Legislação Informatizada - Decreto nº 1.867, de 17 de Janeiro de 1857 - Publicação Original

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Decreto nº 1.867, de 17 de Janeiro de 1857

Autorisa a incorporação nesta Côrte de huma Companhia com a denominação de- Architectonica -, e approva os respectivos Estatutos.

     Attendendo ao que Me representou Francisco José Fialho, e de conformidade com a Minha immediata Resolução de sete do corrente, tomada sobre parecer da Secção dos Negocios do Imperio do Conselho d'Estado, exarado em Consulta de doze de Novembro proximo passado: Hei por bem Autorisa-lo a incorporar nesta Côrte huma Companhia com a denominação de - Architectonica -, tendo por fim construir por sua conta ou de terceiros, predios destinados á habitação das differentes classes sociaes, e a estabelecimentos industriaes, e fundar outros estabelecimentos para commodidade e recreio publico, incumbindo-se tambem de comprar, vender e administrar immoveis por conta de terceiros; e bem assim Approvar os Estatutos que com este baixão.

     Luiz Pedreira do Coutto Ferraz, do Meu Conselho, Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios do lmperio, assim o tenha entendido e faça executar. Palacio do Rio de Janeiro em dezesete de Janeiro de mil oitocentos cincoenta e sete, trigesimo sexto da Independencia e do Imperio.

Com a Rubrica de Sua Magestade o Imperador.

Luiz Pedreira do Coutto Ferraz.

 

ESTATUTOS DA COMPANHIA - ACHITECTONICA. -

CAPÍTULO I
Objecto da Companhia
 
     A Companhia - Architectonica - tem por fim:



     Art. 1º Adquirir em plena propriedade, em perpetuo fatiosim, e em arrendamentos de longos prazos, dentro do Municipio do Rio de Janeiro, o dominio e a posse de terrenos devolutos, e de predios em bom estado ou susceptiveis de reparos, convenientemente situados para nelles edifiar e estabelecer:

     § 1º Habitações sadias e economicas para familias e individuos de todas as classes sociaes.

     § 2º Casas de campo com pequenos jardins.

     § 3º Mercados publicos e bazares.

     § 4º Hoteis e hospedarias.

     § 5º Banhos publicos para todas as classes.

     § 6º Lavadouros publicos.

     § 7º Predios para o commercio, fabricas, officinas, depositos, & c.

     § 8º Jardins e parques publicos com restauradores, cafés, banhos, pavilhões, e salas com os respectivos accessorios para bailes, concertos, espectaculos e festas campestres, e toda a sorte de divertimentos e jogos licitos, exercicios saudaveis e de agilidade, como sejão equitação, gymnastica, natação, meneio de armas, & c.

     Art. 2º Incumbir-se da edificação de predios com ou sem jardins, em terrenos proprios ou alheios, por conta de terceiros, mediante ajuste prévio do preço e modo do pagamento.

     Art. 3º Incumbir-se da compra, venda, e administração de immoveis por conta de terceiros, mediante razoavel commissão.

     Art. 4º Tomar empreitadas de obras publicas ou particulares, como sejão: theatros, templos, movimento de terras, aberturas de ruas e de praças, e de seu aformoseamento com arvores, estatuas, &c.

     Art. 5º Dar de arrendamento, permutar, e mesmo vender immoveis de sua propriedade, a dinheiro, a troco de suas acções, e por annuidades ou amortisação a seus Accionistas locatarios.

     Art. 6º Dar em sublocação os predios e estabelecimentos, cuja posse tiver de arrendamentos, como melhor convier aos seus interesses, e lhe for permittido.

     Art. 7º Fundar olarias, officinas de serraria, parquetaria, carpintaria, ferraria, cantaria, e todas as que forem conducentes á satisfação dos fins de sua instituição, ou comprar, tomar de arrendamento, ou associar-se a estabelecimentos desses ramos de industria já fundados.

     Art. 8º Importar directamente artifices, operarios, ferramentas, utensis, materias primas, e todos os objectos de que houver de servir-se em suas obras, e que offereção vantagens de preço e de perfeição de trabalho sobre os que se acharem nesta Cidade.

CAPÍTULO II
Do fundo social



     Art. 9º A Companhia - Architectonica - he fundada com o capital de tres mil contos de réis, representado por quinze mil acções do valor nominal de duzentos mil réis cada huma.

     Art. 10. Este capital poderá ser elevado a mais de dous mil contos de réis com prévia approvação do Governo, sob representação da Assembléa Geral da Companhia.

     Art. 11. Os Accionistas da primeira emissão terão direito a subscrever ao par até metade das acções da segunda emissão, na epocha em que esta a for permittida, e na proporção das que possuirem, e tambem preferirão na distribuição da outra metade, que se emittirá com o agio que tiverem na Praça as da primeira serie, ou for julgado sufficiente pela administração da Companhia.

     Art. 12. O valor nominal das acções da primeira serie será realisado no Banco ou casa bancaria que o fundador designar em prestações, sendo a primeira de vinte por cento no acto da subscripção, e as seguintes de cinco a dez por cento, conforme o exigir o desenvolvimento da Empreza. A segunda chamada de fundos não será feita antes da decorridos seis mezes contados da completa realisação de primeira. As que seguirem-se nunca terão intervallo menor de tres mezes entre huma e outra.

     Art. 13. Os Accionistas são responsaveis sómente até o valor nominal das acções com que estiverem inscriptos nos livros da Companhia, mas perderão em favor desta todas as quantias com que houverem entrado, quando deixarem de effectuar qualquer prestação nos prazos fixados pela administração, e annunciados nas folhas diarias, salvo os casos de força maior, provados perante a mesma administração no decurso de seis mezes, e nestes casos pagarão tambem o juro legal da mora.

     Art. 14. As acções podem ser negociadas ad libitum dos Accionistas, porém a administração só reconhece como real a transferencia averbada nos livros da Companhia, e feita pelo proprio Accionista, por legitimo procurador e por quem legitimamente represente aquelle, como seja o tutor, curador, &c.

CAPÍTULO III
Da administração da Companhia



     Art. 15. A Companhia será administrada e representada em todos os seus actos publicas e particulares, perante os Poderes do Estado, em Juizo e fóra delle, por hum Administrador gerente, eleito de quatro em quatro annos á pluralidade de votos de Accionistas que representem, por si ou por outrem, cujos procuradores forem, metade das acções emittidas. Se na primeira reunião para este fim convocada não se achar representado este numero de acções; outra será feita oito dias depois, declarando-se nos annuncios desta convocação que a eleição se fará pelos Accionistas que se acharem presentes.

     Art. 16. Com a eleição do Administrador gerente se fará tambem em lista separada a de hum Conselho de vigilancia, composto de cinco Accionistas.

     Art. 17. O Administrador gerente será substituido em seus impedimentos ou faltas prolongadas por mais de hum mez, pelo Membro do Conselho de vigilancia que for eleito por escrutinio secreto d'entre os Conselheiros na sua primeira reunião ordinaria, e o numero dos cinco Conselheiros estará sempre completo pelos immediatos em votos, quer se dê a falta ou ausencia delles por substituição ao Administrador gerente, quer por impedimento ou escusa de qualquer dos mesmos Conselheiros.

     Art. 18. Ao Administrador gerente da Companhia, como seu unico representante, ficão conferidos e outorgados todos os poderes em direito permittidos aos Accionistas, para demandar e ser demandado, intervir em todos os actos e factos que a ella interessem, acceitar primeiras citações, constituir procuradores, e em tudo proceder como em causa propria.

     Art. 19. Compete mais ao Administrador gerente:

     § 1º Convocar as reuniões da Assembléa Geral dos Accionistas nas epochas fixadas nos presentes Estatutos, e todas as vezes que lhe forem exigidas pela maioria do Conselho de vigilancia, ou por vinte dos maiores Accionistas, e ainda quando o julgar conveniente para a decisão de negocios importantes e extraordinarios.

     § 2º Presidir a essas reuniões e as do Conselho de vigilancia, dar-lhes as informações que forem pedidas, ou dever levar ao seu conhecimento, e dirigir a ordem de seus trabalhos.

     § 3º Nomear d'entre os Accionistas hum Secretario, para a redacção das Actas da Assembléa geral, e os Escrutadores necessarios quando houver votações.

     § 4º Executar e fazer executar as decisões da Assembléa geral.

     § 5º Nomear e demittir livremente os Empregados necessarios para o expediente e regularidade dos trabalhos da Companhia.

     § 6º Fixar, de accordo com o Conselho de vigilancia, os ordenados e gratificações d'esses Empregados.

     § 7º Assignar todos os contractos feitos com a Companhia. Para os de acquisição ou alienação de immoveis, por qualquer titulo que seja, será expressamente autorisado pela maioria do Conselho de vigilancia.

     § 8º Exercer em fim todos os actos de boa gestão dos negocios da Companhia, que não forem de encontro aos presentes Estatutos.

     Art. 20. O Conselho de vigilancia reunir-se-ha ordinariamente nos dias 2 dos mezes de Janeiro, Abril, Julho e Outubro de cada anno, e extraordinariamente todas as vezes que for convocado pelo Administrador gerente, ou entenderem seus Membros dever faze-lo para pedirem providencias em bem dos interesses da Companhia. Em suas reuniões e fóra dellas tem os Conselheiros, incorporados e isoladamente, o direito de serem instruidos pelo Administrador gerente de qualquer facto, cujo conhecimento lhes interesse; sendo-lhes franqueados os titulos, documentos e livros de que constem os factos sobre que versarem suas indagações, para que os compulsem dentro do escriptorio da Companhia. A presença de tres Membros do Conselho de vigilancia constitue sua maioria, e he sufficiente para tomar deliberações obrigatorias da Companhia.

     Art. 21. O Administrador gerente tem voto de desempate nas votações dos Conselheiros.

     Art. 22. Quando se der desaccordo entre o Administrador gerente e a maioria do Conselho de vigilancia, será a questão submettida ao conhecimento da AssembIéa geral em sua primeira reunião ordinaria, ou na que se convocará extraordinariamente para resolve-la, se o negocio for urgente e importante, e esta decisão será tomada pelos Accionista que se reunirem.

     Art. 23. O Administrador gerente não entrará no exercicio de suas funcções, nem poderá conserva-lo, sem possuir ao menos cem acções da Companhia.

     Art. 24. O Conselheiro de vigilancia tambem não entrará em exercicio, ou deixará suas funcções, desde que possuir menos de cincoenta acções.

     Art. 25. O Administrador gerente póde ser demittido pela Assembléa geral de Accionistas que representem metade das acções emittidas, desde que por denuncia do Conselho de vigilancia, ou de vinte dos maiores Accionistas, for julgado incapaz de preencher convenientemente os seus deveres, seja por falta de intelligencia, seja por incuria ou deleixo.

     Art. 26. Não he responsavel o Administrador gerente pelos actos que praticar autorisado pela Assembléa geral dos Accionistas, ou pelo Conselho de vigilancia, mas o será na fórma das Leis pelos que praticar de motu proprio, e que prejudiquem a Companhia, provando-se-lhe dólo ou má fé.

     Art. 27. São reeligiveis o Administrador gerente e os Conselheiros de vigilancia que houverem bem servido, a juizo dos Accionistas.

CAPÍTULO IV
Da Assembléa geral



     Art. 28. A Assembléa geral dos Accionistas estará constituida e poderá deliberar desde que estiver representado hum terço de suas acções emittidas, salvo o disposto nos Artigos 15, 22 e 25.

     Art. 29. Nas votações em Assembléa geral cada cinco acções dá direito a hum voto, e nenhum votante disporá de mais de dez votos, qualquer que seja o numero de acções que elle represente por si, ou por outrem, cujo procurador for. Sómente o Accionista póde votar como procurador.

     Art. 30. Nenhum Accionista póde votar por si ou por procurador senão trinta dias depois do averbamento de suas acções nos livros da Companhia, exceptuão-se sómente os que as possuirem por successão hereditaria ou casamento, pois nestas hypotheses entrão immediatamente no gozo dos direitos dos antepossuidores.

     Art. 31. A Assembléa geral se reunirá ordinariamente na segunda quinzena dos mezes de Janeiro de cada anno, em dia fixado pelo Administrador gerente, por quem lhe será apresentado o relatorio e o balanço semestral, em os quaes demonstre com a clareza o estado da Companhia.

     Nestas reuniões se elegerá por escrutinio secreto huma Commissão de tres Accionistas para verificar a exactidão da balanço, e a da escripturação social, que lhe será franqueada com os documentos comprobatorios Outra reunião será convocada para tomar conhecimento do parecer desta Commissão, e resolver ácerca de qualquer medida por ella proposta, logo que communique ao Administrador gerente ter concluido sua tarefa.

CAPÍTULO V
Do fundo de reserva e dividendo


     Art. 32. O balanço semestral demonstrará o estado da caixa social.

     Dos lucros liquidos se deduzirão dez por cento annualmente para fundo de reserva, a fim de occorrer a concertos e eventualidades dos proprios da Companhia. Esta reserva nunca excederá de cincoenta contos de reis.

     Art. 33. Por lucros liquidos entender-se-ha o saldo á favor da Companhia, demonstrado pela conta de lucros e perdas, depois de deduzidos os gastos da administração e expediente.

     Art. 34. Quando os lucros liquidos da Companhia excederem a doze por cento ao anno, pertencerá metade do excesso ao Administrador gerente, a outra metade reunida aos doze por cento será distribuida aos Accionistas na proporção de suas acções. Em quanto não houver o sobredito excesso, ou não produzir sua metade annualmente a quantia de seis contos de réis, será esta a gratificação do Administrador gerente, paga pela receita da Companhia.

CAPÍTULO VI
Da duração e liquidação da Companhia



     Art. 35. A Companhia durará trinta annos, contados do dia de sua installação. Antes do termo deste prazo só poderá ser dissolvida nas hypotheses dos §§ 2º e 3º do Artigo 296 do Codigo Commercial; póde-se porém prorogar sua duração por deliberação de Accionistas que representem metade das acções emittidas, se for approvada pelo Governo Imperial.

     Art. 36. Desde que for resolvida a dissolução da Companhia, proceder-se-ha immediatamente á sua liquidação á vista do balanço geral que se fará. A venda do activo será feita em hasta publica, e depois de pago o passivo se rateará o saldo pelos Accionistas.

CAPÍTULO VII
Das vantagens dos Accionistas



     Art. 37. Alêm dos dividendos que provirão aos Accionistas da partilha dos lucros, e maior valor de suas acções, serão elles preferidos:

     § 1º Para os empregados assalariados da Companhia.

     § 2º Como locatarios de seus predios e estabelecimentos.

     § 3º Nas empreitadas de obras que a Companhia der ou tomar.

     § 4º Nas vendas que a Companhia fizer.

     § 5º Na admissão de seus filhos ás escolas e officinas da Companhia.

     Art. 38. O Accionista locatario da Companhia que desejar possuir o predio que occupar, antes mesmo de ter com que pagar o respectivo valor, poderá consegui-lo pela amortisação do dito valor, feita: 1º pela differença do aluguel; 2º com acções da Companhia; 3º com dinheiro em as quotas que puder entregar, tornando-se dest'arte a Companhia a caixa economica de seus Accionistas.

     Art. 39. O Accionista locatario da Companhia póde pagar o aluguel do predio que occupar com acções della pelo valor de suas entradas.

CAPÍTULO VIII
Disposições geraes



     Art. 40. Os empregados da Companhia, a cujo cargo esteja a guarda, ainda mesmo temporaria, de valores delIa, só entrarão no exercicio de seus empregos depois que prestarem fiança idonea a juizo da Administração.

     Art. 41. A Companhia não possuirá escravos; póde porêm emprega-los em suas obras, convindo-lhe.

     Art. 42. A Companhia entreterá por sua conta os jardins e parques que fizer, e os estabelecimentos que nelles fundar, ou os dará de arrendamento, como for mais conveniente aos Accionistas e aos bons costumes, a juizo da Administração.

     Art. 43. A Companhia estatuirá em seu Regimento interno o modo pratico de levar-se a effeito o disposto nos Artigos 37, 38 e 39.

     Art. 44. Os presentes Estatutos, ou quaesquer das suas disposições só poderão ser alterados por deliberação da Assembléa geral dos Accionistas, approvada pelo Governo Imperial.

     Rio de Janeiro em 24 de Dezembro de 1856. - Francisco José Fialho.


Este texto não substitui o original publicado no Coleção de Leis do Império do Brasil de 1857


Publicação:
  • Coleção de Leis do Império do Brasil - 1857, Página 12 Vol. 1 pt II (Publicação Original)