Legislação Informatizada - Decreto nº 750, de 2 de Janeiro de 1851 - Publicação Original
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Decreto nº 750, de 2 de Janeiro de 1851
Approva e Manda que se execute nos Presidios Leopoldina e Santa Isabel o Regulamento para os Presídios Militares fundados á margem do Rio Araguaya na Provincia de Goyaz.
Em virtude do disposto no § 5º do Art. 11 da Lei Nº 555 de 15 de Junho ultimo: Hei por bem Approvar, e Mando que se execute nos Presidios Leopoldina e Santa Isabel, o Regulamento para os Presidios Militares fundados á margem do Rio Araguaya na Provincia de Goyaz, que com este baixa, assignado pelo Visconde de Mont'alegre, do Conselho d'Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do Imperio. O mesmo Ministro e Secretario d'Estado o tenha assim entendido, e faça executar.
Palacio do Rio de Janeiro em dois de Janeiro de mil oitocentos cincoenta e hum, trigesimo da Independencia e do Imperio.
Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.
Visconde de Mont' alegre.
REGULAMENTO PARA OS PRESIDIOS MILITARES FUNDADOS Á MARGEM DO RIO ARAGUAYA NA PROVINCIA DE GOYAZ, MANDADO EXECUTAR PELO DECRETO DESTA DATA
CAPITULO I
Dos Presidios
Art. 1º Os Presidios fundados nas margens do Rio Araguaya são pontos militares destinados a proteger e auxiliar a navegação deste rio; a attrahir população para suas margens; e a chamar, com o auxilio da catechese, os Indios á civilisação.
Art. 2º Para assento e fundação de cada Presidio fará o Presidente da Provincia demarcar, no lugar que for escolhido, huma superficie equivalente a hum quadrado de legua e meia de lado.
Art. 3º A guarnição dos Presidios constará de hum Commandante Militar e de huma força de Pedestres, ou de 1ª Linha, marcada pelo Presidente da Provincia, tendo attenção ás circumstancias das localidades.
CAPITULO II
Dos deveres dos Commandantes
Art. 4º Aos Commandantes dos Presidios compete:
§ 1º A guarda e arrecadação dos objectos pertencentes á Fazenda Publica.
§ 2º A distribuição dos viveres pelas praças e mais pessoas pertencentes aos Presidios.
§ 3º A manutenção da ordem, a economia e disciplina da guarnição, e a segurança dos presos que estiverem cumprindo sentença.
§ 4º Prestar auxilio aos Missionarios para as operações de catechese, ministrando-lhes até a quinta parte da força total do Presidio.
§ 5º Auxiliar aos navegantes da carreira do Pará com viveres por troca ou venda; emprestando-lhes, sem prejuizo dos Presidios, alguma embarcação, e fornecendo-lhes huma até duas duas praças, que não poderão passar alêm do Presidio mais proximo, cujo Commandante providenciará sobre o opportuno regresso dellas.
§ 6º Proteger as familias que se forem estabelecer no Presidio, fornecendo-lhes viveres, ferramentas, e quaesquer outros auxilios de que careção para os trabalhos agricolas. A natureza dos auxilios, sua qualidade e quantidade, bem como o tempo por que devem durar, serão fixados pelo Presidente da Provincia em huma Tabella, que submetterá á approvação do Governo.
§ 7º Dar parte ao Governo da Provincia de qualquer offensa que tenha sido feita aos Indios por parte dos negociantes, ou das tripolações de seus barcos, com informações circunstanciadas que habilitem o Governo a proceder como for conveniente.
§ 8º Fazer todas as diligencias a seu alcance a fim de que os selvagens da visinhança vivão em harmonia com os habitantes do Presidio, e abracem a vida social. Para conseguir este fim procurarão captar a amizade dos maioraes de todas as Tribus, e recusarão intrometter-se em favor de qualquer, no caso de dessidencias, ainda que isso lhes seja solicitado; procurando pelo contrario, com boas maneiras, tornarem-se os arbitros das contestações dos selvagens.
§ 9º Velar em que as praças, e quaesquer outros moradores do Presidio tratem sempre aos Indios com a maior cortezia e urbanidade; não os provocando jamais por gestos ou por palavras, e muito menos por vias de facto; finalmente observando nos tratos e negocios que com elles fizerem a maior sinceridade e lisura.
§ 10. A exacta observancia das disposições deste Regulamento.
Art. 5º Os Commandantes dos Presidios não poderão ausentar-se delles, qualquer que seja o motivo, sem licença do Presidente da Provincia.
Art. 6º He expressamente prohibido aos Commandantes de Presidios o fazerem nelles qualquer negocio, e muito principalmente com as praças que os guarnecem. Os pagamentos dos vencimentos das mesmas praças devem ser feitos nas mesmas especies que sahirem dos cofres publicos, com a maior publicidade, e immediatamente que chegarem ás mãos dos Commandantes as quantias a esse fim destinadas.
Art. 7º No acto do pagamento ás praças dos Presidios, os Commandantes farão ler em voz alta e intelligivel os Artigos de Guerra, a 2ª parte do Art. 5º deste Regulamento, e os Arts. 9º a 14, 17, 19, 20, 21, 22, 57 a 64 e 67, a fim de que as mesmas praças comprehendão, e não esqueção seus direitos e deveres.
Art. 8º He tambem prohibido aos Commandantes de Presidios trocarem entre si praças das respectivas guarnições, sem previa permissão do Governo da Provincia; bem como emprega-las em seu serviço particular dentro ou fóra do Presidio, salvo direito que lhes assiste de terem hum camarada ou ordenança.
CAPITULO III
Da cultura e distribuição das terra nos Presidios
Art. 9º Deve haver em cada Presidio huma roça commum para alimentação das praças; e de todas as pessoas obrigadas a residir no Presidio. Alêm desta os soldados podem ter suas roças particulares, de cujos productos poderão dispor livremente, salvo quando o celleiro commum não tiver viveres que cheguem até á colheita proxima.
Art. 10. Para a cultura de suas roças, ou exercicio de alguma industria, as praças dos Presidios terão livres, alêm dos Domingos, dias Santos de guarda e dispensados, hum dia util em cada semana. Esta disposição cessa no caso de algum serviço extraordinario.
Art. 11. Será permittido nos Presidios todo o ramo de cultura conhecido; deve porêm merecer preferencia a cultura daquelles generos que servirem para exportação, como sejão o café, algodão, anil, baunilha, fumo, trigo e cacao. Esta preferencia não deverá ser entendida de maneira que prejudique a cultura dos generos necessarios á sustentação dos Presidios.
Art. 12. Quando alguma praça se distinguir pela plantação e colheita de mantimentos superior á de qualquer outra, o respectivo Commandante, alêm do que puder fazer para anima-la, dará parte ao Presidente da Provincia, a fim de que o individuo seja premiado convenientemente.
Art. 13. Os serviços das roças communs, nos quaes os Commandantes devem empregar sempre todos os braços disponiveis, serão feitorisados por Inferiores, ou mesmo por praças sem graduação, huma vez que sejão capazes para isso. Os mesmos Commandantes devem visitar as roças ao menos huma vez por semama, e lançar no caderno diario, de que adiante se tratará, aquillo que tiverem observado relativamente ao estado das plantações.
Art. 14. Em quanto existirem receios de ataque da parte dos Indigenas, haverá nas roças, á vista dos trabalhadores, huma guarda, nunca menor de 3 praças, convenientemente municiada, a fim de se evitar que os trabalhadores sejão surprendidos.
Art. 15. Quando se concluir qualquer colheita da roça commum, os Commandantes dos Presidios darão parte ao Presidente da Provincia da quantidade de mantimento que se houver colhido, avaliada em mãos ou em alqueires como se usa na Provincia.
Art. 16. Reservar-se-ha em cada Presidio, no sitio destinado para o Arraial, huma porção razoavel de terreno, nunca menor de 40 braças em quadro, para Praça, com lugar marcado para huma Igreja que se construirá logo que for possivel.
Art. 17. Os soldados casados podem ter habitações proprias separadas do quartel commum, para cuja construcção deverão os Commandantes prestar-lhes o auxilio necessario. Não poderão porêm edificar suas casas, levantar cercas, ou abrir valas, senão segundo o alinhamento traçado pelos Commandantes.
A disposição deste Artigo he applicavel aos paizanos que residirem nos Presidios.
Art. 18. Os alinhamentos no Arraial dos Presidios serão feitos em linhas rectas e parallelas: os que as houverem de atravessar serão em linhas perpendiculares. Nenhuma rua nos Presidios poderá ter menos de 40 palmos de largura.
Art. 19. As terras para roças e plantações nos Presidios serão distribuidas ás praças pelos respectivos Commandantes. As sortes de terras destinadas para aquelles que não tiverem familia serão de 40 braças de frente com 80 de fundo. Aos que tiverem familia, que possa trabalhar nas roças, serão as sortes de terras de estensão dupla, e mesmo tripla, conforme o numero das pessoas da familia.
A extensão acima marcada poderá ser augmentada quando o terreno não for todo apropriado á cultura.
Art. 20. As sortes de terra marcadas ás diversas praças dos Presidios serão contiguas humas ás outras, sempre que a natureza do terreno o permittir.
Art. 21. O soldado que depois de escuso do serviço continuar a residir no Presidio, e tiver beneficiado a sua sorte de terras por espaço de 3 annos, adquire dominio na dita sorte de terras, de que poderá livremente dispor por qualquer maneira; ficando todavia sujeito ao que decretar o Poder Legislativo do Imperio a respeito das terras nacionaes.
Art. 22. O Presidente da Provincia, precedendo informação dos Commandantes dos Presidios, passará titulo de propriedade da sorte de terras, com declaração da sua extensão, e confrontações, aos soldados que preencherem a condição do Artigo antecedente.
Art. 23. Os paizanos que forem estabelecer-se nos Presidios, alêm dos soccorros que o Governo lhes mandar prestar, terão tambem huma sorte de terras em tudo regulada pela maneira que fica determinada para os soldados.
Art. 24. Tambem terá huma sorte de terras qualquer preso que coucluido o tempo de sua condemnação, tendo dado provas de bom comportamento, quizer ficar estabelecido no Presidio, e occupar-se na lavoura. Alêm disto terá direito por espaço de hum anno aos soccorros alimentares prestados pelo Governo, ou fique no Presidio para se empregar na lavoura, ou para exercer algum officio mechanico; consistindo os mesmos soccorros em huma etape, que será fixada pelo Presidente da Provincia.
CAPITULO IV
Das casas, das embarcações, e dos utensis pertencentes aos Presidios
Art. 25. Haverá em cada Presidio huma Capella destinada para o Culto divino; huma casa para residencia do Commandante; hum quartel commum com casa forte para guarda de presos; hum paiol, ou celleiro commum; huma casa para artificios empregados na lavoura, como moinho, monjolo, bolandeira, &c.: hum telheiro em lugar proprio para guarda das embarcações, hum rancho espaçoso para passageiros.
Art. 26. Em quanto se não ordena a construcção de huma Capella, haverá em cada Presidio na casa do Commandante huma sala ou camara decente destinada para oração, onde nos dias santificados pela Igreja se reunirá a povoação do Presidio para orar, segundo se usa no Paiz em falta do sacrificio da Missa.
Art. 27. Ficará reservada em qualquer das sobreditas casas hum salão para guarda dos objectos pertencentes á Fazenda Publica.
Art. 28. Haverá em cada Presidio o numero conveniente de embarcações que serão empregadas.
§ 1º Em pesca e caça para o rancho commum dos Presidios.
§ 2º Na conducção de Officios ao Governo pela maneira adiante declarada.
§ 3º Na conducção de socorros de viveres.
§ 4º Em socorro aos navegantes da carreira do Pará por meio de emprestimo, ou ajudando os descarretos dos barcos grandes nas passagens das cachoeiras.
§ 5º Em diligencias tendentes a manter a ordem nas tripolações, e a salvar carregamentos que estiverem por qualquer modo em risco de perder-se.
Art. 29. As embarcações devem ser conservadas sempre promptas para o serviço, calafetadas, breadas e alcatroadas. Aquellas que não forem empregadas em serviço diario, devem estar abrigadas do sol, mas nunca mettidas a pique, ou alagadas. Cada huma deve ter o maior numero de remos, com que puder ser tocada, a fim de que, em caso de necessidade, possão servir todas ao mesmo tempo e com a maxima velocidade.
Art. 30. Haverá em cada Presidio, alêm do armamento e correame das praças, e da munição convenientemente proporcionada ás circunstancias da localidade, toda a ferramenta necessaria para o reparo dos edificios e embarcações do Presidio. Todos estes objetos devem ser guardados, quando não estiverem em serviço no armazem de que trata o Art. 27.
CAPITULO V
Da escripturação, da fiscalização, e da correspondencia com o Governo
Art. 31. Deve haver em cada Presidio hum inventario de todos os objectos pertencentes à Fazenda Pública, e quando algum extraviado, far-se-ha declaração disso no inventario, e se dará parte ao Governo.
Art. 32. Quando se augmentar por meio de compra, ou remessa feita pelo Governo, ou por trabalho da gente do Presidio, o numero de objectos que devem estar inventariados, far-se-ha declaração no inventario, como fica determinado no Artigo antecedente para o caso de diminuição.
Art. 33. Não devem ser lançados no inventario os objectos que o Governo remetter para serem distribuidos como brindes pelos Indios. Aquillo porêm que for manufacturado nas officinas dos Presidios, como anzoes, arpões e peças de ferramenta, deve ser lançado no inventario.
Art. 34. Na entrega do commando dos Presidios, os Commandantes se regularão pelo inventario existente, e trocarão relações, com declaração de entrega e recebimento dos objectos inventariados.
Art. 35. Os Commandantes dos Presidios já fundados, immediatamente que receberem o presente Regulamento, remetterão ao Governo hum inventario do que existe nelles, e guardarão huma copia para ir servindo como fica dito.
Art. 36. Haverá em cada Presidio hum caderno diario, em que os Commandantes lancem os acontecimentos do dia, como sejão a distribuição das praças pelos diversos serviços, a chegada ou passagem de barcas, ou de qualquer outra embarcação, pelo Presidio, com declaração de seu destino, do numero das pessoas da tripolação, e dos nomes dos passageiros e do dono; a visita de Indios ao Presidio; o comportamento havido para com huns e outros por parte da gente do Presidio, e vice-versa; as transacções, dadivas, emprestimos, vendas ou permutas que se houver feito; e quaesquer outros acontecimentos, de que importa ao Governo ter conhecimento.
Art. 37. Estes diarios serão escriptos pelos Commandantes dos Presidios em cadernos anteriormente numerados e rubricados pelos mesmos Commandantes, com termos de abertura e de encerramento. Para cada mez se fará hum caderno na fórma aqui declarada. Concluida a escripturação do dia, na qual se declarem os acontecimentos nelle occorridos, o Commandante assignará, continuando a mesma marcha em todos os mais dias.
Art. 38. Do dia 1º de cada mez até o dia 4 impreterivelmente, os Commandantes dos Presidios devem remetter ao Governo os seguintes papeis.
§ 1º Huma copia da alteração que tiver soffrido o inventario ou livro de carga pelas entradas e consumo de generos.
§ 2º Hum mappa de todas as praças da guarnição do Presidio, com declaração de quaes pertencem á Compapanhias de Pedestres, e quaes ao Corpo fixo; bem como das que se achão promptas, ou doentes, em serviço (militar ou agricola) dentro do Presidio, ou em diligencia fóra delle.
§ 3º Huma relação nominal de todas as outras pessoas existentes no Presidio, com declaração de seu estado, idade, profissão e relações de parentesco com os militares.
§ 4º Huma informação circunstanciada de tudo quanto tiver occorrido no mez antecedente acerca das tribus selvagens que habitarem nas visinhanças do Presidio, assim como de suas relações com a gente do mesmo Presidio, e das disposições que tiverem manifestado de commerciar e de viver pacificamente.
§ 5º O caderno diario do mez antecedente, do qual deverá ficar hum copia archivada no Presidio.
§ 6º Huma informação circunstanciada do estado das obras e das plantações existentes no Presidio, com a indicação dos meios necessarios para o adiantamento daquellas e melhoramento destas.
Art. 39. A correspondencia de que trata o Artigo antecedente será remettida ao Governo em data de 1 a 4 de cada mez pelo methodo seguinte. A do Commandante do Presidio Leopoldina será remettida ao Subdelegado da Freguezia de Santa Rita por huma parada de hum a dois soldados somente. A do Commandante do Presidio de Santa Isabel será remettida ao Commandante do destacamento de Jamimbú.
Art. 40. Não obstante o disposto nos Artigos antecedentes, havendo algum caso extraordinario, será immediatamente communicado ao Governo, trazendo o Officio no sobrescripto as palavras - logo, logo e logo, a fim de que tanto o Subdelegado de Santa Rita, como o Commandante do destacamento de Jamimbú lhe dem prompta expedição, conforme as ordens do Governo.
Art. 41. A correspondencia do Governo para os dois mencionados Presidios será enviada por intermedio dos referidos Subdelegado de Santa Rita e Commandante do destacamento de Jamimbú.
Art. 42. A correspondencia dos Commandantes de Presídios com o commando do Corpo fixo, relativa á economia e disciplina da guarnição, deve acompanhar a que pertence ao Governo nas mesmas datas, e reciprocamente irá com a do Governo a do referido Commandante de Corpo fixo.
CAPITULO VI
Dos soccorros e auxilio aos navegantes da carreira do Pará
Art. 43. Os soccorros e auxilio aos navegantes da carrreira do Pará consistem na pratica de todos os bons officios da hospitalidade; na venda de generos alimentares, ou troca por outros que convenhão ao Presidio; no emprestimo de embarcações; na coadjuvação nos descarretos; no fornecimento de huma a duas praças para ajudar a tripolação até o Presidio mais proximo; na guarda ou deposito de quaesquer generos que queirão deixar no Presidio; finalmente na execução de medidas tendentes a manter, a ordem nas tripolações e a evitar prejuizos.
Art. 44. Se constar ao Commandante de qualquer Presidio que a bordo de barcos de negocio reina a insubordinação, deverá mandar immediatamente a esse barco huma escolta sufficiente, a fim de evitar não só algum attentado contra a segurança individual, como tambem o extravio ou perda de mercadorias.
Art. 45. Quando tambem constar que algum carregamento foi abandonado por diserção da tripolação de hum barco, ou por ataque de Indios, deverá o Commandante do Presidio mais visinho providenciar, a fim de que o mesmo carregamento se não perca.
Art. 46. No caso de estar a tripolação de qualquer barco insubordinada a ponto de poder prejudicar por qualquer modo aos donos do barco, ou do carregamento, deve o Commandante do Presidio onde o barco se achar, de intelligencia com os mesmos donos, ou seus encarregados, prender os insubordinados e remette-los á Capital com huma parte circunstanciada do que houverem praticado, a fim de se proceder convenientemente contra elles.
Art. 47. Quando as praças e outros moradores dos Presidios não tiverem os generos procurados pelas negociantes, poderão ser vendidos os do paiol commum, com tanto que seja do que se tiver calculado que sobrará. Os Commandantes mandarão fazer a venda pelo Almoxarife do Presidio, ou por outra praça, não se, entendendo por isso que negocião.
Art. 48. He prohibido o emprestimo de embarcações a quaesquer negociantes, que as pedirem de lugar onde possão prover-se dellas sem prejuizo do Presidio.
CAPITULO VII
Disposições geraes
Art. 49. Os Commandantes de Presidios são Empregados de Commissão; serão conservados em quanto bem servirem, e terão alêm do soldo de sua patente huma gratificação mensal de trinta mil réis, paga pela rubrica em favor da navegação do Araguaya. Esta ultima disposição fica dependente da approvação do Governo Imperial.
Art. 50. Os Commandantes dos Presidios devem fornecer ao Inspector Geral dos mesmos Presidios, que opportunamente se nomeará, todas as informações que exigir, verbaes e escriptas, ácerca da execução deste Regulamento, e de todo o seu comportamento no commando.
Art. 51. Haverá nos dias 1º e 15 de cada mez revista de armamento e de fardamento. O armamento deve existir em arrecadação sob a responsabilidade dos Commandantes, que poderão encarregar da mesma arrecadação algum Inferior ou soldado que saiba ler e escrever, sem com isso deixarem de ser os principaes responsaveis.
Art. 52. Os Commandantes de Presidios guarnecidos por 20, ou mais praças, nomearão hum Official Inferior, ou mesmo soldado que saiba ler, escrever e contar, e que seja de boa conducta, para servir de Escrivão e Almoxarife do Presidio, ficando por isso dispensado de qualquer outro serviço, excepto das revistas de armamento e exercicios, ou instrucção militar.
Art. 53. A instrucção ás praças dos Presidios será dada pelos respectivos Commandantes nos dias de revista de armamento e fardamento.
Art. 54. Os presos condemnados, que forem cumprir sentenças nos Presidios, serão empregados de dia nos trabalhos das roças, e outros serviços dos mesmos Presidios; á noite serão recolhidos a prisão segura; ficando os homens sempre separados das mulheres tambem condemnadas, que deverão dormir presas e com segurança.
Art. 55. Os Commandantes de Presidios não consentirão que nelles residão pessoas suspeitas, nem que ahi se demorem por mais de dois dias.
Art. 56. Os barcos e quaesquer outras embarcações que passarem pelos Presidios deverão ahi aportar. Os Commandantes deverão fazer as indagações e pesquizas necessarias, sempre com a maior moderação, a fim de evitar-se que neles escapem desertores; criminosos, presos fugidos das cadeias, pessoas suspeitas, objectos furtados e escravos fugidos ou furtados; sendo os individuos , que se acharem em qualquer das circunstancias declaradas, presos; e os objectos apprehendidos, e tudo remettido para a Capital, com participação circunstanciada.
Art. 57. Tambem devem os Commandantes dos Presidios prender, e remetter para a Capital as praças e quaesquer outras pessoas que commetterem delictos, pelos quaes devão ser processadas no foro commum ou militar.
Art. 58. Não he permittido residirem mulheres solteiras nos Presidios, excepto as que se acharem cumprindo sentença, e as parentas honestas de soldados do Presidio, ou de paizanos que ahi se acharem estabelecidos.
Art. 59. As primeiras, isto he, as que estiverem cumprindo sentença, serão empregadas em serviços analogos ao seu sexo, como lavagem de roupa, costuras, e cozinha de guarnição do Presidio, e especialmente dos doentes. As segundas só poderão ser empregadas no serviço dos parentes em cuja companhia estiverem.
Art. 60. Aos soldados dos Presidios que nelles tiverem familia, alêm dos vencimentos militares que lhes competirem, se abonará mais huma ração ou etape por espaço de dois annos para auxilio da familia. Quando as pessoas da familia excederem de 3, o supprimento será de duas rações ou etapes.
Art. 61. Considerar-se-ha familia do soldado a mulher, a mãi ou sogra, as irmãs honestas e irmãos menores, filhos, sobrinhos, e netos legitimos, ou naturaes, que viverem em sua companhia.
Art. 62. As rações ou etapes serão reguladas, pelo methodo seguinte.
Farinha 1/40 de alqueire por dia.
Feijão 1/8 de medida por dia.
Arroz, quando não se der feijão, 4 onças por dia.
Toucinho 2 onças por dia.
Carne secca 1/2 libra por dia.
Carne fresca, não se dando secca, huma libra por dia.
Sal huma onça por dia.
Art. 63. As praças que adoecerem, serão tratadas, ou em suas casas se as tiverem, com as precisas commodidades, ou em huma enfermaria commum. Quando os Commandantes julgarem alguma praça enferma em estado perigoso, ou de difficil cura, receiando por isso medica-la, deverão faze-la seguir com as precisas cautelas para o Hospital da Capital.
Art. 64. Os filhos dos militares e dos paizanos que residirem nos Presidios sob a protecção do Governo, isto he, recebendo soccorros alimentares e outros auxilios, são obrigados a aprender hum officio daquelles em que trabalharem os militares ou paizanos. Devem porêm merecer a preferencia os officios de ferreiro e de carpinteiro, aos de alfaiate e sapateiro, quando destes dous ultimos officios houver hum numero sufficiente para as necessidades da Povoação.
Art. 65. Todos os menores desde a idade de cinco annos, qualquer que seja o sexo, serão obrigados a aprender a ler, escrever e contar, logo que houver pessoa nomeada pelo Governo para ensinar no Presidio.
Art. 66. Não poderão os paes ou mães empregar seus filhos em qualquer serviço, que obsto ao cumprimento dos deveres escolares.
Art. 67. Logo que alguma praça de qualquer Presidio se habilitar a servir de interprete no trato com os Indios, o Commandante respectivo dará parte ao Governo, a fim de ordenar-lhe alguma recompensa.
Art. 68. Nas diligencias para fóra dos Presidios devem ser empregadas de preferencia aquellas praças que não inspirarem suspeitas de deserção.
Art. 69. Póde-se exercer nos Presidios qualquer officio ou industria licita. Não se poderá porêm fabricar polvora, ou cortir couros senão a hum distancia de 800 braças do quartel do commando do Presidio; salvo se houver morro ou serra de permeio, em cujo caso será permittida qualquer das duas industrias a menor distancia.
Art. 70. He prohibida a mineração ou exploração de veias e terras mineraes, excepto a do sal gemma. Logo que se descobrir em qualquer Presidio ou perto delle ouro, diamantes, e qualquer outro metal, ou pedra preciosa, o Commandante obstará á sua exploração, e dará immediatamente parte ao Governo da Provincia, transmittindo-lhe todas as informações que tiver a semelhante respeito.
Art. 71. Se occorrer algum caso que não esteja prevenido no presente Regulamento, e que exija prompta solução, os Commandantes dos Presidios providenciarão como julgarem conveniente, e darão conta de seu procedimento ao Governo, expondo os motivos que o justificarem.
Palacio do Rio de Janeiro em 2 de Janeiro de 1851.
Visconde de Mont'alegre.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1851, Página 1 Vol. 1 pt II (Publicação Original)