Cidades e transportes

Deputados apontam desafios para Código de Trânsito ser efetivamente cumprido

Texto foi sancionado há 20 anos. Para especialistas, deficiências na fiscalização e pouco investimento contribuem para o ainda elevado índice de violência no trânsito brasileiro

19/09/2017 - 19:09  

O Código de Trânsito Brasileiro (Lei 9.503/97) endureceu as punições aos infratores e previu medidas educativas e preventivas consideradas modelo. Mas, vinte anos depois de ter entrado em vigor, especialistas reunidos nesta terça-feira (19) em um seminário na Câmara dos Deputados concluíram que falta muito para que a lei seja, de fato, cumprida e ajude a diminuir o número de mortes nas ruas e rodovias.

Cleia Viana/Câmara dos Deputados
Seminário sobre os 20 anos do Código de Trânsito Brasileiro
Os 20 anos do Código de Trânsito  Brasileiro foram tema de seminário realizado pela Comissão de Viação e Transportes

“O código foi um avanço, mas nós ainda temos de consolidar sua implantação, especialmente no que se refere às políticas públicas de aplicação da lei nos estados e nos municípios”, disse o deputado Hugo Leal (PSB-RJ), presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Trânsito Seguro e idealizador do debate de hoje, promovido pela Comissão de Viação e Transportes.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), ocorrem anualmente no Brasil 47 mil mortes no trânsito e outras 400 mil pessoas ficam com alguma sequela. Esses dados, apontam especialistas, são subestimados porque nem sempre há dados confiáveis à disposição.

Elmer Coelho Vicenzi, diretor do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e presidente do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), admitiu que o número de vítimas é muito alto e anunciou que vai apresentar ao Ministério da Educação uma proposta de educação para o trânsito a ser aplicada nas escolas. “40 mil mortes ainda é um número muito grande”, ressaltou.

A deputada Chistiane de Souza Yared (PR-PR), que perdeu um filho em um acidente causado por um motorista embriagado, concordou que muito ainda precisa ser feito para que o Código de Trânsito consiga salvar mais vidas. "Não é aceitável que tenhamos uma morte a cada dez minutos, uma sequela por minuto. Quando falamos em 40 mil mortes, são números que não são reais. Esse índice provavelmente é mais que o dobro", sustentou.

Investimentos
Os participantes do seminário apontaram deficiências na fiscalização e o pouco investimento como fatores que explicam o elevado índice de violência no trânsito.

Conforme o diretor da Polícia Rodoviária Federal (PRF), Renato Borges Dias, o órgão tem hoje praticamente o mesmo número de policiais que possuía em 1992 e não há autorização para a realização de concursos.

Deolindo Paulo Carniel, presidente da Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais, também criticou os cortes orçamentários e a falta de pessoal da corporação. “Em 2017, tivemos 25% menos verbas do que no ano anterior”, lamentou.

Os debatedores também criticaram o contingenciamento dos recursos do Fundo Nacional de Segurança e Educação no Trânsito (Funset), que recebe 5% do valor de todas as multas de trânsito.

Esse dinheiro deveria ser destinado a programas preventivos de segurança e educação no trânsito. No seminário, foram apresentados dados que mostram que o Funset arrecadou R$ 475 milhões neste ano. Desse total, só teriam sido efetivamente empregados R$ 24 milhões, de acordo com a federação dos policiais rodoviários.

O Supremo Tribunal Federal (STF) analisa uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) proposta pelo PSB contra o contingenciamento de 90% dos recursos do fundo.

O médico Moise Edmond Seid, da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego e um dos autores do projeto original do Código de Trânsito, defendeu que a aplicação desse dinheiro deve ser vista como investimento, e não gasto. “Na década de 1970, o Japão tinha um prejuízo anual de 5 bilhões de dólares com acidentes de trânsito e resolveu investir nessa área 1 bilhão de dólares. No ano seguinte, o prejuízo caiu para 3 bilhões de dólares. Ou seja, o Japão não gastou 1 bilhão, ganhou 1 bilhão”, ilustrou.

Alterações
Desde que foi aprovado, em 1997, o Código de Trânsito foi alterado por 31 leis. As principais alterações foram a Lei Seca; a obrigatoriedade do uso de air-bags; as regras para direção, descanso e exigência de exame toxicológico para os motoristas profissionais das categorias C, D e E; e penas alternativas no trânsito.

Também foram editadas mais de 600 resoluções do Contran, entre as quais as que aumentaram o valor de multas.

Reportagem – Antonio Vital
Edição – Marcelo Oliveira

A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura 'Agência Câmara Notícias'.