Legislação Informatizada - DECRETO Nº 4.978, DE 12 DE JUNHO DE 1872 - Publicação Original
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DECRETO Nº 4.978, DE 12 DE JUNHO DE 1872
Promulga o tratado de extradição entre o Imperio do Brasil e o Reino de Hespanha.
Tendo-se concluido e assignado nesta Côrte, aos 16 dias de Março do corrente anno, um tratado de extradição entre o Brasil e a Hespanha, e, achando-se este acto mutuamente ratificado, havendo-se trocado as ratificações em 8 do presente mez: Hei por bem Ordenar que o dito tratado seja observado e cumprido tão inteiramente como nelle se contém.
Manoel Francisco Correia, do Meu Conselho, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros, o tenha assim entendido e expeça para este fim os despachos necessarios.
Palacio do Rio de Janeiro, aos doze dias do mez de Junho de mil oitocentos setenta e dous, quinquagesimo primeiro da Independencia e do Imperio.
Com a rubrica de Sua Magestade o Imperador.
Manoel Francisco Correia.
Nós a Princeza Imperial, herdeira presumptiva da Corôa, Regente em Nome de Sua Magestade o Senhor D. Pedro II, por Graça de Deus e Unanime Acclamação dos Povos, Imperador Constitucional e Defensor Perpetuo do Brasil, etc. Fazemos saber a todos os que a presente carta de confirmação virem, que aos dezaseis dias do mez de Março de mil oitocentos setenta e dous concluiu-se e assignou-se nesta muito leal e heroica cidade de S. Sebastião do Rio de Janeiro entre Nós e Sua Magestade El-Rei de Hespanha, pelos respectivos plenipotenciarios, munidos dos competentes plenos poderes, um tratado de extradição do teor seguinte:
Sua Alteza a Princeza Imperial, Regente do Brasil em Nome de Sua Magestade o Imperador o Senhor D. Pedro II, e Sua Magestade El-Rei de Hespanha, tendo julgado util regular por meio de um tratado a extradição reciproca dos criminosos, que se refugiarem de um dos dous paizes no outro, resolveram nomear para este fim seus plenipotenciarios, a saber:
Sua Alteza Imperial a Regente em Nome de Sua Magestade o Imperador do Brasil a S. Ex. o Sr. Manoel Francisco Correia, do Conselho de Sua dita Magestade, Deputado á Assembléa Geral Legislativa, Cavalleiro da Ordem do Nosso Senhor Jesus Christo, Bacharel formado em sciencias sociaes e juridicas, Ministro e Secretario de Estado dos Negocios Estrangeiros, etc., etc., etc.
E Sua Magestade El-Rei de Hespanha ao Sr. D. Dionisio Roberts, commendador de numero da Real Ordem Americana de Izabel a Catholica e da Real e Distincta Ordem de Carlos III, cavalleiro da de S. João de Jerusalém e da de Leopoldo da Belgica, Encarregado de Negocios de Hespanha, etc., etc., etc.
Os quaes, depois de haverem communicado reciprocamente seus plenos poderes, achados em boa e devida fórma, convieram nos artigos seguintes:
Art. 1º O Governo Brasileiro e o governo hespanhol obrigam-se pelo presente tratado á reciproca entrega de todos os individuos refugiados de Hespanha e provincias ultramarinas no Brasil e deste Imperio em Hespanha e provincias ultramarinas, accusados ou condemnados como autores ou complices de qualquer dos crimes declarados no art. 3º pelos tribunaes daquella das duas nações em que o crime deva ser punido.
Art. 2º A obrigação da extradição não se estende em caso algum aos nacionaes dos dous paizes ou aos individuos que nelles se houverem naturalisado antes da perpetração do crime.
Art. 3º A extradição deverá realizar-se a respeito dos individuos accusados ou condemnados como autores ou complices dos seguintes crimes:
1º Homicidio, comprehendidos o assassinio, o parricidio, o envenenamento e o infanticidio;
2º A tentativa de qualquer dos crimes especificados no numero antecedente;
3º Lesões corporaes graves segundo a lei dos dous paizes;
4º Violação, estupro, rapto e outros attentados contra o pudor, uma vez que se dê a circumstancia da violencia; polygamia;
5º Occultação, subtracção e substituição de menor; usurpação do estado civil;
6º Roubo;
7º Incendio voluntario; damno nos caminhos de ferro do qual resulte ou possa resultar perigo para a vida dos passageiros;
8º Peculato ou malversação dos dinheiros publicos; estellionato, abuso de confiança ou subtracção de dinheiro, fundos, documentos e quaesquer titulos de propriedade publica ou particular por pessoas á cuja guarda estejam confiados ou que sejam associadas ou empregadas no estabelecimento em que o crime foi commettido;
9º Falsificação, alteração, importação, introducção e emissão de moeda e papeis de credito com curso legal nos dous paizes; fabrico, importação, venda e uso de instrumentos com o fim de fazer dinheiro falso, apolices ou quaesquer outros titulos da divida publica, notas dos bancos ou quaesquer papeis dos que circulam como se fossem moeda; falsificação de actos soberanos, sellos do Correio, estampilhas, sinetes, carimbos, cunhos e quaesquer outros sellos do Estado e uso, importação e venda desses objectos; falsificação de escripturas publicas ou particulares, letras de cambio e outros titulos do commercio e uso desses papeis falsificados;
10. Barataria e pirataria, comprehendido o facto de alguem apossar-se de navio de cuja equipagem fizer parte por meio de fraude ou violencia contra o capitão ou quem o substituir; abandono da embarcação fóra dos casos previstos na lei, trafico de escravos;
11. Quebra fraudulenta, perjurio em materia criminal;
12. Reducção de pessoa livre á escravidão.
Paragrapho unico. Os individuos accusados ou condemnados por crimes aos quaes conforme a legislação da sua nação corresponder a pena de morte, sómente serão entregues com a clausula de que essa pena lhes será commutada.
Art. 4º A extradição será reclamada por via diplomatica e não poderá ser concedida senão á vista do traslado do despacho de pronuncia ou da sentença condemnatoria, extrahida dos autos de conformidade com as leis do Estado reclamante.
Estes documentos serão, sempre que fôr possivel, acompanhados dos signaes caracteristicos do accusado ou condemnado e de uma copia do texto da lei, applicavel ao facto criminoso que lhe é imputado.
Art. 5º Nos casos urgentes cada um dos dous Governos, firmado em sentença condemnatoria, despacho de pronuncia ou mandado de prisão, poderá pelo meio mais expedito pedir e alcançar a prisão do condemnado ou accusado, com a condição de apresentar com a brevidade possivel o documento invocado na instancia.
Art. 6º Se dentro do prazo de tres mezes, contados do dia em que o condemnado ou accusado fôr posto á disposição do agente diplomatico, este não o tiver remettido para o Estado reclamante, dar-se-ha a liberdade ao dito condemnado ou accusado, que não poderá ser de novo preso pelo mesmo motivo.
Neste caso as despezas correrão por conta do Governo que dirigiu a instancia.
Art. 7º Quando o accusado fôr estrangeiro nos dous Estados contractantes, o Governo que deve conceder a extradição informará o do paiz ao qual pertence o individuo reclamado do pedido de extradição, e, se este ultimo Governo reclamar o culpado para o mandar julgar pelos seus tribunaes, o Governo que tiver recebido a instancia poderá, a seu arbitrio, entregal-o á nação em cujo territorio commetteu o delicto ou áquella de quem fôr subdito.
Art. 8º Se o accusado ou condemnado, cuja extradição fôr pedida em conformidade do presente tratado por uma das partes contractantes, fôr igualmente reclamado por outro ou outros Governos, em virtude de crimes commettidos em seus respectivos territorios, será elle entregue ao Governo cuja instancia houver sido primeiro apresentada ou tiver data mais antiga, quando as apresentações forem simultaneas.
Art. 9º Em caso algum se concederá a extradição por crimes politicos ou por factos connexos com elles.
Não se reputará delicto politico, nem facto connexo com elle, o attentado contra os soberanos dos dous Estados contractantes e os membros de suas respectivas familias, quando esse attentado constituir o crime de homicidio e envenenamento.
Art. 10. Os individuos, cuja extradição houver sido concedida, não poderão ser julgados ou punidos por crimes politicos anteriores á extradição, nem factos connexos com elles, nem por qualquer outro crime anterior distincto do que motivar a extradição, salvo se fôr dos declarados no art. 3º e tiver sido perpetrado posteriormente á celebração deste tratado.
Art. 11. A extradição tambem não será concedida, quando, segundo a lei do paiz em que o criminoso estiver refugiado, se achar prescripta a pena ou acção criminal.
Art. 12. Se o individuo reclamado achar-se perseguido ou detido no paiz onde se refugiou por obrigação contrahida com pessoa particular, a sua extradição terá comtudo lugar, ficando salvo á parte lesada fazer valer seus direitos perante a autoridade competente.
Art. 13. Os individuos reclamados, que se acharem condemnados ou em processo por crimes commettidos no paiz em que se asylaram, serão entregues depois do julgamento definitivo ou de cumprirem a pena que lhes tiver sido ou fôr imposta.
Art. 14. Serão sempre entregues os objectos subtrahidos ou encontrados em poder dos réos, os instrumentos e utensilios de que se tiverem servido para a perpetração do crime e qualquer outra prova de convicção, quér se realize a extradição, quér esta não chegue a realizar-se por morte ou fuga do culpado.
Ficam, todavia, resalvados os direitos de terceiro sobre os mencionados objectos, os quaes nesse caso serão devolvidos sem despeza alguma depois de terminado o processo.
Art. 15. As despezas feitas com a captura, custodia, sustento e transporte do individuo, cuja extradição fôr concedida, assim como os gastos com a remessa dos objectos especificados no artigo antecedente, ficarão a cargo dos dous Governos nos limites de seus respectivos territorios.
As despezas, porém, com o transporte por mar correrão por conta daquelle que reclamar a extradição.
Art. 16. Quando no seguimento de uma causa crime não politica, se julgar necessario o depoimento de testemunhas residentes no outro, será enviada para esse fim, por via diplomatica, carta de inquirição, á qual se dará cumprimento, observando-se as leis do Estado onde as testemunhas forem inquiridas.
Os dous Governos renunciam a qualquer reclamação que tenha por objecto a restituição das despezas resultantes do cumprimento da commissão rogatoria, uma vez que não se trate de exames criminaes, commerciaes ou medico-legaes.
Art. 17. O presente tratado terá vigor por cinco annos contados do dia da troca das ratificações e continuará a subsistir passado esse prazo, emquanto um dos dous Governos não o denunciar com anticipação de um anno.
Será ratificado e as ratificações trocadas no Rio de Janeiro com a possivel brevidade.
Em fé do que nós, plenipotenciarios de Sua Alteza a Princeza Imperial, Regente do Brasil em Nome de Sua Magestade o Imperador o Senhor D. Pedro II, e de Sua Magestade El-Rei de Hespanha, assignamos este tratado em duplicado e nelle puzemos o nosso sello.
Feito no Rio de Janeiro, aos 16 dias de mez de Março do anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1872.
(L. S.) - Manoel Francisco Correia.
(L. S.) - Dionisio Roberts.
E sendo-Nos presente o mesmo tratado, cujo teor fica acima inserido, e bem visto, considerado e examinado por Nós tudo o que nelle se contém, o approvamos, ratificamos e confirmamos, assim no todo, como em cada um dos seus artigos e estipulações, e pela presente o damos por firme e valioso para os seus devidos effeitos, promettendo em fé e palavra imperial observal-o e cumpril-o inviolavelmente e fazel-o cumprir e observar por qualquer modo que possa ser.
Em testemunho e firmeza do que fizemos passar a presente carta, por Nós assignada, sellada com o sello grande das armas do Imperio e referendada pelo Ministro e Secretario de Estado abaixo assignado.
Dada no Palacio do Rio de Janeiro, aos vinte e sete dias do mez de Março do anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos setenta e dous.
(L. S.) - ISABEL, PRINCEZA IMPERIAL REGENTE.
Visconde do Rio Branco.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1872, Página 473 Vol. 1 pt. II (Publicação Original)