Qual a justa jornada?
O filósofo Aristóteles recomendava aos gregos a justa medida como ação correta na arte da política. O dilema é encontrar o ponto justo quando distintos atores sociais lutam por diferentes demandas em relação à mesma questão. Hoje na Câmara, a discussão em torno da duração semanal da jornada de trabalho é exemplar no processo de busca de ponto de equilíbrio para atender a sociedade. De um lado, há empresários a temer a elevação dos custos de produção com a aprovação de nova lei reduzindo a jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais. De outro, trabalhadores reivindicam redução do período de labor como forma de geração de novas vagas no sistema de empregos do país, permitindo maior qualidade de vida aos empregados. Essas posições divergentes impedem o avanço das negociações. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 231, que reduz a jornada de trabalho, tramita na Câmara dos Deputados desde 1995. São 15 anos de debates, avanços e retrocessos na matéria. Há grande controvérsia sobre o tema, posições apaixonadas de ambos os lados que sempre impediram a construção de consenso. As pressões dos sindicatos aumentaram de forma substancial depois que reinterpretei a Constituição e abri a pauta do Legislativo a outras votações além das Medidas Provisórias. A sociedade desaguou suas demandas na Câmara, com intensa movimentação para votar matérias represadas durante anos. A pressão pela votação da PEC elevou muito a temperatura no Congresso. Organizei amplo debate para ouvir o setor produtivo, com trabalhadores e empregados presentes no Plenário apresentando publicamente suas posições. Creio no diálogo como esteio da democracia. Por isso, ao fim do ano encarreguei deputados ligados aos dois setores de tentarem a composição de uma proposta intermediária. O resultado, porém, não foi alcançado entre as partes envolvidas. Como presidente da Câmara, avancei um pouco mais para tentar equacionar o problema, seguindo receita aristotélica: propus medida que atende aos trabalhadores, mas também procura evitar prejuízos aos empregadores... Formulei proposta de redução de jornada de 44 para 42 horas. É menos que os trabalhadores querem, porém mais do que os patrões aceitam negociar. Além disso, a hora extra não subiria em relação ao patamar atual de 50% a mais em relação à hora trabalhada. A PEC atual prevê aumento desses 50% para 75%. Iniciei também consultas ao governo em direção a possível compensação fiscal para as empresas em função da nova proposta. Tratei do assunto com o ministro Guido Mantega. Não houve compromisso do governo em adotar a medida, mas há boa vontade para conversar. A proposta está em debate, com simpatias e resistências. A fórmula busca gerar impacto econômico menor nas empresas, pois a compensação fiscal minimizaria a necessidade de contratação extra de pessoal para compensar a redução da jornada. Pode permitir maior qualidade de vida ao trabalhador e criação de novas vagas formais, sempre reação positiva para economia. Essa pode ser a justa medida para resolver questão que não avança há mais de 15 anos e atender, com parcimônia, aos anseios da sociedade. (Artigo do Presidente da Câmara, Michel Temer, originalmente publicado no site https://www.brasileconomico.com.br/ em fevereiro de 2010)