Rádio Câmara

Reportagem Especial

Educação inclusiva: o Brasil está preparado?

03/04/2017 - 07h01

  • Educação inclusiva: o Brasil está preparado? (bloco 1)

  • Educação inclusiva: casos reais (bloco 2)

  • Educação inclusiva: projetos em tramitação na Câmara (bloco 3)

Aprovado em julho de 2015, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, conhecido também como Lei Brasileira de Inclusão (Lei Nº 13.146/15), é considerada uma conquista. Três artigos da lei asseguram o direito à educação inclusiva adaptada às necessidades das pessoas com deficiência. Porém, garantir esses direitos ainda é um desafio para o País. Os artigos devem entrar em vigor em 2020, mas a sua implementação ainda é vista como um problema.

Em caso de descumprimento da lei, o estatuto prevê que medidas judiciais podem ser propostas pelo Ministério Público, Defensoria Pública, União, Estados e Municípios. E ainda por associação constituída há mais de um ano, autarquias, empresas públicas que tenham a finalidade de proteger os interesses e a promoção de direitos da pessoa com deficiência.

A pena é de reclusão de dois a cinco anos e multa para quem recusar, cobrar valores adicionais, suspender, cancelar ou fazer cessar inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, em razão de sua deficiência.

Parlamentares e especialistas apontam que os direitos garantidos ainda não são respeitados. Eles destacam os benefícios da educação inclusiva para as pessoas com deficiência.

Atuando na área de educação inclusiva há mais de dez anos, o professor da Universidade de Brasília, Charles Rocha Teixeira, realiza pesquisas voltadas para cegos e surdos ensurdecidos – ou seja: quem não nasce surdo e se torna deficiente auditivo depois. Ele diz que o ensino superior e as escolas no País não estão preparados para receber os alunos com deficiência.

Charles Rocha Teixeira: “Essa é uma realidade não só da Universidade de Brasília, mas de todas as universidades e de todas as escolas. O Brasil não está preparado para o ensino voltado para essas pessoas com deficiência. Não há uma preparação. Então, a insatisfação é muito grande. Nós temos hoje na universidade muitos alunos com deficiência sensorial.”

Segundo Charles, quando conseguem o acesso à educação, os estudantes com deficiência enfrentam problemas que dificultam o aprendizado e o desenvolvimento. Material em braile para os cegos e aulas em Libras para os surdos, por exemplo, são assegurados na Lei, porém, ainda são barreiras em universidades e escolas.

Charles relata a reclamação de uma estudante da UnB.

Charles Rocha Teixeira: “Essa aluna em específico, a reclamação dela, normalmente, era com respeito à demora na confecção de textos, transformar textos que estão em ‘Word’ para braile, para que ela possa acompanhar. As universidades brasileiras não estão preparadas para esses alunos não.”

Charles aponta que se as condições não são boas, já foram piores e que as pessoas com deficiência estão recebendo a educação básica. Ele aponta que a falta formação para os profissionais é um problema, o que impossibilita atender o estudante de forma adequada.

De acordo com a deputada Professora Dorinha Seabra, do DEM do Tocantins, a capacitação dos profissionais ainda é um ponto sensível.

Professora Dorinha Seabra: “É... a formação dos professores é, talvez, um dos pontos mais... de maior desafio. A gente tem avançado em relação ao atendimento das pessoas com deficiência na área visual, auditiva, têm sido criados alguns projetos que regulamentam a figura do intérprete, a figura do profissional com formação específica – isso é importante – e, cada vez mais, à medida em que os direitos vêm sendo assegurados, mais crianças e mais jovens têm conseguido avançar na escolarização.”

A psicopedagoga Valderlene Ramalho atua no Centro de Educação Infantil em Taguatinga, no Distrito Federal. Mesmo a escola sendo estruturada para a educação inclusiva, ela revela que são muitas as dificuldades para os docentes.

Valderlene Ramalho: “Colocar isso em prática ainda é difícil. No planejamento, lembrar que esse aluno está em sala, que ele precisa de uma metodologia diferenciada, que ele precisa de um atendimento diferenciado”.

Diretora adjunta da Escola Francisco Walcy Lobato Lima na cidade de Santana no Amapá, Andreia Guedes aponta os problemas vividos pela unidade escolar.

Andreia Guedes: “Nós temos dois agravantes e um é: a maioria desses professores não é do quadro efetivo do Estado. São contratos administrativos. E o maior é a falta de estrutura física. Nossa escola está sofrendo situações muito complicadas, diárias, de falta de energia, de falta de merenda, de falta de recursos. Isso prejudica muito não só a educação inclusiva, mas, a escola como um todo. [...] Mas, especificamente da parte de inclusão, o que a gente percebe é que o nosso professor em sala de aula, ele não está preparado para fazer a educação inclusiva.”

A lei prevê que cada aluno deve ser avaliado de forma adaptada à sua deficiência. Por exemplo, o cego com prova oral e o surdo com a linguagem em Libras. Andreia diz que os professores sentem a dificuldade em colocar isso em prática.

Andreia Guedes: “A gente consegue perceber que eles fazem um trabalho mais direcionado. Consegue acompanhar de perto esse aluno, só que sentem a dificuldade do professor em fazer adaptações dos trabalhos para esses alunos. E, conseguir avaliá-los da forma que eles precisam ser avaliados.”

Se Charles vê falta de capacitação, Andreia diz que, no Amapá, esse não é o problema – e sim a falta de estrutura.

A professora Andreia pede mais atenção para a educação e, em especial, à educação inclusiva.

Andreia Guedes: “Que o Estado e a União possam olhar para esse ensino especial, que deveria ser especial, porque não existe o especial ainda. A educação, no geral, infelizmente, a gente está se sentindo abandonado. Estamos há meses sem receber dinheiro de merenda para manter a escola funcionando. E você se sente incapaz de lutar por um ideal que você acredita.”

Mesmo com os problemas e desafios, todos concordam que existem avanços nos últimos dez anos.

Deficientes e familiares enfrentam dificuldades no cumprimento da chamada Lei Brasileira de Inclusão. Confira, no próximo capítulo

Trabalhos Técnicos - Milton Santos
Edição - Mauro Ceccherini
Reportagem - Eduardo Lobo

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