24/01/2017 17:11 - Meio Ambiente
Radioagência
Comissão especial da Câmara prevê crise hídrica duradoura no país
Relator de comissão especial da Câmara prevê crise hídrica duradoura e antecipa pontos do relatório final. O colegiado busca soluções para reduzir o impacto da escassez de água no país desde abril de 2015 e o relatório final deve ser apresentado em março.
Mesmo considerando as diferenças climáticas do país, o relator, deputado Givaldo Vieira, do PT do Espírito Santo, avalia que a crise hídrica é resultado, sobretudo, de desmatamentos, crescimento populacional desordenado nas áreas urbanas e negligência governamental na proteção dos mananciais e na ampliação dos reservatórios. Outros fatores, como o aumento da temperatura global, levam Vieira a prever que a crise não será passageira, e vai exigir que a sociedade se adapte à nova realidade de pouca disponibilidade de água em algumas regiões. No relatório final, Givaldo Vieira pretende apontar soluções viáveis de rápida implementação e relativo baixo custo.
"Por exemplo, o pagamento por serviços ambientais: é preciso transformá-lo em programas de longo alcance, já que hoje são programas pilotos espalhados pelo país que não conseguem a repercussão necessária. Outro caminho interessante são as chamadas ‘barraginhas’, uma tecnologia que a Embrapa desenvolveu e permite reservar, sem grande custo, uma quantidade interessante de água no tempo das chuvas e que depois abastece o lençol freático. O relatório vai apontar também necessárias mudanças no padrão das edificações no país, principalmente com relação ao uso racional da água e a captação da água de chuva".
Outro foco do relatório está na educação, a fim de que o uso consciente da água esteja presente em todas as fases do aprendizado escolar. O deputado lembra que o Brasil tem uma das maiores reservas de água doce do mundo, porém, mal distribuída: a maior parte está na Região Norte, onde a população é menor que a das demais regiões. Entre 2014 e 2015, a crise hídrica atingiu o Sudeste, deixando parte da região com cenários típicos do semiárido nordestino. Já 2017 começou com racionamento de água em parte do Distrito Federal. A medida, inédita, surpreende pelo fato de acontecer em pleno período de chuva no Centro-Oeste, região conhecida como "caixa d'água" do Brasil, exatamente por abrigar as nascentes de rios que formam algumas das maiores bacias hidrográficas do país.
Especializado em fluxo de água no solo, o ex-diretor do Departamento de Geografia da UnB, Mário Diniz de Araújo Neto, avalia que a crise hídrica tem especificidades regionais, de acordo com o histórico de uso e ocupação territorial. No Distrito Federal, ele aponta problemas de gestão nos últimos 30 anos, que levaram à expansão desenfreada das áreas urbanas e a transformação do cerrado em áreas agrícolas. O atual racionamento recebeu críticas por estar restrito a apenas 14 regiões administrativas abastecidas pela barragem do Rio Descoberto. Outras regiões consideradas nobres, como Brasília e os Lagos Sul e Norte, foram poupadas. Já Mário Diniz criticou outro aspecto do racionamento.
"O foco do racionamento está na gente, nos usuários residenciais: vamos diminuir o banho, diminuir o uso da máquina de lavar. Está certo, vamos lá. Mas há outros envolvidos que não estão sendo chamados a participar do processo: a agricultura irrigada, a agroindústria, aqueles abatedouros de frango em que, cada peça abatida, gasta em torno de 15 litros de água. E são abatidas, por baixo, 50 mil a 60 mil cabeças por dia. Aí ninguém fala nada, só estão olhando para a gente".
Segundo Mário Diniz, a média mundial mostra que as residências respondem por apenas 8% do consumo total de água. Os outros 92% são consumidos pela indústria, agricultura e comércio. Em março de 2018, Brasília vai sediar a oitava edição do Fórum Mundial de Água. O evento é promovido a cada três anos pelo Conselho Mundial de Água para envolver governos locais e parlamentares na busca de soluções para problemas ligados aos recursos hídricos. Além das medidas em estudo na comissão especial da crise hídrica, a Câmara também analisa vários outros projetos de lei relativos ao tema. Além disso, a crise hídrica já foi tema de comissão geral no Plenário da Câmara em 2015.