Legislação Informatizada - Carta de Lei de 8 de Junho de 1815 - Publicação Original

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Carta de Lei de 8 de Junho de 1815

Retifica o tratado entre o Principe Regente de Portugal e o Rei da Grã-Bretanha, assignado em Vienna a 22 de Janeiro deste anno, para abolição do trafico de escravos em todos os lugares da Costa d`Africa ao Norte do Equador.

     D. João por graça de Deus, Principe de Portugal e dos Algarves, daquem, e dalem mar, em Africa de Guiné, e da Conquista, Navegação, e Commercio da Ethiopia, Arabia, Persia e da India, etc. Faço saber a todos os que a presente Carta de Approvação, Confirmação e Ratificação virem, que em 22 de Janeiro do corrente anno se concluiu e assignou na Cidade de Vienna entre mim e o Serenissimo e Potentissimo Principe Jorge III, Rei do Reino Unido da Grande Bretanha e Irlanda, meu bom Irmão e Primo, pelos respectivos Plenipotenciarios, reunidos de competentes Poderes, um Tratado, com o fim de effectuar, de commum accordo com as outras Potencias da Europa, que se prestaram a contribuir para este fim benefico, a abbolição emmediata do Trafico de Escravos em todos os logares da Costa de Africa, sitos ao Norte do Equador: do qual Tratado a sua fórma e teor é a seguinte:

     Em nome da Santíssima e Indivisivel Trindade.
     Sua Alteza Real o Principe Regente de Portugal, Tendo no artigo decimo do Tratado de Alliança feito no Rio de Janeiro em 19 de Fevereiro de 1810, declarado a sua Real Resolução de cooperar com sua majestade Britannica na causa da humanidade e justiça, adoptando os meios mais efficazes para promover a abolição gradual do Tratado de Escravos: e Sua Alteza Real em virtude da dita sus Declaração desejando effectuar, de commum accordo com Sua Magestade Britannica e com as outras Potencias da Europa, que se prestarem a contribuir para este fim benefico, a abolição immediata do referido Trafico em todos os logares da Costa da Africa sitos ao Norte do Equador: Sua Alteza Real o Principe Regente de Portugal e Sua Magestade Britannica, ambos igualmente animados do sincero desejo de accelerar a epoca, em que as vantagens de uma industria pacifica, e de um commercio innocente, possam vir a promover-se por toda essa grande extensão do Continente Africano, libertado este do mal do Trafico de Escravos, Ajustaram fazer um Tratado para esse fim, e nomearam nesta conformidade para seus Plenipotenciarios; a saber: Sua Alteza Real o Principe Regente de Portugal, os Illustrissimos e Excellentissimos D. Pedro de Souza Holstein, Conde de Palmella, do seu Conselho, Commendador da Ordem de Christo, Capitão da Sua Guarda Real Allemã; Antonio de Saldanha da Gama, do seu Conselho, e do da sua Real Fazenda, Commendador da Ordem Militar de S. Bento de Aviz e D. Joaquim Lobo da Silveira, do seu Conselho, Commendador da Ordem de Christo; todos tres seus Plenipotenciarios ao Congresso de Vienna; e sua Magestade El-Rei dos Reinos Unidos da Grã-Bretanha e Irlanda o Muito Honrado Roberto Stewart, Visconde Castlereagh, Cavalleiro da Muito Nobre Ordem da Jarreteira, Membro do Honrosissimo Conselho Privado de Sua dita Magestade, Membro do Parlamento, Coronel do Regimento de Milicias de Londonderry, Principal Secretario de Estado de Sua dita Magestade para os Negocios Estrangeiros, e Seu Plenipotenciario ao Congresso de Vienna; os quaes, havendo reciprocamente trocado os Plenos Poderes respectivos, que se acharam em boa e devida forma convieram nos artigos seguintes.

ARTIGO I

     Que desde a Ratificação deste Tratado, e logo depois da sua publicação, ficará sendo prohibido a todo e qualquer Vassallo da Corôa de Portugal o comprar escravos, ou traficar nelles, em qualquer parte da Costa da Africa ao Norte do Equador, debaixo de qualquer pretexto, ou por qualquer modo que seja; exeptuando com tudo aquelle ou aquelles navios que tiverem sahido dos Portos do Brazil, antes que a sobredita Ratificação haja sido publicada; comtanto que a viagem desse ou desses navios se não estenda a mais de seis mezes depois da mencionada publicação.

ARTIGO II

      Sua Alteza Real o Principe Regente de Portugal consente, e se obriga por estes artigo a adoptar, de accordo Sua Magestade Britannica, aquellas medidas que possam melhor contribuir para a execução effectiva do Ajuste precedente, conforme ao seu verdadeiro objectivo, e litteral intelligencia: e Sua Magestade Britannica se obriga a dar, de accordo com Sua Alteza Real, as ordens que forem adequadas para effectivamente impedir que, durante o tempo em que ficar sendo licito continuar o Trafico de Escravos, segundo as leis de Portugal, e os Tratados subsistentes entre as duas Corôas, se cause qualquer estorvo ás Embarcações Portuguezas, que se dirigirem a fazer o Commercio de Escravos ao Sul da Linha, ou seja nos actuaes Dominios da Corôa de Portugal, ou nos Territorios sobre os quaes a mesma Corôa reservou o seu direito no mencionado Tratado de Alliança.

ARTIGO III


      O Tratado de Alliança concluido no Rio de Janeiro a 19 de Fevereiro de 1810, sendo fundado em circumstancias temporarias, que felizmente deixaram de existir, se declara pelo presente artigo por nullo e de nenhum effeito em todas as suas partes; sem que por isso comtudo se invalidem os antigos Tratados de Alliança, Amisade, e Garantia, que por tanto tempo e tão felizmente teem subsistido entre as duas Corôas, e que se renovam aqui pelas duas Altas Partes Contratantes, e se reconhecem ficar em plena força e vigor.

ARTIGO IV


      As Duas Altas Partes Contratantes se reservam e obrigam a fixar por um Tratado separado o periodo em que o Commercio de Escravos haja de cessar universalmente, e de ser prohibido em todos os Dominios de Portugal: e Sua Alteza Real o Principe Regente de Portugal Renova aqui a sua anterior Declaração e Ajuste de que, no intervallo que decorrer até que a sobredita abolição geral e final se verifique, não será licito aos Vassallos Portuguezes o comprarem ou traficarem em Escravos em qualquer parte da Costa de Africa, que não seja ao Sul da Costa de Africa, que não seja ao Sul da Linha Equinocial, com rica especificado no segundo artigo deste Tratado; nem tão pouco o emprehenderem este trafico debaixo da Bandeira Portugueza para outro fim que não seja o de supprir de Escravos as Possessões Transatlanticas da Corôa de Portugal.

ARTIGO V

     Sua Magestade Britannica convem, desde a data em que for publicada, da maneira mencionada no artigo primeiro, a Ratificação do presente Tratado, em desistir da cobrança de todos os pagamentos, que ainda restem por fazer para a completa solução do emprestimo de 600.000 libras esterlinas, contrahido em Londres por conta de Portugal no anno de 1809, em consequencia da Convenção assignada aos 21 de Abril do mesmo anno; a qual Convenção, debaixo das condições acima especificadas, se declara pelo presente Artigo nulla e de nenhum effeito.

ARTIGO VI


     O presente Tratado será ratificado e as Ratificações trocadas no Rio de Janeiro dentro no espaço e cinco mezes, ou antes si posssivel for.

     Em fé e Testemunho do que os Plenipotenciarios com o Sello das Suas Armas.

     Feito em Vienna aos 22 de Janeiro do Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1815.

(L.S) Conde de Palmella
(L.S.) Antonio de Saldanha da Gama.

(L.S) D. Joaquim Lobo da Silveira.

ARTIGO ADDICIONAL

      Convencionou-se que, no caso de algum Colono Portuguez querer passar dos Etabelecimentos da Corôa de Portugal na Costa de Africa ao Norte do Equador com os Negros bona fide seus domesticos para qualquer outra Possessão da Corôa de Portugal, terá a liberdade de fazel-o, logo que não seja a bordo de navio armado e preparado para o trafico, e logo que venha munido dos competentes Passaportes e Certidões, conforme a norma que se ajustar entre os dous Governos.

     O presente Artigo Addicional terá a mesma força e vigor como se fosse inserido palavra por palavra no Tratado assignado neste dia; e será ratificado, e a Ratificação trocada ao mesmo tempo.

     Em fé e Testemunho do que os Plenipotenciarios respectivos o assignaram e firmaram com o Sello das suas Armas. Feito em Vienna aos 22 de Janeiro do Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1815.

(L.S) Conde de Palmella
(L.S.) Antonio de Saldanha da Gama.
(L.S) D. Joaquim Lobo da Silveira.

     E sendo-me presente o mesmo Tratado, cujo teor fica acima inserido, e bem visto, considerado, e examinado por mim tudo o que nelle se contém, e no Artigo Addicional que faz parte integrante do mesmo Tratado, o Approvo, Ratifico, e Confirmo, assimno todo, como em cada uma das suas partes, clausulas e estipulações; e pela presente o dou por firme e valido, para haver de produzir o seu devido effeito; promettendo em fé e palavra real observal-o, e cumpril-o inviolavelmente, e fazel-o cumprir, e observar por qualquer modo que possa ser. Em testemunho e firmeza do sobredito, fiz passar a presente Carta por mim assignada, passada com o Sello Grande das minhas Armas, e referendada pelo meu Secretario e Ministro de Estado abaixo assignado. Dado no Palacio do Rio de Janeiro aos 8 de Junho do Anno do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1815.

O PRINCIPE com guarda.

Marquez de Aguiar


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1815


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1815, Página 27 Vol. 1 (Publicação Original)