a partir daí, aquele instrumento tramita nas outras instâncias da Casa. Na prática, o que se quis foi o seguinte: como a Comissão não podia realmente acelerar a aprovação de matérias, porque não havia um mecanismo para isso, ela tentou, pelo menos, tomar conhecimento de todo instrumento do MERCOSUL que viesse ao Congresso Nacional. Então, foi a maneira de ter conhecimento desses instrumentos. Porque nem isso havia no início. Às vezes, a Comissão não sabia se havia ou não um determinado tratado do MERCOSUL tramitando no Congresso Nacional. Então, como ela poderia acelerar aquela tramitação? De uma maneira institucional, hoje, todos os instrumentos do MERCOSUL que vêm ao Congresso Nacional são distribuídos em primeiro lugar à Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL. Isso já dá a ela uma possibilidade de acompanhar pelo menos a tramitação daquele instrumento. E houve uma aceleração desse processo agora na Comissão, sob a Presidência do Deputado Dr. Rosinha, mas de uma maneira bastante informal, porque, como não há um mecanismo regimental para isso, o que se tem obtido vem através de articulações políticas, de uma boa relação entre o Presidente da Comissão do MERCOSUL e os Presidentes das Comissões de Relações Exteriores. Então, é feita uma articulação política para que o instrumento MERCOSUL evolua e tramite mais rapidamente dentro do Congresso Nacional.
Mas essa não é a forma ideal. O ideal seria que tivéssemos realmente um mecanismo regimental que permitisse a toda a norma do MERCOSUL que viesse ao Congresso Nacional uma tramitação mais ágil e mais rápida aqui.
Eu acredito que o Deputado Dr. Rosinha vai falar sobre isso, porque S.Exa. está com uma proposta de resolução do Congresso Nacional nesse sentido, para estabelecer justamente esse mecanismo ágil de aprovação das normas.
Mas eu queria dizer que há uma evolução bastante palpável nas funções da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL dentro da integração. E é isso que nos faltava. Não havia uma função eficaz da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL no processo decisório da integração.
O Protocolo de Ouro Preto prevê uma atuação da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL simplesmente no sentido de enviar recomendações ao Conselho do Mercado Comum, das quais ele pode ou não tomar conhecimento. Muitas vezes não tomou.
Enfim, não havia uma interlocução ágil entre os 2 órgãos. E com isso se abria aquele chamado déficit democrático. Aí — peço licença ao Dr. Jorge Fontoura para tomar emprestada uma expressão européia — abriu-se um vácuo de democracia, de legitimidade, no processo decisório do MERCOSUL.
Então, a evolução a que eu me referia foi a celebração, em outubro de 2003, do primeiro acordo interinstitucional entre 2 órgãos do MERCOSUL: o Conselho do Mercado Comum e a Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL. Esses 2 órgãos celebraram um acordo muito simples, que tem apenas 2 artigos. O art. 1º diz basicamente que o Conselho se compromete a enviar todas as normas que requeiram aprovação congressual à consulta da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL no momento da negociação daquele instrumento. Ou seja, o órgão decisório do MERCOSUL está negociando um instrumento que posteriormente vai necessitar de aprovação congressual. Aquele projeto de norma é enviado à Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL. Ela emite um parecer. E aí, no art. 2º, vem a contrapartida da Comissão: a Comissão se compromete a dar uma tramitação mais ágil, mais rápida, a toda a matéria que tenha merecido o seu parecer favorável. Ou seja, todo o instrumento que tenha vindo à Comissão e tenha recebido o seu parecer favorável, quando chegar ao Parlamento Nacional, terá uma tramitação mais rápida.
Aqui eu queria fazer um parêntesis para lembrar que uma das grandes fragilidades do Parlamento europeu é exatamente a falta de contato que ele tem, o vácuo que se abriu entre o Parlamento regional e os Parlamentos nacionais. E essa fórmula que foi vislumbrada pelos negociadores do MERCOSUL parece sanar esse vácuo que normalmente existe entre os órgãos regionais e os órgãos nacionais, porque há uma interação. Há uma consulta. A Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL, que é regional, que é quadripartite, dá o seu parecer. Mas esse parecer vem anexado ao instrumento MERCOSUL, à norma MERCOSUL, quando ela é enviada a cada Congresso Nacional. Então, as Comissões que forem examinar, aqui no Congresso Nacional, vão ver esse parecer, vão recebê-lo como um parecer da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL, o órgão regional, e vão estar informadas de que aquela norma já foi examinada em algum momento por um órgão que representa os Legislativos.
A Secretaria Da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL, a secretária regional que fica em Montevidéu, fez um levantamento das normas do MERCOSUL já negociadas e assinadas e de quantas delas ainda estão pendentes de aprovação nos Parlamentos, já que estamos falando em uma debilidade do MERCOSUL por conta da falta de internalizarão de normas.
Os resultados foram interessantes: 80 normas do MERCOSUL foram aprovadas até hoje desde o início, 1991. Todas elas requerem trâmite legislativo. Dessas 80, 21 foram aprovadas nos Parlamentos dos 4 países, ou seja, um quarto delas, 26%.
Há um número aqui que chama a atenção. Dessas 80 normas, 23 não foram enviadas a nenhum Parlamento. Ou seja, 23 ainda estão em algum lugar, em algum ministério, em alguma consultoria jurídica de algum órgão do Executivo, provavelmente sendo analisadas. Vinte e três estão ainda em poder dos Poderes Executivos dos 4 países e não foram enviadas aos respectivos Parlamentos.
Então, esse levantamento foi bastante interessante. Ele revelou algo que não se imaginava existir. Como, por exemplo, não se imaginava que algumas normas ficassem paradas durante muito tempo antes de serem enviadas aos respectivos Parlamentos nacionais e que isso também contribuiu para essa fragilidade institucional do MERCOSUL, para essa insegurança jurídica que existe no momento.
Eram mais ou menos esses os contornos de que eu queria falar, relativos à atuação da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL.
Eu retorno a palavra ao nosso coordenador e agradeço a atenção de todos. (Palmas.)
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Obrigado, Maria Cláudia Drummond.
Eu acho que agora o crédito do Deputado Dr. Rosinha aumentou mais ainda.
Parece que a organização do evento foi muito feliz na escolha dos temas das palestras, que partiram de uma visão mais focada na soberania, nos possíveis avanços de acordos institucionais etc., identificados pela Cláudia. Talvez o maior avanço esteja nessa proposta sobre a qual o Dr. Rosinha vai falar agora, que é justamente a atuação da Comissão Parlamentar Conjunta, com a implementação da consulta parlamentar, um novo mecanismo que se pretende estabelecer.
Passo a palavra ao Dr. Rosinha.
O SR. DEPUTADO DR. ROSINHA
- O nosso Coordenador Eugênio está me dando um tempo bastante elástico. Mas não vou usar todo esse tempo. Serei breve.
Quero falar um pouco da experiência de trabalho no curto espaço em que estou na Comissão do MERCOSUL e sobre o que vejo de dificuldades em uma Comissão como esta, no sentido de internalizar as normas e o papel do Parlamento nesse contexto.
A Maria Cláudia referiu-se à Comissão Parlamentar Conjunta citando o Tratado de Assunção, no seu art. 24, e o Protocolo de Ouro Preto, no seu art. 22, que cria a Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL.
A primeira pergunta que se faz é: a criação da Comissão Parlamentar Conjunta partiu da necessidade de os Parlamentos exigirem presença, ou partiu da necessidade de o Poder Executivo dizer que o Legislativo estava presente? Isso faz diferença.
Os Parlamentos são muito ausentes da política internacional nos países do MERCOSUL, porque não há interesse do Parlamentar na política internacional ou não há interesse daquele que pretensamente o Parlamentar representa.
Se formos debater a política internacional com a sociedade não obteremos eco. Em geral, o eco no meio da população não é a política internacional. São poucos os Parlamentares que se preocupam em debater política internacional, até porque ele se torna muito ausente — fazendo um outro discurso — da chamada base de apoio ao Parlamentar. Isso o leva a se afastar da política internacional.
Nos últimos 20 anos, os modelos econômicos adotados, os tratados internacionais assinados, principalmente na Área de Livre Comércio, afetaram diretamente a população. Hoje, qualquer tratado na Área de Livre Comércio tem tudo a ver com a realidade do dia-a-dia de qualquer um de nós ou de qualquer pessoa que vive em algum país. No entanto, isso não leva a despertar o interesse da população pelo Deputado ou pelo debate da política internacional. As últimas eleições no Brasil exemplificam isso. Com exceção do Lula, fazendo referência ao MERCOSUL, e do Serra, negando-o, em certo momento do debate, observamos que não é o que repercute em termos de voto.
O Uruguai vive um processo eleitoral que, felizmente, ganhou força nacional no debate da política do MERCOSUL porque a população começou a se envolver no tema. É importante o envolvimento do Parlamento nesse tema. Na questão do MERCOSUL os Parlamentos estão pouco envolvidos, de uma maneira geral. No caso do Brasil há um maior interesse, às vezes, de Parlamentares do Sul, pela fronteira e não pelas relações. Há a compreensão de que a integração seria meramente para debater problemas de fronteira e, então, acaba-se exigindo mais desses Parlamentares.
Então, por não ter uma demanda popular, por não ter uma demanda institucional, o Parlamento brasileiro hoje tem um papel limitado, eu diria, no âmbito do debate da política internacional. Ele ganha ênfase, ou está ganhando, em um processo cumulativo dos últimos anos, porque nossa capacidade de intervenção ou de mudança de qualquer acordo internacional que passe pelo nosso Parlamento é limitada.
No caso da Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL, quando assumi a Presidência, em maio do ano passado, tínhamos cerca de 26 ou 28 acordos para serem analisados, e hoje temos somente 4. Isso demonstra que às vezes a questão da internalização não depende do Parlamento, ou não chega até aqui, ou se chega não é ele que segura, até porque hoje podemos dizer que temos apenas 4 acordos para serem aprovados, no Senado. Na Câmara, não temos mais nenhum.
Vou explicar essa tramitação. Vejo-a como uma dificuldade para a internalização, porque a nossa Comissão é a primeira a dar um parecer, que recomenda a matéria às demais Comissões, que chama a atenção sobre o mérito e, sobre esse mérito, recomenda aos demais um comportamento. Não podemos dizer, não... Arquive-se ou não se arquive não significa absolutamente nada.
A partir da nossa Comissão, a matéria passa a ser analisado por outra, e, se a votação for até o final, serão no mínimo 7 votações e no máximo 11 a 13 votações de um acordo do MERCOSUL. Digo no mínimo 7 porque irá passar pela nossa Comissão, pela Comissão de Relações Exteriores, pela Comissão de Constituição e Justiça e pelo Plenário da Câmara. Já são 4. No Senado, passará pela Comissão de Constituição e Justiça, pela Comissão, geralmente, do mérito da matéria, que é a de Relações Exteriores, e depois pelo Plenário do Senado Federal. Aí já são 7. Se for referente a transporte, passará pelas Comissões De Transporte; se for referente à vigilância sanitária, passará pela de Saúde. Portanto, acabam sendo de 7 a 12 votações.
Mesmo com essa situação, o processo de internalização demorado não tem se dado pelo comportamento — pelo menos posso falar a respeito do último ano e meio — do Congresso Nacional. Mas, para viabilizar esse processo, estamos discutindo o mecanismo a que a Cláudia se referiu, que é o mecanismo de consulta.
Elaboramos e assinamos a Disposição nº 02, de 2004, que regulamenta o mecanismo de consulta de maneira mais transparente. Durante o processo de negociação nos Estados-Partes, seremos ouvidos, o Congresso Nacional de cada Estado-Parte será consultado. Se entendermos que há alguma dificuldade em algum setor, entraremos e começaremos juntos a recomendar como vai se dar a negociação ou, inclusive, a participar do processo. Teremos 60 dias para responder a essa consulta feita pelo Poder Executivo, pelos órgãos negociadores. Dada a resposta, após o protocolo ou o acordo ser assinado, teremos, caso seja dito que não há problema, um compromisso de, em 180 dias, aprovar a tramitação dele nos respectivos congressos.
Esse é um mecanismo para que o Congresso Nacional ou os Parlamentos de cada Estado-Parte tenham um papel mais relevante no processo negocial, o que hoje não existe.
Hoje, apesar de não haver obrigatoriedade, participamos e somos convidados a participar de todo o processo de negociação dentro do MERCOSUL. O Governo brasileiro não se opõe à presença de Parlamentares brasileiros na negociação. Esse é um ponto positivo. O único problema é que não damos conta, é impossível darmos conta, porque a negociação é permanente, e todo dia há um subgrupo ou um grupo negociando no âmbito do MERCOSUL. Então, apesar dessa transparência, ele é insuficiente para nós, porque é impossível para nós, Parlamentares, estarmos em todas as negociações do MERCOSUL.
Então, o mecanismo de consulta pode vir a contribuir para que, indiretamente, o Parlamento brasileiro ou os Parlamentos de cada Estado-Parte participem e a sua participação seja fundamental para a incorporação das normas, impedindo que elas fiquem nas gavetas das Comissões.
Um outro ponto que estamos discutindo, que acho pode vir a ajudar, mas não significa solução, mesmo porque o mecanismo de construção do MERCOSUL não é um mecanismo supranacional, diz respeito ao Parlamento do MERCOSUL. Há um debate hoje bastante avançado. Acredito que em dezembro se assine o acordo de constituição do Parlamento.
Estamos distribuindo, para quem quiser, cópia do que foi acordado até o momento, no âmbito dos 4 Estados. É muito aquém do desejo brasileiro. Nosso desejo é de eleições diretas para um Parlamento no âmbito do MERCOSUL, com um mínimo de representatividade, proporcional à população. Era esse o nosso desejo. Não conseguimos isso num primeiro momento, porque os Estados menores acham que, se fizermos na proporcionalidade, só o Brasil vai impor o seu desejo. Mas há dispositivos para construirmos uma proporcionalidade mínima, e essa proporcionalidade não ser superior aos demais Estados Partes, pelo mecanismo de quorum de votação. Podemos estabelecer um quorum qualificado, dando-lhe algumas características, impedindo que os Parlamentares de um único país imponham seu desejo e a sua vontade aos demais.
Essa é uma dificuldade que estamos encontrando, mais uma, porque a primeira é o sufrágio universal. Há certa oposição, hoje, muito mais constatada nos Parlamentares do Uruguai, mas acredito que, com o processo eleitoral, vai ser possível mudar.
A segunda questão é a proporcionalidade, que também encontra muita dificuldade entre os Parlamentares uruguaios.
A terceira questão, que estamos propondo, diz respeito à corrente ideológica de voto, como é hoje na União Européia. É apenas um exemplo, um modelo, não se trata de transportarmos diretamente para cá. Mas, se desejamos representar minimamente e mesmo que indiretamente a população, há que se ter corrente ideológica na hora de concorrer ao Parlamento, com os liberais de um lado, os chamados social-democratas do outro, os socialistas do outro, os verdes do outro, se assim forem chamados os ambientalistas. Essas correntes ideológicas iriam se autodefinindo.
Com a corrente ideológica e com o sufrágio universal, será possível, inclusive, não se fazer alinhamento direto dos Parlamentares por blocos de países, porque o que vai levar à constituição do bloco não será apenas o debate do nacionalismo de determinado país ou de determinada visão ou somente o debate sobre a soberania deste ou daquele país.
Então, como esse Parlamento vai contribuir para a internalização de normas, se ele não vai ter a capacidade e a possibilidade de legislar? Ele vai contribuir no sentido de ser uma instituição a mais onde o debate político vai se dar. Boa parte ou toda a construção de um bloco passa pela vontade política. Se não houver vontade política de se construir esse bloco, não se superam as barreiras legais, ou mesmo as barreiras da necessidade de se construir um novo processo legislativo, não se superam as barreiras econômicas e não se superam, inclusive, as barreiras de criação de identidade.
Se comecei dizendo que, no Brasil, o grande problema é que a população não consegue enxergar a importância do Parlamentar na política externa do País, ao se constituir o Parlamento do MERCOSUL, podemos conseguir, com isso, construir uma identidade política de bloco, porque a população passará a eleger parlamentares e vai fazer debates políticos sobre o processo eleitoral, sobre eleições.
É lógico que se ganha uma referência política, ganha-se uma representatividade política. Essa referência e essa representatividade vão contribuir para a internalização das normas, porque se vai dar em outra instituição, em outro âmbito o debate político sobre todas as normas, acordos e protocolos.
Vejam que hoje vivemos um momento importante na conjuntura da América: somos países presidencialistas e todos vivendo uma democracia liberal — não há mais ditadura militar hoje na América do Sul. Isso é importante num processo de debate de integração entre os países, e num processo de debate inclusive de integração de levar a política de integração para dentro dos próprios países.
A dificuldade maior que se apresenta atualmente não é a barreira política, mas a econômica, conforme enxergamos. A macroeconomia hoje tem pouca capacidade de decisão dentro dos próprios países. Vejo que isso também, Jorge, dificulta a internalização de muitas normas, porque a decisão hoje da macroeconomia, dentro dos países da América do Sul, é muito limitada. É pouco o poder de decisão de um governo sobre os rumos econômicos que vai tomar. Ele tem uma dependência econômico-financeira dos grandes países, dos grandes setores financeiros, inclusive, às vezes, dependendo do país, não tem capacidade de decisão nem sobre algumas grandes empresas, ou corporações que mandam mais na economia do que alguns governos.
A internalização de normas muitas vezes passa pela própria dificuldade econômica de se fazer isso, até porque a barreira está na economia, ou por insuficiência de capacidade de resolução desse Estado ou pela imposição econômica de grandes corporações ou de outros Estados.
Vejam agora as dificuldades econômicas que estão vivendo todo o processo, ou o que ocorreu ainda esta semana na Argentina, com a visita do Rato, um nome bastante importante do Fundo Monetário Internacional, a Buenos Aires, para negociar. É uma piada, mas o sobrenome do homem é Rato — o que podemos fazer? É o espanhol que representa o Fundo Monetário Internacional na negociação com a Argentina. Então, o Rato, do Fundo Monetário, visitou a Argentina para negociar o processo de dívida daquele país.
As normas emanadas dos acordos do MERCOSUL e que dependem de processos de concessões econômicas — muitas delas dependem —, ou que dependem, às vezes, de investimentos para serem internalizadas, vivem essa dificuldade.
Para encerrar, a questão social. O que há de ponto positivo é a democracia liberal na qual vivem os países, e as dificuldades são a macroeconomia e a questão social, bastante grave.
Como vamos internalizar determinadas normas? Eu estive num debate nesta semana sobre a questão de contrabando. Há um acordo assinado entre Brasil e Paraguai, de atuação conjunta nessa área, ainda não aprovado pelo Parlamento do Paraguai. Aí começamos a ver em que isso vai repercutir.
Quando comparamos a questão tributária entre os vários países que compõem o MERCOSUL e, principalmente, entre o Brasil e o Paraguai, vemos que no Paraguai há maior liberdade tributária ou uma menor cobrança de tributos. Assim, no momento em que se vai fazer a internalização de algumas normas, equalizar, provavelmente os custos de algumas mercadorias no Paraguai vão subir. Isso vai gerar mais problemas sociais.
A resistência de um governo, às vezes, de internalizar determinadas normas é que o problema social que ele enfrenta pode inclusive agravar-se, porque não temos um mecanismo de macroeconomia suficiente para compensar os problemas internos desse país. Eu teria que ter um fundo de compensação, fundo esse que não temos hoje no MERCOSUL. Há um processo de debate, há uma discussão para que possamos ter esse fundo de compensação, ou até fundo de desenvolvimento, que não temos, mas se não se compensar determinado país em determinado setor, vai-se agravar o problema social nesse país. Vejo isso como uma barreira à internalização de algumas normas. O país, ao aprovar aquela norma, não vai conseguir dar respostas sociais e econômicas àquele setor.
São debates importantes, mas o que nos deixa otimista é a vontade política dos Estados-Partes de construir o MERCOSUL. Há também não diria um destino, mas uma exigência histórica ou uma exigência de futuro de construção de blocos, porque hoje é impossível, praticamente, a qualquer país enfrentar sozinho a política econômica no âmbito internacional. Ele vai ter que fazer esse enfrentamento por meio da construção de blocos e acredito que estamos caminhando para um bloco da América do Sul, em passos até rápidos, devido à vontade política, se nos compararmos à União Européia, que levou mais de 50 anos em sua construção, e estamos praticamente há dez anos. E mesmo na União Européia nem todas as normas são internalizadas: um pouco mais de 10%, mesmo que seja por decisão supranacional. Há algumas dificuldades. Nem tudo é colocado em prática imediatamente, mesmo na União Européia, o que demonstra também grandes dificuldades.
O Jorge levantou o assunto dos subsídios agrícolas na União Européia, que tivemos oportunidade de debater. Eles dizem — e há uma aliança de todas as forças políticas — que não vão abrir mão desses subsídios. Eles viveram grave crise de fome após a Segunda Guerra Mundial e, para eles, é estratégico ter uma política de segurança alimentar; o subsídio deles funciona como estratégica de segurança alimentar.
No âmbito do nosso bloco, temos também de definir estratégias. Se hoje a nossa estratégia é a construção de um bloco da União dos Países da América do Sul, que considero correta, temos de entender que essa união nos colocará numa certa condição importante, no âmbito mundial, da produção de alimentos e de acesso aos 2 oceanos, o Atlântico e o Pacífico. Portanto, há alguma importância estratégica para nós e justamente por isso os outros blocos enxergam o que estamos querendo e se opõem violentamente à nossa construção. Há que se levar em consideração, nessa construção e nessa internalização de normas, a oposição das grandes forças políticas do mundo, não desejando que seja construído.
Esse debate nosso de hoje é importante, porque nos mostra que o obstáculo à internalização de normas não é criado por vontade de alguém. Não é o Parlamento brasileiro nem alguns Parlamentos que não querem votar rapidamente. É que a internalização daquela norma leva setores de determinado Estado-Parte a sofrer uma ou outra conseqüência, por falta de políticas maiores. Não há, talvez, falta de vontade de algum burocrata, mas o limitador que às vezes os Estados impõem. Nesse debate em Buenos Aires, o Vice-Ministro que representava o Paraguai afirmou que a capacidade do Estado paraguaio — se houvesse algum percentual de medir qual a capacidade do Estado — de intervir naquele país era de 13%, 14%, 15%. Vemos, portanto os limitadores da capacidade de um Estado de intervir no âmbito geral para internalizar essas normas.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Antes de passar aos debates, queremos agradecer a presença e a colaboração de alguma pessoas que colaboraram para a realização desse evento: Prof. Osvaldo Della Giustina, adjunto da Secretaria de Representação do Estado do Tocantins; Dra. Enir Guerra, coordenadora do Subgrupo de Saúde, Subgrupo 11; Dra. Sônia Damasceno, assessora desse mesmo subgrupo; Sr. Gonzalo Urriolabeitia, representante da Embaixada da Argentina; Sr. Severino de Sousa Oliveira, representante da OAB-DF; Sra. Susan Elizabeth Martins César, representante da Embaixada do Canadá; Sra. Vitória Gehre e Sr. Sérvulo Moreira, representantes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social; Secretária Márcia Loureiro, do Ministério das Relações Exteriores; Sr. Wilfrido Fernández, membro da lista de árbitros do MERCOSUL pelo Paraguai; à Ministra Teresita Gonzáles Díaz, da Embaixada da Argentina.
Há 3 pessoas inscritas, peço-lhes que se identifiquem antes de iniciar a intervenção.
O SR. ANDRÉ BARBOSA
- Bom dia. Há 10 anos se discute esse mercado. Sou de origem argentina mas resido aqui há 25 anos. Dez anos, estamos no 1º grau ainda. Jorge falou que talvez tenhamos de derrubar 4 ou 3 elos, mas ainda vejo o MERCOSUL engatinhando. Há muitas dificuldades, como disseram o Jorge, a Dra. Márcia e o Dr. Rosinha, Deputado atuante, e vejo que temos 23 medidas engavetadas. O que ocorre? Estamos agindo como tecnocratas e não como técnicos. Vejo que a solução seria Deputados, empresários e líderes de ambos os países passarem 6 meses em cada país para aprender as legislações, saber as dificuldades, conhecer os sindicatos e os produtos e não criticarem nos jornais: "Não queremos mais cota tal e tal". Isso é uma coisa inadmissível.
Estamos acostumados a trabalhar com fax, com documentos enviados, mas não estamos acostumados a passar 6 meses em um país para conhecer tudo o que se vai negociar. Estamos acostumados a falar e a contar histórias, mas a fazer coisas já, ninguém. Isso fica pendente de assinatura apenas de Presidentes, Deputados, só técnicos, tecnocratas. Não há algo mais prático, técnico e comercial, executado, sobretaxado, não taxado, livre de isenções. Precisamos abrir as janelas e as portas; não precisamos ser egoístas, mas livres. Estamos acostumados a ouvir: "Independência ou morte", na História, ou: "Hay que endurecer-se pero sin perder la ternura jamás", mas temos que ser mais livres. Ou seja, a moeda comum para o MERCOSUL pode ser livre como o euro, é um início. Mas temos pequenas coisas que vejo que devemos fazer e saber o que há de retaguarda em cada país para elaborar uma legislação — e não se acostumar a andar de avião daqui para lá e não fazer nada. Para ser técnico e praticante, é preciso ir lá, ficar 6 meses para saber tudo, voltar ao país e falar: "Vamos fazer". E cada um faz. Assim, a lei sai, como também o Mercado Comum, como fez a União Européia. Eles falam para nós o seguinte: "Você, quando tirar o chapéu, bota terno e volta". Mas estamos ainda como um caipira. Esperamos que haja uma boa solução — com mais 5 anos no 2º grau para ser universitário e vender nosso produto.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Peço a V.Sa. que se identifique.
O SR. ANDRÉ BARBOSA -
Meu nome é André Barbosa, ambientalista.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Peço às pessoas que estão inscritas que se identifiquem. Vamos adotar a seguinte sistemática: as intervenções serão feitas em seqüência, a não ser que haja um ponto muito concreto para a intervenção, em seguida a Mesa fará uma apreciação geral das intervenções.
Com a palavra o Sr. Severino de Sousa Oliveira, Diretor-Tesoureiro da OAB/DF. (Pausa.) Ausente.
Concedo a palavra ao Sr. Rogério Calil, representante da UNAFISCO.
O SR. ROGÉRIO CALIL
- Meu nome é Rogério Calil, sou Auditor Fiscal da Receita Federal e Diretor de Defesa Profissional do UNAFISCO Sindical.
Nossa preocupação maior é quanto à internalização das normas — levantar com muita rapidez as paredes e esquecer das bases. A Dra. Maria Cláudia disse que o problema maior da não-incorporação das normas é a questão da insegurança jurídica. Quero amplificar um pouco esse entendimento dizendo que isso não pode ser levado somente do ponto de vista de insegurança jurídica nas relações contratuais. Vou ser mais claro. Há outros pontos basilares nessas relações que são as questões fiscais — operação triangular, certificado jurídico, percentual de nacionalização — questões que ainda não estão muito claras. Mas há questões mais básicas que ainda não conseguimos internalizar e dar maior clareza, como segurança fiscal e segurança do fiscal, do agente do Estado, de um modo geral, especialmente nas áreas de integração.
Temos algumas aduanas integradas, especialmente no sul do País; estamos tentando fazer no Paraná — já temos no Rio Grande do Sul. Mas existe uma série de questões naquelas zonas que ainda estão indefinidas para os agentes de Estado brasileiros. Por quê? Porque a maioria das nossas zonas de integração está no Estado argentino e lá não existe esse tipo de problema.
No nosso caso, por exemplo, se um agente estatal brasileiro sofre algum atentado numa zona integrada, pela própria natureza da sua função, em que fórum isso vai ser julgado? Trabalhei 2 anos e meio em Uruguaiana, divisa com a Argentina. Temos exemplos de apreensões de mercadorias que são classificadas como drogas, proibidas no Brasil, e não são classificadas assim na Argentina. Houve uma apreensão desse tipo de mercadoria na nossa aduana de passagem. E o juiz do país determinou que entregássemos aquela mercadoria — sabemos que ela entrou por outro lugar no momento em que a entregamos. São questão básicas das nossas relações que ainda não resolvemos, com as quais devemos nos preocupar para avançar nas normas contratuais, pois sabemos que têm grande importância.
Muito obrigado.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Com a palavra o Sr. Sérvulo Vicente Moreira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada — IPEA.
O SR. SÉRVULO VICENTE MOREIRA
- Obrigado, Dr. Eugênio Arcanjo. Primeiramente quero agradecer aos senhores expositores, porque, confesso, estou surpreso, pois eu não imaginava que o evento trouxesse à baila assuntos que estamos vivenciando e com os quais nos preocupamos.
Vou fazer algumas considerações a respeito desse tema, já que ele me interessa muito. O que me surpreende é o dinamismo do MERCOSUL. Criado em 1991, já tem resultados palpáveis desde 2000, como já foi quantificado. Considero mais importante a parte quantitativa e qualitativa do MERCOSUL, ou seja, a parte microeconômica.
Quero lembrar que a integração se dinamiza segundo a tradição de comércio existente entre os países, ou seja, é um tipo de sociedade. Quanto mais a tradição vai sendo criada numa negociação comercial, mais fácil flui a negociação. Se não há tradição de comércio, então, fica numa negociação de lista de produtos etc., haja vista o que aconteceu com a ALALC. E essa tradição leva a uma confiabilidade, a uma aproximação, e até aproximação cultural, como vemos no âmbito do MERCOSUL. Portanto, outras formas de integração nem sempre funcionam.
O MERCOSUL, até onde sei, procurou adaptar, na medida do possível, algumas experiências de sucesso da União Européia. E, desde o início do MERCOSUL, a União Européia já manifestou interesse, o desejo de participar do MERCOSUL — isso em 90, à época das negociações.
Quanto a procurarmos imitar a União Européia, essa postura levantada da soberania, uma parte nacional, não concordo com isso. Não vamos fazer uma tentativa e erro, como ocorreu na União Européia. Se estamos apenas aproveitando aquilo que deu certo na União Européia, podemos transportar para o MERCOSUL, importar e usar, e não reinventar a roda. Não é esse nosso interesse. E se temos como queimar etapas, como tem sido feito no MERCOSUL, a meu ver, é fantástico.
Por que insistirmos em coisas que não são tão válidas? Concordo com a posição da Dra. Maria Cláudia quanto à história da União Européia, que é um referencial para a integração no mundo inteiro, tanto em termos empíricos quanto teórico. Não adianta pensarmos em outras coisas. Se observarmos a Teoria da Integração, vamos encontrar Wainer, em 1949, e Balassa, em 1962. São estudos baseados na experiência da antiga Comunidade Européia do Carvão e do Aço, chegando ao Mercado Comum Europeu, hoje União Européia.
A construção de um bloco, uma questão levantada pelo Dr. Jorge Fontoura, com a qual não concordo — e não sei se foi isso que ele quis dizer, — começa com a parte jurídica. Entendo que não. Quem leva o bloco para frente é a firma individual. A firma, participando, vai criar necessidades que têm que ser resolvidas pela parte jurídica. Firmas, pessoas, confusões, aquisições, no âmbito do MERCOSUL, vão levar à criação de normas e jurisprudências, ou seja, a parte jurídica. Exemplos nós temos. Se criar só com a parte jurídica não vai funcionar, como a ALALC, criada por decreto. Foi citada a Comunidade Andina, que é o Grupo Andino vestido com outra roupa, também não está funcionando, porque, na verdade, está repetindo o que o Grupo Andino fez.
Quanto ao que disse o Deputado Dr. Rosinha, que a população não participa do processo integracionista do MERCOSUL, parte disso também acontece na União Européia, pelo que sabemos. O que eu gostaria de mencionar, Deputado, é que todos os Estados da União participam efetivamente do MERCOSUL. Há um estudo feito, uma pesquisa recente, um levantamento quantitativo, empresa por empresa, com grau de escolaridade dos funcionários, renda, localização, Município. Então, todos os Estados da Federação estão participando ativamente do MERCOSUL. Obviamente, começou pelo Sul e depois foi avançando até o Acre. Tenho esse estudo, que foi objeto de muita pesquisa, já foi traduzido. Isso existe, e é recente, mostrando a evolução e o grau de participação.
Então, voltando à população, eu gostaria de saber o que será feito para disseminar o MERCOSUL entre a população, considerando que cada pessoa dentro do bloco é um consumidor em potencial, e que o que se leva em consideração é esse consumidor em potencial.
Por outro lado, desde o início do MERCOSUL, sinto que há necessidade de formação de administradores do MERCOSUL. Isso é algo que temos que ter em mente, eu acho. Já disse isso em outros fóruns internacionais. Há falta de pessoas habilitadas, não querendo desmerecer ninguém, que possam dar seqüência aos trabalhos do MERCOSUL.
Quanto a essas normas e seus efeitos, caso não sejam bem analisadas, com o repique que elas têm, como o senhor mencionou com toda propriedade, Deputado, ou se o Executivo não for mais dinâmico, como disse a Dra. Maria Cláudia — foi essa a palavra que a senhora usou, não é? —, se não forem bem analisadas, poderão levar mais a um desvio de comércio intra-regional do que à criação de comércio, que é a nossa proposta, que é a proposta do bloco. Obrigado.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- A intervenção do colega do IPEA foi muito interessante. Acho que o IPEA pode ser uma parceria importante, inclusive com a Comissão do MERCOSUL, na elaboração desses estudos. Achei muito importante.
Com a palavra o Sr. Wilfrido Fernández, do Paraguai, do Tribunal Arbitral do MERCOSUL.
O SR. WILFRIDO FERNÁNDEZ
- Primeiro, quero parabenizá-los pela qualidade do evento e das apresentações dos oradores. Em segundo lugar, farei um breve comentário e uma breve pergunta.
Acho que os oradores foram muito felizes e uniformes em asseverar que um dos pontos fracos do MERCOSUL é a carência atual de uma devida e séria institucionalidade. Atualmente, depois de 13 anos de criação da sua estrutura, o MERCOSUL ainda é uma união alfandegária imperfeita, eu diria, ainda bastante imperfeita. Há 4 graus de integração tradicionais, bem clássicos: área de livre comércio, união alfandegária, mercado comum e, finalmente, uma união econômica e monetária. Hoje em dia, os europeus já estão falando em um quinto estágio, que é uma constituição européia.
Na minha modesta opinião, uma alternativa bem possível para melhorar essa carência de institucionalidade dentro do MERCOSUL é a instauração imediata e bem rápida do princípio da supranacionalidade. E acho, não sei se porque não entendi bem os oradores, que eles não são muito favoráveis à instauração do processo de supranacionalidade. Creio que a Dra. Maria Cláudia disse que a instauração da supranacionalidade hoje em dia, dentro do MERCOSUL, seria uma fantasia. Talvez eu esteja errado, mas, na minha modesta opinião, a única solução institucional séria e responsável dentro do MERCOSUL para melhorar o estado atual da estrutura é a criação da supranacionalidade.
Hoje, o Tribunal Arbitral do MERCOSUL, lamentavelmente, ainda não é um órgão supranacional, como acho que já deveria ser. A Comunidade Andina, que, com todo o respeito, dentro do espectro regional, continental e internacional, é um bloco menos importante, política e economicamente falando, que o MERCOSUL, está décadas mais à frente no que se refere à supranacionalidade e à institucionalidade no processo de integração. O MERCOSUL, lamentavelmente, depois de 13 anos, ainda não pode falar em um direito comunitário, só pode falar em um modesto direito de integração, que acabou se desprendendo do direito internacional clássico.
Finalmente, a minha pergunta e a minha conclusão: os senhores concordam com a necessidade da supranacionalidade dentro do MERCOSUL ou não concordam? Concordo, como o cavalheiro que me precedeu no uso da palavra, que copiar ou imitar processos da União Européia ou da Comunidade Andina de forma automática não adianta. Mas copiar ou aprender quando lá deu certo é algo positivo.
Então, essa seria a minha pergunta: gostaria de saber se os senhores concordam ou não com a supranacionalidade dentro do MERCOSUL, como uma possibilidade séria e responsável, um passo à frente dentro de um processo de integração, em que algum dia, em um breve futuro, dentro do MERCOSUL, possa se falar em um direito comunitário e não somente em um modesto direito de integração. Muito obrigado.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Obrigado, Sr. Wilfrido. As perguntas serão respondidas logo em seguida, na rodada final de intervenção dos palestrantes.
Com a palavra o Sr. Otávio Augusto Trindade, do Instituto Rio Branco.
O SR. OTÁVIO AUGUSTO TRINDADE
- Obrigado, Dr. Eugênio. Agradeço aos membros da Mesa as exposições, que, se não tivessem sido tão enriquecedoras, não teriam aceso esse debate tão profundo.
Tenho uma questão, que diz respeito à possibilidade de vigência imediata de normas do MERCOSUL no Direito brasileiro. Talvez seja uma questão dirigida ao Prof. Jorge Fontoura.
O art. 42 do Protocolo de Ouro Preto estabelece que essas normas do MERCOSUL têm caráter obrigatório e, quando necessário, deverão ser incorporadas aos ordenamentos internos. A leitura desse artigo sugere que a regra seria a vigência imediata, em razão da expressão "quando necessário".
Há 9 anos, o Conselho Mercado Comum interpretou a matéria de forma mais restritiva, dizendo que essas normas que dispensam aprovação legislativa, que teriam vigência imediata, seriam apenas aquelas que diriam respeito ao funcionamento do bloco.
Há quem entenda que esse art. 42 autoriza normas do MERCOSUL, cuja matéria seja de competência dos Executivos, como, por exemplo, questões tarifárias, medidas fitossanitárias e outras barreiras. Essas normas que diriam respeito a essas matérias de competência do Executivo poderiam ter vigência imediata, ou seja, após aprovadas no âmbito do MERCOSUL, seriam publicadas diretamente nos diários oficiais. Então, há quem entenda que esse art. 42 permita isso e que não há nada no Direito brasileiro que impeça, uma vez que o Protocolo de Ouro Preto também foi aprovado pelo Congresso.
Essa solução não seria um meio termo entre uma "soberanofilia" e uma "eurofilia", porquanto as normas que atingiriam diretamente o indivíduo ainda estariam sujeitas ao Parlamento? Essa a minha pergunta. Obrigado.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Muito obrigado, Otávio.
Essa questão é muito importante e, inclusive, antes de passar a palavra para os oradores, quero chamar a atenção para o painel de hoje à tarde, que irá tratar mais diretamente desse tema. Será um painel superimportante, com a presença do Dr. Cachapuz de Medeiros; do Dr. João Ricardo, que é consultor aqui da Câmara; do Dr. Márcio Garcia, do Ministério da Justiça, internacionalista; e do Dr. Valdir Vicente de Barros, Coordenador da Seção Brasileira do Fórum Consultivo Econômico-Social.
Há uma última pergunta, que foi enviada por escrito. Eu peço aos participantes que se inscrevam. Apesar de ser uma questão bastante específica, não sei se vai ser possível uma intervenção sobre ela aqui.
Há ainda pergunta do Pastor Bentílio, da Igreja Batista: como ficam as relações dos trabalhadores dos Correios do Brasil e dos outros países no tocante às normas do MERCOSUL? Eventualmente, se puder haver maior detalhamento da pergunta, a Mesa agradeceria.
Essas foram as questões apresentadas.
Não havendo mais pessoas que queiram intervir no debate, vamos passar a palavra aos expositores, na ordem em que se manifestaram, para responder às perguntas..
Em primeiro lugar, passo a palavra ao Sr. Jorge Fontoura.
O SR. JORGE FONTOURA
- Inicialmente, gostaria de agradecer aos participantes pelas perguntas formuladas, que considero extremamente relevantes. Vou procurar respondê-las num só comentário.
É muito importante sabermos que o MERCOSUL é a integração dos pobres e que a União Européia é a integração dos ricos. A União Européia tem 23 mil funcionários, 11 mil tradutores. Tem orçamento próprio, fundos comunitários. O MERCOSUL é uma integração única na história da América Latina, porque foi construída a partir de um sistema extremamente flexível, transparente e simples. O Tratado de Roma chega a quase 500 artigos. O Tratado de Assunção tem apenas 24 artigos. Nós construímos um modelo de integração extremamente original na história da América Latina, região onde sempre procuramos complicar as coisas antes que resolvê-las.
Talvez isso explique o grande sucesso dos primeiros tempos da integração do MERCOSUL, quando os países iam economicamente muito bem, quando nós tivemos um salto no comércio intrazona de 3 bilhões para 21 bilhões de dólares em poucos anos — e o dinheiro é sempre um bom argumento. Todas as pessoas, naqueles primeiros anos, se convenceram da correção do caminho da integração. Mas isso não mudou a estrutura extremamente flexível, simples, do MERCOSUL, que atendia à História e à Geografia, porque a integração é história e geografia. Os europeus têm a sua própria história e a sua própria geografia. A história às vezes pode ser uma interpretação, mas a geografia é sempre e inexoravelmente um fato. Não podemos discutir com ela. E a geografia nos leva a essa realidade de integração intergovernamental, que, atendendo às assimetrias entre os países, cria e utiliza o sistema do Direito Internacional Público clássico, em que tudo é decidido por consenso e unanimidade. Se assim não fosse, estaríamos caminhando talvez num sendeiro muito perigoso de integração, em que as assimetrias viriam à tona.
E, quando concebemos a possibilidade da supranacionalidade, devemos imaginar que o primeiro mandamento da supranacionalidade é a tomada de decisões por maioria. E seríamos obrigados, então, no nosso pacto, a descobrir qual maioria. Qual seria a maioria aplicável à realidade da integração? Há a diversidade dos países. Há o problema do Brasil com o seu gigantismo, talvez no sentido doentio da palavra, da acumulação da produção industrial, do peso institucional das empresas, do fato de um dos países desse bloco ter 70% do PIB da região, o que causa grandes dificuldades na construção de uma arquitetura de entendimento político, o que os europeus fizeram muito bem.
Se tivéssemos uma estrutura supranacional, eu me pergunto: o que teria acontecido ao MERCOSUL logo após a desvalorização do real? O que teria acontecido para o MERCOSUL, se nós tivéssemos uma instituição supranacional, no dia seguinte ao das constantes crises que tivemos, temos e teremos nessa realidade política da América Latina, que tão bem conhecemos?
Em relação ao problema constitucional levantado pelo aluno do Instituto Rio Branco, trata-se evidentemente de um tema de primeira grandeza. A expressão do art. 42 do Protocolo de Ouro Preto, quando necessária, poderia permitir uma série de interpretações, mas a única interpretação efetiva, válida e aplicável à vida real seria a dos tribunais. Se os casos chegassem aos tribunais, seriam estes que iriam decidir em relação a eles — não a comunidade acadêmica. Posso escrever 50 livros, burocratas ou mercocratas poderão fazer uma série de pareceres, porém, na vida real, se esse problema existir, será decidido pelos tribunais. Essa expressão, entendida pelos tribunais brasileiros, seria feita da forma comum: o sistema do controle de constitucionalidade das leis.
Quando imaginamos que uma norma do MERCOSUL não precisa passar pelo Congresso Nacional, estamos apenas imaginando. Mas, se algum operador econômico tiver um prejuízo e for ao Poder Judiciário, este irá aplicar o regime constitucional brasileiro e esse regime está, nesse sentido, previsto. Temos um sistema de Direito Positivo, no art. 49, inciso I, que fala do princípio do utilitarismo. Os atos internacionais, usando a expressão mais ampla possível, que gerarem compromissos gravosos, deverão ser objeto de convalidação parlamentar.
Poderíamos imaginar até — e compartilho dessa idéia — que não existe Direito derivado no MERCOSUL. Direito derivado é uma expressão de Direito Comunitário europeu. Temos unicamente um Direito de Integração, que é Direito Internacional clássico. E se estamos falando do MERCOSUL e não de sua história — saber por que o MERCOSUL não deu certo como o SELA e como todas as outras experiências frustradas de integração na América Latina —, nós o fazemos justamente pela adoção desse sistema jurídico extremamente parcimonioso e realista na leitura de nossa verdade política.
Apenas um esclarecimento: a construção jurídica a que me referi é a construção institucional. Evidentemente, o Direito é fruto da sociedade. Quando não o é, será um Direito precário. O Direito deve estar nas medidas das necessidades sociais. E o Direito do MERCOSUL hoje, na minha percepção, está na medida das nossas dificuldades como países que vivem uma realidade de América Latina.
Se considerarmos que o Direito é um caudatário da sociedade, evidentemente todos são importantes, e, na integração, a primeira voz é a do cidadão, daquele que participa da vida econômica, que sente as vantagens e benefícios da integração, até porque a integração é feita simplesmente por interesse e conveniência. Por mais que tenhamos um discurso bolivariano, que os europeus façam um discurso de pacifismo, a integração se faz por conveniência e oportunidade. Não se faz integração por filantropia ou por caridade — faz-se integração por interesse político, de agenda externa. Os países fazem integração porque é proibido proibir. O art. 1º do GATT, a cláusula da nação mais favorecida, proíbe que façamos favores no comércio, a não ser que estejamos em blocos econômicos. Por isso, os blocos proliferam, e existem países que estão em blocos e países que querem entrar em blocos.
Quanto a esses problemas pontuais que surgem na integração, como o da segurança fiscal, embora sejam importantíssimos, derivados da cultura dos povos, surgidos na integração, não podemos confundi-los com problemas de fronteira. Os problemas de fronteira devem ser resolvidos com a sua própria temperatura e a sua própria pressão.
A construção de um bloco econômico, na verdade, é um projeto de desconstrução, e, quando desconstruímos, temos muitas dificuldades. Costumo citar o exemplo dos argentinos: se visitarmos a Casa Rosada, veremos que, logo ao lado, existe um prédio muito maior, a Casa do Fisco. Isso é reflexo da história da América Latina. Fomos criados com a idéia de que o comércio é algo ruim, de que o fiscal da fronteira é um sentinela da pátria e está ali para evitar o comércio. Hoje, estamos hoje num momento completamente diferente. E o próprio Direito Internacional, o utilizado para a integração, e é por ele começa a integração, porque não há outra forma de fazer um bloco econômico senão por um tratado, também vive uma crise de identidade. Precisaria ir ao analista, porque foi historicamente o Direito da construção das fronteiras — aí está a obra do Barão do Rio Branco. Hoje vivemos a contramão desse processo. O Direito é utilizado como instrumento de desconstrução das fronteiras. Esse fato talvez gere essa perplexidade, mas também a riqueza que o debate de integração e de construção de blocos econômicos suscita.
Um último comentário: não acho que o MERCOSUL ainda é uma união aduaneira, mas que já é uma união aduaneira. Com essa união aduaneira, que tem personalidade jurídica, teríamos a possibilidade inclusive de participarmos mais ativamente da vida internacional. Hoje, juridicamente, o MERCOSUL poderia em tese exercer sua voz de maneira mais firme, por exemplo, na negociação da dívida externa, ou como faz a União Européia — já que é necessário citar a União Européia —, que litiga como personalidade jurídica única na Organização Mundial do Comércio. Quando os pescadores espanhóis tiveram um conflito com os canadenses, como ocorreu recentemente, não se tratava, na OMC, de um conflito entre a Espanha e o Canadá, mas de um conflito entre a União Européia e o Canadá. Quem ganha?
Essa pergunta talvez responda muitas das nossas inquietações. Nós precisamos da integração não para resolver nossos problemas pessoais. Precisamos do bloco econômico para resolver problemas maiores, para resolver problemas de todas as pessoas. E por isso, encerrando, digo que a integração é uma tarefa para estadistas, porque as dificuldades vêm antes. Em geral, entre o ônus e os bônus há uma eleição, e os estadistas são obrigados a explicar a seus eleitores, às pessoas que acreditam neles porque a integração é positiva.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Obrigado, Dr. Jorge Fontoura.
Tem a palavra a Sra. Maria Cláudia Drummond.
A SRA. MARIA CLÁUDIA DRUMMOND
- Eu também queria agradecer aos participantes pelas perguntas formuladas, que representaram contribuições importantes para o aprofundamento do debate, sem dúvida nenhuma.
Abordo inicialmente a manifestação do Sr. André Barbosa sobre questões, pelo que entendi, que teriam muito a ver com a dimensão econômica e comercial do MERCOSUL. Lembro-me de um debate que se deu neste fim de semana em Montevidéu, ocasião em que o próprio Embaixador Botafogo, um dos artífices do MERCOSUL, dizia que precisamos dimensionar melhor o MERCOSUL de agora em diante em seu aspecto político e social, pois o MERCOSUL não é apenas econômico. Isso é interessante ressaltarmos.
Vejam como evoluíram os instrumentos constitutivos do MERCOSUL. Quando a integração se dava em nível bilateral, entre Argentina e Brasil, a integração era setorial e falava-se em desenvolvimento. O nome do tratado que instituiu essa integração era Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento entre Argentina e Brasil, e aí vinham os vários — entre 24 e 26 — protocolos setoriais: trigo, bens de capital etc.
Quando evoluímos para o Tratado de Assunção, a lógica da integração sofreu uma transformação bastante expressiva. Por quê? Porque o Tratado de Assunção usa instrumentos muito mais radicais de abertura de mercado. Não se fala mais em protocolos setoriais. Apenas um artigo do Tratado de Assunção menciona os acordos setoriais como um dos instrumentos da integração. A essência do Tratado de Assunção é a abertura das economias de maneira regular e sustentada, e não fala em desenvolvimento.
Há realmente uma mudança de rumo na construção da integração a partir do Tratado de Assunção. Não sou somente quem o diz, outras pessoas também identificaram que há um tom mais neoliberal a partir do Tratado de Assunção. Isso acarreta na integração o quê? Acarreta que a integração, ao invés de inserir de uma maneira mais vantajosa os produtos dos 4 países no mercado internacional — o Tratado de Assunção é composto de 4 países — passa a funcionar abrindo os mercados intra-MERCOSUL. Ou seja, o comércio intra-MERCOSUL passa a ter uma dimensão extraordinária. É o que preside toda a integração.
O que é isso? É concorrência entre os parceiros. Vejam como há, nesse caso, uma incongruência. Os parceiros assim o são numa integração, mas os produtos começam a concorrer entre si. Por isso, ao invés de privilegiarmos uma integração construtiva, retomamos recentemente àquela idéia dos estudos sobre cadeias produtivas. Mas o que deve haver é uma sociedade. Somos sócios; ramos produzir juntos e inserir, de maneira mais competitiva, nossos produtos no mercado internacional. Isso, sim, é uma integração.
Também não custa lembrar que a União Européia fez isso. Ela começou como integração setorial, com o carvão e o aço. E aqui lembro a pergunta do Sr. Rogério Calil sobre a questão da fiscalização, de discrepância de normas no caso da apreensão da droga. Quando houve problemas internos no CECA — Comunidade Européia de Carvão e Aço, o que se fez? Harmonizaram-se as normas. É uma questão de harmonização de normas.
Logicamente, é mais fácil promover a harmonização de normas por setores — no caso europeu, tratava-se de carvão e aço apenas. E temos de pensar também numa alta autoridade que emita decisões, aliás já aqui mencionada pelo Prof. Jorge Fontoura. Isso, de certa maneira, facilitava a harmonização de normas. Mas não significa que, como não temos um órgão supranacional, não possamos harmonizar nossas leis. Falta um pouco de vontade política. Daria até um exemplo: há uma reforma tributária em curso no Brasil. Não vi ainda ninguém falar na dimensão MERCOSUL dessa reforma. Não ouvi ninguém falar que se deve pensar que estamos num processo de integração ao se considerar essa reforma. Muitas outras leis têm passado pelo Congresso Nacional sem que se faça uma reflexão sobre o fato de que estamos num processo de integração. O mesmo acontece, sem dúvida nenhuma, nos outros países-membros, não apenas no Brasil. Falta uma consciência da integração, com certeza.
É lógico que, ao fazer uma integração por setores, é muito mais fácil se harmonizar as leis e fazer as adaptações necessárias. O nosso projeto, de certa maneira, foi um tanto ambicioso quando pensou em uma integração geral.
Sobre o que disse o Sr. Sérgio Vicente Moreira, cumprimento-o pelo estudo feito. Vai contribuir muito para o esclarecimento da questão. Esses estudos do IPEA. precisam ser mais bem divulgados, porque temos poucos trabalhos desse tipo.
O Sr. Sérgio Moreira também disse que a tradição de comércio é construída, mas o MERCOSUL não é só comércio, é muito mais do que isso. O MERCOSUL é infra-estrutura. Hoje se pensa muito na integração energética. Inclusive, essa foi uma das sugestões feitas no seminário em que estive em Montevidéu. Lá, houve muitas novidades que merecem ser mencionadas. Uma delas foi que reproduzíssemos um pouco o modelo europeu, quando elegeu o carvão e o aço para começo da integração. Aqui, deveríamos eleger a integração energética. É disso que precisamos no momento. Trata-se de um setor básico para produção e está causando problemas no momento.
O SR. SÉRVULO VICENTE MOREIRA
- Permita-me. Olhando outro aspecto, é em decorrência do comércio que está havendo essa mudança na infra-estrutura. Foi o mesmo caso da CECA — Comunidade Européia do Carvão e do Aço: em decorrência do comércio é que se muda a infra-estrutura, a parte social etc.
A SRA. MARIA CLÁUDIA DRUMMOND
- Com certeza, porque o comércio impulsiona e se faz mais presente a necessidade dos meios de comunicação, de estradas etc.
Quanto à intervenção do Dr. Wilfrido Fernández sobre a carência de institucionalidade no MERCOSUL, está se formando uma massa crítica no sentido de que o MERCOSUL como está hoje não responde às necessidades de sua própria institucionalidade. Por isso que se pensa e se fala em um Protocolo de Ouro Preto II.
Não sabemos até que ponto isso vai ser aprofundado, mas, enfim, o fato de os Governos estarem pensando no assunto já é um bom sinal.
Não me coloco, em princípio, contra a supranacionalidade. Diria que há vários tipos de supranacionalidades. Afinal de contas, o que significa supranacionalidade? Por exemplo, em um eventual Parlamento do MERCOSUL, a supranacionalidade seria o quê? O fato de que cada Parlamentar teria um voto e que as representações seriam proporcionais. Se os Parlamentares fossem eleitos por sufrágio universal direto, seria assim um órgão com aspectos de supranacionalidade — embora não vá legislar.
Voltando à metodologia dos pequenos passos da União Européia, talvez não seja o momento de se instalar a supranacionalidade, mas talvez seja momento, sim — e acho que é —, de se instalar uma visão regional que ainda está ausente no MERCOSUL. Os negociadores — aqueles que tomam as decisões — ainda não estão pensando com uma visão regional, e, sim, em termos nacionais. Essa mudança de mentalidade é um passo em direção à supranacionalidade. É um passo modesto, mas importantíssimo, fundamental numa integração.
Há ainda a pergunta do Pastor Bentílio: como ficam as relações dos trabalhadores dos Correios dos 4 países do MERCOSUL. Não sei se S.Sa. se encontra presente para explicitar melhor a pergunta... Como ainda não é um mercado comum, não há o livre trânsito de fatores de produção. Assim, os trabalhadores ainda não podem cruzar as fronteiras para trabalhar em outro Estado- parte. Nesse caso, também se enquadrariam os trabalhadores dos Correios.
Eram as considerações que tinha a fazer.
Muito obrigada.
O SR. COORDENADOR (Eugênio Arcanjo)
- Antes de passar a palavra ao Deputado Dr. Rosinha, agradeço o convite da organização desse evento para estar aqui como mediador deste painel. Estou aqui ao lado de queridos amigos: da Maria Cláudia, do Jorge Fontoura e do Deputado Dr. Rosinha, Parlamentar que aprendi admirar pelo dinamismo e companheirismo na Comissão Parlamentar Conjunta do MERCOSUL.
Mais uma vez, relembro a importância do painel de hoje à tarde, talvez até um pouco mais incisivo em termos das questões técnicas de incorporação de normas do MERCOSUL.
Passo a palavra ao Deputado Dr. Rosinha, a quem peço que, após responder as perguntas, encerre os trabalhos.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Dr. Rosinha)
- Como praticamente tudo foi respondido, vou me ater, inicialmente, à questão dos trabalhadores. Acordo bilateral Brasil e Uruguai já aponta a possibilidade de se trabalhar em qualquer um dos países pela fronteira administrativa — não mais a fronteira geográfica — com documentos fronteiriços, atendendo a saúde, à educação etc.
Com relação à fronteira administrativa , já há um acordo sendo debatido com o Paraguai e o Uruguai, o que facilitará bastante para resolver à questão dos trabalhadores dos Correios.
Há também um acordo assinado — falta ser aprovado pelo Parlamento do Paraguai para entrar em vigor — que diz respeito ao direito de contar tempo de serviço para efeitos da Previdência Social. A pessoa trabalha um período no Brasil, depois na Argentina, e esse tempo de serviço é contabilizado para fins de Previdência Social.
Repito: o acordo já está assinado, falta apenas a aprovação pelo Parlamento paraguaio Inclusive, vai haver um sistema informatizado entre Brasil e Argentina para a prestação das informações — atualmente, uma declaração do tempo de serviço prestado demora, às vezes, até 2 anos, porque os órgãos responsáveis ficam trocando papéis.
Sobre a questão da supranacionalidade, a princípio, ninguém da Mesa é contra, mas hoje a realidade política e econômica dos Estados-membros impossibilita isso. Como disse o Prof. Jorge Fronteira, houve muitas disputas de fronteiras. Se não me engano, a última foi em 1976 com a Argentina. Ora, se há uma cultura de disputa de fronteira durante décadas e, de repente, se muda — agora a política não é mais disputar fronteira, mas, sim, eliminar fronteira —, essa mudança não se faz tão rapidamente. É preciso mais tempo e mais debate.
A supranacionalidade é algo que está em construção, mas será algo inevitável nesse processo. E entendo que está em construção porque, se estamos debatendo instituições que vão ter papel mais relevante — como, por exemplo, o próprio tribunal ou o próprio Parlamento —, estamos dando passos importantes rumo à supranacionalidade. Do contrário, não há razão para se dar esses passos.
Agradecemos novamente a todos a presença, convidando-os para voltar na parte da tarde, quando também haverá um debate muito interessante.
Está encerrada a primeira fase do nosso seminário. (Palmas.)