Legislação Informatizada - ALVARÁ DE 26 DE JANEIRO DE 1818 - Publicação Original
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ALVARÁ DE 26 DE JANEIRO DE 1818
Estabelece penas para os que fizerem commercio prohibido de escravos.
Eu El-Rei faço saber aos que este Alvará com força de Lei virem, que attendendo a que a prohibição do commercio de escravos em todos os portos da Costa d'Africa ao norte do Equador, estabelecida pela retificação do Tratado de 22 de Jneiro de 1815, e da Convenção addicional de 28 de Julho de 1817, exige novas providencias que, prescrevendo as justas e proporcionadas penas que hão de ser impostas aos trangressores, sirvam de regra certa de julgar e decidir nos casos occurrentes sobre este objecto, aos Juizes, e mais pessoas encarregadas da sua execução: Hei por bem ordenar o seguinte:
§ 1° todas as pessoas de qualquer qualidade e condição que sejam, que fizerem armar e preparar navios para o resgate e compra de escravos, em qualquer dos portos da Costa d'Africa situados ao norte do Equador, incorrerão na pena de perdimento dos escravos, os quaes immediatamente ficarão libertos, para terem o destino abaixo declarado; e lhes serão confiscados os navios empregados nesse trafico com todos os seus apparelhos e pertences, e juntamente a carga, qualquer que seja, que a seu bordo estiver por conta dos donos e fretadores dos mesmos navios, ou dos carregadores de escravos. E o Officiaes dos navios, a saber, Capitão ou Mestre, Piloto e Sobrecarga, serão degradados por cinco annos para Moçambique, e cada um pagará uma multa equivalente á soldada e mais interesses que haveria de vencer na viagem. Não se poderão fazer seguros sobre taes navios, ou sua carregação, e fazendo-se seão nullos; e os seguradores que scientemente os fizerem, serão condemnados no tresdobro do premio estipulado para o caso de sinistro.
§ 2º Na mesma pena de perdimento dos escravos, para ficarem libertos e terem o destino abaixo declarado, incorrerão todas as pessoas de qualquer qualidade e condição, que os conduzirem a qualquer dos portos do Brazil em navios com bandeira que não seja portugueza.
§ 3º Todos os sobreditos casos serão objecto de denuncia. E no caso de Ter havido confisco de navio e de sua carga, ametade de todo o preço que se realizar em arrematação publica, bem como ametade das outras penas pecuniarias, será para os denunciantes, e a outra ametade para a minha Real Fazenda, á qual pertencerá tudo quando não houver denunciante. No caso porém de Ter havido preza de navio feita por embarcação de guerra, a respeito delle e sua carga se observará o que é prescripto pelo artigo 7} do regulamento para as Commissões mixtas, addicionando em numero terceiro á sobredita Convenção de 28 de Julho de 1817. Porém só poderão ser demandados dentro de tres annos, contados, no caso de preza ou confisco do navio, do dia da entrada do navio no porto da descarga, e findo este espaço, ficarão prescriptas e extinctas as acções.
§ 4º As denuncias, e todos os autos do processo até sentença final e sua execução, serão feitos perante os Juizes dos Contrabandos e Descaminhos do logar ou districto onde os escravos forem conduzidos, ou perante qualquer outro Magistrado ou Juiz, que essa jurisdicção, bem como a necessaria para executarem as sentenças preferidas pelas Commissões Mixtas, nos casos do seu conhecimento, e para julgar e conhecer dos outros casos que occerrerem, e suas dependencias, dando os competentes recursos na fórma da ordenação. Qualquer das partes porém poderá requerer á Commissão Mixta, para que julgue se é ou não caso de prohibição; e neste caso se lhe remetterão os autos no estado em que estiverem, e o que por ella fôr decidido, se executará.
§ 5º Os escravos consignados á minha Real Fazenda, pelo modo prescripto no sobredito 7} artigo do regulamento para as Commissões Mixtas, e todos os mais libertos pela maneira acima decretada, por não ser justo que fiquem abandonados, serão entregues no Juizo da Ouvidoria da Comarca, e onde o não houver, naquelle que estiver encarregado da Conservatoria dos Indios, que hei por bem ampliar unindo-lhe esta jurisdicção, para ahi serem destinados a servir como libertos por tempo de 14 annos, ou em algum serviço publico de mar, fortalezas, agricultura e de officios, como melhor convier, sendo para isso alistados nas respectivas Estações; ou alugados em praça a particulares de estabelecimento e probidade conhecida, assignando estes termo de os alimentar, vestir, doutrinar, e ensinar-lhe o officio ou trabalho, que se convencionar, e pelo tempo que fôr estipulado, renovando-se os termos e condições as vezes que fôr necessario, até preencher o sobredito tempo de 14 annos, este tempo porém poderá ser diminuido por dous ou mais annos, aquelles libertos que por seu prestimo e bons costumes, se fizerem dignos de gozar antes delle do pleno direito da sua liberdade. E no caso de serem destinados a serviço publico na maneira sobredita, quem tiver autoridade na respectiva Estação nomeará uma pessoa capaz para assignar o sobredito termo, e para ficar responsavel pela educação e ensino dos mesmos libertos. Terão um Curador, pessoa de conhecida probidade, que será proposto todos os trienios pelo Juiz, e approvado pela Mesa do Desembargo do Paço desta Côrte, ou pelo Governador e Capitão General da respectiva Provincia; e a seu officio pertencerá requerer tudo o que fôr a bem dos libertos, e fiscalisar os abusos, procurar que no tempo competente se lhe dê resalva do serviço, e promover geralmente em seu beneficio a observancia do que se acha prescripto pela lei a favor dos orphãos, no que lhes puder ser applicado, para o que será sempre ouvido em tudo o que ácerca delles se ordenar pelo sobredito Juizo.
§ 6º Nos portos ao sul do Equador, em que é permittido o commercio de escravos, se observará o que está ordenado pelo Alvará de 24 de Novembro de 1813 com as modificações e declarações seguintes, a saber: Ficará abolida a distinção entre toneladas que excederem o numero de 201, e que não excederem este numero, e sem effeito o que ácerca destas ultimas é ordenado no dito alvará, para ser regulada a carga de escravos á razão de cinco por cada duas toneladas do porte de qualquer navio, medida pelo antigo padrão. Da prohibição das marcas feitas com ferro no corpo dos escravos serão exceptuadas e permittidas as marcar impressas com carimbos de prata. Será lícito aos donos ou fretadores dos navios empregar no serviço destes caldeiras de ferro ou de cobre indistinctamente, comtanto que estas ssejam todas as viagens estanhadas de novo, o que se fiscalizará nas visitas que se hão de fazer á bordo dos mesmos navios; e quando á bordo destes não possam andar cirurgiões para curar os escravos, pelos não haver, ou por outra razão equivalente, serão os donos ou fretadores obrigados a trazer á bordo dos ditos navios pretos sangradores, intelligentes e expreimentados no tratamento das molestias de que ordinariamente são infectados os ditos escravos, e no conhecimento dos remedios, proprios e adequados de que elles usam em seus curativos, porque em todos estes objectos tem mostrado a experiencia ser necessario declarar as providencias dadas naquelle alvará, que se observará (com as sobreditas explicações) em tudo o mais que nelle é disposto.
§ 7º Attendendo a que a mudança e alteração superveniente ao commercio dos escravos, pelas restricções ajustadas no sobredito Tratado e Convenção addicional, exige que em grande parte se alterem e modifiquem as disposiçções das antigas leis a este respeito feitas sem attenção áquella posterior mudança, pela qual muitas até ficaram sem tEr applicação: Hei por bem ordenar que em todos os portos do Brazil seja lícito importar escravos trazidos dos portos em que fôr licito este commercio, e que os fretes fiquem á disposição e convenção das partes.
Este se cumprirá como nelle se contém: Pelo que mando á Mesa do Desembargo do Paço e da Consciencia e Ordens; Presidente do meu Real Erario; Conselho da minha Real Fazenda; Regedor da Casa da Supplicação do Brazil; Governador da Relação da Bahia; Governadores e Capitães Generaes e mais Governadores do Brazil e dos meus Dominios Ultramarinos; e a todos os Ministros de Justiça, e mais pessoas, a quem pertencer o conhecimento deste alvará, o cumpram e guardem, não obstante qualquer decisão em contrario, que hei por derogada para este effeito sómente: E valerá como carta passada pela Chancellaria, posto que por ella não ha de passar, e que o seu effeito haja de durar mais de um anno, sem embargo da Lei em contrario. Dado no Palacio do Rio de Janeiro em 26 de Janeiro de 1818.
REI com guarda.
Thomaz Antonio de Villanova Portugal.
Alvará com força de Lei, pelo qual Vossa Magestade ha por bem estabelecer penas, para os que fizerem commercio prohibido de escravos, e dar as convenientes providencias a respeito daquelles escravos, que em consequencia das sobreditas penas ficarem libertos; tudo na fórma acima declarada.
Para Vossa Magestade ver.
Luiz Joaquim dos Santos Marrocos o fez.
- Coleção de Leis do Império do Brasil - 1818, Página 7 Vol. 1 (Publicação Original)