Legislação Informatizada - LEI Nº 859, DE 16 DE AGOSTO DE 1902 - Republicação

LEI Nº 859, DE 16 DE AGOSTO DE 1902

Reforma a lei sobre fallencias

O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brazil:
Faço saber que o Congresso Nacional decretou e eu sancciono a seguinte lei sobre fallencias:

TITULO I

DA NATUREZA E DECLARAÇÃO DA FALLENCIA

     Art. 1º O commerciante, sob firma individual ou social, que sem relevante razão de direito deixa de pagar no vencimento qualquer obrigação mercantil liquida e certa (art. 2º), entende-se fallido, qualquer que seja o estado de seus negocios.

     § 1º Caracteriza-se tambem o estado de fallencia, embora não haja falta de pagamentos, si o devedor:

     a) realizar pagamentos usando de meios ruinosos e fraudulentos;

     b) transferir ou ceder bens a uma ou mais pessoas, credoras ou não, com obrigação de solver dividas vencidas e não pagas;

     c) occultar-se, ausentar-se furtivamente, mudar de domicilio sem sciencia dos credores, ou tentar fazel-o, revelado esse proposito por actos inequivocos;

     d) alienar, sem sciencia dos credores, os bens que possue, fazendo doações, contrahindo dividas extraordinarias ou simuladas pondo os bens em nome de terceiros ou commettendo algum outro artificio fraudulento;

     e) alienar os bens immoveis, hypothecal-os, dal-os em antichrese, ou em penhor os moveis, sem ficar com algum ou alguns equivalentes ás dividas, livres e desembargados ou tentar praticar taes actos, revelado esse proposito por actos inequivocos;

     f) fechar ou abandonar o estabelecimento, desviar todo ou parte do activo;

     g) occultar bens e moveis da casa;

     h) proceder dolosamente a liquidações precipitadas;

     i) não pagar, quanto executado por divida commercial, ou não nomear bens á penhora dentro das 24 horas seguintes á citação inicial da execução;

     j) recusar, como endossador ou sacador, prestar fiança no caso do art. 390 do Codigo Commercial;

     k) não evitar o concurso de preferencia em execução commercial (art. 609 § 2º do reg. n. 737 de 25 de novembro de 1850).

     § 2º Si bem que dividas civis só por si não autorizem a declaração da, fallencia, podem, todavia, concorrer com obrigações mercantis para constituir o estado della.

     Art. 2º Consideram-se dividas liquidas e certas:

     a) as indicadas no art. 247 do dec. n. 737 de 25 de novembro de 1850;

     b) as obrigações ao portador (debentures) e os respectivos coupons para pagamento de juros emittidos pelas sociedades commanditarias por acções (arts. 32 e 41 do dec. n. 161 de 17 de janeiro de 1890);

     c) os bilhetes de ordem pagaveis em mercadorias (art. 379 do dec. n. 370 de 2 de maio de 1890);

     d) os warrants (dec. n. 1746 de 13 de outubro de 1869, art. 1º § 6º; decs. ns. 2502 de 1897 e 3945 de 1901);

     e) os recibos dos trapicheiros (art. 88 n. III do Codigo Commercial);

     f) os cheques (dec. n. 3323 de 12 de outubro de 1864);

     g) as notas assignadas pelos corretores que, nas venda prazo, ficaram pessoalmente obrigados, si nellas não houverem sido indicados os nomes do vendedor e comprador;

     h) as contas mercantilmente extrahidas de livros de commerciantes com as formalidades legaes intrinsecas e extrinsecas e verificadas judicialmente por peritos nomeados pelo juiz em petição do credor (art. 23 ns. II e IIl do Codigo Commercial).

     § 1º Ás contas assim verificadas consideram-se vencidas desde a data do despacho do juiz na petição em que o credor requerer o exame em seus proprios livros ou nos do devedor, que, si recusar apresental-os, seja qual for o motivo, será havido por confesso.

     § 2º Os autos do exame, depois de julgado procedente, serão entregues á parte, independente de traslado e sem recurso algum, para delles usar como e quando lhe convier.

     Art. 3º A falta de pagamento das dividas a que se refere o artigo antecedente ficará plenamente provada com a certidão do protesto interposto perante o official publico competente (reg. n. 737 de 1850, art. 375.)

    § 1º Os officiaes publicos encarregados do serviço de protestos são obrigados a ter nos seus cartorios um livro especial, por ordem alphabetica, onde irão notando diariamente os nomes dos devedores cujos titulos forem protestados, indicando a natureza do titulo, quem o protestou, data do titulo, seu valor, data do vencimento, motivo da recusa de pagamento.

     Este livro poderá ser examinado por qualquer pessoa; e o official que o não tiver escripturado em dia incorrerá na multa de 1:000$000.

     § 2º Nenhuma fallencia poderá ser requerida por falta de pagamento, sem que o credor exhiba com o respectivo titulo a certidão do seu protesto.

     Art. 4º E' competente para declarar a falIencia o juiz commercial em cuja jurisdicção o devedor tiver seu principal estabelecimento ou casa filial de outra situada fóra do Brazil, si não operar por conta e sob a responsabilidade do estabelecimento principal.

     A fallencia dos negociantes ambulantes, emprezarios de circo e espectaculos publicos será declarado, pelo juiz commercial do logar onde se acharem.

     Art. 5º A fallencia será declarada a requerimento:

     a) do devedor, sua viuva ou seus herdeiros;

     b) do socio, ainda que commanditario ou em conta de participação, exhibindo o contracto social;

     c) do credor chirographario ou não, exhibindo o titulo de divida, ainda que não vencida.

     § 1º O credor hypothecario ou privilegiado só será admittido a requerer a fallencia do devedor, provando que os bens em garantia não chegam para solução da divida, ou renunciando a garantia ou privilegio.

     § 2º O credor por titulo mercantil ou civil não vencido póde requerer a fallencia do devedor, provando, com a certidão do protesto, e este deixou de pagar, sem razão relevante de direito, obrigação mercantil certa e liquida.

     § 3º O credor commerciante, com domicilio no Brazil, sómente será admittido a requerer a fallencia de seu devedor, si mostrar que tem inscripta sua firma ou razão social no registro do commercio, pela fórma indicada no decreto n. 916 de 24 do outubro de 1890.

     § 4º Não serão admittidos a requerer a declaração da fallencia os ascendentes, descendentes, conjuge, irmão, sogro, sogra, genro e nora do devedor.

     Podem, todavia, estes parentes, na qualidade de credores, concorrer e deliberar sobre a concordata e defender os seus direitos no processo da fallencia.

     Art. 6º Quando a fallencia tiver sido requerida com certidão de protesto ou protestos por falta de pagamento, o juiz ordenará, que o devedor dê as razões de não pagamento no prazo de 24 horas, salvo o caso de ausencia do devedor, que torne impraticavel a audiencia sua ou de procurador, dentro desse prazo.

     Paragrapho unico. Os credores que não tiverem domicilio no Brazil se poderão requerer a fallencia do devedor, prestando caução para reparação do damno.

     Art. 7º Nos demais casos, será declarada a fallencia, depois de justificada com instrumentos publicos ou particulares, ou com o depoimento de testemunhas, algum dos factos que a caracterizam, citado o devedor, sua viuva ou seus herdeiros, quando presentes.

     Estando ausentes ou havendo herdeiros menores, será nomeado um curador ad hoc, que assistirá de justificação e requererá por petição o que for a bem dos direitos dos curatelados. O juiz, quando julgar conveniente, interrogará o devedor.

      Art. 8º O devedor que faltar ao pagamento de alguma divida commercial deverá, no preciso termo de dez dias, contados do vencimento, apresentar ao juiz do commercio declaração datada e assignada por elle ou seu procurador, em que exponha as causas do fallimento e estado dos seus negocios, acompanhada:

     a) do balanço exacto do seu activo e passivo, com os documentos probatorios ou instrumentos que julgar necessarios;

     b) dos livros, no estado em que se acharem;

     c) da relação nominal dos credores commerciaes e civis;

     d) do contracto social ou da indicação de todos os socios e suas qualidades e dos respectivos domicilios, quando a sociedade só existir ou tiver existido de facto.

     § 1º No activo não serão incluidas dividas ás quaes pelo lapso de tempo possa ser opposta pelo devedor a excepção de prescripção, devendo apresentar a relação dellas em apartado com as necessarias explicações.

     § 2º A declaração será entregue pelo juiz ao escrivão, a quem for distribuida, com os documentos e livros, que os encerrará, immediatamente.

     § 3º Si o devedor for uma firma social e a declaração não tiver sido feita por todos os socios, inclusive os commanditarios, não se tratando de sociedade em commandita por acções, poderá o juiz, antes de preferida a sentença, ouvir por 24 horas os que não a tiverem assignado.

     Art. 9º Praticadas as diligencias necessarias, o juiz, no prazo de 24 horas, proferirá a sentença, declarando ou não aberta a fallencia e publical-a-ha immediatamente em mão do escrivão.

     Paragrapho unico. A sentença declaratoria de fallencia:

     a) indicará a hora da abertura da fallencia, entendendo-se, no caso de omissão, que o foi ao meio-dia;

     b) fixará o termo legal da fallencia, a contar da data em que se tenha caracterizado esse estado, não podendo, porém, retrotrahil-a á época que exceda de 40 dias da data do primeiro protesta por falta de pagamento, da declaração do devedor, ou do requerimento para a justificação;

     c) poderá decretar a prisão preventiva do fallido, na fórma da lei;

     d) ordenará as diligencias que o caso exigir;

     e) nomeará um syndico para a arrecadação da massa.

     Art. 10. Declarada a fallencia, o juiz interrogará immediatamente os fallidos, inquirindo si, além das dividas constantes de seus livros commerciaes, teem elles outros debitos particulares, os quaes deverão ser especificados, como existam.

     Art. 11. Antes da sentença da declaração da fallencia, emquanto se proceder ás diligencias preliminares, poderá o juiz, ex-officio ou a requerimento do justificante, decretar o sequestro dos livros, correspondencia, titulos e bens do devedor, para salvaguarda do activo, nos casos do art. 1º § 1º.

      Art. 12. O devedor poderá, emquanto se proceder ás diligencias anteriores á declaração da fallencia, ellegar por petição, e provar em um triduo relevantes razões de direito para excluil-a, e depois de declarada embargar a sentença ou aggravar.

     § 1º Além da falta de qualquer dos elementos constitutivos da fallencia ou de facto que a caracterize (art. 1º, principio e § 1º), são tambem razões relevantes de direito:

     a) a falsidade;

     b) o pagamento anterior ao protesto, ou nos tres dias uteis de sua interposição;

     c) a novação;

     d) a prescripção;

     e) a materia do art. 588 do Codigo Commercial e do art. 252 do reg. n. 737 de 25 de novembro de 1850;

     f) em geral todo facto que, por direito, dirima ou suspenda a obrigação.

     § 2º O aggravo não suspenderá a arrecadação dos bens, nem outras deligencias assecuratorias dos direitos dos credores.

     § 3º Os embargos não terão effeito suspensivo; si forem recebidos e julgados provados, o que terá logar no prazo improrogavel de 20 dias, contados da data da publicação da sentença, será tudo reposto no anterior estado, cessando todas as medidas provisorias.

     § 4º Da sentença que julgar ou não provados os embargos haverá aggravo, mas só de instrumento no primeiro caso.

     § 5º Julgados provados os embargos, dado provimento ao aggravo, ou não declarada aberta a fallencia, o justificante, que houver dolosa ou falsamente requerido a declaração da fallencia, será na mesma sentença condemnado ao pagamento de perdas e damnos, que serão liquidados na execução perante o juiz que a tiver proferido.

     Art. 13. A sentença pela qual deixar de ser declarada a fallencia não fará caso julgado, e della caberá aggravo.

     Art. 14. A morto do devedor ou a cessação do exercicio do commercio, a dissolução e liquidação da sociedade, não obstam a declaração da fallencia; sendo necessario, porém, que algum facto, que caracterize, se tenha verificado em vida do devedor, ou que a falta de pagamento se verifique depois de sua morte.

     § 1º Em todo caso, não poderá ser declarada a fallencia um anno depois do fallecimento do devedor, nem dous annos depois da cessação do exercicio do commercio.

     § 2º A viuva e os herdeiros do devedor represental-o-hão exclusivamente para os effeitos commerciaes, antes ou depois de declarada a fallencia.

     Art. 15. Um resumo da sentença declaratoria da fallencia será, dentro de duas horas de publicada em mão do escrivão, affixado por edital á porta do juizo commercial e da casa de negocio do fallido, do que se lavrará certidão para ser junta aos autos e publicada pela imprensa, onde a houver. 

     No resumo serão omittidas todas as diligencias que forem do segredo de justiça; o que o juiz declarará na sentença.

     Paragrapho unico. O escrivão que deixar de cumprir o disposto neste artigo será suspenso por seis mezes.

     Art. 16. O juiz nomeará, além do syndico provisorio, uma commissão fiscal composta de dous credores, tirados aquelle e esta de duas listas organisadas na fórma em seguida declarada:

     § 1º De dous em dous annos, no mez de dezembro, as Juntas Commerciaes, onde as houver, organisarão uma lista de commerciantes do logar, e a remetterão ao juiz do commercio, para servirem os alistados como syndicos nas fallencias que occurrerem nos dous annos seguintes:

     a) nos logares onde não houver Junta Commercial será a lista formada pelos commerciantes maiores contribuintes, em numero, pelo menos, de dez, convocados pelo juiz á vista da certidão da repartição fiscal federal para, em dia e logar determinados, se reunirem para este fim, sob sua presidencia;

     b) o numero dos nomes da lista será: de 40 na Capital FederaI; de 16 nas cidades de Belém, S. Luiz, Fortaleza, Recife, Bahia, S. Paulo e Porto Alegre; de 10 nas outras capitaes e nas cidades de 20.000 habitantes, segundo o ultimo recenseamento concluido e publicado; de 4 a 8 nos mais termos, segundo o seu movimento commercial;

     c) a designação será feita por qualquer numero do commerciantes que compareçam, e, nenhum comparecendo, a fará o juiz.

     Serão tambem designados pelo juiz os quatro a oito nomes, nos termos a que se refere a disposição antecedente;

     d) a lista será alterada de metade biennalmente, publicada pela imprensa e registrada depois de organisada por ordem numerica; e na mesma ordem cada um será nomeado e obrigado a servir, sob multa de 200$ a 1:000$, salvo motivo attendivel, á apreciação do juiz;

     e) a designação recahirá em commerciantes de fama illibada, notoriamente abonados e que conheçam os negocios.

     § 2º O fallido será obrigado a apresentar em juizo, dentro de 24 horas, sob pena de prisão por 30 dias, a lista de seus 10 maiores credores.

     Dentre estes dez maiores credores nomeará o juiz a commissão fiscal.

     Findas as 24 horas, que correrão do resumo da sentença á porta do fallido, si a lista de credores não estiver em cartorio, o escrivão lavrará certidão nos autos, e, independente de qualquer consulta ao juiz, de qualquer recurso intentado pelo fallido, passará contra este mandado de prisão que, assignado pelo juiz, será cumprido incontinenti.

      Na falta da lista dos credores serão nomeados para a commissão fiscal o credor que houver requerido a fallencia e outro credor por este indicado.

     § 3º Não poderá ser nomeado syndico ou membro da commissão fiscal parente do fallido até o 4º gráo civil.

     Art. 17. A nomeação do syndico não impede a qualquer credor de requerer e promover o que for a bem da massa fallida.

     Art. 18. A fallencia abrange a universalidade dos bens, direitos, acções e obrigações do fallido, com as excepções estabelecidas nesta lei.

     A sua declaração instituo um juizo universal para onde convergem todas as execuções pendentes movidas contra o fallido e onde deverão correr todas as acções movidas contra o fallido ou contra a massa, excepto aquellas que tiverem por objecto direitos de familia e quaesquer outros ligados exclusivamente á pessoa do fallido, e as que ao fundarem em creditos não sujeitos a rateio. 

     Todavia, si a materia das acções exceptuadas eventualmente interessar á massa, será admittido o syndico a intervir como assistente.

TITULO II

DOS EFFEITOS DA DECLARAÇÃO DA FALLENCIA

SECÇÃO I

     Quanto á pessoa do fallido

     Art. 19. O nome e cognome do fallido serão publicados pela imprensa, na Junta ou na Inspectoria Commercial, que fará as devidas annotações no registro do commercio e communicará o facto ás Alfandegas e Mesas de Rendas, ao presidente da Camara Syndical dos Corretores, á administração ou agencia de Correio ou do Telegrapho.

     Esta disposição terá logar logo que seja declarada a fallencia; e, si reformada a sentença, nova publicação e communicações serão feitas nesta conformidade.

     Art. 20. O fallido não poderá afastar-se de seu domicilio sem licença do juiz, ouvidos o syndico e a commissão fiscal; deverá assistir a todos os actos e reuniões, fazendo-se representar por procurador quando occorrer justo motivo e obtiver licença do juiz e prestar todas as informações ao juiz, ao syndico e á commissão fiscal, auxiliando-os diligentemente.

     Art. 21. A correspondencia do fallido será pelos agentes do Correio e do Telegrapho entregue ao syndico, que abrirá em presença do fallido ou pessoa por elle autorizada, a quem entregará a que se referir a assumpto alheio á fallencia.

     Art. 22. O fallido poderá ser preso, si faltar ao cumprimento dos seus deveres, oppondo embaraços ás funcções de syndico e da commissão fiscal, occultando-se ou de qualquer outro modo encobrindo a existencia de bens, demorando a arrecadação, não exhibindo os livros, recebendo quaesquer quantias por dividas activas, praticando algum acto prejudicial á massa ou que motivo acção de nullidade, subtrahindo documentos ou desviando a correspondencia que deve ser entregue ao syndico.

     Paragrapho unico. A prisão não poderá durar mais de 60 dias e será decretada pelo juiz, desde que de modo summarissimo se verifique a exactidão dos factos arguidos.

     Art. 23. O fallido ficará privado do exercicio de direitos politicos, quando condemnado por sentença criminal definitiva; e sujeito á restricções estabelecidas nas leis fiscaes e aduaneiras, não podendo

     a) votar, nem ser votado nas eleições dos membros das Juntas Commerciaes;

     b) exercer as funcções de corretor, agente de leilões e trapicheiro, interprete do commercio, avaliador, perito ou arbitrador em assumptos commerciaes.

     § 1º Em caso algum ficará privado do exercicio do direito de habeas-corpus.

     § 2º A fallencia não affectará o exercicio do poder marital e do patrio poder, nem a administração dos bens proprios e particulares da mulher ou dos filhos.

     § 3º O exercicio da capacidade de direito é garantido ao fallido em tudo quanto não se referir directa ou indirectamente aos interesses, direitos e obrigações da massa fallida.

     § 4º Os contractos que celebrar e as obrigações que assumir ficarão inteiramente alheios á massa e não poderão ser annullados, si, por occasião de celebral-os ou assumil-as, tiver sido denunciado pelo fallido o seu estado ou delle tiver conhecimento a outra parte contractante.

SECÇÃO II

Quanto aos bens o contractos

     Art. 24. O fallido fica de pleno direito privado da administração de seus bens e dos que adquirir durante a fallencia.

     Paragrapho unico. Não serão arrecadados:

     a) os bens que o fallido tiver adquirido com a clausula de não poderem ser obrigados por dividas, as pensões, ordenadas ou outras quantias a que tiver direito a titulo de alimentos, aposentadoria, reforma, jubilação, ou que a esses forem equiparados por lei, salvo o consentimento do fallido e de sua mulher;

     b) os vestuarios do fallido e de sua familia, e a mobilia e utensilios necessarias aos usos da vida;

     c) o dote da mulher estimado, quer venditionis causa, quer taxationis, o os bens proprios della;

     d) o peculio dos filhos, salvo o profecticio;

     e) os rendimentos dos bens dos filhos menores.

     Art. 25. Si o fallido fizer parte de alguma sociedade, como socio solidario, ou commanditario em commandita simples, ella se reputará dissolvida (art. 335 n. II do Cod. Com.); e em sua liquidação intervirão o syndico e a commissão fiscal com os poderes do art. 353 do Codigo CommerciaI.

     Art. 26. Os mandatarios, commissarios e procuradores do fallido exercerão, ainda depois de declarada a fallencia, seus poderes até revogação expressa, pelo syndico e commissão fiscal, a quem prestarão contas.

     Paragrapho unico. Para o fallido cessa o exercicio do mandato, commissão ou procuração.

     Art. 27. As contas correntes com o fallido consideram-se fechadas no dia da declaração da quebra, prevalecendo de pleno direito a respectiva compensação.

     Tambem se compensam quaesquer outras dividas que se acharem vencidas até o dia da abertura da fallencia, quer o vencimento provenha da sentença que decreta a fallencia, quer da extincção do prazo dos contractos.

     Paragrapho unico. Não se realizará a compensação quando o credito se fundar em algum titulo ao portador:

     a) tambem não prevalece a compensação, não obstante o credito vencido antes da fallencia, si o devedor de fallido e houve sabendo da insolvabilidade do seu credor para o fim de compensação em proveito proprio ou de terceiro, com prejuizo da massa;

     b) igualmente não haverá compensação quando o credito do credor do fallido tiver sido obtido do outrem, do modo que não seja originariamente seu, salvo o caso de successão.

     Art. 28. A fallencia não resolve os contractos, cuja execução o syndico e a commissão fiscal promoverão, si a julgarem conveniente á massa.

     § 1º Nas vendas a entregar em prazo certo, tendo por objecto valores ou mercadorias, cuja cotação, curso ou preços correntes possam ser annotados (art. 33 do Cod. Com.; dec. n. 6132 de 4 de março de 1876; e dec. n. 6635 de 26 de julho de 1877), a operação se resolverá no direito ao pagamento da differença, segundo o valor no dia da entrega.

     § 2º Os contractos não inteiramente executados dão direito a perdas e damnos contra a massa.

     Art. 29. A declaração da fallencia torna exigiveis todas as dividas passivas do fallido, commerciaes ou civis, observadas as regras do desconto pela taxa legal, quando outra não tiver sido estipulada.

     § 1º As obrigações ao portador (debentures), emittidas com promessa de premio de reembolso, sendo uma a taxa da emissão e outro o capital nominal reembolsavel a longo prazo e á sorte, concorrerão a fallencia pelo capital da emissão accrescentado da differença entre os juros pagos e a taxa de 6%, quando o juro estipulado for inferior, desde a emissão até a data da fallencia; e sobre essa quantia se contarão os juros legaes até final embolso.

      § 2º A exigibilidade não comprehendo as obrigações condiciones; estas entrarão em rateio, sendo, porém, o pagamento differido até que se verifique a condição.

     § 3º Não serão attendidas as clausulas penaes.

     § 4º A prescripção ficará interrompida; só a quitação ou a renuncia exonerará a massa e o fallido.

     § 5º Os co-obrigados com o fallido, em divida não vencida ao tempo da fallencia, darão fiança ao pagamento no vencimento, não preferindo pagal-a immediatamente.

     Esta disposição procede sómente no caso dos co-obrigados simultanea, mas não successivamente. Sendo a obrigação successiva, como nos endossos, a fallencia do endossado posterior não dá direito a accionar os endossatarios anteriores, antes do vencimento.

     Art. 30. Contra a massa não cerrem juros, si ella não chegar para o pagamento do principal, salvo os das obrigações ao portador emittidas pelas sociedades commanditarias por acções e das dividas garantidas por hypotheca, antichrese ou penhor, até onde chegar o producto dos bens dados em hypotheca, antichrese ou penhor, incluido o agricola.

     Art. 31. As acções pendentes contra o devedor e as que houverem de ser intentadas posteriormente á fallencia, excepto aquellas de que trata o art. 18 in fine, só poderão ser continuadas ou intentadas contra o syndico, que aliás não poderá intentar, seguir ou defender acção alguma, em nome da massa, sem autorização da commissão fiscal.

     Art. 32. As execuções de sentenças proferidas em acção pessoal, que ao tempo da declaração da fallencia se moverem contra o fallido, ficarão suspensas até a verificação dos creditos, não excedendo de 30 dias, sem prejuizo de quaesquer medidas assecuratorias já verificadas.

     § 1º Si a execução descender de reivindicação, proseguirá sem suspensão com o syndico.

     § 2º Achando-se já em praça, com dia definitivo para a arrematação fixado por editaes, far-se-ha a arrematação dos bens; entrando, porém, para a massa o producto.

     Art. 33. E' garantido, no caso do art. 198 do Codigo Commercial, o direito de retenção, salvo a resolução do contracto, bem como nos demais casos previstos na legislação commercial.

     § 1º O credor gosado direito de retenção sobre os bens moveis e titulos que se acharem á sua disposição por consentimento de devedor, embora não esteja vencida a divida, sempre que haja connexidade entre esta e a cousa retida. Entre commerciantes tal connexidade resulta de suas relações de negocio.

     § 2º O direito de retenção não se póde exercer de modo contrario ás instrucções do devedor, nem contra a estipulação sobre uso determinado da cousa.

      § 3º Si o devedor entregou como propria ao credor cousa pertencente a terceiro, o direito de retenção póde ser opposto ao terceiro, provada, a boa fé do credor, salvo a reivindicação no caso de perda ou furto.

     § 4º Si a massa não remir a cousa retida, o credor, como o pignoraticio, a excutirá, ficando a este equiparado para os devidos effeitos.

SECÇÃO III

Dos actos nullos e annullaveis

     Art. 34. Serão nullos de pleno direito, independentemente de acção de nullidade:

     a) os actos, operações e pagamentos feitos pelo devedor depois da decretação do sequestro ou da declaração da fallencia, publicada nos termos do art. 15, uma vez que tenham relação directa com a massa ou se refiram aos bens que devam ser arrecadados;

     b) os pagamentos feitos ao commerciante fallido, depois de publicada a sentença da declaração da fallencia.

     § 1º O pagamento da letra de cambio ou bilhete á ordem não será repetido contra quem o recebeu, quando este, segundo o direito cambial, pudesse perder seus direitos contra os co-obrigados, por não haver recebido o pagamento.

     § 2º A restituição do valor cambial poderá ser exigida do ultimo obrigado, na ordem do direito regressivo (art. 422 do Codigo Commercial) ou do terceiro por conta de quem o valor foi creado, quando o ultimo obrigado ou esse terceiro, no momento da emissão do titulo, tinha conhecimento de que estava decretado o sequestro ou declarada a fallencia.

     Art. 35. Consideram-se nullos de pleno direito, mas sómente a beneficio da massa, tenha ou não o contractante conhecimento do estado do devedor, seja ou não intenção deste defraudar os credores:

     a) todos os actos e alienações a titulo gratuito, salvo obediencia á lei, ou si referir-se a objectos de valor até 360$, desde dous annos antes do termo legal da fallencia, façam ou não parte de contractos onerosos;

     b) os pagamentos de dividas não vencidas, feitos dentro do termo legal da fallencia, quer em dinheiro, quer por meio de cessão, transferencia, endosso, venda, compensação (menos a que se opera por effeito do contracto de conta corrente, ou outro qualquer meio de solução de obrigações);

     c) as hypothecas em garantias de dividas contrahidas anteriormente ao termo legal da fallencia ou outra qualquer garantia real, inclusive a retenção, si forem celebradas dentro do termo legal da fallencia;

     d) a renuncia á successão, legado ou usufructo, feita até dous annos antes do termo legal da fallencia, salvo si a esse tempo o devedor não exercia o commercio;

     e) a restituição antecipada de dote ou a sua entrega antes do prazo estipulado no contracto ante-nupcial;

     f) as inscripções de hypothecas, e as transcripções de instituições de onus reaes e penhor agricola e as de transmissões inter-vivos por titulo oneroso ou gratuito de immoveis susceptiveis de hypotheca, feitas após a decretação do sequestro ou a declaração da fallencia;

     g) os actos caracteristicos de fallencia enumerados nas lettras b), d), e) e h) do § 1º do art. 1º.

    § 1º A falta de transcripção ou inscripção dá acção pessoal ao comprador para haver o preço até onde chegar o producto do immovel, o ao credor para ser admittido á massa como chirographario.

     § 2º A nullidade será decretada, embora para a celebração do acto tenha precedido sentença executoria, ou ella seja consequencia da medida assecuratoria para garantia da divida ou seu pagamento.

     § 3º Annullado o acto, fica de pleno direito rescindida a sentença que a motivou e a consequente execução.

     Art. 36. São annullaveis sómente em beneficio da massa:

     a) os actos a titulo oneroso entre o fallido e o conjuge, antes ou depois do casamento, ou entre o fallido e seus parentes affins na linha recta e na collateral até o 2º gráo, sempre que resultar ou tiver resultado prejuizo aos credores, e se provar que o contractante não ignorava na data do acto o designio do fallido ou seu estado de fallencia;

     b) todos e quaesquer actos, seja qual for a época em que tenham sido feitos, sem que se possa allegar prescripção, provando-se fraude de uma e outra parte contractante.

     Art. 37. Podem ser annullados os actos ou contractos, em que se der omissão de formalidade, que, segundo a lei, for necessaria para adquirir, conservar ou fazer valer direito, ou cujo cumprimento deveria ter logar por ordem judicial em prazo determinado, provando-se em qualquer dos casos que houve proposito de prejudicar os credores.

     Art. 38. A nullidade ou annullação póde ser requerida:

     a) contra todos aquelles que figurarem no acto como contractantes, ou que por effeito do acto foram pagos, garantidos ou beneficiados;

     b) contra os successores causa mortis das pessoas acima indicadas, até a concurrencia da quota hereditaria, do legado, ou usofructo;

     c) contra seus successores:

     I, si tiverem conhecimento, no momento em que se creou o seu direito, da intenção do fallido de prejudicar os credores;

     II, si o direito se originou de acto nullo, nos termos dos arts. 34 e 35;

     III, si estiverem nas condições do art. 36, a);

     d) contra os successores causa mortis das pessoas indicadas na alinea c) ns. I, II e III deste artigo, até a concurrencia da quota hereditaria, legado ou usofructo.

     Art. 39. Os bens deverão ser restituidos em especie com todos os accessorios, mas, não sendo possivel, terá logar a indemnização.

     Art. 40. A restituição dos fructos, incluidos os que se deixaram de perceber, é devida, no caso de má fé, connivencia, fraude ou conhecimento do estado do devedor; em todo o caso sel-o-ha desde a propositura da acção e comprehenderá os pendentes ao tempo da acquisição.

      § 1º O donatario de boa fé restituirá sómente na proporção daquillo com que se achar augmentado o seu patrimonio por effeito da doação.

     § 2º A massa restituirá o que tiver sido prestado pelo contractante, salvo si do contracto ou acto não auferiu vantagem; e neste caso o contractante será admittido como credor chirographario.

     § 3º No caso de restituição do pagamento, o credor reassumirá o seu estado anterior de direito, e participará dos dividendos, si chirographario.

     § 4º Fica salvo aos terceiros de boa fé, acção de perdas e damnos, a todo o tempo, contra o fallido.

     Art. 41. A nullidade póde ser allegada por acção ou embargos na execução.

     § 1º A acção de nullidade e quaesquer outras intentadas contra a massa serão sempre summarias e processadas:

     a) perante o juiz da fallencia;

     b) a appellação será recebida em ambos os effeitos;

     c) qualquer credor poderá intervir como assistente.

     § 2º A' acção de nullidade não poderá ser opposta compensação ou reconvenção.

     § 3º E' permittido o uso do interdicto fraudatorium, que consiste em fazer entrar a massa na posse dos bens alienados.

     § 4º Nas questões de fraude ou de má fé, o juiz não será adstricto ás regras de direito quanto á prova, mas decidirá conforme sua livre e intima, convicção, fundamentando, comtudo, a sentença com os factos e razões que motivem a decisão.

TITULO III

DOS ACTOS CONSECUTIVOS Á DECLARAÇÃO DA FALLENCIA E DA CONCORDATA.

     Art. 42. Dentro de dez dias da publicação da sentença declaratoria da fallencia, os credores apresentarão os seus titulos ao syndico, que é obrigado a dar recibo, sempre que lhe for exigido.

     Art. 43. Publicada em mão do escrivão a sentença que declarar a fallencia, o juiz, acompanhado do syndico, procederá immediatamente á arrecadação dos bens, livros e documentos do fallido, quer os bens pertençam ao estabelecimento ou casa commercial, quer a cada um dos socios solidarios da firma fallida; entregando os em seguida ao syndico, que assignará termo de depositario. O juiz tambem encerrará logo os livros.

     § 1º Não sendo possivel a arrecadação de todos os bens em um só dia, proseguirá nos seguintes, mandando o juiz pôr sellos nos que não tiverem ainda sido arrecadados.

     § 2º Si por accumulo de serviço ficar o juiz impossibilitado de proceder á arrecadação immediata, a commetterá logo a um dos pretores, na Capital Federal, o qual a effectuará, incontinenti, deixando o serviço do seu juizo, caso haja, ao sub-pretor. Nos outros logares o juiz commetterá a arrecadação ao seu substituto, que se haverá na fórma exposta.

     § 3º Incumbe ao syndico:

     a) dar toda, a publicidade á declaração da fallencia pelos meios que julgar convenientes;

     b) por si ou por pessoa que designar, ter em boa guarda, os bens, papeis e documentos do fallido, podendo incumbir a este a guarda dos immoveis e mercadorias;

     c) arrecadar os bens particulares que estejam fóra do gyro commercial do fallido, requerendo ao juiz o que para esse fim for necessario;

     d) vender em hasta publica, por intermedio de leiloeiro, ou, onde não o haja, do porteiro dos auditórios ou de quem suas vezes fizer, respeitadas as leis aduaneiras, os generos e mercadorias de facil deterioração ou que não se possam guardar sem risco ou grande despeza, ouvidos a commissão fiscal e o fallido, e, no caso de opposição, precedendo autorização do juiz;

     e) diligenciar o acceite de letras e a cobrança, de quaesquer dividas activas, nomeando cobradores, advogados, procuradores com salarios previamente ajustados, e dar as respectivas quitações;

     f) praticar todos os actos conservatorios de direitos e acções do fallido (arts. 277, 387 e 453 do Cod. Com.);

     g) realizar as entradas de acções de companhias de que o fallido for subscriptor ou accionista;

     h) proceder ao levantamento do balanço, inventarios, exames de livros, ou verifical-os quando apresentados pelo fallido, auxiliado por perito de sua confiança e sob sua responsabilidade;

     i) com autorização do juiz, remir penhores e antichreses;

     j) praticar todos os actos de administração;

     k) propor todas as acções tendentes a completar e indemnizar a massa;

     l) promover o exame dos livros do fallido com citação do mesmo, por peritos nomeados pelo juiz, e em sua presença, para se averiguar das causas da fallencia, com assistencia do curador das massas fallidas;

     m) requerer todas as diligencias necessarias para se conhecer dessas causas.

     § 4º As quantias provenientes da venda de bens e mercadorias, da cobrança de dividas ou de qualquer outra procedencia, serão recolhidas a um estabelecimento bancario, da confiança do syndico e sob sua responsabilidade, despendendo o syndico e a commissão fiscal sómente o que for estrictamente necessario ao preenchimento de suas funcções.

     § 5º O syndico e a commissão fiscal ficarão responsaveis por dolo e falta, devendo empregar toda a diligencia como si fôra em seus proprios negocios.

     § 6º Divergindo o syndico e a commissão fiscal, desempatará, o juiz, que resolverá como entender e sem recurso algum.

     Art. 44. Feita a arrecadação, o syndico e a commissão fiscal, por si ou por peritos de sua confiança, farão a avaliação do activo do fallido; si este não concordar com a avaliação, poderá requerer que ella seja feita por avaliadores da Junta Commercial, ou por peritos de nomeação do juiz, nos logares onde não houver Junta.

     Art. 45. A requerimento do fallido, sob informação da commissão fiscal e do syndico, poderá ser autorizada pelo juiz a continuação do negocio do fallido, sob a direcção de pessoa por elle indicada e directa fiscalização do syndico, que deverá nomear os prepostos encarregados do escriptorio.

     § 1º As compras e vendas serão feitas a dinheiro de contado, salvo autorização especial do syndico e da commissão fiscal para que possam ser effectuadas a prazo, não excedente de trinta dias, e serão escripturadas em livros especiaes, abertos, numerados, rubricados e encerrados pelo syndico ou por um dos membros da commissão fiscal.

     § 2º Essa autorização poderá ser cassada pelo juiz, sob representação da commissão fiscal ou do syndico.

     § 3º As dividas e obrigações por effeito dessa autorização serão consideradas da massa e não da fallencia.

     Art. 46. O syndico e a commissão fiscal, pela escripturação e pelos titulos que lhe forem exhibidos, organizarão a relação dos credores, classificando seus creditos.

     Art. 47. Dentro de vinte dias, contados da publicação da sentença de declaração da fallencia, reunir-se-hão os credores, sob a presidencia do juiz, presentes, pelo menos, um dos membros da commissão fiscal, o syndico e o curador das massas, que será para isso notificado pelo escrivão.

     Si, dentro deste prazo, não tiver logar a reunião, o syndico e a commissão fiscal serão destituidos pelo juiz, ex-officio ou a requerimento do fallido ou de qualquer credor, ficando solidariamente responsaveis pelas deteriorações que soffrer a massa.

     § 1º Os credores por dividas commerciaes ou civis serão citados por edital publicado, pelo menos, tres vezes no jornal official e em outro de maior circulação, indicado pelo juiz.

     § 2º Os credores ausentes em logar sabido e com o qual haja communicação telegraphica ou telephonica serão avisados por esse meio ou, conforme a distancia, por carta registrada, com o recibo de volta.

     § 3º Os credores ausentes poderão constituir procurador por telegramma, cuja minuta authenticada ou legalizada deverá ser apresentada ao expedidor, que na transmissão mencionará esta circumstancia.

     § 4º E' licito a um só individuo ser procurador de diversos credores.

     A procuração póde ser feita por instrumento particular, sendo a firma reconhecida por tabellião, ou pelo escrivão da fallencia.

     § 5º Quaesquer que sejam os termos do telegramma ou da procuração, entende-se que o procurador ficará habilitado para tomar parte em todas e quaesquer deliberações, si tiver sido feita menção da firma do fallido.

     § 6º Serão considerados representantes legaes dos credores para todos os effeitos:

     a) os prepostos, feitores, gerentes e quaesquer outros representantes, uma vez que tenham poderes para administrar, ainda que careçam da faculdade de alienar;

     b) quaesquer procuradores ad negotia, embora não estejam especificados poderes para a fallencia.

     Art. 48. Reunidos os credores, proceder-se-ha á chamada por lista organisada pelo syndico e pela commissão fiscal. Contra a inclusão ou omissão, nunca contra a classificação, poderá reclamar qualquer credor, ou o fallido.

    O juiz admittirá ou não os credores contestados.

    Paragrapho unico. Os credores por titulos ou obrigações ao portador deposital-os-hão em poder do syndico dous dias antes da reunião, sob pena de não tomarem parte nas discussões e deliberações, não sendo attendidos para o calculo da maioria.

     Art. 49. Si na primeira reunião dos credores do fallido não forem dados por verificados os creditos, conhecerá o juiz das razões allegadas e decidirá como for de direito, podendo ordenar as diligencias que forem necessarias para o conhecimento da verdade, inclusive o exame nos livros do credor contestado, si for commerciante.

     Nas letras e quaesquer titulos particulares do obrigação, de que forem portadores pessoas não commerciantes, presume-se que a data do acceite ou da promessa do pagamento ou da acquisição do direito pelo devedor é a do reconhecimento da firma por tabellião, ou a de qualquer dos actos indicados no art. 3º do decreto n. 79, de 26 de agosto de 1892.

     Art. 50. Decididas as reclamações sobre os creditos, o syndico e a commissão fiscal apresentarão o balanço, o inventario, a avaliação do activo e o exame dos livros.

     Em seguida o syndico lerá o relatorio das causas da fallencia, em que declarará si houve:

     I) excesso de despezas no tratamento pessoal do fallido; venda por menos do preço corrente do effeitos comprados nos seis mezes anteriores á época legal da fallencia, e ainda não pagos, com intenção de retardal-a; abusos de acceites, endossos e responsabilidades de mero favor; si deixou decorrer dez dias do protesto, sem requerer a fallencia;

     II) despezas ou perdas ficticias; falta de justificação do emprego de todas as receitas; occultação, no balanço, de qualquer somma do dinheiro, de quaesquer bens ou titulos; inclusão de dividas activas pagas ou prescriptas; desvio ou applicação de fundos ou valores de que seja depositario ou mandatario; vendas, negociações ou doações feitas ou dividas contrahidas com simulação ou fingimento; compra de bens em nome de terceira pessoa, ainda que parente; falsificação ou truncamento do Diario ou Copiador; perdas avultadas em jogo de qualquer especie, inclusive os chamados de Bolsa e Cambio.

     Paragrapho unico. O fallido ou seu representante poderá oppôr as reflexões que julgar a bem de seu direito, e o juiz ou qualquer credor interrogal-o.

     Art. 51. Qualquer que seja o parecer do syndico ou da commissão fiscal, o fallido ou seu representante poderá apresentar proposta de concordata, apoiada ou não anteriormente pelos credores.

     Art. 52. Concedida ou negada a concordata, o escrivão enviará, no prazo maximo de dez dias, ao curador das massas fallidas, cópia de todo o processado, passando disso a devida certidão e cobrando recibo.

     Art. 53. A concordata consistirá na manutenção do devedor na posse da massa pelo tempo accordado para pagamento dos credores, nos termos propostos e acceitos. Não libera o devedor dos effeitos criminaes da fallencia e só depois de cumprida é que o desonera dos seus effeitos civis e commerciaes.

     Emquanto não estiver cumprida a concordata, o devedor concordatario será considerado depositario dos bens da massa com poderes de disposição e administração.

     Art. 54. A concordata só será válida quando concedida:

     a) por maioria dos credores, representando mais de metade do valor dos creditos, si o dividendo for superior a 50 %;

     b) por dous terços dos credores, representando tres quartos do valor dos creditos, ou tres quartos dos credores, representando dous terços do valor dos creditos, si o dividendo não for inferior de 30%;

     c) por tres quartos dos credores e do valor dos creditos, si o dividendo fôr menor de 30 %;

     d) si for ajustado prazo para pagamento, não excederá este de dous annos, salvo si maior fôr concedido por 3/4 dos credores, representando 3/4 do valor dos creditos.

     Serão computados sómente os creditos reconhecidos verdadeiros e admittidos ao passivo, com exclusão dos credores da massa e de dominio (reivindicantes) separatistas, privilegiados e hypothecarios.

     § 1º A proposta de concordata poderá ser apresentada com declaração escripta e assignada pelos credores, devidamente authenticada, concedendo-a; nesse caso o valor dos creditos e o numero dos credores se apurarão de conformidade com este artigo.

     § 2º Si os credores a que se refere a ultima parte deste artigo quizerem tomar parte na deliberação da concordata, acceitando-a ou rejeitando-a, ficarão equiparados aos chirographarios.

     § 3º Os credores contestados, quando em acção regular forem julgados legitimos, não ficarão sujeitos aos creditos da concordata.

     § 4º Os credores por titulos não mercantis, si não se tratar de fallencia de sociedade, ficam sujeitos aos effeitos da concordata.

     Art. 55. A concordata será acceita ou rejeitada na mesma, reunião.

     Paragrapho unico. Não havendo credores dissidentes, a concordata, quando acceita, considera-se homologada para produzir todos os seus effeitos juridicos; si, porém, houver credores dissidentes, o juiz assignar-lhes-ha o prazo de cinco dias para formularem seus embargos em auto apartado, observando-se o seguinte:

     a) dos embargos o fallido será vista por 48 horas;

     b) conclusos os autos ao juiz, em 24 horas, assignará dez dias para a prova;

     c) finda a dilação, que correrá da publicação do despacho em cartorio ou em audiencia, serão, sem mais allegações, conclusos os autos para sentença;

     d) a appelação, comum a ambas as partes, será recebida só no effeito devolutivo.

     Art. 56. A concordata cumprida importa quitação ao fallido e a sua consequente rehabilitação, salvo, quanto a esta, si no juizo criminal houver elle sido condemnado.

     Art. 57. A concordata poderá ser rescindida:

     a) por má fé do devedor concordatario;

     b) si por culpa ou negligencia do devedor ou por caso fortuito, o activo da massa se deteriorar, de sorte que não possa satisfazer o accôrdo celebrado.

     Art. 58. Para fiscalizar o cumprimento da concordata, na mesma reunião em que fôr ella acceita, os credores indicarão ao juiz dous dentre si, os quaes, nomeados, formarão a commissão fiscalizadora.

     Paragrapho unico. Essa commissão poderá requerer, em qualquer dos casos do artigo precedente, a rescisão da concordata, ficando salvo a qualquer credor o direito de denunciar ao juiz factos que, na fórma do art. 57, determinam a rescisão da concordata. Da petição terá vista, para nella responder, o concordatario, por 48 horas, e com a resposta o juiz julgará. Desta decisão caberá aggravo.

     Art. 59. Rescindida a concordata, proseguirá a fallencia nos termos da liquidação do activo e passivo.

     Art. 60. A concordata definitivamente acceita, induz:

    a) á entrega da massa ao devedor para liquidal-a, como entender, sob a fiscalização da commissão de que trata o art. 58;

     b) á prestação de contas dos syndicos.

     Art. 61. As contas dos syndicos serão prestadas por petição documentada, da qual o juiz dará vista ao fallido e á commissão fiscal para nella responderem. Com a resposta o juiz julgará, e desta decisão caberá aggravo.

     Paragrapho unico. O julgamento das contas não isenta os syndicos das responsabilidades provenientes da administração da massa.

     Art. 62. O devedor que, para a obtenção da concordata, tiver occultado ou desviado bens, simulado passivo, feito conluio com algum ou alguns credores, ou por qualquer modo viciado o consentimento dos credores, poderá, a todo o tempo, ser condemnado, em acção ordinaria, ao pagamento integral da divida e seus juros; e, não estando ainda cumprida, a concordata será rescindida.

     Paragrapho unico. O credor que, nas deliberações sobre a concordata, transigir com o seu voto para obter vantagens para si, perderá, em beneficio da massa, a importancia de seu credito, bem como quaesquer vantagens que lhe possam provir de semelhante transacção.

     Art. 63. A concordata, embora negada, póde ser proposta em todo e qualquer estado da fallencia, ainda quando já esteja formado o contracto de união, fazendo o devedor, á sua custa, as despezas da convocação dos credores.

     § 1º Para ser decretada pelo juiz a reunião dos credores, deverá o fallido apresentar, com a petição, a proposta.

     § 2º Os credores serão convocados por editaes, na fórma do art. 47 § 1º, publicados pela imprensa oito dias, no minimo, antes da reunião, indicando-se em resumo os termos da proposta.

     § 3º Observar-se-ha, quanto for applicavel, o disposto neste titulo.

     Art. 64. Rescindida a concordata, a massa passiva compor-se-ha dos credores da fallencia, pelo que lhes for devido do principal primitivo e dos que tiverem contractado com o fallido depois da entrega da massa.

     § 1º Os credores da segunda serie serão pagos pelo producto dos bens adquiridos a titulo oneroso, depois da entrega da massa, com recursos estranhos a esta, concorrendo, com os da primeira, nos demais bens.

     § 2º Fóra desse caso, os credores chirographarios de ambas as series serão tratados em pé de igualdade.

     § 3º E' licito aos credores da segunda serie pôr á disposição dos da primeira a somma necessaria ao pagamento da concordata para excluil-os do concurso.

     Art. 65. De todas as reuniões se lavrará acta circumstanciada, que será sujeita á approvação dos credores, assignada pelo juiz, commissão fiscal, syndico, credores (querendo) e pelo fallido.

TITULO IV

DO CONTRACTO DE UNIÃO

Da liquidação do activo e passivo

     Art. 66. Não se apresentando proposta de concordata, sendo rejeitada, ou não havendo numero para votal-a, ficará, constituido o contracto de união dos credores, que elegerão um ou mais syndicos, credores ou não, para a liquidação definitiva da massa e uma commissão fiscal, composta de dous membros.

     Marcarão ao syndico ou syndicos eleitos um prazo para a liquidação do activo da massa e a commissão a que os mesmos terão direito, finda a liquidação.

     § 1º A' commissão fiscal será arbitrada uma commissão que não excederá de 1 % sobre o liquido da massa até 200:000$, e sobre o excedente desta somma 1/4 por cento até mil contos de réis, limite maximo.

     § 2º Ao syndico provisorio e á commissão fiscal, por seu trabalho, será arbitrada pelo juiz uma commissão apurada sobre o valor da liquidação e que será de 5 % até 200:000$; de 2, 1/2 % sobre o excedente até 500:000$; de 1, 1/2 % sobre o excedente até 1.000:000$; de 1/4 % sobre o que exceder de 1.000:000$; sendo duas partes para o syndico e uma para a commissão fiscal.

     Art. 67. Os syndicos assumirão a administração da massa e reputar-se-hão investidos de plenos poderes para todas e quaesquer operações e actos da liquidação, para demandar e serem demandados.

     Art. 68. Os syndicos com autorização da commissão fiscal:

     a) procederão á venda de todos e quaesquer bens, moveis, semoventes, immoveis, direitos e acções pela fórma indicada no art. 43, d);

     b) poderão transigir sobre as dividas e negocios da massa;

     c) vender toda a massa activa a qualquer pessoa, ainda que seja o proprio fallido.

     § 1º Recusada essa autorização, os syndicos poderão recorrer ao juiz, que decidirá sem recurso, ouvindo ou não o fallido.

     § 2º Além dos modos acima indicados, todo e qualquer outro de liquidação do activo será permittido aos syndicos com autorização da commissão fiscal.

     § 3º A venda dos bens immoveis independe de intervenção ou outorga da mulher do fallido.

     Art. 69. Dentro do prazo improrogavel de 15 dias, contados da data da reunião, independente de convocação por edital, os credores que não se conformarem com a relação e classificação dos creditos apresentados pelo syndico provisorio poderão reclamar e provar o que for a bem do seu direito.

     § 1º Os syndicos definitivos são obrigados a mostrar os livros e papeis á sua guarda a quaIquer credor que os queira examinar, independente de mandado do juiz.

     § 2º Findos os 15 dias, os syndicos e a commissão fiscal darão seu parecer sobre as reclamações, no prazo de cinco dias, e o juiz ordenadas as diligencias que entender necessarias, preferirá sentença classificando os creditos, da qual serão intimados os credores por um edital com o prazo de 10 dias.

     § 3º Da sentença que classfica os creditos cabe apenas o recurso de aggravo de petição para o superior competente. Podem aggravar os syndicos ou qualquer credor.

     Art. 70. Os syndicos apresentarão todos os mezes, com informação da commissão fiscal, conta demonstrativa do estado da liquidação e das quantias em caixa.

     § 1º Os syndicos são obrigados a distribuir dividendos sempre que o rateio seja superior a 5 %, notando-se as quantias pagas nos respectivos titulos ou creditos lançados em uma folha que os credores assignarão.

     § 2º O saldo final a favor da massa, depois de deduzidas as custas e mais despezas e de paga aos syndicos a porcentagem que lhes tiver sido arbitrada e os adeantamentos que houverem feito, determinará o ultimo rateio.

     § 3º Si dos livros do fallido, ou por documento attendivel, constar que existem credores ausentes, o juiz, sob informação dos syndicos e da commissão fiscal, poderá ordenar se reservem os dividendos que lhes tocarem.

     § 4º Os dividendos não reclamados serão depositados nos cofres dos depositos publicos por conta de quem pertencerem.

     § 5º Si acontecer que, pagos integralmente, de capital e juros, os credores, fiquem sobras, serão restituidas ao fallido ou a seus legitimos representantes, observado o disposto no paragrapho anterior.

     § 6º Si o fallido for sociedade, o juiz nomeará um liquidante para proceder á distribuição das sobras.

     Art. 71. Finda a liquidação, os syndicos prestarão as contas, de conformidade com o disposto no art. 61.

     Art. 72. Si a massa não chegar para pagamento integral dos credores, estes terão a todo tempo direito de executar o devedor pelo saldo do seus creditos, servindo de titulo executorio a sentença que julgou a classificação de creditos.

     Art. 73. Os syndicos e os membros da commissão fiscal poderão ser destituidos a requerimento dos credores, representando a maioria dos creditos, sem allegarem causa.

     § 1º Dando-se causa justificada, a destituição poderá ser decretada ex-officio, a requerimento de qualquer credor ou da commissão fiscal e dos syndicos.

     § 2º Do despacho que decreta ou não a destituição ha aggravo de instrumento.

     § 3º A destituição importa a perda do direito á porcentagem.

     § 4º A substituição do syndico e da commissão fiscal será feita provisoriamente por nomeação do juiz e definitivamente pelos credores, ou em reunião pela fórma do art. 66 ou por declaração authentica de voto, escripta e assignada.

     Art. 74. E' prohibido ao juiz, aos syndicos, á commissão fiscal, peritos, avaliadores e mais officiaes da justiça, comprar por si, ou por interposta pessoa, quaesquer bens da massa, sob as penas do art. 232 do Codigo Penal.

TITULO V

DOS CREDORES DA MASSA E DOS DA FALLENCIA

     Art. 75. São credores da massa e serão pagos de preferencia a todos o quaesquer outros:

     a) os de despezas, salarios, custas, honorarios, commissões, fornecimentos referentes á arrecadação, administração e distribuição da massa fallida e á sua segurança, guarda, conservação e defesa;

     b) os de despezas com a molestia e funeraes do fallido depois de declarada a fallencia;

     c) os de alimentos ao fallido, quando autorizados.

     Paragrapho unico. Si o activo for insufficiente, os syndicos não terão direito á repetição de qualquer pagamento effectuado.

     Art. 76. São credores reivindicantes, quer tenham acção real ou reipersecutoria, quer não, propriedade plena ou jus in re:

     a) o dono de cousa adquirida pelo fallido de quem não era o proprietario;

     b) o dono de cousa em poder do fallido por titulo de deposito, penhor, antichrese, administração, arrendamento, commodato, usofructo, uso ou habitação;

     c) os donos de mercadorias em commissão de compra ou venda, transito ou entrega;

     d) o dono de cousa, embora fungivel, em poder do fallido por effeito de mandato, inclusive dinheiro, effeitos de commercio ou titulos a elles equiparados, endossados sem transferencia de propriedade, ainda não pagos ou em poder de terceiro, em nome do fallido, na época da fallencia;

     e) o dono de cousa furtada, roubada, extorquida ou obtida por falsidade, estellionato ou outras fraudes;

     f) o dono de titulos ao portador, que forem perdidos, furtados, roubados, extorquidos ou obtidos por falsidade, estellionato ou outras fraudes, si o fallido for quem os achou ou obteve por esses meios, ou os recebeu sabendo a origem viciosa da posse;

     g) o vendedor de bens immoveis, embora feita a tradição, ainda não pago do preço da venda, salvo si o tiver creditado ao comprador;

     h) o vendedor depois da entrega da cousa vendida a credito, si reservou a propriedade até o pagamento ou si, á venda a credito, foi induzido por dolo do comprador;

     i) o vendedor de cousa expedida ao fallido, si a este não foi entregue o conhecimento, antes de declarada a fallencia;

     j) a mulher casada pelos bens:

     I, dotaes estimados para qualquer effeito;

     II, paraphernaes;

     III, incommunicaveis sob o regimen da communhão;

     IV, que não respondam por dividas anteriores ao casamento;

     V, pelas arrhas o doações ante-nupciaes, feitas pelo futuro marido, quando insinuadas;

     k) os filhos menores, legitimos, legitimados ou reconhecidos, pelos bens castrenses, quasi castrenses e adventicios;

     l) os tutelados e curatelados pelos bens que lhes pertencerem; e quanto ás cousas adquiridas pelo tutor ou curador, em seu proprio nome, com bens ou producto de bens dos mesmos tutelados ou curatelados;

     m) os herdeiros e legatarios pelos bens da herança ou legado;

     n) os que tiverem feito remessas para um fim determinado.

     § 1º Não se considera deposito o de dinheiro, quando ao depositario é permittido fazer uso delle ou empregal-o em operações civis ou commerciaes, vença ou não juros, sendo sómente tal quando tomar o caracter de cousa não fungivel.

     § 2º O producto da venda de mercadorias em commissão de compra e venda, que, por autorização do dono for creditada em conta corrente, constituirá credito chirographario.

     § 3º A cousa, não se offerecendo duvida ou contestação, será pelos syndicos, com autorização da commissão fiscal, entregue ao dono na mesma especie em que houver sido recebida pelo fallido, ou naquella em que existir, tendo sido subrogada; na falta da especie, será pago o seu valor.

     § 4º O reivindicante pagará á massa as despezas a que a cousa reivindicada ou seu producto tiver dado logar.

     § 5º A reclamação ou acção de reivindicação obsta a venda da cousa reclamada, mas não annulla a anterior alienação.

     § 6º A reivindicação do valor da cousa, quando esta não exista mais na massa, não autoriza a repetição dos dividendos distribuidos aos credores.

     Art. 77. São credores separatistas (ex jure credito):

     a) a Fazenda Publica, os Estados e os Municipios, pelos impostos devidos;

     b) os que estiverem com o fallido em relações de co-propriedade ou em sociedade, para que, pelos bens que formam a co-propriedade ou a sociedade, sejam pagos dos seus creditos;

     c) os credores e os legatarios da pessoa de quem o fallido é herdeiro sobre os bens da herança, para que por elles sejam pagos com exclusão dos credores do fallido, salvo si convieram por qualquer modo, no juizo do inventario ou fóra delle, para que lhes fossem adjudicados bens com o encargo de pagar as dividas do de cujus.

     Art. 78. São credores da fallencia:

     I. Com privilegio sobre todo o activo, salvo hypotheca devidamente inscripta e anterior á emissão ou em garantia do pagamento do preço do immovel adquirido depois della:

     a) os portadores de obrigações (debentures) emittidas pelas sociedades commanditarias por acções;

     b) os de salarios ou soldadas de feitores, guarda-livros, caixeiros, agentes ou domesticos do fallido, vencidos no anno immediatamente anterior á data da declaração de fallencia, tenham ou não registrados os titulos de nomeação;

     c) os de salarios e soldadas de equipagem que não estiverem prescriptos nos termos do art. 449 n. IV do Codigo do Commercio.

     II. Com privilegio sobre determinados immoveis e moveis, salvo hypotheca anteriormente inscripta:

     a) o proprietario e o sublocador, nos moveis de uso pessoal que se acharem dentro da casa, para pagamento dos alugueis vencidos, e nos fructos pendentes a respeito da renda ou fôro dos predios rusticos;

     b) os operarios, artistas, fabricantes o empreiteiros, sobre os objectos que fabricaram ou concertaram e dos quaes estão de posse para pagamento de seus salarios, fornecimentos de material e mais vantagens estipuladas;

     c) os credores pignoraticios e antichresistas e os que teem direito de retenção na cousa dada em penhor ou antichrese, e na cousa retida;

     d) na cousa salvada, quem salvou-a, pelas despezas com que a fez salvar (art. 738 do Cod. do Com.);

     e) no navio e fretes da ultima viagem, a tripulação (art. 564 do Cod. do Com.);

     f) no navio, os que concorreram com dinheiro para a sua compra, concerto, aprestos ou provisões (art. 475 do Cod. do Com.);

     g) nas fazendas carregadas, o aluguel ou frete, as despezas e avaria grossa (arts. 117, 626 e 627 do Cod. do Com.); 

     h) no objecto sobre que recahiu o emprestimo maritimo, o dador de dinheiro a risco (arts. 633 e 662 do Cod. do Com.);

     i) os que possam invocar em seu favor qualquer dos arts. 108, 156, 189, 537, 565 e 632 do Cod. do Com.;

     j) os hoteleiros, pelas despezas de hotel, sobre os objectos do devedor que estiverem retidos;

     k) os credores por bemfeitorias, sobre o augmento do valor que com ellas deram ao objecto, ainda em seu poder.

     § 1º O privilegio prevalece a respeito do preço dos immoveis hypothecados anteriormente, depois de pagas as dividas hypothecarias e os creditos provenientes das despezas e custas judiciaes feitas para excussão do immovel hypothecado e que serão deduzidas precipuamente do producto do mesmo immovel.

     § 2º Os bens dados em penhor ou antichrese e objecto do direito de retenção podem ser remidos a beneficio da massa, e, não sendo possivel remirem-se, os credores serão intimados para os trazer a leilão, nos termos do art. 43, d). A sobra, havendo, entrará na massa; mas si, pelo contrario, não bastar o seu producto, a differença entrará em rateio entre esses credores e os chirographarios.

     § 3º Os privilegiados só poderão ser pagos pelo producto dos bens em que tiverem privilegio, até onde chegar sómente e por via de rateio.

     III. Os que tiverem hypotheca legal ou convencional inscripta.

     Paragrapho unico. Os decretos n. 169 A, de 19 de janeiro da 1890, e n. 370, de 2 de maio do mesmo anno, regularão as preferencias.

      IV. Todos os mais credores são simples ou chirographarios, comprehendidos:

     a) a mulher, pelos bens dotaes inestimados;

     b) os credores, por hypotheca legal não especializada;

     c) os credores privilegiados e hypothecarios, pelos saldos;

     d) os depositantes de dinheiro com o caracter de cousa fungivel.

    § 1º Os credores que tiverem garantias por fiança serão contemplados entre os chirographarios, deduzindo-se as quantias que tiverem recebido do fiador; e este será tambem como tal considerado por tudo quanto tiver pago em descarga do fallido.

     § 2º No caso de faIlencia simultanea de muitos co-obrigados solidarios, o credor será admittido pela totalidade de seus creditos em todas as massas fallidas, e os dividendos recebidos de uma das massas descarregarão as outras e os co-obrigados solventes, até integral pagamento.

     § 3º Os co-devedores solidarios do fallido serão admittidos na massa pela importancia do que tiverem pago, observando-se, porém as regras de Direito Civil sobre as obrigações solidarias.

     Art. 79. Não serão considerados credores:

     a) o chirographario que se apresentar habilitado com sentença meramente de preceito, isto é, não fundada em titulos liquidos e certos definidos no art. 2º, obtida anteriormente á declaração da fallencia;

     b) os credores, pelas despezas que fizerem com o processo ou reconhecimento de seus creditos;

     c) os credores por titulo de simples liberalidade, não incluidas as doações remuneratorias, inter vivos ou causa mortis.

TITULO VI

DISPOSIÇÕES RELATIVAS ÁS SOCIEDADES

     Art. 80. A fallencia de sociedades em nome collectivo, de capital e industria e em commandita simples ou por acções, acarreta a de todos os socios pessoal e solidariamente, responsaveis.

     § 1º A de qualquer ou de todos os socios, pessoal e solidariamente responsaveis não produz a da sociedade em nome collectivo, de capital e industria e em commandita simples ou por acções, si não se acharem tambem em estado de fallencia, considerando-se, porém, dissolvidas para entrarem em liquidação.

     § 2º Os socios commanditarios que, nos termos do art. 314 do Codigo Commercial, se tornarem solidarios, não incidirão nos effeitos da fallencia, mas responderão in solidum por todas as obrigações sociaes.

     § 3º Na sociedade em conta de participação sómente os socios ostensivos e gerentes poderão ser declarados fallidos.

     Art. 81. Os bens da sociedade e as particulares dos socios, pessoal e solidariamente responsaveis, serão arrecadados e entregues á administração dos syndicos da fallencia.

     § 1º Proceder-se-ha separadamente ao inventario dos bens sociaes e dos de cada um dos socios, de modo que não se confundam nas operações de administração e liquidação do activo e passivo.

     § 2º Os credores particulares dos socios não serão pagos pelos bens sociaes, nem concorrerão com os credores da sociedade; e só o serão pelos bens do socio devedor e pelas sobras do que tiver na sociedade, depois de pagos os credores sociaes.

     § 3º Os credores da sociedade só serão pagos pelos bens particulares dos socios e em concurso com os criadores destes, não havendo mais bens sociaes e apenas pelos saldos das dividas.

     § 4º Quando uma mesma pessoa for membro de diversas sociedades com diversos socios, fallindo uma, os credores nella só poderão executar a quota liquida que o socio commum tiver nas sociedades solventes, depois de pagos os credores desta.

     § 5º Esta disposição tem logar si as mesmas pessoas formarem diversas sociedades; fallindo uma, os credores da massa fallida só terão direito sobre as massas solventes depois de pagos os credores destas.

     § 6º Só os credores sociaes tomarão parte nas deliberações referentes ao patrimonio social, mas concorrerão com os credores particulares dos socios nas que affectarem o patrimonio individual de cada um dos fallidos.

     § 7º No caso de fallir o socio gerente de sociedade em conta de participação, é licito ao terceiro com quem houver tratado saldar todas as contas que com elle tiver, posto que abertas sejam debaixo de distinctas designações, com os fundos pertencentes a quaesquer das mesmas contas, ainda que os outros socios mostrem que esses fundos lhes pertencem, uma vez que não provem que o dito terceiro tinha conhecimento antes da fallencia de existir a sociedade (art. 328 do Codigo Commercial).

     § 8º Os socios não ostensivos da sociedade em conta de participação serão admittidos ao passivo pela parte dos fundos com que contribuiram, si provarem que não foi absorvida pelas perdas, conforme a quota de cada um.

     Art. 82. Os socios de responsabilidade limitada deverão preencher as quotas com que se obrigaram a contribuir, quaesquer que sejam as disposições do contracto social.

     Paragrapho unico. O socio que se despedir antes de dissolvida, a sociedade ficará responsavel pelas obrigações contrahidas e perdas havidas até o momento da despedida, que será o da data da respectiva averbação no registro do commercio (arts. 338 e 339 do Codigo Commercial).

     Art. 83. A concordata póde ser proposta por qualquer dos socios, e cada qual tem o direito de discutil-a e apresentar substitutiva.

     § 1º Salvo declaração expressa, uma vez acceita, desonera os co-obrigados com os fallidos e a estes em todo caso.

     § 2º Acceita a proposta e homologada, ao socio que a fez será entregue a massa para liquidal-a, como entender, fazendo seus todos os commodos e incomodos, guardado o disposto no art. 60.

     § 3º E' licito a qualquer dos socios oppor embargos á concordata, nos termos do art. 55, observando-se o mesmo processo.

     § 4º A rescisão da concordata não affectará sinão o socio concorditario a quem a massa foi entregue.

TITULO VII

DA CLASSIFICAÇÃO DA FALLENCIA E DOS CRIMES QUE DELLA DECORREM

     Art. 84. O processo criminal contra o fallido correrá em auto apartado, distincto e independente do commercial; não poderá, porém, ser iniciado antes de declarada a fallencia.

     Art. 85. E' competente para qualificar a fallencia o juiz que a declarou.

     § 1º O curador das massas fallidas promoverá perante este o processo contra o fallido, seus cumplices e mais pessoas culpadas.

     § 2º Quando o syndico provisorio e a commissão fiscal em seu relatorio mencionarem qualquer dos factos enumerados nos ns. 1 e 2 do art. 50, o syndico definitivo é obrigado, sob pena de destituição, a promover o processo contra o fallido, nos termos do paragrapho antecedente, si o não fizer o curador fiscal.

     § 3º A petição inicial preencherá todos os requisitos exigidos pelas leis do processo criminal, será instruida com a cópia de todo o processado até a concessão ou denegação da concordata, e apresentada dentro do prazo de 15 dias, a contar do recebimento dessa cópia.

     § 4º Autoadas essas peças, o processo será o da formação da culpa nos crimes communs, com todos os recursos e garantias individuaes estabelecidos nas respectivas leis.

     § 5º Qualquer credor poderá, e o promotor publico deverá requerer o que for a bem da justiça.

     § 6º As autoridades policiaes remetterão ao juiz processante os inqueritos a que procederem durante o summario.

     § 7º Findo o interrogatorio do fallido e produzida a defesa no summario, o curador fiscal e o promotor publico emittirão parecer sobre a qualificação da fallencia.

     § 8º Conclusos os autos ao juiz, este poderá ordenar as diligencias que julgar necessarias e, cumpridas, qualificará a fallencia casual, culposa, ou fraudulenta; nos dous ultimos casos pronunciará, os indiciados, dando-lhes recursos para o superior competente.

     Art. 86. A fallencia será qualificada:

     a) casual, quando proceder de accidentes, casos fortuitos ou força maior, ou não concorrer circumstancia pela qual deva ser qualificada culposa ou fraudulenta;

     b) culposa, quando o occorrer algum dos seguintes factos:

     I. Excesso de despezas no tratamento pessoal do fallido em relação ao seu cabedal, numero de pessoas de familia e especie do negocio.

     II. Venda por menos do preço corrente de effeitos comprados nos seis mezes anteriores á época legal da fallencia e ainda não pagos, si foi feita com intenção de retardar a declaração da fallencia.

     III. Emprego de meios ruinosos para obter recursos e retardar a declaração da fallencia.

     IV. Abuso de acceites, endossos e responsabilidades de mero favor.

     V. Quando o fallido não tiver os livros e sua escripturação na fórma exigida pelo Codigo Commercial, ou a tiver em atrazo; salvo si a exiguidade do commercio e a falta de habilitações litterarias rudimentares do fallido o relevem do cumprimento daquelles preceitos;

     c) fraudulenta, quando occorrer:

     I. Despezas ou perdas ficticias, falta de justificação do emprego de todas as receitas e gastos para fins reprovados.

     II. Occultação no balanço de qualquer somma de dinheiro, de quaesquer bens ou titulos, inclusão de dividas activas pagas ou prescriptas.

     III. Desvio ou applicação de fundos ou valores de que seja depositario ou mandatario.

     IV. Vendas, negociações ou doações feitas ou dividas contrahidas com simulação ou fingimento.

     V. Compra de bens em nome de terceira pessoa, ainda que conjuge, ascendentes e descendentes e irmãos.

     VI. Falta pelo menos do Diario visado na fórma do art. 134.

     VII. Falsificação ou truncamento do Diario ou do Copiador.

     VIII. Falta de archivamento e lançamento no registro do commercio, dentro de 15 dias subsequentes á celebração do casamento (art. 31 do Codigo Commercial), do contracto ante-nupcial, sendo o marido commerciante ao tempo do casamento; desse contracto a dos titulos dos bens incommunicaveis da mulher, dentro de 15 dias subsequentes ao começo do exercicio do commercio, quanto ao contracto ante-nupcial, e, dentro de 30 dias subsequentes á acquisição, quanto aos referidos bens; e dos titulos de acquisição de bens que não possam ser obrigados por dividas nos prazos aqui indicados.

     IX. Perdas avultadas em jogos de qualquer especie e sob qualquer fórma, inclusive os chamados da Bolsa.

     X. O officio de corretor ou agente de leilões, embora tenha o fallido deixado de exercer taes funcções, uma vez que a fallencia proceda do tempo em que as tiver exercido.

     XI. O exercicio do commercio sob firma ou razão commercial que não pudesse ser inscripta no registro.

     Paragrapho unico. As regras da cumplicidade estabelecidas no Codigo Penal prevalecerão em toda a sua extensão e effeitos no caso de fallencia fraudulenta.

     Art. 87. Incorrerá nas penas de fallencia culposa, salvo a fraude, caso em que serão applicadas as da fraudulenta:

     I. O fallido que, depois da declaração da fallencia ou do sequestro, praticar algum acto nullo ou annullavel.

     II. O fallido que tiver os livros escripturados de fórma a difficultar ou tornar obscura a verificação ou a liquidação, quer do activo, quer do passivo.

     III. O devedor que, no prazo legal, não se declarar fallido, si da omissão resultar que fique fóra da influencia da época legal da fallencia, algum acto que, dentro dessa época, seria nullo ou annullavel.

     IV. O fallido que, occultando-se, ausentando-se, não comparecendo, negando informações ou esquivando-se de auxiliar os syndicos e a commissão fiscal, crear embaraços de qualquer especie ao andamento do processo commercial.

     V. O concordatario, si por negligencia, descuido ou algum outro acto de culpa, concorrer para a deterioração da massa e consequente rescisão da concordata e declaração de fallencia.

     Art. 88. Incorrerá nas penas de fallencia fraudulenta:

     I. O devedor que, por meio de fraude ou simulação, obtiver de seus credores accordo preventivo da fallencia.

     II. O devedor que obtiver o dito accordo, prevalecendo-se de algum facto que qualifica de fraudulenta a fallencia.

     III. Qualquer pessoa, inclusive guarda-livros, que se mancommunar com o devedor para fraudar os credores, ou o auxiliar para occultar ou desviar bens, seja qual for a sua especie, quer antes, quer depois da decIaração da fallencia.

     IV. Qualquer pessoa que se apresentar com credito simulalo.

     V. Qualquer pessoa que occultar ou recusar aos syndicos ou á commissão fiscal a entrega dos bens, creditos ou titulos que tenha do fallido; admittir, depois de publicada a declaração da fallencia, cessão ou endosso do fallido, ou com elle celebrar algum contracto ou transacção.

     VI. O credor legitimo que fizer concerto e m o devedor em prejuizo da massa ou transigir com o seu voto para obter vantagens para si nas deliberações e actos da concordata, preventiva ou não, quitação e rehabilitação.

     VII. O corretor que intervier em qualquer operação mercantil do fallido depois de declarada e publicada a fallencia.

     Art. 89. Os crimes do que tratam os arts 86, b) até 88 serão julgados pelo juiz de direito criminal do districto da séde do estabelecimento do fallido.

     Art. 90. A fórma do processo do julgamento será a do dec. n. 707 de 9 de outubro de 1850.

     Paragrapho unico. Da sentença poderão appellar o réo e o promotor publico, nos effeitos regulares.

     Art. 91. A sentença criminal condemnatoria, em fallencia fraudulenta ou por crime a ella equiparado, além dos effeitos estabelecidos no Codigo Penal, produzirá:

     a) o de annullar a quitação dada ao fallido;

     b) o de rescindir a concordata, ou o accordo extra-judicial;

     c) o de annullar, independente de sentença civil ou commercial, os actos criminosos e de obrigar á restituição dos bens a que se referirem.

     Art. 92. Os syndicos e os membros da commissão fiscal ficarão sujeitos á responsabilidade civil e criminal pelos actos que praticarem em opposição aos interesses a seu cargo, sendo equiparados, para os effeitos da penalidade e respectivo processo, aos empregados publicos.

TITULO VIII

DA REHABILITAÇÃO DO FALLIDO

     Art. 93. Cumprida a concordata ou obtida dos credores a quitação plena, poderá o devedor, cuja fallencia tiver sido qualificada casual, ou absolvido de accusação por fallencia culposa, fraudulenta, ou por acto a ellas equiparado, requerer, com folha corrida, ao juiz commercial da fallencia, a rehabilitação.

     § 1º O fallido condemnado que for declarado innocente, nos termos do art. 186 do Codigo Penal, poderá tambem requerer a rehabilitação.

     § 2º O cumprimento da pena, por effeito da fallencia culposa ou de acto a ella equiparado, não impedirá, a rehabilitação, si o fallido se mostrar digno de obtel-a.

     § 3º O fallido condemnado por fallencia fraudulenta, ou acto a ella equiparado, só depois de cinco annos do cumprimento da pena poderá requerer e obter rehabilitação, si provar ter pago effectivamente de principal e juros todos os credores.

     Art. 94. O requerimento para a rehabilitação será publicado por edital durante trinta dias e pela imprensa, onde a houver, devendo ser ouvido o curador fiscal.

     Paragrapho unico. Qualquer credor ou prejudicado poderá, dentro dos 30 dias, oppor-se, por petição, á rehabilitação.

     Art. 95. Da sentença que não conceder a rehabilitação haverá appellação em um só effeito.

     § 1º O fallido, nas condições do art. 93, principio, será declarado rehabilitado; nos demais casos ficará ao prudente arbitrio do juiz conceder a rehabilitação.

     § 2º A sentença que negar a rehabilitação não fará caso julgado.

     Art. 96. Declarado rehabilitado o fallido, será publicada a sentença pela mesma fórma por que o houver sido a declaração da fallencia e communicada ás mesmas instituições.

     Paragrapho unico. No registro das firmas ou razões commerciaes far-se-ha a devida averbação ex-officio.

     Art. 97. A rehabilitação faz cessar todas as incapacidades produzidas pela declaração da fallencia.

TITULO IX

DAS FALLENCIAS DECLARADAS FÓRA DA REPUBLICA

     Art. 98. E' competente para declarar a fallencia o tribunal do domicilio commercial, do devedor, ainda que tenha praticado accidentaImente actos de commercio em outra nação, ou nella mantenha agencias filiaes que operem por conta e sob responsabilidade do estabelecimento principal.

     Art. 99. Tendo o fallido dous ou mais estabelecimentos independentes em diversos paizes, serão competentes os tribunaes dos respectivos domicilios.

     Art. 100. Serão exequiveis no Brazil, haja ou não reciprocidade legislativa ou diplomatica, mediante as formalidades do decreto n. 6982, de 27 de julho de 1878, as sentenças estrangeiras que abrirem fallencias a negociantes que tenham domicilio no paiz onde foram proferidas.

     Art. 101. As ditas sentenças, depois de receberem o cumpra-se dos juizes brazileiros e da publicação do cumpra-se, produzirão na Republica os effeitos que, por direito, são inherentes ás sentenças de declaração de fallencia, salvo as restricções adeante declaradas.

     Art. 102. Independentemente do cumpra-se e só com a exhibição da sentença e do acto da nomeação, em fórma authentica, os syndicos, administradores, curadores ou outros representantes legaes da massa terão qualidades para, como mandatarios, requererem na Republica diligencias conservatorias dos direitos da massa, cobrar dividas, transigir, si para isso tiverem poderes, e intentar acções, sem obrigação de prestar caução judicatum solvi (fiança, ás custas).

     § 1º O procurador que intentar a acção ou promover os actos judiciarios ficará obrigado ás custas.

     § 2º Todos os actos que importarem execução da sentença, taes como a arrecadação e arrematação dos bens do fallido, não poderão ser praticados sinão depois que a sentença se tornar executoria pelo cumpra-se e mediante autorização do juiz brazileiro, guardando-se as formulas do direito patrio.

     Art. 103. Não obstante haver sido declarada executoria a sentença estrangeira de abertura da fallencia, os credores domiciliados na Republica, que tiverem hypotheca sobre bens aqui situados, não ficam inhibidos de demandar os seus creditos e excutir os bens hypothecados.

     Art. 104. A. disposição do artigo anterior é applicavel aos credores chirographarios domiciliados na Republica, que, na data do cumpra-se, tenham acções ajuizadas contra o fallido. Ser-lhes-ha licito proseguir nos termos ulteriores do processo e executar os bens do fallido sitos na Republica.

     Art. 105. A sentença estrangeira que abrir fallencia a commerciantes que tenham dous estabelecimentos, um no paiz do seu domicilio e outro distincto e separado na Republica, não comprehenderá em seus effeitos o estabelecimento existente na Republica.

     § 1º Poderão, porém, tornar-se effectivas medidas assecuratorias sobre bens existentes na Republica, mediante cartas rogatorias que, uma vez cumpridas, serão publicadas por editaes com prazo de 60 dias.

     § 2º Por esse facto os credores locaes poderão requerer a declaração da fallencia do estabelecimento situado na Republica, e serão pagos pela respectiva massa, de preferencia aos credores do estabelecimento existente no estrangeiro.

     § 3º Credores locaes são aquelles cujos creditos deverão ser pagos na Republica.

     Art. 106. Havendo pluralidade de concursos de credores, as sobras que resultarem a favor do fallido na Republica serão postas á disposição dos credores dos outros concursos.

     Art. 107. No caso do art. 98, os credores locaes concorrerão com os não locaes, que farão valer seus direitos perante o juiz da fallencia.

     Art. 108. A lei local regulará a classificação dos creditos.

     Art. 109. As concordatas e os modos de prevenir e obstar a declaração da fallencia, homologados por tribunaes estrangeiros, só serão obrigatorios para os credores residentes na Republica que houverem sido citados para nella tomarem parte, e depois de receberem o cumpra-se.

     Art. 110. Declarada mais de uma fallencia, as incapacidades do fallido serão reguladas pela lei do paiz onde tiver domicilio pessoal.

     Art. 111. A rehabilitação do fallido só produzirá effeito quando tiver sido declarada, por todos os tribunaes perante os quaes se processaram as fallencias.

     Art. 112. Havendo tratado ou convenção com alguma nação, regulando esta materia, se observará o que ahi estiver estipulado.

     Art. 113. Não são susceptiveis de execução na Republica as sentenças estrangeiras que declararem a fallencia do commerciante aqui domiciliado, sendo brazileiro.

TITULO X

DO ACCORDO OU CONCORDATA PREVENTIVA

     Art. 114. O devedor com firma inscripta no registro commercial e antes de decorridos dez dias de protesto por falta de pagamento de obrigação mercantil liquida e certa, que tiver requerido accordo com seus credores perante o juiz commercial da séde do seu estabelecimento, não póde ser declarado fallido sinão quando não homologado o accordo.

     Paragrapho unico. O requerimento para a homologação deverá ser apresentado antes de requerida a fallencia.

     Art. 115. Para o accordo, seja elle apoiado ou não por declaração assignada pelos credores, fará o devedor requerimento ao juiz expondo o seu estado, acompanhando a proposta os livros, o balanço do activo e do passivo, a conta demonstrativa dos lucros e perdas, relação dos credores, o domicilio de cada um, a natureza dos titulos e o importe de cada um.

     Art. 116. Distribuida a petição, publicará o escrivão edital pela imprensa, onde a houver, e dirigirá carta aos credores, conforme estiverem presentes ou não, communicando o accordo proposto, e intimando-os para, no prazo de 10 dias, remetterem a juizo, além do seu voto de acceitação ou recusa, os documentos em que fundam o seu credito, cobrando recibo do escrivão.

     Findo este prazo, o juiz marcará o de 10 dias para, dentro delle, o impetrante e os credores allegarem e provarem qualquer reclamação, observadas as disposições do art. 49, alinea, sobre a prova e authenticidade dos titulos paticulares.

     Encerrado o decendio, o juiz, procedendo aos exames dos livros do devedor e do credor, si houver contestação, e outras diligencias que julgar precisas, com o concurso de uma commissão de dous credores, que nomeará, homologará ou não, dentro de oito dias, devendo no caso negativo decretar a fallencia do devedor. A taes diligencias assistirá o curador fiscal das massas fallidas.

     Art. 117. A homologação não terá logar si o accordo ou concordata não for estipulado na fórma prevista no art. 54.

     Art. 118. São causas de reclamação:

     1º, dólo, fraude, má fé do devedor;

     2º, falta de capacidade de algum dos signatarios do accordo;

     3º, conluio com um ou mais credores signatarios do accordo;

      4º, simulação de credores para formar o computo legal do passivo.

     Art. 119. Caberá aggravo da sentença proferida.

     Art. 120. O accordo homologado poderá, a requerimento de qualquer credor, ser rescindido, declarando-se a fallencia:

     a) por má fé do devedor, antes ou depois da homologação;

     b), si por culpa ou por negligencia do devedor, o activo da massa se deteriorar, de sorte que não possa satisfazer o accordo celebrado.

     Art. 121. A homologação do accordo produzirá o effeito de obrigar a todos os credores chirographarios, e obstará a declaração da fallencia, salvo por falta do pagamento de divida contrahida depois della, ou si não for cumprido o accordo.

     Art. 122. Durante o processo da homologação não poderá o devedor alienar ou hypothecar seus bens, nem contrahir novas obrigações sem autorização do juiz, que procederá ás informações necessarias.

TITULO XI

DISPOSIÇÕES GERAES

     Art. 123. Aos corretores, agentes de leilões, trapicheiros e commissarios de transportes são applicaveis as disposições desta lei com a excepção do art. 114.

     Art. 124. Os credores, a requerimento do fallido, ou por proposta dos syndicos, poderão autorizar a prestação de alimentos ao fallido, á sua viuva e filhos menores.

     Art. 125. Todos os prazos marcados nesta lei correrão em cartorio, independentemente de accusação e lançamento em audiencia, e serão fataes e improrogaveis.

     Art. 126. Só por motivo extraordinario e convindo aos credores, poderá ser adiada a reunião convocada; funccionará qualquer que seja o numero dos presentes, e, salvo os casos expressos, a decisão da maioria, dos presentes obrigará os ausentes.

     Art. 127. Do toda e qualquer reunião de credores lavrará o escrivão acta circumstanciada, que será assignado, pelo juiz, pelo fallido e pelos credores que o quizerem.

     Art. 128. O processo das fallencias prefere, na ordem dos feitos, a todos os outros do juizo commercial; não tem ferias, salvo os domingos e os dias de festa nacional.

     Art. 129 O juiz e o escrivão perceberão custas na razão de um terço das actuaes, e mais 1 % sobre o liquido da massa até 200:000$, e sobre o que exceder desta somma terão 1/4 % até o limite maximo de mil contos de réis, sendo uma parte para o juiz e duas para o escrivão.

     Art. 130. O curador das massas fallidas apenas perceberá custas pelos actos que exercer, e uma gratificação annual de 4:800$, na Capital Federal.

     Art. 131. A massa não pagará commissão a agentes de leilões pelas vendas que effectuarem.

     Art. 132. Os syndicos provisorios e os definitivos poderão contractar advogados, por conta da massa, mediante autorização expressa da commissão fiscal, approvada pelo juiz, quando a massa for a juizo, como autora ou ré, ou se trate de negocio judicial, que exija competencia a technica.

     Art. 133. Declarada a fallencia, o syndico fará juntar ao processo certidão da Junta Commercial, da repartição ou autoridade competente, de quaes, quantos e quando por ella abertos, rubricados e encerrados os livros da casa fallida nos ultimos tres annos, si mais recente não for o seu commercio.

     Art. 134. Todo commerciante é obrigado a apresentar annualmente ao juiz o seu Diario, logo que nelle houver lançado o balanço a que se refere o art. 12 do Codigo Commercial; e o juiz, sem examinar a escripturação, authenticará com o seu - visto e assignatura - o estado da escripta nessa data.

     E' competente para esse visamento o juiz commercial, e qualquer outro de primeira instancia do logar do estabelecimento.

     Pelo visamento perceberá o juiz 2$000.

     Art. 135. Na fallencia de estabelecimento de fundo mercantil, não excedente de 10:000$ o juiz, procedendo de plano verbal e summariamente, ordenará o inventario, avaliação, venda e deposito dos bens e do seu preço. Outtosim, successivamente, ou simultaneamente, si for possivel, fará, a requerimento e com assistencia do curador fiscal, as inquirições, interrogatorios, exames e averiguações necessarios, e mandará extrahir cópias para enviar incontinenti ao juiz competente, para a formação da culpa, e proseguirá nos ulteriores termos do processo e concurso de preferencia, com cuja decisão, salvos os recursos legaes, se terminará a causa.

     Art. 136. Si pela diligencia a que se refere o art. 44 verificar-se que não existem bens, ou que os existentes são manifestamento insufficientes para as despezas, e não houver por isso dividendo a distribuir, o juiz, ouvidos os credores e não havendo opposição, encerrará o processo de fallencia, ficando livre aos credores o exercicio das acções, que individualmente Ihes competir contra, o fallido.

     O encerramento do processo não exime o fallido do procedimento criminal pela qualificação da falIencia.

     Art. 137. Vagando o logar de curador das massas fallidas, no Districto Federal, será creado mais um logar de promotor publico, com funcção especial nas fallencias, o qual substituirá o curador fiscal em todas as obrigações.

     Paragrapho unico. As funcções do curador das massas fallidas serão exercidas pelos promotores publicos nas comarcas nas quaes não estiver o cargo creado ou provido, com as mesmas vantagens concedidas ao curador.

     Art. 138. As porcentagens a que se refere esta lei serão sempre tiradas do liquido, que effectiva e realmente for apurado afinal, deduzida a importancia dos creditos privilegiados e as despezas da liquidação.

     Art. 139. Fica revogado o art. 380 do regulamento mandado observar pelo decreto n. 370, de 2 de maio de 1890, na parte em que sujeita á jurisdicção commercial e á fallencia os que contrahirem emprestimos mediante hypotheca ou penhor agricola.

     Art. 140. Revogam-se as disposições em contrario.

Capital Federal, 16 de agosto de 1902, 14º da Republica.

M. FERRAZ DE CAMPOS SALLES.
Sabino Barroso Junior.


 


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 07/06/1903


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 7/6/1903, Página 2763 (Republicação)