Legislação Informatizada - LEI Nº 191, DE 16 DE JANEIRO DE 1936 - Publicação Original
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LEI Nº 191, DE 16 DE JANEIRO DE 1936
Regula o processo do mandado de segurança.
O Presidente da Republica dos Estados Unidos do Brasil:
Faço saber que o Poder Legislativo decreta e eu sancciono a seguinte lei:
Art. 1º Dar-se-á mandado de segurança, para defesa de direito certo e incontestavel, ameaçado, ou violado, por acto manifestamente inconstitucional, ou illegal, de qualquer autoridade.
Paragrapho unico. Consideram-se actos de autoridades os das entidades autarchicas e de pessoas naturaes ou juridicas, no desempenho de serviços publicos, em virtude de delegação ou de contracto exclusivo, ainda quando transgridam o mesmo contracto.
Art. 2º O mandado não prejudica as acções petitorias competentes.
§ 1º A decisão do mandado de segurança não impede que a parte reitere a defesa de seu direito por acção competente, nem por esta pleiteie effeitos patrimoniaes não obtidos.
§ 2º Poderá renovar-se o pedido do mandado sómente quando a decisão denegatoria lhe não houver apreciado o merecimento.
§ 3º Cabe o mandado de segurança contra quem executar, mandar ou tentar executar o acto que o tenha provocado.
Art. 3º O direito de requerer mandado de segurança extingue-se depois de 120 dias, contados da sciencia do acto impugnado.
Art. 4º Não se dará mandado de segurança quando se tratar:
I - de liberdade de locomoção, exclusivamente;
II - de acto de que caiba recurso administrativo com effeito suspensivo, independente de caução, fiança ou deposito;
III - de questão puramente politica;
IV - de acto disciplinar.
Art. 5º Compete processar e julgar originariamente o pedido do mandado de segurança;
I - nos casos de competencia da Justiça Federal:
a) contra actos do Presidente da Republica, de Ministro de Estado ou de seu presidente - á Côrte Suprema;
b) contra actos de quaesquer outras autoridades federaes, inclusive legislativas; e de entidades autarchicas, institutos ou empresas que dirijam ou explorem serviços creados e mantidos ou delegados pela União - aos tribunaes ou juizes federaes de primeira instancia;
c) contra acto de juiz ou tribunal federal, ou do seu presidente - ao mesmo juiz, ou ao tribunal pleno;
II - nos casos de competencia da Justiça Eleitoral, aos tribunaes e juizes designados nas leis de sua organização;
III - nos casos de competencia da Justiça local:
a) contra actos das autoridades determinadas na lei de organização judiciaria - á Côrte de Appellação. Quando o acto impugnado fôr da Côrte de Appellação, de alguma de suas Camaras, ou de seu presidente, ou de outro juiz, será competente o tribunal que a lei de organização judiciaria determinar;
b) nos demais casos - ao juiz competente do civel.
Paragrapho unico. No Districto Federal e no Territorio do Acre, será competente a propria Côrte plena, nos casos mencionados na parte final do n. III, a.
Art. 6º Só o titular de direito certo e incontestavel, ameaçado ou violado, poderá, por pessoa habilitada da forma do decreto n. 20.784, de 14 de novembro de 1931, com as modificações ulteriores, requerer mandado de segurança.
§ 1º Sempre que o direito ameaçado ou violado seja certo e incontestavel, mas não se tenha individualizado o titular respectivo, cabendo, indeterminadamente, a uma ou mais dentre determinadas pessoas, qualquer destas poderá votar mandado de segurança para que o mesmo direito seja garantido a alguma dellas.
§ 2º Quem tiver o seu direito certo e incontestavel, ameaçado ou violado, em consequencia de ameaça ou violação feita a direito igualmente certo e incontestavel de terceiro, poderá notificar, opportunamente, esse mesmo terceiro para que impetre mandado de segurança, afim de salvaguardar o seu direito, sob pena de responder pela plena indemnização das perdas e damnos decorrentes da omissão.
Art. 7º A petição inicial, em tres vias, conterá:
a) o nome, o estado civil, a profissão e o domicilio do impetrante;
b) exposição circurmstanciada do facto:
c) demonstração de ser o direito allegado certo e incontestavel;
d) indicação precisa, inclusive pelo nome, sempre que possivel, da autoridade a quem se attribua o acto impugnado;
e) referencia expressa, ao texto constitucional ou legal em que se funde o direito ameaçado ou violado por aquelle acto;
f ) o pedido de garantia ou de restauração do direito.
§ 1º Dever-se-á instruir a petição, quando necessario, com documentos probatorios do direito allegado e da sua ameaça ou violação. Á segunda e á terceira vias da petição inicial juntará o requerente copias authenticas de todos os documentos.
§ 2º Se o requerente affirmar que documento, necessario á prova de suas allegações, se acha em repartição publica, ou em poder de autoridade, que lhe não dê a certidão respectiva, o juiz requisitará, por officio, a sua exhibição, em original ou em copia authenticada, no prazo, que fixar, de 3 a 8 dias, uteis. Se a autoridade, indicada pelo requerente, fôr a coactora, a requisição se fará no mesmo officio em que se lhe pedirem informações; se se tratar de outra autoridade, a requisição lhe será dirigida preliminarmente, aguardando-se a decisão do incidente para se pedirem informações nos termos do art. 8º, § 1º.
§ 3º Nos casos do paragrapho precedente, se a autoridade não attender á requisição, poderá o impetrante, nos tres dias subsequentes á terminação do prazo fixado, requerer, nos mesmos autos, justificação, por testemunhas do allegado, com citação do Ministerio Publico e dos representantes da pessoa juridica de direito publico interessada, e da pessoa ou entidade a que attribua o acto impugnado. A justificação não exclue outras diligencias que o juiz possa determinar, nem elide a responsabilidade da autoridade a que se fizera a requisição.
§ 4º Sempre que a autoridade enviar copia do documento, ou fôr por ella extrahida em juizo, o impetrante pagará os emolumentos que seriam devolvidos pela certidão.
Art. 8º A inicial será desde logo indeferida quando não fôr caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos desta lei.
§ 1º Conhecendo do pedido, o juiz immediatamente:
a) mandará citar o coactor, por official do juizo, ou por precatoria, afim de lhe ser entregue a segunda via da petição inicial, com a respectiva copia dos documentos;
b) encaminhará, por officio, em mão do official do juizo ou pelo correio, sob registo, ao representante judicial, ou, na falta, ao representante legal de pessoa juridica de direito publico interno, interessada no caso, a terceira via da petição inicial com a respectiva copia dos documentos.
§ 2º Se se tiver juntado aos autos, documentos requisitado na forma do art. 7º, § 2º, ou prestado a justificação autorizada pelo art. 7º, § 3º, serão annexadas á segunda e á terceira vias da petição inicial, copias extrahidas pelo escrivão, dessas mesmas peças.
§ 3º Na contrafé de citação, a que se refere a letra a do § 1º, assim como no officio de que trata a letra b do mesmo paragrapho, será fixado o prazo de dez dias uteis, que correrá em cartorio, depois de juntar-se aos autos a contrafé e o recibo do officio, para apresentação da defesa e das informações reclamadas.
§ 4º Quando o destinatario do officio recusar recebel-o, ou dar-lhe recibo, o official do juizo, que tenha sido portador do mesmo officio, ou o funccionario postal competente, certificará o occorrido; e a certidão será junta aos autos para as effeitos do paragrapho precedente.
§ 5º Logo que expedir o officio de que trata o § 1º, b, o escrivão juntará aos autos copia authenticada do mesmo.
§ 6º Findo o prazo do § 3º, o escrivão fará os autos conclusos com as allegações e informações recebidas, ou sem ellas.
§ 7º Se, pelas informações, o juiz verificar que o acto foi ou vae ser praticado por ordem de autoridade que, pela sua hierarchia, esteja sujeita a outra jurisdicção, mandará remetter o processo ao juiz do tribunal competente.
§ 8º O juiz proferirá o julgamento dentro em cinco dias depois que receber os autos.
§ 9º Quando se evidenciar, desde logo, a relevancia do fundamento do pedido, e decorrendo do acto impugnado lesão grave irreparavel do direito do impetrante, poderá o juiz, a requerimento do mesmo impetrante, mandar; preliminarmente, sobreestar ou suspender o acto alludido.
Art. 9º Serão representados:
a) a União, na Corte Suprema, pelo Procurador Geral da Republica; na Justiça eleitoral e na Justiça militar, pelos orgãos do Ministerio Publico respectivos; nos demais juizos e tribunaes, pelo Procurador Seccional que fôr designado - na Justiça federal, pelo juiz do feito, e, nas Justiças locaes, pelo Procurador da Republica;
b) os Estados e os Municipios, em primeira e em segunda instancias, na conformidade das leis respectivas;
c) o Districto Federal, em qualquer instancia, por seus procuradores, na forma da legislação em vigor.
Art. 10. Julgando improcedente o pedido, o juiz:
a) transmittirá, em officio, por mão do official do juizo, ou pelo Correio, sob registro, o inteiro teor da sentença ao representante legal da pessôa juridica de Direito, publico, interno, interessada, e no caso do art. 1º, paragrapho unico, tambem ao representante legal da pessoa que praticou o acto impugnado;
b) fará expedir, incontinenti, como titulo executorio em favor de que o impetrou, o mandado de segurança, determinando as providencias especificadas na sentença contra a ameaça ou a violencia.
Paragrapho unico. Recebendo a copia da sentença, o representante da pessoa juridica de direito publico, sob pena de responsabilidade, ou, no caso do art. 1º, paragrapho unico, o representante da pessoa que praticou o acto impugnado, sob pena de desobediencia, dará immediatamente as providencias necessarias para cumprir a decisão judicial.
Art. 11. Cabe recurso, dentro em cinco dias, contados da intimação, da decisão que indeferir "in limine" o pedido ou que, afinal, conceder ou denegar o mandado. O recurso não terá effeito suspensivo, subindo, porém, nos proprios autos originarios.
§ 1º O recurso poderá ser interposto pelo impetrante, pela pessoa juridica de direito publico interno interessada, ou pelo coactor.
§ 2° Para a Côrte Suprema caberá recurso ordinario nos casos do art. 76, nº 2, II, a, b, e recurso extraordinario nos do mesmo art. n. 2, III.
Art. 12. O recorrente e o recorrido terão successivamente, por tres dias cada um, vista dos autos, afim de offerecerem allegações e documentos.
§ 1º Conclusos os autos, em seguida, ao juiz, em quarenta e oito horas, manterá elle, ou não, a decisão recorrida, mandando que, num ou noutro caso, subam os auto, á instancia superior, sem mais allegações.
§ 2° Recebidos os autos na instancia superior, serão preparados, dentro em cinco dias uteis, pena de deserção, e immediatamente distribuidos e conclusos ao relator designado. Este os apresentará em mesa, na primeira sessão subsequente, procedendo-se ao julgamento.
§ 3° Quando a decisão da instancia superior conceder o mandado, ou confirmar o de que fôra suspensa a execução, proceder-se-á na conformidade do art. 10; quando o cassar, logo se fará a communicação a que se refere o mesmo artigo, expedindo-se contramandado para intimação do impetrante e do coactor; quando confirmar a concessão do mandado, já expedido, far-se-á apenas a communicação, nos termos já alludidos.
§ 4° Resalvado o recurso extraordinario, quando cabivel, á decisão do recurso sómente se poderão oppôr embargos da declaração.
Art. 13. Nos casos do art. 8°, § 9°, e art. 10, poderá o Presidente da Côrte Suprema, quando se tratar de decisão da Justiça Federal, ou da Côrte de Appellação, quando se tratar de decisão da justiça local, a requerimento do representante da pessoa juridica de direito publico interno interessada, para evitar lesão grave á ordem, á saude ou á segurança publica, manter a execução do acto impugnado até ao julgamento do feito, em primeira ou em segunda instancias.
Art. 14. Nos casos de competencia originaria da Côrte Suprema ou da Côrte de Appellação, caberá ao relator designado a instrucção do processo, procedendo-se ao julgamento em Côrte Plena.
Art. 15. Em caso de urgencia, o pedido de mandado de segurança, com os requisitos desta lei, poderá transmittir-se por telegramma, ou radiogramma, bem assim as communicações, mandados e quaesquer determinações de juiz ou Côrte.
§ 1º Os originaes serão sempre apresentados á agencia expedidora com as firmas reconhecidas por tabellião da localidade, e, esta circunstancia declarada no despacho.
§ 2° Quando o mandado fôr transmittido por telegramma ao juiz competente da localidade, este fará autuar o telegramma e expedir outro mandado, em que se transcreverá o teor daquelle, afim de ser cumprido por officiaes do Juizo.
§ 3º Quando requerido por telegramma o mandado, caberá ao escrivão do feito extrahir copias do mesmo telegramma para os fins do art. 8°, § 1°, a, b.
Art. 16. O processo do mandado de segurança prefere a qualquer outro, salvo o habeas corpus; póde iniciar-se e correr em férias, e admitte a intervenção de terceiro como assistente de qualquer das partes.
Art. 17. Os prazos ou termos estabelecidos nesta lei são continuos e improrogaveis e a transgressão ou inobservancia de qualquer delles, além, das communicações estabelecidas nas leis de processo, acarretará, para o juiz, escrivão e representantes do Ministerio Publico, a pena de suspensão de suas funcções até sessenta dias.
Paragrapho unico. Os prazos fixados para apresentação de documentos (art. 7°, § 2°) ou para prestação de informação (art. 8º, § 3°), poderão ser ampliados pelo juiz, até o triplo, attendendo a difficuldade, ou demora, notoria de communicações, ou a outras circumstancias especiaes que reconheça.
Art. 18. Esta lei será communicada por telegramma aos Governadores e Interventores dos Estados, afim de ser immediatamente publicada em todo o Paiz.
Art. 19. Revogam-se as disposições em contrario.
Rio de Janeiro, 16 de janeiro de 1936, 115° da Independencia e 48° da Republica.
GETULIO VARGAS
Vicente Ráo
- Diário Oficial da União - Seção 1 - 21/1/1936, Página 1603 (Publicação Original)
- Coleção de Leis do Brasil - 1936, Página 53 Vol. 1 (Publicação Original)