Legislação Informatizada - Decreto nº 1.980, de 28 de Setembro de 1857 - Publicação Original
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Decreto nº 1.980, de 28 de Setembro de 1857
Concede á Companhia que incorporarem Luiz de Carvalho Paes de Andrade, e outros, privilegio exclusivo, por tempo de 66 annos, para construcção de huma Estrada de ferro, ligando o porto de Tamandaré á parte inferior do rio Una, com a extensão nunca maior de sete mil braças.
Attendendo ao que Me representárão Luiz de Carvalho Paes de Andrade, Antonio Marques de Amorim, e Henrique Augusto Milet, e de conformidade com a Minha immediata Resoluçõo de cinco do corrente mez, tomada sobre Parecer da Secção dos Negocios do Imperio do Conselho d'Estado, exarado em Consulta de tres: Hei por bem, nos termos do Decreto Nº 641 de 26 de Junho de 1852, e em vistude do Art. da Lei Nº 939 de 26 de Setembro do corrente anno, conceder á Companhia que incorporarem, e que terá sua séde na Cidade do Recife, privilegio exclusivo por tempo de sessenta e seis annos para construcção de huma Estrada de ferro destinada a ligar o porto de Tamandaré á parte inferior do rio Una, na Provincia de Pernambuco, com a extensão nunca maior de sete mil braças, mediante as condições, que com este baixão, assignadas pelo Marquez de Olinda, Conselheiro d'Estado, Presidente do Conselho de Ministros, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do lmperio, que assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em vinte oito de Setembro de mil oitocentos cincoenta e sete, trigesimo sexto da lndependencia e do Imperio.
Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.
Marquez de Olinda.
CONDIÇÕES A QUE SE REFERE O DECRETO DESTA DATA, PARA A CONSTRUCÇÃO DE HUMA ESTRADA DE FERRO, QUE DEVE COMEÇAR NO PORTO DE TAMANDARÉ, PROVINCIA DE PERNAMBUCO, POR MEIO DE HUMA COMPANHIA FORMADA POR LUIZ DE CARVALHO PAES DE ANDRADE, ANTONIO MARQUES DE AMORIM, E HENRIQUE AUGUSTO MILET
1ª O Governo Imperial concede á Companhia formada por Luiz de Carvalho Paes de Andrade, Antonio Marques de Amorim, e Henrique Augusto Milet, e cuja sede será na Cidade do Recife, o privilegio exclusivo para a construcção de huma Estrada de ferro, que ligue o porto de Tamandaré á parte inferior do rio Una com a extensão nunca maior de sete mil braças.
2ª A duração do privilegio será de sessenta e seis annos; com os seguintes favores e isenções.
3ª Durante o tempo do privilegio, não se poderá conceder emprezas de outros caminhos de ferro dentro da distancia de cinco leguas, tanto de hum, como de outro lado, e na mesma direcção deste, salvo se houver accordo com a Companhia. Esta prohibição não comprehende a da construcção de outros caminhos de ferro, que, ainda partindo do mesmo ponto, mas seguindo direcções diversas, possão aproximar-se accidentalmente de algum ponto da estrada privilegiada, ou ainda corta-la, com tanto que dentro da zona privilegiada não possão receber mercadorias, e passageiros.
4ª Os pontos intermedios da linha contractada ficão dependentes de accordo posterior entre o Governo e a Companhia, depois que esta houver precedido a todos os exames, e trabalhos preparatorios, apresentando a respectiva planta, que será submettida á definitiva approvação do Governo.
5ª A Companhia poderá construir também linhas transversaes de ferro, de madeira, ou de qualquer outra conveniente especie, quando julgue de utilidade para facilitar o transito de generos, e de passageiros para a linha principal; não gosando porêm dos favores para aquelles caminhos que á esta são concedidos, excepto os que forem expressamente designados no contracto.
6ª A Companhia deverá formar-se dentro de hum anno contado da data do presente Decreto; apresentar os planos no prazos de seis mezes; começar os trabalhos dentro de hum anno, e conclui-los dentro de tres, sendo os ultimos tres prazos contados da data da sua formação.
7ª A falta de cumprimento de qualquer das obrigações da condição antecedente fará incorrer na multa de cinco contos de réis, imposta pelo Governo. Paga a multa, o Governo poderá prorogar os mesmos prazos, mas nunca por mais de hum anno. Se passado este ultimo prazo, não estiver satisfeita a condição, alêm de outra multa igual, perderá a Companhia o privilegio, e todos os favores concedidos, salvo se a mora for proveniente de força maior, reconhecida pelo mesmo Governo.
8ª Quando a Companhia tiver perdido o direito ao contracto pela falta da conclusão da obra, conservará a propriedade da parte feita, perdendo sómente o direito á continuação do goso dos favores que pelo contracto lhe tinhão sido concedidos; e será neste caso ainda responsavel pelo valor dos que já tiver recebido; dando-se para este fim a hypotheca nas mesmas obras.
9ª Poderá a Companhia usar do direito de desapropriar na fórma das Leis em vigor, o terreno de dominio particular que for necessario para leito do caminho de ferro, estações, armazens, e mais obras adjacentes, e pelo Governo lhe serão gratuitamente concedidos, para os mesmos fins, os terrenos devolutos que houver, e bem assim os comprehendidos nas sesmarias e posses, salvas as indemnisações que forem de direito. Tambem o Governo lhe concederá o uso das madeiras, e, outros materiaes existentes nos terrenos devolutos, e de que a Companhia tiver precisão para a construcção do caminho de ferro. Os favores deste artigo são extensivos aos caminhos transversaes.
10ª Ficão isentos de direitos de importação, dentro do prazo marcado para a conclusão das obras, os trilhos, machinas e instrumentos que se destinarem á mesma construcção, e bem assim os carros, locomotivas e mais objectos necessarios para começarem os trabalhos da empresa. A mesma isenção he concedida ao carvão de pedra, durante o referido prazo, e o de mais cinco annos depois das obras concluidas, e a linha aberta ao publico em toda a sua extensão. O goso destes favores fica sujeito aos Regulamentos fiscaes para evitar qualquer abuso.
11ª A Companhia se obriga a não possuir escravos, e a não empregar no serviço da construcção do caminho de ferro senão pessoas livres, que, sendo nacionaes, poderão gosar da isenção do recrutamento, bem como da dispensa do serviço activo da Guarda Nacional, e sendo estrangeiros, participarão de todas as vantagens que por Lei forem concedidas aos colonos uteis e industriosos.
12ª Só terão direito de gosar da isenção do serviço activo da Guarda Nacional, e do recrutamento os nacionaes empregados pela Companhia, que estiverem incluidos em huma lista entregue todos os seis mezes ao Presidente da Provincia, e assignada pelo seu Director; não podendo, passado o primeiro semestre, ser nella contemplado o individuo que não tiver tres mezes de effectivo exercicio. Convencida a Companhia de qualquer abuso sobre este importante assumpto em detrimento do serviço publico, poderá ser multada pelo Governo na quantia de quatro contos de réis, e até perderá este favor em caso de reincidencia, se o Governo o julgar conveniente.
13ª O caminho de ferro não impedirá o livre transito dos caminhos actuaes, e de outros que para commodidade publica se abrirem; nem a Companhia terá direito de exigir taxa alguma pela passagem de outras estradas, de qualquer natureza, nos pontos de intersecção.
14ª O Governo poderá fazer em toda a extensão do caminho de ferro as construcções e apparelhos necessarios ao estabelecimento de huma linha telegraphica electrica; responsabilisando-se a Companhia pela guarda dos fios, e apparelhos eletricos, e prestando-se a transportar gratuitamente os agentes da telegraphia, que viagem em razão do seu emprego. A Companhia terá o direito de fazer semelhante construcção, se o Governo a não quizer executar por sua conta; sendo neste caso gratuito o serviço prestado ao mesmo Governo.
15ª As malas do Correio, e seus conductores, bem como quaesquer sommas de dinheiro pertencentes aos Cofres Publicos, serão conduzidas gratuitamente pelo caminho de ferro. Igual vantagem terão dous passageiros ao serviço do Governo em cada viagem, e a carga não excedente de dez arrobas. O que demais accrescer a Companhia se obriga a transportar mediante o abatimento de vinte por cento do preço commum.
16ª Se o Governo mandar tropas para qualquer ponto, a Companhia se obriga a pôr immediatamente á sua disposição por metade da tarifa estabelecida, todos os meios de transporte que possuir, e a empregar tambem nesta conducção os pertencentes ao Governo, que forem apropriados ao serviço da linha.
17ª Por igual preço fará a Companhia transportar os presos, e seus respectivos guardas, prestando o Governo os carros proprios, e com a necessaria segurança.
18ª Durante o previlegio, a Companhia perceberá os preços de tranportes de mercadorias, e passageiros segundo huma Tabella que o Governo, de accordo com ella, organisará conforme as seguinte bases:
1ª Para os generos de exportação e de producção do
paiz se formará huma Tabella cujo maximo será regulado nos Estatutos, tomando-se
por base que o preço dos tranportes nos primeiros dez annos não deverá exceder á
metade do que actualmente exigem os almocreves, e depois daquelle prazo á quarta
parte.
2ª Para os generos de importação o maximo
será de 30 réis pelo mesmo peso e distancia.
3ª O
preço da conducção para os objectos de grande volume, e de pequeno peso, como
sejão mobilias, caixões de chapéos, &c., poderá ser elevada ao duplo. Tambem
poderão ser sujeitos a huma Tabella especial os de conducção perigosa como seja
a polvora &c., e os que em razão de sua fragilidade, como pianos, louça,
vidros &c., ou por seu valor, como prata, ouro, joias &c., obrigão a
Companhia á maior responsabilidade; estes preços deverão ser especificadamente
declarados.
19ª Logo que a Companhia puder fazer dividendos de 12 por cento o preço do transporte será redusido, reformando o Governo as Tabellas, ouvindo para este fim a mesma Companhia. De qualquer maneira haverá todos os cinco annos revisão das referidas Tabellas, para receberem as modificações que o bem publico, conciliado com o interesse da empresa, aconselhar.
20ª Se o Governo entender de conveniencia publica effectuar o resgate da concessão do caminho de ferro, o poderá fazer, mediante previa indemnisação á Companhia, que será regulada da maneira seguinte:
1º Não poderá ter lugar este resgate, salvo de
accordo com a Companhia, senão passados vinte annos da duração do privilegio.
2º O preço do resgate será regulado pelo termo
medio do rendimento liquido dos ultimos tres annos.
3º A Companhia receberá do Governo huma somma em fundos publicos, que dê igual
rendimento.
21ª Ficão concedidas á Companhia as seiscentas braças de terreno que actualmente estão destinadas para uso e serviço da Fortaleza de Tamandaré; sendo porêm reservada a parte que for necessaria para o serviço da mesma Fortaleza, assim como para praças, ruas, cáes, e para edificios publicos, como Igreja, Casa de Camara, Escola, Cadeia, Alfandega, Trapiches, e Officinas publicas: fica entendido que nesta concessão não se comprehendem os terrenos de marinha. Nos Estatutos se deverá assentar a base do maximo preço porque a Companhia poderá alienar esse terreno em favor de terceiros, ou por titulo de de venda, ou por titulo de aforamento.
22ª Para a edificação nesse terreno a Companhia apresentará ao Governo no prazo de seis mezes, contados da sua formação, a planta do terreno com hum plano de edeficios regulares; e sómente depois da approvação deste he que será effectuada a concessão. Seis mezes depois de approvado o plano deverão começar as edificações. O Governo poderá prorogar cada hum destes prazos por outros seis mezes: se no fim de cada huma das prorogações não for preenchida a condição respectiva, o Governo poderá dispor do terreno como bem entender.
23ª O Governo prestará á Companhia, por meio das Autoridades, toda a protecção compativel com as Leis, a fim de que possa ella realisar a arrecadação das taxas estabelecidas; e protegerá com Regulamentos especiaes não só a segurança dos viandantes, como a dos conductores e empregados que a Companhia tiver para fiscalisar a observancia de seus Regulamentos; permittindo-lhe ter guardas-barreiras, que serão Cidadãos Brazileiros morigerados, pagos pela Companhia, e que poderão andar armados, mas sujeitos á inspecção das Autoridades locaes.
24ª Nos Regulamentos do Governo, de conformidade com o § 14 do Art. 1º da Lei de 26 de Junho de 1852, serão tambem estabelecidas regras de policia e de segurança em favor dos proprios caminhos, e do seu uso regular, para prevenir qualquer perigo, que venha ou de estranhos, ou da propria Companhia; impondo o Governo as convenientes multas, e sollicitando do Corpo Legislativo maiores penas, se por experiencia reconhecer necessario.
25ª No caso de que o Governo queira que alguns Engenheiros seus se instruão na construcção de caminhos de ferro a Companhia os admittirá, para que assistão a todos os trabalhos da Empresa.
26. A Companhia não poderá emittir acções ou promessas de acções negociaveis sem que se tenha constituido em sociedade legal com Estatutos approvados pelo Governo.
27. A Companhia terá a faculdade de explorar e lavrar minas de carvão, pedra calcarea, de ferro, chumbo, cobre e de quaesquer outros metaes, ainda preciosos, sem prejuiso de direitos adquiridos por outros, devendo, quando as descobrir, dirigir-se immediatamente ao Governo, para que lhe sejão demarcadas as datas, e estipuladas as condições do seu goso; podendo a Companhia exercer esta faculdade no seguimento da linha do caminho de ferro, e na mesma zona de cinco leguas para cada hum dos lados.
28ª Podendo, não obstante a claresa de todas as estipulações do Contracto, dar-se desaccordo entre o Governo e a Companhia a respeito de seus direitos e obrigações, reconhecendo o Governo a vantagem de huma qualquer decisão, esta será dada por Juizes arbitros, dos quaes hum será da nomeação do mesmo Governo, outro da Companhia, e o terceiro por accordo de ambas as partes; e se este accordo não for possivel, será o terceiro membro o Conselheiro d'Estado mais antigo, e em igualdade de antiguidade o mais velho.
29ª A presente concessão ficará dependente, para seu complemento, de ajuste posterior e definitivo entre o Governo e a Companhia, depois que esta apresentar os trabalhos e esclarecimentos de que trata a condição 4ª, e então, serão determinadas as clausulas e condições, que devão regular o systema da construcção do caminho de ferro, de carros, machinas, e locomotivas, de accordo com os ultimos melhoramentos, a bem da segurança dos passageiros e dos transportes da economia do custeio, da velocidade da marcha, e de todas as mais commodidades e vantagens para o publico; devendo tal ajuste preceder ao começo da obra.
Rio de Janeiro em 23 de Setembro de 1857.
Marquez de Olinda.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1857, Página 292 Vol. 1 pt II (Publicação Original)