A lição da Europa

O auxílio financeiro da União Européia à Grécia salvou instituições financeiras que haviam emprestado recursos sem os cuidados devidos. Note-se que a explosão das contas públicas no país berço da democracia teve o condão de revelar outros países da comunidade na mesma dificuldade. A crise poderia se agravar sem medidas de contenção do problema. A realidade que emergiu foi de Estado e mercado intrinsecamente ligados, sem possibilidade de negação de um ou de outro.

O preço pago pelos fiadores da salvação da economia grega é alto. Será talvez maior ainda do ponto de vista político. Cortes de salários e redução de benefícios estão sendo anunciados por governos patrocinadores, durante anos, do Estado do Bem Estar Social. Essas decisões surgem na esteira da discussão de como foi estruturada a divisão da responsabilidade, dos países sócios da União Européia, pela administração das contas públicas individuais de seus integrantes. Na verdade, gastos dispararam acentuadamente e houve descontrole das contas dos entes individuais da UE. Tesouros de países investiram mais do que podiam, assumiram compromissos sociais permanentes além do poderiam pagar e comprometeram a estabilidade do sistema. Ao fim, todos pagam a conta.

Significa isso que a comunidade de países europeus é um erro? Não. Somente a paz conquistada no continente pós Segunda Guerra Mundial já é argumento suficiente para demonstrar a qualquer interlocutor o imenso lucro advindo da união entre potências como Alemanha, França, Itália, Holanda, Inglaterra. Desde o Império Romano, a forma mais fácil de um país crescer na Europa era invadir e pilhar as riquezas de outra nação. A União Europeia foi o ponto final definitivo desse comportamento.

Se houve erros na implantação da moeda única, é possível corrigi-los. Se ainda não há sistema perfeito da administração de contas entre Estados tão distintos, ainda é possível lançar novas bases legais para erguer estruturas que respondam adequadamente à necessidade de equilíbrio financeiro.

A Europa ainda será uma federação. Assim como o mundo tende cada vez mais a se integrar, a se aproximar. A globalização exige caminhar neste rumo sem titubeios e sem dúvidas. Não existe retorno possível. As barreiras protecionistas ainda existem, e vão continuar em vigor por alguns anos. São normais resistências aos avanços e mudanças. Contudo, imaginá-las vigorando dentro de 50 anos, é apostar na inércia da história. E não há como deter o processo histórico.

O Brasil precisa estar preparado para esse novo ciclo. Grandes acertos vêm sendo praticados pela nossa política internacional nos últimos anos. Desde a abertura democrática, o Itamaraty buscou parceiros que estavam fora do âmbito das relações internacionais pela determinação ideológica. Hoje, a visão é outra. Estamos nos integrado a novos parceiros e agindo conjuntamente com outras forças emergentes no processo internacional. Estar atento para o processo histórico é fundamental. O ganho futuro será enorme, porque estaremos juntos sob numa lógica diferenciada. A paz européia trouxe ganhos enormes para o mundo. Não foram as guerras que permitiram os ganhos sociais mais relevantes da história da humanidade. Foi a paz, a ação coordenada, o trabalho pela união. Esses ganhos são hoje moeda corrente, livre de qualquer especulação ou de quedas bruscas do mercado. Essa é a moeda forte que deve ancorar a política internacional de nossos governantes para os próximos anos.

 

Deputado Michel Temer

Presidente da Câmara