Legislação Informatizada - Decreto nº 664, de 18 de Janeiro de 1850 - Publicação Original

Veja também:

Decreto nº 664, de 18 de Janeiro de 1850

Approva os Estatutos da Caixa Commercial da Cidade da Bahia, e marca-lhes o prazo de sua duração.

     Attendendo ao que Me repesentou a Direcção da Caixa Commercial da Cidade da Bahia solicitando a approvação de seus Estatutos, e Tendo ouvido a Secção de Fazenda do Conselho d'Estado; Hei por bem Approvar os referidos Estatutos, que no fim de vinte annos deverão ser de novo examinados e approvados se convier. Joaquim José Rodrigues Torres, do Meu Conselho, Senador do Imperio, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios da Fazenda, e Presidente do Tribunal do Thesouro Publico Nacional, o tenha assim entendido, e faça executar com os depachos necessarios.

Palacio do Rio de Janeiro em dezoito de Janeiro de mil oitocentos e cincoenta, vigesimo nono da Independencia e do Imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Joaquim José Rodrigues Torres.

ESTATUTOS DA CAIXA COMMERCIAL

TITULO I

DA CAIXA COMMERCIAL

     Art. 1º A Caixa Commercial he estabelecida com fins de mutuo interesse para os Accionistas. Os seus fundos são divididos em acções de 10$000 cada huma, o numero dellas he indeterminado até decisão da Assembléa Geral em contrario.

     Art. 2º As entradas com fundos para a Caixa Commercial serão francas, porêm nada vencerão se forem retiradas no prazo de trinta dias depois de terem sido effectuadas; e só vencerão o juro fixo de 6 % ao anno, se forem retiradas antes do ultimo dia dos mezes de Março e Setembro.

     § Unico. A epoca marcada para cada Accionista começar a lucrar dividendos, principiará no primeiro dia de cada mez, para o que deverá ter sido effectuada a entrada até o ultimo dia do mez antecedente: os juros de 6% serão contados da data da entrada.

     Art. 3º Os fundos existentes na Caixa Commercial poderão ser retirados pelos Accionistas pela maneira seguinte:

     § 1º Os titulos de huma até dez acções inclusive são pagos pelo Thesoureiro á vista, sempre que for exigido.

     § 2º Os de doze até cincoenta acções inclusive, quinze dias depois de exigido o pagamento.

     § 3º Os de cincoenta e huma acções e para mais serão pagos trinta dias depois de exigidos.

     § 4º Não são admittidas retiradas por conta dos titulos de dez até cem acções.

     § 5º Estas porêm terão lugar nos titulos excedentes de cem mil réis, com tanto que nunca serão por menos de tal quantia: e quando o Accionista queira retirar de hum só titulo, por duas ou mais vezes, quantias pagaveis á vista, sempre mediará hum espaço de cinco dias de huma a outra retirada parcial.

     § 6º A Direcção poderá pagar á vista, se assim o entender, e convindo ao portador, as quantias retiraveis nos prazos marcados nos §§ 2º e 3º mediante descontos na razão de 8% ao anno.

     Art. 4º A Caixa Commercial poderá ser dissolvida, e entrará em liquidação se as suas perdas vierem a absorver o seu fundo de reserva, e 20% do capital effectivo.

TITULO II

DOS ACCIONISTAS

     Art. 5º A Caixa Commercial considera seu Accionista toda a pessoa que legalmente possuir acções da mesma competentemente averbadas no livro de registro. O averbamento para fazer effectiva a transferencia terá lugar á vista das acções, e das partes contratantes por si ou seus procuradores, sem que haja endosso no mesmo titulo.

     Art. 6º Os Accionistas não respondem por mais do que o valor de suas acções, mesmo no caso do Art. 4º.

     Art. 7º Os Accionistas de cinco ou mais acções são habilitados para votarem em Assembléa Geral, e exercem os cargos de Presidente e Secretario da mesma, e membros da Commissão de exame; somente Accionistas de dez ou mais acções poderão ser nomeados para Directores.

     § 1º Havendo Accionistas com firmas sociaes, só hum dos socios poderá votar e ser votado; podendo este no seu impedimento nomear o socio, que o deva substituir como votante.

     § 2º Passando o capital da Caixa a quantia de 500.000$000, poderão ser elevadas as habilitações do Art. 7º pela Assembléa Geral ordinaria.

     Art. 8º Os titulos das acções serão subministrados aos Accionistas gratuitamente; no caso de perda, comprovada a identidade da pessoa, se lhes subministrarão outros por duplicata, pagando para a Caixa 1$000 por cada hum.

     Art. 9º He permittido aos Accionistas, depois de concluida a revisão pela Commissão de exame, verificar o Balanço á vista dos livros, que Ihe estarão para isso patentes por tres dias, sem com tudo poderem extrahir copias. He porêm prohibido o exame nas contas de deposito e registros de letras, que só serão patentes á Commissão de exame.

     Art. 10. Para o Accionista poder votar deverá constar o seu direito pelos assentos das suas acções no registro da Caixa ao menos tres mezes antes do dia da reunião da Assembléa Geral, estando no caso do Art. 7º.

     Art. 11. Nenhum Accionista terá mais que hum voto. No caso de impedimento poderão os ausentes ser representados por outros Accionistas, que deverão estar munidos de procuração: mas nenhum Accionista poderá votar como procurador de mais de hum ausente.

TITULO III

DAS OPERAÇÕES DA CAIXA COMMERCIAL

     Art. 12. As operações da Caixa Commercial serão as seguintes:

     § 1º Descontar Letras que tiverem pelo menos duas firmas de reconhecido credito, das quaes huma será de pessoa residente nesta Cidade.

     § 2º Descontar Bilhetes da Alfandega e quaesquer outros titulos do Governo pagaveis a prazos fixos.

     § 3º Emprestar dinheiro com as garantias do § 1º.

     § 4º Emprestar dinheiro sobre penhores de prata, ouro, joias, mediante as cautelas exigidas no Art. 19.

     § 5º Emprestar dinheiro sobre Apolices da Divida Publica, Acções da Banco Commercial e titulos desta Caixa, pela forma que a Direcção achar conveniente.

     Art. 13. O juro para quaesquer descontos e emprestimos será de 12% ao anno, em quanto a Assembléa Geral não julgar conveniente diminui-lo: exceptua-se o estipulado no § 6º do Art. 3º.

     Art. 14. Nenhuma transacção de emprestimo poderá ser feita senão por meio de Letra, a prazo nunca maior de seis mezes.

     § 1º As Letras provenientes de desconto poderão ser admittidas até o prazo de nove mezes, se assim julgar conveniente á Direcção, devendo taes Letras ser integralmente pagas no dia do vencimento.

     § 2º As provenientes de emprestimos poderão ser reformadas, mediante a amortisação de dez por cento do capital primitivo, e pagando o competente juro; tendo-se sempre em vista que as novas Letras não diminuão em garantias.

     § 3º No corpo das Letras provenientes de emprestimo se declarará que na falta de renovação da transacção, ou de integral pagamento, o juro será de 24% ao anno, assim como a renuncia de quaesquer privilegios, e do fôro domiciliario do passador e garantes, para poderem ser demandados no do contracto, nos termos da Lei de 30 de Agosto de 1833.

     Art. 15. As firmas dos Directores não serão contadas no numero das exigidas para garantia de qualquer Letra offerecida para desconto; e nenhuma Letra será descontada trazendo a firma de algum dos Directores em serviço.

     Art. 16. Logo que qualquer Letra deixe de ser paga ou reformada no vencimento, conforme o estipulado no Art. 14 §§ 1º e 2º, será protestada e immediatamente ajuizada.

     Art. 17. Se qualquer Letra proveniente de emprestimos sobre penhores não for paga ou resgatada no vencimento, far-se-ha venda delles em leilão mercantil, precedendo annuncios nos jornaes publicos por oito dias, podendo com tudo o dono resgata-la até o momento de começar o leilão, pagando as despezas que tiver occasionado.

     Art. 18. A nenhuma firma he permittido responder por mais de 10.000$000, seja como originario devedor, seja como garante. Não se comprehendem na quantia acima os emprestimos feitos sobre penhores, nem as Letras, que não são reformaveis mediante amortisação, para as quaes fica a Direcção autorisada a transigir como entender e merecer a solidez, credito e moralidade das firmas e qualidade das Letras.

     Art. 19. Os emprestimos sobre penhores de ouro, prata e joias far-se-hão á vista de avaliação por pessoa da confiança da Direcção e mediante as cautelas devidas.

     Os donos deverão assignar termo de responsabilidade nesta Cidade, e de se submetterem ás disposições dos Estatutos, ordens e usos da Caixa.

     Art. 20. A quantia que se emprestar sobre penhores de ouro e prata, não amoedados, não excederá de 2/3, e sobre joias a 1/2 do seu valor.

     Art. 21. A venda dos penhores de qualquer natureza será feita com as formalidades do Art. 17 em presença de hum dos Directores; e liquidada a conta das despezas do leilão, juros vencidos e commissão de 1%, se entregará o saldo a quem pertencer.

     Art. 22. A Caixa Commercial receberá gratuitamente dinheiros para abrir contas correntes e verificar os respectivos pagamentos, que não devem ser menores de 100$000, mediante as cautelas julgadas necessarias pela Direcção.

TITULO IV

DOS DIVIDENDOS E FUNDOS DE RESERVA

     Art. 23. Todos os semestres se procederá a hum Balanço com o fecho de 31 de Março e 30 de Setembro, o qual será apresentado á Assembléa Geral em Sessão ordinaria. O lucro liquido, deduzidos 5% para o fundo de reserva, será dividido pelos Accionistas proporcionalmente ás Acções de cada hum.

     § 1º Os dividendos que não forem retirados pelos Accionistas dentro de quinze dias depois do annuncio para receberem, serão accumulados ao capital, ficando as fracções á ordem.

     Art. 24. Ao debito do fundo de reserva serão lançadas as dividas julgadas inteiramente perdidas.

     Art. 25. Na dissolução da Caixa Commercial o saldo do fundo de reserva será accumulado ao capital, e dividido pelos Accionistas na fórma do Art. 23.

TITULO V

DA ASSEMBLÉA GERAL

     Art. 26. As Assembléas Geraes serão compostas somente dos Accionistas que tiverem cinco ou mais Acções; os mais poderão todavia assistir ás deliberações.

     Art. 27. As pessoas que forem eleitas para os cargos da Assembléa Geral ou Direcção, e acceitarem a nomeação, serão obrigadas a se habilitarem para o exercicio effectivo, em conformidade com as disposições do Art. 7º.

     Art. 28. As Assembléas Geraes ordinarias terão lugar nos mezes de Abril e Outubro por convite da Direcção, publicado por tres vezes nos jornaes publicos.

     Art. 29. No dia e hora marcados para a reunião da Assembléa Geral, esta se julgará constituida com quarenta ou mais Accionistas, que representem pelo menos hum terço do capital effectivo; e tomará as suas decisões por maioria absoluta de votos. Não comparecendo o numero exigido, a Direcção annunciará outra reunião.

     Art. 30. As deliberações tendentes a reformar os presentes Estatutos só poderão ser tomadas, quando em Assembléa se reunirem votos concordes de tantos Accionistas quantos representem mais da metade do capital effectivo da Caixa.

     Art. 31. As reuniões das Assembléas extraordinarias terão lugar quando a Directoria as convocar por occorrencias de casos, para cuja decisão ella não se julgue competente, ou quando lhe for isso requerido em representação individualmente assignada por Accionistas que possuão pelo menos hum terço do capital effectivo da Caixa.

     Art. 32. As convocações das Assembléas Geraes extraordinarias, julgadas necessarias pela Direcção, serão feitas em conformidade com o Art. 29. As requeridas pelos Accionistas serão convocadas pela Direcção dentro dos oito dias uteis que se seguirem ao da entrega da representação, na qual o Secretario da Direcção porá a data depois de averiguada e reconhecida a sua legalidade, quanto a proporção do capital representado pelos signatarios.

     § Unico. Recusando-se a Direcção á convocação da Assembléa Geral extraordinaria requerida, ella incorrerá em responsabilidade, e os signatarios terão o direito de convoca-la elles mesmos por annuncios publicos, por todos assignados, com designação das acções de cada hum, declaração do motivo do chamamento, e das razões que tiverão para representar á Direcção.

     Art. 33. As Assembléas Geraes extraordinarias só poderão tomar decisões reunindo os votos requeridos pelo Art. 30; e não poderão admittir discussão alguma fóra do objecto da convocação. Podem com tudo nellas ser apresentadas quaesquer indicações para serem decididas opportunamente.

     Art. 34. A Assembléa Geral terá hum Presidente e dous Secretarios, todos eleitos annualmente por maioria relativa de votos em escrutinio secreto em huma só lista, e habilitados em conformidade do Art. 7º.

     § Único. Havendo impedimento do Presidente e Secretario, serão elles substituidos o presidente pelo 1º Secretario, o 1º Secretario pelo 2º, e este pelo Accionista imediato em votos, e assim por diante.

     Art. 35. São attribuições da Assembléa Geral:

     § 1º Nomear a Direcção.

     § 2º Eleger a Commissão de exame.

     § 3º Approvar o numero dos empregados que nomear a Direcção, e os ordenados que esta lhes arbitrar.

     § 4º Examinar e approvar os Relatorios e Balanços semestraes da Caixa.

     Art. 36. Pertence ao Presidente da Assembléa Geral abrir e fechar as Sessões, conceder a palavra, manter a boa ordem e regularidade nas discussões, e fazer executar as Resoluções da Assembléa Geral.

     Art. 37. Pertence aos Secretarios fazer a leitura do que for ordenado pelo Presidente, redigir as Actas, apurar os votos como escrutadores, e fazer a correspondeucia e o expediente, que deverá ser igualmente assignado pelo Presidente.

TITULO VI

DA DIRECÇÃO

     Art. 38. A Caixa Commercial será Administrada por sete Directores, habilitados na fórma do Art. 7º, e eleitos annualmente pela Assembléa Geral por escrutinio secreto á maioria relativa de votos e em huma só lista. A Direcção elegerá de entre si o seu Presidente e Secretario: no impedimento serão substituidos pelos que se seguirem em votos.

     Art. 39. A Direcção se reunirá pelo menos duas vezes por mez, nos dias que entre si marcar.

     Art. 40. Para ser válida qualquer deliberação tomada pela Direcção deve ella ter pelo menos quatro votos em favor.

     Art. 41. Pertence á Direcção a inteira administração dos fundos e negocios da Caixa que regerá como melhor entender, sem todavia se apartar dos Estatutos.

     Art. 42. Diariamente haverá de serviço dous Directores, que dirigirão as operações, e serão individualmente responsaveis, quando infringirem os Estatutos e o Regulamento interno, ou commetterem abusos. No caso de empate chamarão a qualquer dos outros Directores, que puder comparecer com mais facilidade.

     Art. 43. Quando algum dos Directores se achar impedido por mais de hum mez, será chamado para o substituir o Accionista immediato em votos.

     Art. 44. Os Directores terão em compensação do seu trabalho e responsapilidade 5 % sobre o total dos premios adqueridos, repartidos em partes iguaes.

     Art. 45. Os Directores serão obrigados a conservar na Caixa as acções precisas segundo o Art. 7º; e no caso de quererem dispor dellas, serão por este acto considerados como não pertencendo á Direcção.

     Art. 46. Todas as correspondencias e documentos de importancia serão assignados pelo Presidente e Secretario da Direcção. A correspondencia ordinaria e outros objectos do expediente (nos quaes se comprehendem os conhecimentos dos Accionistas) devem ser assignados pelos dous Directores de serviço.

TITULO VII

DA COMMISSÃO DE EXAME

     Art. 47. A Commissão de exame será composta de tres Accionistas, habilitados na fórma do Art. 7º, eleitos annualmente pela Assembléa Geral, á marioria relativa de votos e em huma só lista.

     Art. 48. A Commissão de exame logo que for convidada pela Direcção devera examinar escrupulosamente o estado da escripturação das operações da Caixa, da correspondencia e comportamento dos empregados; fiscalisando se os presentes Estatutos e as decisões da Assembléa Geral tem sido estrictamente executados, para o que todo o estabelecimento lhe será franqueado, e a Direcção lhe dará todos os esclarecimentos que forem exigidos. O exame deve terminar tres dias antes da Assembléa Geral ordinaria.

     Art. 49. Concluido o exame a Commissão fará hum Relatorio circunstanciado, no qual emittirá sua opinião sobre o estado da Caixa commercial e maneira por que tiver sido dirigida. Este Relatorio será registrado no livro das Actas da Assembléa Geral e impresso com o Balanço para serem distribuidos pelos Accionistas.

TITULO VIII

DOS EMPREGADOS

     Art. 50. Os empregados da Caixa serão admittidas pela Direcção, e por ella demittidos, quando para isso hajão justos motivos, os quaes serão presentes á Assembléa Geral.

     Art. 51. Os empregados da Caixa prestarão as fianças que em razão dos seus empregos forem exigidas pela Direcção.

TITULO IX

DISPOSIÇÕES GERAES

     Art. 52. Todas as contestações que occorrerem nos negocios da Caixa Commercial serão ultimadas por arbitros, quando isso for possivel.

     Art. 53. As operações da Caixa e especialmente as que forem a respeito de particulares são objecto de segredo, principalmente para os seus empregados, sob pena de demissão.

     Art. 54. Toda a pessoa, que faltar a boa fé ou á pontualidade nos seus tratos com a Caixa Commercial, ficará excluida de fazer com ella transacções.

     Art. 55. Nas Assembléas Geraes nenhum Accionista poderá fallar mais de duas vezes sobre a mesma materia, nem mesmo para pedir explicação. Antes de fallar deve para isso pedir a palavra, e obter licença do Presidente.

     § Unico. Exceptuão-se da regra antecedente a Direcção, e a Commissão de exame, que poderão responder ás arguições, que lhes forem dirigidas. - Francisco José Godinho, Presidente. - João Correia de Brito, 1º Secretario. - Theodoro Teixeira Gomes, 2º Secretario.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1850


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1850, Página 1 Vol. 1 pt. II (Publicação Original)