Legislação Informatizada - Decreto nº 1.186, de 4 de Junho de 1853 - Publicação Original

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Decreto nº 1.186, de 4 de Junho de 1853

Approva os Estatutos da Companhia de Seguros Maritimos, denominada-Utilidade Publica-estabelecida na Cidade do Recife.

     Attendendo ao que Me representaram os directores da Companhia de seguros maritimos, denominada - Utilidade Publica -, estabelecida na cidade do Recife, e de conformidade com o parecer da Secção dos Negocios do Imperio do Conselho de Estado, exarado em Consulta de 11 de Fevereiro do corrente anno: Hei por bem Approvar os estatutos organizados para a mesma companhia, e que com este baixam, assignados por Francisco Gonçalves Martins, do Meu Conselho, Senador do Imperio, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios do Imperio, que assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em 4 de Junho de 1853, 32º da lndependencia e do Imperio.

Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Francisco Gonçalves Martins.

ESTATUTOS DA COMPANHIA DE SEGUROS MARITIMOS, DENOMINADA - UTILIDADE PUBLICA - ESTABELECIDA NA CIDADE DO RECIFE, E A QUE SE REFERE O DECRETO DESTA DATA CAPITULO I DA COMPANHIA

     Art. 1º Esta companhia tem por titulo - Utilidade Publica, - por objecto - seguros maritimos em navios de qualquer lotação ou bandeira, - por emblema uma ancora; e dará principio ás suas operações logo que tenha obtido a approvação do Governo.

     Art. 2º Os fundos da companhia serão de 400:000$ em moeda legal, divididos em 400 acções de 1:000$ cada uma, de que entrará logo em caixa 10% para fundo effectivo.

     Art. 3º Todo o dinheiro disponivel será applicado a desconto de letras ou de outros papeis de credito, tendo pelo menos duas firmas de reconhecida solidez, e que uma seja residente nesta cidade, podendo a direcção, no caso que convenha, abrir conta corrente com o Banco.

     Art. 4º Nos livros da companhia se abrirá conta em separado das operações dos descontos que se fizerem, e os interesses, que delles resultarem, se accumularão ao fundo effectivo, até que seja elevado a 100:000$, e só então os juros do dinheiro disponivel entrarão para a massa dos lucros partiveis.

     Art. 5º A importancia dos sinistros será paga com os lucros que houverem na companhia, e na falta os accionistas entrarão com a quantia proporcional para seu complemento, de maneira que o fundo effectivo de 10% (art. 2º) esteja sempre preenchido.

     Art. 6º A companhia será representada por uma direcção composta de dous membros accionistas, aos quaes a acta da sessão em que forem eleitos servirá de procuração geral.

     Art. 7º A companhia durará 20 annos contados do dia de sua installação; si antes desse prazo lhe sobrevierem prejuizos que absorvam um terço do seu capital, fará cessar suas transacções e entrará em liquidação, convocando-se logo a assembléa geral.

     Art. 8º No caso do artigo precedente, é livre a qualquer accionista retirar-se da companhia, podendo esta continuar, preenchendo o fundo primitivo, si o restante dos accionistas assim o deliberar em assembléa geral.

     Art. 9º A companhia poderá tambem ser dissolvida antes do prazo de sua duração, si os accionistas de dous terços do capital assim o resolverem.

CAPITULO II

DOS ACCIONISTAS

     Art. 10. Será reconhecido accionista quem fôr habilitado para contractar, e subscrever por cinco ou mais acções, e não se admittirá accionista de menor numero, e nem de mais de quinze acções.

     Art. 11. Todo o accionista tem direito de votar e ser votado para exercer os logares de presidente, vice-presidente, secretarios e directores, tendo um voto por cada cinco acções, não se admittindo a votar por procuração sinão os accionistas que estiverem ausentes da Provincia, e sendo o procurador tambem accionista.

     Art. 12. Sendo a companhia sociedade anonyma, a responsabilidade dos accionistas não se estende a mais do valor de suas acções.

     Art. 13. Nenhum accionista poderá retirar-se da companhia durante o tempo de sua duração, seja qual fôr o motivo que pretexte, mas poderá fazer venda ou cessão de suas acções com approvação da direcção, sem o que não ficará desonerado da responsabilidade, nem o comprador dellas reconhecido accionista.

     Art. 14. A transferencia das acções será declarada em livro para isso destinado, em que estejam registrados estes estatutos, obrigando-se o cessionario por toda a responsabilidade e obrigações sociaes do cedente, sendo o competente termo assignado pelo cessionario, cedente e pelos dous directores.

     Art. 15. Si a direcção recusar a approvação de qualquer transferencia de acções, terá a faculdade de ficar com ellas pelo preço que derem no mercado para cedel-as a pessoa que mereça sua confiança.

     Art. 16. Logo que a sociedade seja approvada pelo Governo os accionistas são obrigados a entrar para a caixa da companhia com 10% do valor de suas acções (art. 2º), sendo para isso prevenidos com o aviso que a direcção mandar inserir nas folhas publicas, e o accionista que não realizar sua entrada no prazo que lhe marcar será excluido.

     Art. 17. Os accionistas tambem ficam obrigados a entrar em caixa com a porcentagem que pela direcção lhes fôr pedida, para preencher o pagamento dos sinistros que occorrerem (art. 5º), e os que depois de avisados pela direcção deixarem de entrar com a sua quota no prazo de quinze dias, serão excluidos immediatamente da companhia com perdimento, a beneficio desta, das entradas que houverem feito e dos interesses que lhes possam pertencer, ficando ainda responsaveis pelos prejuizos que se derem em riscos tomados até o dia da sua exclusão.

     Art. 18. Cessa o interesse de accionista, nos casos de morte natural ou civil, por fallencias ou embaraços de seu commercio, si não prestar fiança idonea a contento da direcção.

     Art. 19. Em todos os casos comprehendidos no artigo antecedente, o fallido e os representantes do accionista morto que se não habilitarem para ser accionista, podem dispôr de suas acções no prazo de sessenta dias immediatos á morte ou fallencia; não o fazendo porém até esse tempo, a direcção fará dellas venda, por intermedio do corretor, annunciando-as por dez dias nas folhas publicas, entendendo-se sempre que em nenhum caso o comprador se pode tornar accionista da companhia sem a approvação precisa da direcção (art. 13).

     Art. 20. O producto das acções vendidas pela direcção, em conformidade do artigo precedente, será recolhido á caixa da companhia, servindo de garantia aos prejuizos que possam acontecer, e riscos pendentes, tomados até o dia da morte ou fallencia do accionista; mas logo que os riscos cessem e fique salva a sua responsabilidade, será entregue a seus legitimos representantes.

     Art. 21. No caso de não poder realizar-se a venda das acções vagas por morte, fallencia ou impossibilidade de qualquer accionista, ficarão para ser negociadas pela direcção quando convier por conta de quem pertencer.

     Art. 22. As duvidas que se suscitarem na liquidação do interesse do accionista morto ou fallido, na responsabilidade do accionista impontual, ou em qualquer reclamação a respeito de sinistros sobre effeitos seguros pela companhia, não podendo ser concluidos amigavelmente, sei-o-hão por arbitros nomeados na conformidade do art. 34.

     Art. 23. O accionista que se ausentar sem prestar fiança a contento da direcção, não receberá os dividendos, os quaes ficarão em caixa para garantia de sua responsabilidade, e si durante a ausencia se ordenar alguma entrada em conformidade do art. 17, não havendo quem a satisfaça, será excluido conforme o mesmo artigo.

     Art. 24. Todos os accionistas têm direito de examinar os livros da companhia, sendo-lhes para isso franqueados no escriptorio desta, mas não poderão extrahir cópia alguma de qualquer natureza que seja.

CAPITULO III

DA DIRECÇÃO

     Art. 25. A administração e gerencia da companhia será confiada a dous directores accionistas, eleitos em assembléa geral á pluralidade absoluta de votos e por escrutinio secreto.

     Art. 26. Serão tambem eleitos dous supplentes para servirem no caso de impedimento dos directores; e o mais votado será chamado para desempatar quando os dous directores não concordarem entre si.

     Art. 27. A direcção será eleita quando o fôr a mesa que preside a assembléa geral: uma e outra servirão dous annos, findos os quaes poderão ser reeleitas, e em todo o caso será um dos directores anteriormente nomeados, podendo tambem o prazo marcado ser interrompido si em assembléa geral fôr tomada essa resolução.

     Art. 28. Os directores são obrigados a dirigir e zelar os interesses da companhia, e nas apolices e documentos que firmarem escreverão antes da sua assignatura a formula - pela Companhia Utilidade Publica.

     Art. 29. Os directores por suas assignaturas contrahem a responsabilidade que têm na qualidade de accionistas (art. 12), e aquella em que possam incorrer como gerentes da companhia.

     Art. 30. Os directores poderão nomear agentes nos diversos portos para onde se dirigirem effeitos segurados, enviando-lhes procuração e instrucções para que fiscalisem os interesses da companhia; estes agentes vencerão a commissão de 3% sobre objectos vendidos por causa de avaria grossa, e esta commissão será paga pelo segurado e levada em conta pela companhia.

     Art. 31. Os directores estipularão os premios pelos riscos que se tomarem da maneira mais conveniente que julgarem, tendo attenção ao tempo em que se faz a viagem, porto do destino, capacidade do commandante, estado do navio e mais circumstancias, podendo recusar-se a tomar qualquer riscos quando entenderem que assim convem.

     Art. 32. A companhia não tomará em navio algum e sua carga risco maior do que a quantia correspondente a 5% do seu capital: os premios que excederem de cem mil réis poderão ser pagos pelo segurado em letra a prazo razoavel, ficando o mesmo segurado sujeito ao pagamento do sello de qualquer documento.

     Art. 33. A direcção fica autorisada a pagar as perdas que se verificarem, entendendo que da parte do segurado houve boa fé, e que preencheu os requisitos exigidos pelo Codigo Commercial.

     Art. 34. Quando houver motivo para suppôr-se dolo da parte do segurado, e este não se conformar com a opinião dos directores, as duvidas que occorrerem serão sempre decididas por arbitros (art. 22), sendo um nomeado pela direcção e outro pela parte; no caso porém que estes não concordem em sua opinião, nomeará cada uma das partes tres negociantes de credito, cujos nomes, sendo lançados em uma urna, delles se extrahirá por meio da sorte o terceiro arbitro que deve desempatar, o qual se pronunciará pela opinião que lhe parecer mais justa. Da decisão arbitral não se póde interpôr appellação ou recurso, e esta condição será exarada na apolice.

     Art. 35. Cada um dos directores vencerá a commissão de dous e meio por cento, deduzidos do importe dos premios dos seguros que realizarem, exceptuando sómente os retornos estipulados nas apolices, e quando algum director estiver impedido o supplente que o substituir perceberá no fim do anno a porcentagem correspondente ao tempo que servir.

CAPITULO IV

DA ASSEMBLÉA GERAL DOS ACCIONISTAS

     Art. 36. A assembléa geral será presidida por uma mesa composta de um presidente, vice-presidente, primeiro e segundo secretarios, e os dous directores eleitos na conformidade dos arts. 25 e 27.

     Art. 37. A assembléa geral se reunirá ordinariamente duas vezes em cada anno, e extraordinariamente quantas vezes a direcção o julgar conveniente; um numero de accionistas que representem a quarta parte do capital da companhia poderá exigir da direcção a convocação da assembléa geral.

     Art. 38. Si no prazo de oito dias a direcção não tiver convocado a assembléa geral exigida por um numero de accionistas que representem a quarta parte do seu capital, estes o poderão fazer por annuncios assignados por todos declarando o numero de acções de cada um, designando pelas folhas publicas o dia e hora em que deverá ter lugar a reunião, na qual não se admittirá discussão alheia ao objecto para que fôr convocada.

     Art. 39. A assembléa geral considera-se constituida sempre que os accionistas presentes representem por si um quarto do capital da companhia, e quando por falta de comparecimento deste numero de accionistas não puder funccionar, a sessão será adiada, e a direcção fará nova convocação para outro dia, no qual a assembléa geral será constituida com qualquer numero de accionistas que apparecer, e as resoluções que se tomarem terão inteiro vigor, excepto nos casos marcados nestes estatutos.

     Art. 40. As deliberações serão tomadas pela maioria absoluta de votos, não se admittindo votar por procuração, exceptuando-se o que fica disposto no art. 11.

     Art. 41. Haverá reunião de assembléa geral todos os annos nos dias 15 e 30 de Novembro: no dia 15 os directores apresentarão o balanço do anno findo e uma demonstração do estado da companhia, e logo será eleita uma commissão de tres accionistas para conferir e verificar o mesmo balanço, franqueando-se-lhe os livros e o archivo, e na reunião do dia 30 esta commissão apresentará o resultado de seu exame, que sendo approvado, se determinará o dividendo a partir pelos accionistas.

     Art. 42. Nos annos em que houver de fazer-se a eleição da mesa e direcção, será no dia 30 de Novembro, tomando o presidente, vice-presidente e secretarios posse de seus cargos logo depois da approvação das contas, mas a nova direcção só substituirá a antiga em 30 de Dezembro depois de pagos os dividendos.

CAPITULO V

DISPOSIÇÕES GERAES

     Art. 43. Serão a cargo da companhia todas as despezas de aluguel de casa, objectos de escriptorio, ordenado de empregados, as judiciaes e quanto fôr concernente aos negocios da mesma.

     Art. 44. A admissão e exclusão dos empregados da companhia é da competencia da direcção, a qual lhes arbitrará ordenados, submettendo-os á approvação da assembléa geral para isso convocada.

     Art. 45. Em assembléa geral os accionistas não poderão fallar mais do que duas vezes sobre qualquer assumpto; exceptuam-se o autor de algum requerimento que poderá fallar tres vezes, e os directores que poderão responder a todas as interpellações que lhes forem dirigidas.

     Art. 46. Justificando-se perante a direcção perda ou extravio de qualquer acção, poderá ella entregar ao accionista uma duplicata da acção perdida ou extraviada, exigindo primeiro as garantias que julgar convenientes.

     Art. 47. A direcção requererá ao Governo a approvação da companhia e seus estatutos como sociedade anonyma, e fal-os-ha registrar no Tribunal do Commercio, como prescreve o art. 296 do Codigo Commercial.

     Art. 48. Todos os accionistas deverão assignar estes estatutos, e concordarão que qualquer contestação entre si seja decidida por arbitros na conformidade do art. 34.

     Art. 49. Os accionistas se obrigam por si, seus herdeiros e successores ao inteiro e fiel cumprimento das disposições destes estatutos, fazendo especial renuncia de qualquer direito que tenham ou possam vir a ter para impedirem a observancia delles.

DISPOSIÇÃO TRANSITORIA

     O presidente da direcção do Banco de Pernambuco presidirá a primeira assembléa geral, nomeando d'entre os accionistas os secretarios e escrutadores necessarios para a primeira e segunda discussão dos estatutos, finda a qual se nomeará a mesa, a quem competirá dahi em vante reger os trabalhos.

Palacio do Rio de Janeiro em 4 de Junho de 1853.

Francisco Gonçalves Martins.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1853


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1853, Página 259 Vol. 1 pt II (Publicação Original)