Declaração
I Fórum de Debates sobre Integração Fronteiriça
DECLARAÇÃO DE FOZ DO IGUAÇU
Os participantes do I Fórum de Debates sobre Integração Fronteiriça, realizado em Foz do Iguaçu em 19 e 20 de setembro de 2002, promovido pela Presidência Pro Tempore da Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul; pela Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados; e pela Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu,
CONSIDERANDO
A importância de que se revestem o apoio e a participação, nos debates sobre o Mercosul, das entidades representativas dos diversos setores da sociedade civil, verdadeiro motor da integração;
O papel fundamental de canal de comunicação entre as instâncias negociadoras e a sociedade civil organizada, que os Parlamentos vêm desempenhando no processo de integração regional;
VISTO
A necessidade de se criar uma agenda, no marco do Mercosul, para a identificação e o equacionamento conjunto de problemas específicos das fronteiras, particularmente aqueles que nesse momento assolam a Tríplice Fronteira entre Argentina, Brasil e Paraguai, e que geram graves conseqüências de natureza econômica e social para a sub-região e para a totalidade dos três países que a integram;
As propostas apresentadas pelas seguintes entidades da sociedade civil, reunidas em Uruguaiana, em 25 e 26 de junho de 2002, por ocasião da reunião preparatória ao I Fórum de Debates sobre Integração Fronteiriça: Associação dos Engenheiros Agrônomos de Uruguaiana; Associação das Indústrias de Arroz de Uruguaiana; Sindicato Rural de Uruguaiana e Sociedade Uruguaiense de Medicina Veterinária; Sindicato dos Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Uruguaiana; Sindicato dos Despachantes Aduaneiros do Estado do Rio Grande do Sul e sua Delegacia de Uruguaiana; Associação Comercial e Industrial de Quaraí/Departamento de Serviço de Proteção ao Crédito; Associação Uruguaianense das Micro e Pequenas Empresas; Sindicato dos Representantes Comerciais de Uruguaiana; Câmara de Dirigentes Lojistas de Uruguaiana; Associação Comercial de Varejistas de Uruguaiana; Associação Comercial e Industrial de Uruguaiana; Departamento de Mulheres Empresárias da Associação Comercial e Industrial de Uruguaiana. A essas propostas foram posteriormente agregadas sugestões apresentadas pelo Departamento do Mercosul e Assuntos Internacionais da Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu; pela Associação Comercial e Industrial de Foz do Iguaçu, com base em documentos apresentados pela Associação de Despachantes Aduaneiro de Foz do Iguaçu; do Sindicato Patronal do Comércio Varejista de Foz do Iguaçu; Comitê Organizador de Foz do Iguaçu; Câmara de Comércio Paraguayo-Americana; Associação dos Municípios da Grande Santa Rosa, Prefeitura Municipal de Porto Vera Cruz; Prefeitura Municipal de Porto Mauá; Conselho Municipal de Turismo de Foz do Iguaçu (COMTUR); a Comisión de Turismo de la Cámara de Senadores de Argentina; e da Cámara de Comercio, Industria, Comercio Exterior y Afines de Puerto Iguazú.
DECLARAM:
A integração regional do Mercosul é a expressão do destino comum dos países do Cone Sul e sua vocação é estender-se a toda a América do Sul, em um processo onde o Mercosul serve de pólo de atração aos demais países e blocos econômicos do sub-continente. Nesse contexto, encontros como o presente seminário permitem lançar idéias e discutir estratégias sobre que tipo de destino conjunto queremos ter.
O Mercosul deverá encaminhar-se para o seu alargamento horizontal, concluindo acordos com outros blocos e países sul-americanos, para constituir-se no chamado "núcleo duro" da integração, o que requer a decidida vontade política dos governantes dos países membros no sentido da consolidação do processo integracionista.
Mais além das trocas comerciais e de seus aspectos meramente econômicos, o Mercosul deve significar um novo patamar no processo civilizatório da região, implicando em uma mudança de mentalidade pela qual os problemas passam a ser resolvidos de maneira integrada, as soluções passam a ser conjuntas e a visão passa a abranger a região como um todo. Nesse sentido, questões estratégicas, como a negociação da Área de Livre Comércio das Américas, devem ser consideradas do ponto de vista do conjunto da região e não dos países membros isoladamente.
As particularidades em matéria de hábitos, costumes e características sócio-econômicas e geopolíticas tornam as regiões fronteiriças detentoras de peculiaridades geradoras de necessidades específicas, em contraposição aos problemas e questões presentes nas áreas centrais dos países membros do Mercosul. As soluções, porém, somente serão efetivas e capazes de produzir frutos no longo prazo se pensadas a partir de uma perspectiva regional, compatibilizada com as prioridades nacionais.
No que diz respeito a questões de extrema importância para a promoção do bem-estar das populações fronteiriças, como as que tocam a saúde e o trabalho, torna-se fundamental a criação de uma política integrada voltada para esses setores, baseada em uma metodologia de trabalho que encaminhe as reivindicações apresentadas pela sociedade civil sem considerar apenas o horizonte das fronteiras nacionais, atitude claramente inibidora de opções voltadas para políticas integradas e integradoras, e que apenas contribui para a perpetuação dos problemas.
O I Fórum de Debates sobre Integração Fronteiriça encaminha à consideração, exame e debate da Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul, por meio de sua Presidência Pro Tempore, as propostas apresentadas pelas entidades da sociedade civil, que figuram no Anexo.
Foz do Iguaçu, 20 de setembro de 2002
ANEXO
As propostas convergem, de maneira geral, para os seguintes objetivos:
- Criação e regulamentação de uma área fronteiriça caracterizada por normas específicas, estabelecidas com a participação de todos os setores interessados dos países envolvidos;
- Integração das cadeias produtivas dos países membros do Mercosul a partir das suas áreas fronteiriças, com vistas à criação de empregos e à obtenção de uma melhor inserção dos produtos Mercosul no mercado internacional. Exemplo concreto de tal iniciativa seria a proposta apresentada pela Associação das Indústrias de Arroz de Uruguaiana, sobre a integração da produção do arroz colhido na Argentina, cuja secagem e armazenamento poderia ser feita no Brasil.
- Criação de mecanismos legais para a conversão monetária de forma a simplificar o comércio entre os países membros.
- Criação e reconhecimento de Câmaras de Mediação e Arbitragem e Comissões de Conciliação Prévia para dirimir questões peculiares à tríplice fronteira, ademais de outras, como aquelas decorrentes das relações patrono-laborais.
- Instituição de um Comitê Permanente de Foz do Iguaçu junto às Seção Nacional do Foro Consultivo Econômico-Social, como órgão consultivo e de assessoramento técnico.
- Realização do II Fórum de Debates sobre Integração Fronteiriça do Mercosul em uma das cidades da fronteira trinacional abordando os temas Turismo, Meio Ambiente, Educação e Projetos de Desenvolvimento.
- Reconhecimento da região de fronteira trinacional como laboratório para as questões de integração do Mercosul.
- Consolidação do "Iguassu Pólo Turístico Internacional", que é objeto de discussões na RET — Reuniões Especializadas de Turismo — e reconhecida conforme a Resolução GMC 41/97.
- Implementação do "Projeto Iguassu — Desenvolvimento sem Fronteiras", composto pela implantação do "Fórum Permanente de Integração da Região Trinacional do Iguassu"; do "SIIG - Sistema de Informações do Iguassu"; e da formação de agentes de integração.
No âmbito do primeiro objetivo podem-se destacar sugestões, como o treinamento dos funcionários nos terminais fronteiriços, de modo a agilizar os trâmites burocráticos na fronteira; integração total entre a Gendarmería argentina e a Polícia Federal brasileira na liberação de turistas com atendimento simultâneo entre ambas; concentração dos serviços relativos a ambas as cabeceiras de fronteira em uma cabeceira única; e harmonização dos horários nas fronteiras do Mercosul de modo a possibilitar o atendimento das 7:00 às 19:00 hrs., em todos os dias da semana, sem que haja interrupção ao meio-dia. Que seja, ademais, reconhecido o Código Aduaneiro Argentino, Lei n.º 23.860, que isenta de aplicação da taxa de serviços extraordinários o trânsito vicinal e de turistas de qualquer origem realizado aos sábados, domingos e feriados, pelas pontes, passagens internacionais e passos fronteiriços, com o estabelecimento de um regime compensatório adequado.
- Propostas mais arrojadas reivindicam que o trânsito de mercadorias técnica e legalmente permitidas seja liberado de forma irrestrita entre as zonas de fronteira e que os controles aduaneiros sejam recolhidos para as áreas limítrofes determinadas pela distância de 50 km ou de 100 km da fronteira física. Advogam, ademais, a criação de uma identidade única para os habitantes de fronteira que comprovem certos requisitos quanto à moradia e veracidade de sua condição de cidadão fronteiriço. Tratar-se-ia de um Cartão Magnético Pessoal, fornecido pelos Serviços de Migração de cada país, a exemplo do Acordo firmado entre Brasil e Uruguai. Sugere-se ainda a criação de um Cartão Único de Vigilância Sanitária. Tais medidas seriam aplicadas em todas as áreas limítrofes entre os países membros do Mercosul, podendo ser utilizadas como "laboratório" com vistas ao aprofundamento da integração. Tal iniciativa viria acompanhada da criação de um escritório de caráter supranacional, com comando rotativo entre os países membros do Mercosul, que teria por atribuição implementar as normas gestoras das zonas de fronteiras.
- Sugere-se ainda a criação de mecanismos legais para a conversão de moedas estrangeiras para pequenos e médios comerciantes nas fronteiras dos países membros do Mercosul; a revisão e ampliação da Portaria MF 16/95 que trata da circulação de veículos no Mercosul; e a descentralização das anuências, hoje centralizadas em Brasília, nos processos de importação de mercadorias do Paraguai e Argentina através de Foz do Iguaçu e homogeneizar a interpretação da instrução Normativa n° 69/96 da Receita Federal que trata do fracionamento de cargas na importação.
A par da temática voltada para o fluxo comercial fronteiriço, o Fórum abordou também as questões laboral e de saúde, que assumem contornos muito específicos nas áreas de fronteira. Algumas sugestões apresentadas estão enumeradas abaixo:
- Coordenação das legislações trabalhistas dos países membros do Mercosul;
- Flexibilização das leis referentes à circulação de veículos utilizados como instrumentos de trabalho;
- Criação de um regime jurídico e identidade para o trabalhador fronteiriço, da .mesma forma que vem sendo praticado no Brasil desde 1980, à luz do art. 21 da Lei n° 6815/80, Estatuto dos Estrangeiros. Segundo esse dispositivo, todo cidadão estrangeiro de fronteira tem direito à Carteirra de Fronteiriço, a qual lhe faculta o acesso ao trabalho, à saúde e à educação.
- Cooperação Técnica para formação profissional em parceria, a exemplo do ocorrido com a instalação da Itaipu Binacional;
- Estabelecimento de Comitês de Fronteira como fóruns de discussão e solução de problemas emergentes e/ou ações prioritárias;
No que concerne à questão saúde, ainda que exista em Foz do Iguaçu uma equipe profissional capacitada para o desenvolvimento de ações de cooperação entre os países, necessita-se de mais recursos financeiros uma vez que brasileiros que vivem do outro lado da fronteira utilizam os serviços de assistência médica (SUS) do Brasil.