Legislação Informatizada - DECRETO Nº 6.590, DE 23 DE JUNHO DE 1877 - Publicação Original

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DECRETO Nº 6.590, DE 23 DE JUNHO DE 1877

Approva os estatutos da Associação de soccorros mutuos «Philantropia e Ordem».

    Attendendo ao que requereu a Directoria da Associação de soccorros mutuos «Philantropia e Ordem», estabelecida nesta Côrte, e Conformando-me com o parecer da Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado, exarado em Consulta de 12 de Abril proximo findo, Hei por bem, em Nome de Sua Magestade o Imperador, Approvar os estatutos da mesma Associação.

    Quaesquer alterações, que se façam nos estatutos, não poderão vigorar sem prévia approvação do Governo Imperial.

    Antonio da Costa Pinto Silva, do Conselho de Sua Magestade o Imperador, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Imperio, assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em 23 de Junho de 1877, 56º da Independencia e do Imperio.

    PRINCEZA IMPERIAL REGENTE.

    Antonio da Costa Pinto Silva.

Estatutos da Associação de soccorros mutuos «Philantropia e Ordem»

CAPITULO I

DA SOCIEDADE E SEUS FINS

    Art. 1º Na cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro fica organizada uma associação de soccorros mutuos com a denominação de - Philantropia e Ordem -, que se comporá de illimitado numero de socios nacionaes e estrangeiros.

    Art. 2º Os socios são: effectivos, honorarios e benemeritos.

    Art. 3º O fim da sociedade é beneficiar seus socios, em caso de necessidade, e suas familias, quando por seu fallecimento fiquem reduzidas á pobreza.

    Art. 4º Entende-se por familia:

    § 1º A viuva;

    § 2º Os filhos;

    § 3º Os pais.

    Art. 5º A sociedade soccorrerá:

    § 1º A viuva emquanto necessitada;

    § 2º Os filhos até á idade de 16 annos, e as filhas emquanto solteiras;

    § 3º Os pais emquanto necessitados.

    Art. 6º Os soccorros serão realizados repartidamente aos soccorridos.

CAPITULO II

DA ADMISSÃO DE SOCIOS

    Art. 7º Para ser socio é necessario:

    § 1º Ter pelo menos 21 annos, afiançados pelo proponente;

    § 2º Ter occupação decente, donde possa auferir os meios de subsistencia;

    § 3º Gozar de boa reputação e conceito;

    § 4º Não ter sido condemnado por crimes em que tenha lugar a acção publica, ou por offensas ao pudor.

    Art. 8º A admissão só poderá ter lugar mediante proposta de um ou mais socios. Essa proposta deverá ser datada e assignada, e conter o nome, idade, estado, nacionalidade, profissão e residencia do proposto.

    Art. 9º A proposta de admissão será entregue ao Presidente, que a sujeitará ao conhecimento do conselho, nomeando immediatamente uma commissão para syndicar das condições do proposto.

    Art. 10. Apresentado ao conselho pelo Presidente o parecer da commisão de syndicancia, se fôr elle favoravel ao proposto, será a proposta submettida á approvação, que terá lugar por meio de escrutinio secreto e por maioria absoluta de votos.

    Art. 11. Poderão ser propostos, e admittidos como socios, os filhos de socios, maiores de 18 annos; mas neste caso, além dos predicados exigidos pelo art. 7º, é mister que se apresente licença do pai ou de pessoa que o represente.

CAPITULO III

DEVERES DOS SOCIOS

    Art. 12. Todo socio tem o dever de pagar, como contribuição de admissão, a joia de 50$000, no acto de sua recepção, e a mensalidade de 1$000, por trimestres adiantados.

    Art. 13. Todo socio tem o dever de aceitar e exercer, durante um anno pelo menos, o cargo ou commissão para que fôr eleito, salvo motivo justo, devidamente provado, desde que se tratar de assumpto que affecte directa ou indirectamente os interesses da sociedade.

CAPITULO IV

DIREITOS DOS SOCIOS

    Art. 14. Todo socio tem pleno e amplo direito de intervir directamente e concorrer com o seu voto em todos os negocios da sociedade, excepto naquelles que forem de particular e exclusiva competencia dos funccionarios do conselho.

    Art. 15. Todo socio tem o direito de exigir, em caso de necessidade, os soccorros sociaes, bem assim sua familia, por seu fallecimento, os beneficios a que se refere o art. 49.

    Art. 16. Todo socio tem o direito de requerer ao conselho o titulo de socio benemerito, desde que prove haver prestado os serviços seguintes:

    § 1º Proposta e entrada de 20 socios effectivos pelo menos;

    § 2º Donativos maiores de 200$000;

    § 3º Desempenho effectivo de cargos do conselho, pelo menos por tres annos seguidos ou interpolados.

CAPITULO V

DAS PENAS

    Art. 17. Perderá todos os direitos:

    § 1º O socio que estiver em atrazo, uma vez que o seu debito exceda a importancia de um semestre vencido;

    § 2º O socio que prejudicar a marcha e o progresso da sociedade;

    § 3º O socio que fôr condemnado nos termos do art. 7º § 4º;

    § 4º O socio que despedir-se voluntariamente da sociedade.

    Neste caso dar-se-lhe-ha um attestado de quitação.

    Art. 18. O socio que deixar o gremio social por alguma das causas acima exaradas, não terá direito a indemnização alguma.

    Art. 19. O socio que faltar ao pagamento de um trimestre vencido, ficará privado, emquanto se não quitar, dos beneficios que a sociedade promette nos presentes estatutos.

CAPITULO VI

DA ASSEMBLÉA GERAL

    Art. 20. Duas vezes por anno reunir-se-ha a assembléa geral, que será convocada pelo Presidente da mesma assembléa, mediante prévio annuncio nos jornaes diarios, publicado oito dias antes, e no qual se designará o dia da reunião.

    Art. 21. A primeira reunião da assembléa geral terá por fim eleger o seu Presidente e dous Secretarios, os funccionarios de que trata o art. 31, uma commissão de finanças ou contas e outra de beneficencias.

    A eleição do Presidente e dos Secretarios da assembléa geral não poderá recahir em algum daquelles funccionarios.

    Art. 22. A segunda reunião terá por fim empossar a mesa da assembléa geral e os novos funccionarios.

    Art. 23. A assembléa geral constitue-se com a presença de 30 ou mais socios quites, e as suas decisões tomar-se-hão por maioria absoluta de votos.

    Art. 24. Na falta de numero sufficiente para a formação da assembléa geral, o Presidente respectivo convocará nova reunião, que funccionará com o numero de socios que se reunirem, desde que exceda a 15;

    Art. 25. Não comparecendo o Presidente, assumirá a cadeira da presidencia da assembléa geral o 1º, e na sua falta o 2º Secretario.

CAPITULO VII

DAS ELEIÇÕES

    Art. 26. As eleições de que trata o art. 21, serão feitas por escrutinio secreto, mediante cédulas, em que se escreverão o nome do candidato e o do cargo respectivo. Não se admittem votos por procuração.

    Art. 27. Antes do recebimento das cédulas, o Presidente da assembléa geral designará dous socios para com os Secretarios da mesa servirem de escrutadores, os quaes tomarão nota dos votos á medida que forem lidos, e darão conta do resultado da apuração. Não serão apuradas as cédulas que contiverem nomes de pessoas que não pertençam á sociedade, ou não sejam elegiveis.

    Art. 28. Lavrar-se-ha acta minuciosa de todo o processo eleitoral e do resultado da apuração, assignando-a o Presidente, Secretarios, escrutadores e socios presentes que o quizerem.

    Art. 29. Ao socio eleito far-se-ha communicação por escripto da sua eleição, que será considerada aceita, se no prazo de 15 dias não apresentar-se recusa fundamentada.

    Art. 30. E' permittida a reeleição indefinidamente.

CAPITULO VIII

DA ADMINISTRAÇÃO

    Art. 31. A administração da sociedade será realizada por um conselho composto de um Presidente, dous Vice-Presidentes, um Fiscal, um Secretario, um Thesoureiro, um Procurador e dos socios que estiverem no gôzo de seus direitos e queiram comparecer.

    Art. 32. O conselho será composto de tantos membros quantos forem os socios que se reunirem no dia da convocação.

    Art. 33. O conselho se reunirá semanalmente em dia certo, que será designado pelo Presidente. A respectiva sessão será annunciada pelo Secretario no jornal do dia.

    Art. 34. Ao conselho compete:

    § 1º Conhecer e resolver os negocios da sociedade que não forem da competencia da assembléa geral e dos funccionarios de que trata o art. 31;

    § 2º Nomear as commissões que se fizerem necessarias para o bom andamento da sociedade;

    § 3º Tomar semestralmente contas ao Thesoureiro e approval-as, dando-lhe quitação, depois de verificada a exactidão das mesmas contas;

    § 4º Eliminar e suspender os socios incursos no art. 17 e seus paragraphos, com recurso necessario e suspensivo, no caso de eliminação forçada, ou de suspensão por mais de tres mezes, para a assembléa geral, que se reunirá extraordinariamente para tomar conhecimento do recurso;

    § 5º Preencher, por eleição, as vagas, que durante o anno se derem, dos funccionarios a que se refere o art. 31;

    § 6º Fazer observar em tudo os presentes estatutos;

    § 7º Escolher, sob proposta do Presidente respectivo, o local em que a sociedade deve funccionar.

    Art. 35. As decisões do conselho serão tomadas por maioria de votos dos socios presentes.

CAPITULO IX

DOS FUNCCIONARIOS DO CONSELHO

    Art. 36. Ao Presidente compete:

    § 1º Presidir as sessões do conselho, dirigindo as discussões, mantendo a ordem dos trabalhos, suspendendo as sessões, quando assim o exija a manutenção da ordem;

    § 2º Convocar, por intermedio da secretaria, semanalmente e em dias certos, a reunião do conselho;

    § 3º Assignar todos os documentos da sociedade, e rubricar o livro das actas;

    § 4º Dar as providencias reclamadas pelo fallecimento ou enfermidade de qualquer socio, tendo a faculdade de autorizar despezas até á quantia de 100$000; o que participará ao Thesoureiro, pela secretaria, a fim de que a sua resolução seja executada. Do que occorrer dar-se-ha conta ao conselho na primeira reunião;

    § 5º Autorizar as despezas com o expediente.

    Art. 37. Aos Vice-Presidentes competem todas as attribuições do Presidente, quando este ausente, ou impedido.

    Art. 38. Ao Fiscal compete zelar a completa observancia destes estatutos, bem assim representar a sociedade em todas as suas relações externas. Para os negocios judiciaes poderá passar procuração com prévia autorização do conselho.

    Art. 39. Ao Secretario incumbe:

    § 1º Redigir e lançar no respectivo livro as actas das sessões, nas quaes mencionará especificadamente todos os actos, resoluções e deliberações do conselho;

    § 2º Annunciar a convocação do conselho, precedendo autorização e designação do Presidente, em cujo nome publicará o convite;

    § 3º Proceder á leitura da acta e do expediente;

    § 4º Manter a correspondencia, e ter o registro das peças na melhor ordem e clareza;

    § 5º Organizar a lista dos funccionarios do conselho e o quadro da sociedade.

    Art. 40. Ao Thesoureiro compete:

    § 1º Toda a responsabilidade pelos cofres da sociedade;

    § 2º Apresentar semestralmente o balancete do estado das finanças sob sua guarda, e no fim de cada anno o balanço geral de todas as operações, juntando os documentos probativos das despezas;

    § 3º Ter a sua escripturação com a ordem e clareza necessarias;

    § 4º Ter conta corrente com cada um dos socios, e empregar os meios para haver as joias e mensalidades destes, de conformidade com o disposto no art. 12;

    § 5º Cumprir as resoluções tomadas pelo Presidente, verificada a hypothese do art. 36 § 4º.

    Art. 41. O Thesoureiro recolherá semanalmente á Caixa Economica todas as quantias que arrecadar, e só poderá conservar em seu poder até á quantia de 300$000 para as despezas correntes.

    § 1º Deverá tambem cumprir as resoluções do conselho relativas aos fundos sociaes, logo que ellas lhe forem communicadas por officio do Secretario. Do que occorrer dará conta na primeira reunião;

    § 2º Deverá ainda nomear, e ter sob sua responsabilidade, um agente de sua confiança, encarregado das cobranças e da entrega do expediente da sociedade. Essa nomeação deverá recahir em algum dos socios, e o nomeado vencerá uma gratificação mensal, arbitrada pelo conselho.

    Art. 42. Ao Procurador compete:

    § 1º Distribuir os auxilios pecuniarios e pagar das pensões;

    § 2º Tratar dos enterramentos e officios funebres promovidos pela sociedade.

    Art. 43. Para que o Procurador dê cumprimento ao que dispõe o artigo antecedente, deverá receber prévia autorização do Presidente.

CAPITULO X

DAS FINANÇAS

    Art. 44. Os fundos sociaes são formados:

    § 1º Das joias de admissão dos socios;

    § 2º Das mensalidades dos mesmos;

    § 3º Das liberalidades e donativos feitos á sociedade.

    Art. 45. Os fundos sociaes se converterão por deliberação do conselho em apolices da divida publica, em letras hypothecarias ou em acções de companhias e sociedades de credito real que tenham a garantia do Governo; as quaes sómente poderão ser alienadas por deliberação da assembléa geral.

    Art. 46. Não poderá sahir quantia alguma dos cofres sociaes, senão para as despezas geraes, beneficencias, pensões e donativos estabelecidos nestes estatutos.

CAPITULO XI

DAS BENEFICENCIAS

    Art. 47. O socio que cahir em pobreza, quér por molestia, quér por impossibilidade physica, tem direito, logo que exigir, a uma mensalidade de 10$000, que poderá ser elevada até 50$000, se elle tiver prestado serviços relevantes á sociedade no exercicio dos cargos de que trata o art. 31. Da importancia desses serviços julgará o conselho.

    Art. 48. Todo socio, em caso de morte, e verificada a hypothese do artigo antecedente, terá enterro decente, feito pela sociedade.

    Art. 49. A familia do socio fallecido, observada a disposição do art. 4º, terá direito a uma pensão mensal nunca inferior a 10$000, a qual poderá tambem ser elevada até 50$000, segundo os serviços do finado, e por deliberação do conselho.

    Paragrapho unico. Estas beneficencias e mais soccorros serão concedidos nos precisos termos do art. 3º dos estatutos, quando os sócios em vida os necessitarem, ou suas familias, depois do seu fallecimento, ficarem reduzidas á pobreza.

CAPITULO XII

DISPOSIÇÕES GERAES

    Art. 50. O socio que adoecer e precisar dos soccorros da sociedade, participará ao Presidente, por intermedio da secretaria, o seu estado de molestia, e o Presidente nomeará immediatamente, se julgar conveniente, uma commissão para verificar o estado do socio.

    Art. 51. Do resultado das investigações o Presidente dará conhecimento ao conselho, que providenciará conforme o caso exigir, salvo verificada a hypothese do art. 36 § 4º.

    Art. 52. Deste modo e em qualquer circumstancia que o socio precise dos soccorros da sociedade, observar-se-ha o disposto nos artigos antecedentes.

    Art. 53. O socio que cahir em pobreza, ou se ausentar da séde da sociedade, tendo obtido licença do conselho, por motivo de indigencia, ficará não só isento do pagamento das mensalidades, mas ainda gozará, em qualquer lugar em que se ache, de todos os beneficios concedidos por estes estatutos.

    Art. 54. A assembléa geral poderá conferir o titulo de benemerito ao socio que prestar relevantes serviços á sociedade.

    Art. 55. A assembléa geral poderá igualmente conceder o titulo de socio honorario a qualquer individuo estranho á sociedade, que lhe prestar serviços importantes.

    Art. 56. A proposta para socio honorario só poderá ser approvada, achando-se firmada por todos os funccionarios do conselho.

    Art. 57. O socio honorario que desejar passar a effectivo, deverá preencher as condições dos arts. 7º e 12.

    Art. 58. A sociedade, logo que seus fundos o permittam, promoverá a instrucção dos filhos dos socios que necessitarem desse auxilio, a juizo do conselho, e poderá beneficiar, por uma só vez, a pobres honestos.

    Art. 59. A sociedade, cujo prazo de duração é fixado em 30 annos, só poderá ser dissolvida por impossibilidade patente de acção, ou nos mais casos previstos nos arts. 35 e 36 do Decreto nº 2711 de 19 de Dezembro de 1860, e a sua dissolução dependerá da deliberação e voto de dous terços do numero dos socios que estiverem no gôzo dos seus direitos.

    Art. 60. A sociedade sómente poderá conceder as beneficencias, de que trata o capitulo XI, depois que formar um capital de 20:000$000.

    Art. 61. Todo socio é obrigado a observar e fazer observar estes estatutos.

    Art. 62. Fica autorizado o conselho para organizar o regimento interno da sociedade, que será submettido á approvação da assembléa geral.

    Art. 63. Os presentes estatutos, depois de approvados pelo Governo Imperial, serão a constituição organica da sociedade, e só poderão ser alterados depois que a mesma sociedade tiver um anno de existencia. A reforma deverá ser feita de conformidade com o art. 59, e só terá execução depois de approvada pelo Governo Imperial.

    Rio de Janeiro em 19 de Dezembro de 1875. - (Seguem-se as assignaturas.)


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1877


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1877, Página 450 Vol. 1 pt II (Publicação Original)