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Reportagem Especial

Voto jovem: uma análise sobre o baixo empenho dos jovens em ir às urnas

25/09/2013 - 18h04

  • Voto jovem: uma análise sobre o baixo empenho dos jovens em ir às urnas

Por que os jovens se animam a ir às ruas para protestar, mas nem sempre demonstram o mesmo empenho em mudar a história do País pelo voto? Saiba o que pensam alguns desses jovens, cientistas políticos e parlamentares, na terceira matéria da Reportagem Especial sobre o voto jovem. O repórter é José Carlos Oliveira.

MÚSICA: "Voto em branco" (Plebe Rude)
"Imaginem uma eleição em que ninguém fosse eleito
Já estou vendo a cara do futuro prefeito
Seja alguém, vote em ninguém..."

O desencanto com a política é sempre citado como um dos principais motivos de afastamento ou de repulsa do eleitor em relação às urnas. Muita gente, tanto especialistas quanto o cidadão comum, acredita que, se o voto não fosse obrigatório, o Brasil teria altíssimo índice de abstenção nas eleições, que aqui acontecem a cada dois anos: alternadamente entre o pleito municipal e as chamadas eleições gerais, englobando os votos para os governos e parlamentos estaduais e federal.

Pelos números oficiais do Tribunal Superior Eleitoral, 23 milhões e 500 mil jovens entre 16 e 24 anos de idade estão hoje com o título nas mãos e em condições de votar nas eleições gerais de 2014. Eles correspondem a quase 17% do total de 140 milhões de eleitores do Brasil, representando, portanto, uma massa capaz de decidir ou, ao menos, influenciar o destino político do país.

Ao mesmo tempo, o Ibope mostrou que 43% dos manifestantes que inundaram as ruas do país nos protestos de junho e julho tinham entre 14 e 24 anos. Ana Carolina Tigre, de 16 anos, era uma delas. A jovem participou da histórica manifestação que reuniu cerca de 50 mil pessoas em frente ao Congresso Nacional, em junho, mas, apesar de já ter o direito de votar, ainda tem dúvidas se é possível mudar a realidade do país por meio do voto.

"Eu não tirei o título ainda nem pretendo, porque acho que não vale a pena. Quero ter condições de poder votar, de poder exigir, de poder falar para o povo colocar alguém dentro da Câmara ou dentro do (governo do) Brasil que possa dar orgulho para o Brasil. Acho que o povo tem que gritar, tem que fazer o que está fazendo mesmo, senão não muda. Eu acho que a manifestação já é um voto: todo mundo está mostrando o que realmente quer para o Brasil."

MÚSICA: "Voto em branco" (Plebe Rude)
"Estamos de saco cheio de não ser representados.
Estamos de saco cheio de ser lembrados de quatro em quatro anos, que vocês querem nossos votos.
Vocês não representam a gente. Então, vamos ser alguém e votar em ninguém!"

O professor de ciências políticas da Universidade de São Paulo, José Álvaro Moisés, ressalta que muitos desses jovens manifestantes de hoje são filhos da geração de jovens que penou ao lutar por democracia ao longo das décadas de 60 e 70, nos anos de chumbo da ditadura militar. Mas, onde teria falhado a nossa tão suada e recente democracia?

"Na sua maioria, são filhos deste período democrático que nasceu a partir de 1988. Ou seja, a democracia fez promessas para essa juventude, mas ao não cumprir as promessas democráticas, de alguma maneira fechou as portas, bloqueou o anseio e a energia de participação. Isso, agora, está sendo recuperado nas ruas."

Outro cientista político, Carlos Ranulfo prefere por o dedo na ferida da crise de representatividade, sobretudo dos partidos políticos. Ele também reconhece que a política ainda é vista como estorvo para os jovens.

"Porque a democracia e a política são um pouco enfadonhas. A democracia, quando se estabiliza, não tem nada de emocionante: é negociação, voto. O jovem quer outras coisas. Se juntarmos a isso o fato de que os partidos brasileiros não têm muita capacidade de dialogar hoje com a juventude, então, a gente entende porque a juventude vai para as ruas dizer: 'sem partidos'. Isso não quer dizer que a juventude esteja certa, só quer dizer que ela está distante da política."

Ranulfo não se surpreendeu com o fato de o "gigante" ter acordado exatamente em um período de relativa estabilidade democrática e econômica do Brasil.

"Nós vivemos um período de normalidade democrática. O jovem de 15 a 20 anos hoje não pegou nada do processo de luta pela democracia. Já pegou uma inflação estabilizada, já pegou um país que tem Bolsa Família, já pegou uma classe pobre ascendendo. E tudo isso está dado. A juventude diz: 'eu quero mais e eu quero rápido'. Esse é o problema."

Apesar de somarem 12 milhões de pessoas no Brasil, apenas cerca de 2 milhões de jovens de 16 e 17 anos de idade, para quem o voto é facultativo, requisitaram o título para votar em 2014. Esse número não chega a 2% do eleitorado nacional. O deputado Alessandro Molon, do PT fluminense, reconhece a óbvia crise de representatividade entre o eleitor e seus representantes no Parlamento e nos governos municipais, mas alerta que esse desinteresse pelo voto pode criar um "ciclo vicioso" de difícil solução.

"Querem se sentir mais representados. Não se sentem representados. Isso cria um ciclo vicioso que é: 'eu não me reconheço, então, eu não voto; e quanto menos eu voto, menos eu me reconheço nos representantes'. Deveria ser o contrário: se eu não me reconheço, eu preciso votar e escolher representantes melhores para me sentir mais representado por esse Congresso. Acho que as pessoas estão discutindo mais política depois do que houve, recentemente, nas ruas do Brasil. Talvez isso sirva para mostrar como é importante participar e dizer o que a gente quer do país."

Daniel Santiago tem 15 anos e também foi às ruas pedir a melhoria dos serviços públicos e o combate geral à corrupção. Ele afirma ter saído das manifestações mais consciente politicamente e disposto a aproveitar logo a primeira oportunidade de voto que terá, em 2014, para tentar concretizar algumas das reivindicações que levou para as ruas.

"Logo após fazer aniversário e completar 16 anos, eu já quero tirar o título para tentar mudar o que está acontecendo aí. Eu acho que, se o povo tiver consciência do voto, se todo mundo for unido - como está acontecendo agora, nas manifestações -, sim. Pelo menos entre meus amigos, todos querem votar e ajudar a mudar o Brasil. E vamos conseguir."

De acordo com o calendário da Justiça Eleitoral, o prazo para o jovem tirar o seu título para votar nas eleições de 2014 é 7 de maio do próximo ano.

Confira no capítulo de amanhã algumas soluções para resolver a crise de representatividade política e despetar a participação do jovem na definição dos destinos do País.

Da Rádio Câmara, de Brasília, José Carlos Oliveira

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h