Legislação Informatizada - DECRETO DE 9 DE DEZEMBRO DE 1835 - Publicação Original
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DECRETO DE 9 DE DEZEMBRO DE 1835
Dá Instrucções aos Presidentes das Provincias para a boa execução da Lei de 14 de Junho de 1831, que marca as attribuições dos mesmos Presidentes, e de 12 de Agosto de 1834, que reformou alguns artigos da Constituição do Imperio.
O Regente em Nome do Imperador o Senhor Dom Pedro Segundo Ha por bem Approvar, e Mandar que se executem as Instrucções dadas aos Presidentes das Provincias, que com este baixão, assignadas por Antonio Paulino Limpo de Abreo, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios da Justiça, encarregado interinamente dos do Imperio, que assim o tenha entendido e expeça os despachos necessarios. Palacio do Rio de Janeiro em nove de Dezembro de mil oitocentos trinta e cinco, decimo quarto da Independencia e do Imperio.
DIOGO ANTONIO FEIJÓ.
Antonio Paulino Limpo de Abreo.
INSTRUCÇÕES PARA OS PRESIDENTAS DAS PROVINCIAS DO IMPERIO,
QUE ACOMPANHÃO O DECRETO DESTA DATA
§ 1º O art. 18 da Lei de 11 de Junho de 1831 fixando os empregos, cujo provimento compete ao Governo Geral, estabeleceu como regra que o de todos os outros alli não especificados, é da privativa attribuição dos Presidentes das Provincias. Esta regra admitte comtudo uma excepção, e é a que vem marcada na ultima parte daquelle artigo, excepção que não póde deixar de entender-se com referencia aquelles empregos, cujo provimento por lei especial posterior foi conferido á Regencia, ou a qualquer outra autoridade, caso em que estão os empregos, de que trata a Lei de 4 de Outubro de 1831, o Regulamento de 20 de Setembro de 1834, e outras disposições legislativas promulgadas depois da Lei de 14 de Junho de 1831.
§ 2º O Acto Addicional de 12 de Agosto de 1834, autorisa as Assembléas Provinciaes para legislarem sobre a creação, e suppressão dos empregos municipaes: convém portanto fixar a idéa que esta expressão designa. O Governo entende por empregos municipaes aquelles que são creados para se levarem a effeito, e execução na pratica, as attribuições das Camaras Municipaes. Pelo que sómente as leis, que forem relativas aos empregos municipaes assim definidos, é que devem, na fórma do art. 13 do Acto Addicional, ser isentas da sancção dos Presidentes. Os empregos, que na sua alçada comprehenderem objectos provinciaes, posto que de envolta com outros municipaes, devem ser creados por leis, que recebão aquella sancção.
§ 3º O mesmo Acto Addicional investe as Assembléas Provinciaes do poder de legislarem sobre os casos, e as fórmas por que os respectivos Presidentes poderão nomear, suspender, e demittir os empregados provinciaes. Necessario é figurar duas hypotheses. Ou existe já a este respeito legislação provincial, ou não. No 1º caso, os Presidentes devem por ella dirigir-se; no 2º as indicadas nomeações, suspensões, e demissões devem ser feitas pelo Governo Geral, todas as vezes que os Presidentes não estejão para isso autorisados por lei especial, como a de 14 de Junho de 1831, a de 18 de Agosto do mesmo anno, e outras.
§ 4º Cumpre além disto observar que, ainda na primeira hypothese, será muito conveniente á causa publica que os Presidentes, quando tiverem de proceder a alguma nomeação, consultem, sempre que o puderem fazer sem detrimento do serviço, a opinião do Governo Geral. Muitos empregados provinciaes adquirem em virtude do primeiro despacho direito de serem promovidos a empregos geraes por accesso, ou escolha, e não é justo que se imponhão no futuro ao Governo Geral funccionarios que não mereção a sua confiança. Na falta de pessoas idoneas para os empregos provinciaes vagos, os Presidentes poderão requisita-las, dirigindo-se para este fim ao Governo Geral, ou ao de alguma das outras Provincias.
§ 5º Os Juizes de Direito, sendo perpetuos, não podem perder os lugares para que forem nomeados, senão em virtude de sentença, na forma do art. 155 da Constituição. Essa sentença, porém, póde ser proferida ou em juizo contencioso, ou nos termos do art. 11 § 7º do Acto Addicional pela respectiva Assembléa Provincial, a quem compete estabelecer o processo que neste ultimo caso deverá seguir-se, para verificar-se a suspensão, ou demissão, sem que por isso deixe o mesmo Juiz de Direito de ficar sujeito a quaesquer outras penas em que possa ter incorrido.
§ 6º Bem que as Assembléas Provinciaes possão sem duvida alguma crear e supprimir os empregos administrativos provinciaes, e dar a cada um delles as attribuições que lhes parecerem convenientes, releva observar quanto será nocivo á regular administração da justiça, e mesmo ao direito das partes, que ellas alterem por qualquer maneira as attribuições que competem ás autoridades judiciarias, pelo transtorno e confusão que semelhante medida imprimiria no systema judiciario, que deve ser uniforme em todo o Imperio. Esta uniformidade, além de ser reclamada pelos principios mais sãos de jurisprudencia, funda-se em certo modo no Supremo Tribunal de Justiça, que, sendo um só para conhecer das revistas que se interpõe das sentenças proferidas nas diversas Provincias do Imperio, não póde em taes objectos regular-se, senão por leis geraes. Estas reflexões comtudo não envolvem em si o corolario de que as Assembléas Provinciaes estejão inhibidas de augmentar, ou diminuir o numero destes empregados. Ellas tem todo o direito de faze-lo, com tanto que se conservem as attribuições que são inherentes a cada um delles para o julgamento e decisão das questões, tanto no foro civil, como no criminal.
§ 7º A Guarda Nacional constitue, nos termos do art. 145 da Constituição, uma parte essencial da força publica. A sua organisação e disciplina devem portanto pertencer ao Governo Geral, e ás Assembléas Provinciaes sómente o que disser respeito á nomeação, suspensão, e demissão dos Officiaes, excepto o Commandante Superior, que o Acto Addicional considera empregado geral.
§ 8º Póde acontecer que entre uma Assembléa e o Presidente da Provincia se suscitem duvidas reaes sobre a verdadeira intelligencia de algum artigo Constitucional, porque sem absurdo possa litteralmente entender-se de diversas maneiras. Em taes casos convém que o Presidente, suspendendo o seu consentimento á decisão da Assembléa, dê parte ao Governo Geral, para levar taes duvidas, em conformidade do art. 25 do dito Acto Addicional, ao conhecimento e deliberação do Poder Legislativo Geral. Nos casos de pouca ou nenhuma importancia para a causa publica, pede a prudencia que o Presidente evite collisões com a Assembléa, convencido de que, mantendo com ella o mais perfeito accordo e harmonia, melhor poderá prover á segurança e á prosperidade publica.
§ 9º Mostrando-se por esta recommendação o zelo, que anima o Governo Geral para que sejão respeitadas as Assembléas Provinciaes, o desejo de que pontualmente se satisfaça ás suas justas requisições; convém a par disso ponderar que o mesmo Governo receberá com desagrado a noticia de que os Presidentes descessem de sua dignidade, ou cedessem das suas attribuições; cumprindo que em circumstancias melindrosas usem com prudencia e moderação, mas sem temor ou fraqueza, dos meios que o Acto Addicional á Constituição lhes offerece, para obstarem a qualquer medida que lhes pareça opposta á mesma Constituição, á dignidade do Governo, ou aos interesses da união e das Provincias.
§ 10. Entre os objectos que muito convem promover, merece ser mencionada a creação de Delegados dos Presidentes em todas as povoações, como o meio mais proprio de serem breve e exactamente informados do que se passa em todos os pontos do territorio sujeito á sua administração; de inspeccionarem e adverttirem as autoridades locaes; de fiscalisarem a conducta dos funccionarios subalternos; e de assegurarem a prompta e fiel execução das suas ordens, mas para se colher toda a vantagem que desta instituição se deve esperar, é indispensavel que as pessoas nomeadas para servirem aquelles cargos, sejão escolhidas entre a classe mais estimavel dos respectivos lugares, e que contem com alguma estabilidade. Sem estas condições, nem taes funccionarios poderão conciliar o respeito e a força moral de que necessitão, nem haverá cidadãos capazes, que queirão aceitar empregos sómente carregados de deveres, e onde se achão confundidos com outros inferiores em reputação, e graduação social. O Governo não duvida lembrar aqui, como modelo, os Prefeitos e Sub-Prefeitos, creados pela Assembléa Legislativa da Provincia de S. Paulo, persuadido de que elles preenchem as necessidades da administração da Provincia.
§ 11. Outra instituição de summa vantagem será a organisação de um Corpo Policial, composto de todas as pessoas excluidas por falta de meios da Guarda Nacional, e que, não concorrendo de ordinario para as despezas do Estado, devem ao menos prestar com as suas pessoas o contingente de serviço que a sociedade tem direito de exigir de todo o cidadão que goza dos seus beneficios. Este Corpo Policial, distribuido por turnos, poderá sem vexame guardar as cadêas, prestar auxilio á justiça, e servir ás autoridades no expediente dos negocios publicos. As Camaras Municipaes, dando sustento e quartel a estes pequenos destacamentos, pouco augmentaráõ a sua despeza, ao mesmo passo que com isso concorreráõ muito para a segurança, e commodidade geral dos Municipios. Este Corpo, que formará parte da força publica, deve ser organisado pelo Presidente, e ficar debaixo da sua direcção, ou da dos seus delegados, sobre as bases que decretar a Assembléa Legislativa Provincial.
§ 12. Satisfeitas as necessidades da administração que ficão indicadas, releva promover a instrucção e a moral, sem as quaes não ha civilisação, e muito menos liberdade. Um plano de educação, uniforme em todas as Provincias, que a torne nacional, que dê caracter, e particular physionomia ao povo brasileiro, é objecto de summa necessidade. Os principios que servem para o desenvolvimento da razão humana, e as principaes regras dos direitos e obrigações do homem, devem formar a base da instrucção geral. As maximas de conducta, prescriptas pelo Evangelho, e ensinadas pelos Ministros da Religião com a voz, e praticamente com o exemplo, serviráõ de alicerce á moral publica. Mas emquanto este plano se não póde realizar, convem ao menos que certo gráo de instrucção e moralidade seja um requisito indispensavel para a admissão dos empregos, no qual deverá sempre preferir o homem instruido e moral, e entre estes os casados, e os que fizerem as vezes de chefes de legitimas familias.
§ 13. Nunca será demasiada a circumspecção nas escolha dos Parochos. Não convem que os Presidentes se contentem com as formalidades de habilitações, que nem sempre as comprovão: é mister que elles se assegurem das precisas qualidades dos candidatos para tão importante ministerio pelos meios, que a Providencia lhes aconselhar. As Assembléas Provinciaes poderão aproveitar qualquer medida que o zelo dos Presidentes lhes suggerir, para que Ministros do Culto desempenhem com exactidão os seus deveres, em cuja fiscalisação os mesmos Presidentes se deveráõ mostrar exactos e severos, obrigando a preencher, ou abandonar o emprego aquelles, que não souberem, ou não puderem satisfazer os seus encargos.
§ 14. Todas as precauções, que devem preceder a escolha, tanto destes, como dos mais empregados, não conseguiráõ o desejado fim, se as não acompanhar, depois de nomeados, e de entrarem em exercicio, um severo e continuado exame sobre a sua conducta. A responsabilidade deve tornar-se effectiva contra os que não cumprirem com as obrigações dos cargos que exercem.
§ 15. A agricultura, fonte principal da nossa riqueza, e esperança da nossa futura prosperidade, deve ser promovida por meio de Escolas praticas, onde os nossos lavradores, aprendendo em pouco tempo, se convenção das vantagens da arte sobre os simples conhecimentos da rotina. Colonos, transportados de paizes onde ella tem feito maiores progressos, e munidos de instrumentos, ou ainda não usados entre nós, ou mais perfeitos, serão para este fim ajustados. Neste intuito o Governo tem dado já algumas providencias, cujo resultado participará em tempo opportuno aos Presidentes das Provincias, para se aproveitarem dos recursos que então lhes forem proporcionados.
§ 16. Tem estreita relação com este objecto a colonisação estrangeira. Escassissima a nossa população comparada com a extensão do territorio reduzida ainda mais com a cessação de um trafico, que a politica reprova, e a humanidade detesta, indispensavel é auxiliarmo-nos de outros braços, que venhão ajudar-nos a extrahir as riquezas, com que o terreno do Brasil por toda a parte recompensa com profusão os trabalhos do agricultor. O Governo tambem tem dado algumas providencias a este respeito, que brevemente poderão ser communicadas aos Presidentes: entretanto as Assembléas Provinciaes devem proporcionar-lhes os meios indispensaveis para o transporte, e manutenção, e mais vantagens dos ditos colonos, bem como para que elles possão desde logo dedicar-se com fructo a quaesquer trabalhos ruraes, ou de industria. A publicação de boas leis sobre este assumpto muito concorrerá para attrahir á nós a emigração dos outros paizes.
§ 17. Igual contemplação tem merecido ao Governo os meios de transporte, sem os quaes a abundancia, produzida pela agricultura, pareceria inutil no mesmo lugar em que nascesse. O Governo, tendo em vistas este fim, mandou vir peritos praticos que instruão os nacionaes na direcção de estradas, na sua construcção, bem como na de pontes e calçadas, dando a estas obras a duração e elegancia que em outros paizes se observão. A introducção dos differentes meios de transporte, que a industria tem descoberto, é tambem objecto da sua solicitude.
O Regente em Nome do Imperador o Senhor Dom Pedro Segundo, Mandando communicar estas instrucções aos Presidentes de Provincia, está disposto a auxiliar, quanto em si couber, as medidas das Assembléas Legislativas Provinciaes em tudo quanto possa concorrer para a prosperidade do Imperio: e bem assim a coadjuvar os mesmos Presidentes no desenvolvimento e bom resultado daquellas, que lhes suggerirem a sua reconhecida intelligencia e zelo pelo serviço publico, e decidido interesse pelo bem estar, e pelos progressos da civilisação, e da industria do paiz. Palacio do Rio de Janeiro em nove de Dezembro de mil oitocentos trinta e cinco.
Antonio Paulino Limpo de Abreo.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1835, Página 134 Vol. 1 pt II (Publicação Original)