Legislação Informatizada - CARTA RÉGIA DE 16 DE JANEIRO DE 1817 - Publicação Original
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CARTA RÉGIA DE 16 DE JANEIRO DE 1817
Approva os Estatutos da nova Companhia de Mineração do Cuyabá.
João Carlos Augusto de Oeynhausen, do meu Conselho, Governador e Capitão General da Capitania de Matto Grosso. Amigo. Eu El-Rei vos envio muito saudar. Sendo-me presente a vossa conta de 31 de Maio de 1814, acompanhada dos estatutos da nova Companhia de Mineração do Cuyabá, que se teem proposto o formar os socios assignados nos mesmos estatutos, pedindo em nome e a requerimento dos mesmos socios, a minha real approvação de todos os artigos de que se compoem, para poder proseguir o plano de mineração projectado, não obstante o terdes já provisoriamente mandado pôr em pratica, pelas vantagens que de um tal estabelecimento podem resultar á minha Real Fazenda, e aos habitantes dessa Capitania, onde pela sua central posição nenhum ramo de industria parecia mais conveniente do que a lavra dos metaes preciosos; e desejando, quanto é possivel, animar todos e quaesquer estabelecimentos que tendam ao bem geral e particular dos meus fieis vassallos, e à prosperidade e riqueza publica: tendo ouvido o parecer de pessoas doutas e zelosas do meu real serviço e bem commum: sou servido approvar a Companhia de Mineração do Cuyabá, para cuja formação tendes corrido com tanto zelo e desvelo, regulando-se pelos estatutos que com esta minha carta vos são remettidos, assignados pelo Conde da Barca, do meu Conselho de Estado, Ministro, e Secretario de Estado dos Negocios da Marinha e Dominios Ultramarinos, e Presidente interino do meu Real Erario: espero do vosso zelo, luzes e actividade que não sómente procurareis que se consigam os bons resultados, a que se propõe esta Companhia, mas que conseguireis persuadil-a, a que haja de mandar, logo que tenha sufficientes forças, à sua custa, algumas pessoas dessa Capitania e aprender nas Reaes Fabricas de Ferro de Ipanema na Capitania de S. Paulo, e do Morro do Pilar, na Capitania de Minas Geraes, a arte de fundir o ferro, em grandes e pequenos fornos, para com ellasse poderem tambem eregir nessa Capitania fabricas de ferro, a fim de o terem em abundancia, e a bom preço, já para os trabalhos de mineração e da agricultura, já para a mesma defesa dessa Capitania; não devendo também esquecer-vos de fazer pesquisar com todo o cuidado as minas de sal que houver nesse territorio, para que possam ser aproveitadas em decidida vantagem dos meus vassallos. O que tudo executareis com a promptidão e acerto com que vos tendes distinguido no meu serviço; dando-me parte pela Secretaria de Estado dos Negocios do Reino e pelo meu Real Erario, dos resultados que annualmente se obtiverem, e propondo-me o que vos parecer conveniente ao progresso e riqueza dessa Capitania, para eu resolver o que for servido. Escripta no Palacio do Rio de Janeiro aos 16 de Janeiro de 1817.
REI com guarda.
Estatutos para o governo da Companhia de Mineração do Cuyabá
I. À Real Fazenda pertencerão duas acções livres nos reditos que produzir o fundo da Companhia de Mineração do Cuyabá, na fórma do seu espontaneo offerecimento.
II. O Governador e Capitão General da Capitania de Matto Grosso será o Inspector da Companhia, para vigiar sobre a observancia dos seus estatutos, zelando e promovendo tudo quanto for em seu proveito e da Real Fazenda, podendo convocar e formar Juntas interinas, emquanto se não estabelecerem as Juntas Administrativas, mandadas crear pelo alvará de 13 de Maio de 1803, para nellas se decidirem em ultima instancia aquelles negocios da Companhia que na fórma do mesmo alvará dependerem de taes decisões.
III. O mesmo Governador e Capitão General será Presidente da Mesa da Direcção e do Conselho da Companhia; e somente por approvação sua e com sua assistencia, ou de pessoa por elle delegada, poderá reunir-se o Conselho, quando forem dignas de attenção as razões allegadas pela Mesa da Direcção para esta convocação.
IV. O Conselho da Companhia será formado de doze dos seus accionistas que merecerem ao Governador e Capitão General um maior conceito; preferindo entre estes os que tiverem maior numero de acções e se acharem presentes no Cuyabá. A Mesa da Direcção será composta de quatro Directores, escolhidos entre os mais habeis dos do Conselho, servindo os Directores por tempo de tres annos, si não houver inconveniente qualificado e reconhecido em Conselho; e no fim do triennio poderão ser reconduzidos os Directores, ou poderão ser nomeados outros, como parecer ao Conselho da Companhia, que para esse fim se convocará.
V. O Conselho da Companhia será convocado no fim de cada um anno, para lhe serem apresentados pelos Directores os livros de receita e despeza, e fazer-se a conferencia do cofre, a fim de se conhecer da boa ou má administração dos Directores, lavrando-se de tudo os competentes termos.
VI. No tempo em que se assentar que se devem repartir os lucros, quando os houver, tambem se congregará o Conselho para regular os dividendos, sendo a partilha que se fizer assignada por todos os do Conselho e Directores, e ficando livre a qualquer interessado o exanimar o modo com que foi calculado o dividendo que lhe toca; para o que lhe será franqueado o livro dos termos e da receita e despeza, quando assim o exija; feito porém este exame perante os Directores, a quem compete a responsabilidade de taes livros.
VII. A sexta parte da quantia que tocar a cada um dos interessados ficará em reserva, fazendo-se a competente escripturação em separado e sendo guardada em cofre separado; e deste fundo é que sahirão as sommas necessarias para despezas extraordinarias, e até para compra de escravos, si para isso chegar, no fim do anno, sendo porém a sua applicação resolvida em Conselho.
VIII. A Mesa da Direcção pertence o governo e direcção dos negocios da Companhia, segundo os seus estatutos, decidindo-se pela pluralidade de votos nos casos duvidosos, ou recorrendo ao Conselho no caso de empate de votos. Nos papeis e contractos da Companhia poder-se-ha usar de um sello particular, e que será formado das armas da Villa do Cuyabá, circuladas com a legenda - Fortuna duce comite virtude - tendo por baixo o anno da creação da Companhia.
IX. O Conselho fará a divisão do trabalho pelos quatro Directores, como melhor parecer, e cada um delles tomará a si uma das quatro chaves que deve ter o cofre da Companhia.
X. As acções desta Companhia são isentas de qualquer penhora, embargo ou execução fiscal ou civil, ou do Juizo dos Orphãos, Defuntos e Ausentes. Os Credores só poderão ter direito aos lucros que de taes acções provierem, requerendo-os nas occasiões sómente em que se repartirem por todos os interessados.
XI. O Juiz de Fóra do Cuyabá será o Juiz Conservador desta Companhia, e julgará breve e summariamente as suas causas.
XII. Todos os que tiverem ao menos quatro acções nesta Companhia, gozarão, emquanto ella durar, do privilegio de homenagens nas suas proprias casas, nos casos em que ellas se custumam conceder; e os Directores gozarão, além disto, da isenção de qualquer serviço militar, não sendo Official de soldo, e não serão violentados a servir officio algum de Justiça ou Fazenda, nem a ser depositarios ou tutores de orphãos, emquanto forem Directores.
XIII. Os fundos desta Companhia serão formados por acções, e a subscripção para estas se conservará aberta até que tenha o fundo necessario para o encanamento das aguas que puderem cobrir os taboleiros das visinhanças da Villa do Cuyabá, fechando-se a subscripção logo que se principiar esta obra, sem que nenhuma autoridade possa violentar a Companhia a receber mais socios, e servindo-lhe de limite o designado para as Companhias de Mineração no § 2º do art. 7º do alvará de 13 de Maio de 1803.
XIV. Para que a Companhia possa augmentar os seus fundos quando lhe convier, até ao indicado limite de mil e oito escravos, ser-lhe-há permittido o admittir novas acções dos seus actuaes socios, e na falta destas, acções de novos socios, regulando-se porém neste caso o premio com que estes novos accionistas devem compensar os trabalhos já feitos pela Companhia, para vencerem os lucros que competirem às praças com que entrarem, sendo este regulamento feito pelo Conselho da Companhia.
XV. A duração desta Companhia será de 30 annos, e findos estes poderá ser dissolvida ou novamente constituida, como parecer conveniente.
XVI. Cada uma acção desta Companhia será de 100$000 em moeda, que se deverão entregar no acto da subscripção, e de dous escravos vestidos e preparados de ferramentas por uma vez, e que serão entregues à Companhia no momento em que principiar a mineração, e logo que se concluir o encanamento das aguas, ou outra qualquer operação preliminar de que ella depender, e para que é applicado o dinheiro recebido. E se por algum motivo o accionista deixar de entrar com os escravos que é obrigado, quando forem requeridos, não terá parte no lucro da mineração, nem jus algum para reclamar a entrada que fez para o fundo de despezas; será permittido porém à Mesa da Direcção o conceder um prazo, que não exceda de seis mezes improrogaveis, aos accionistas de mais de duas acções, para apresenarem todos os escravos que são obrigados, supprindo no emtanto a falta destes com escravos alugados á sua custa: com a clausula de que, findo o prazo concedido sem fazer a entrega dos escravos que devem ficar pertencendo á Companhia, só terá direito ao pagamento dos jornaes, cedendo em proveito da Companhia o mais lucro que houver, e ficando expulso da Companhia.
XVII. O dinheiro e escravos pertencentes á Companhia não se poderão tirar durante o tempo que lhe é concedido; e sómente será livre aos accionistas o vender e traspassar as suas acções, preferindo os socios em igualdade de preço, para o que se fará publica uma tal venda por editaes da Mesa da Direcção, para conhecimento dos actuaes interessados, sem o que será nulla a venda feita á pessoa que não seja da Sociedade.
XVIII. Ficarão pertencendo á Companhia todas as aguas que poder introduzir no rego ou encamento que vai emprehender, achando-se devolutas, ou não occupadas legitimamente por algum mineiro de effectivo trabalho, e com reserva das exceptuadas no § 2º do art. 9º do alvará de 13 de Maio de 1803, assim como as terras que puder lavrar com as aguas do dito encanamento ou regos, chamados do Canellas e do Brigadeiro, achando-se estes terrenos devolutos, ou não occupados legitimamente, e sem trabalho effectivo de algum mineiro; sendo notificados os donos legitimos se alguns houver, sem effectivo trabalho, para dentro do prazo de seis mezes abrirem serviços mineraes correspondentes á extensão do terreno que possuirem, com pena de perdimento a favor da Companhia, no caso contrario, conservando sómente a extensão marcada no § 3º do art. 6º do sobredito alvará, se tiverem forças bastantes para o seu lavor effectivo.
XIX. Na repartição e concessão das terras mineraes e aguas que se acharem devolutas na Capitanias de Matto Grosso, terá a Companhia preferencia na fórma do §1º do art. 6º do alvará de 13 de Maio de 1803, sobejando-lhe forças para novas emprezas, ou devendo suspender os trabalhos principiados, na fórma do § 6º do dito alvará, em terras que lhe são concedidas.
XX. Nos terrenos mineraes concedidos á Companhia, não terão logar quaesquer denuncias ou repartições a titulo de descobertos.
XXI. Os Administradores, Feitores e Camaradas, ou quaesquer empregados no serviço da
Companhia, não podendo ser empregados em outro qualquer serviço, sem mostrarem, que foram despidos do serviço da Companhia, com pena de 40$000 a favor da caixa da Companhia, pagos pelos que os alliciarem.
XXII. Os Administradores que, pelo seu bom serviço por espaço de oit annos, merecerem singular recommendarão da Mesa da Direcção, e satisfação geral da Companhia, ficarão dahi em diante gozando de uma até duas acções, sem serem obrigados a algum premio, entrendo com os escravos competentes. Palacio do Rio de Janeiro aos 16 de Janeiro de 1817. - Conde da Barca.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1817, Página 4 Vol. 1 (Publicação Original)