Trabalho, Previdência e Assistência

Governo: más condições de trabalho não podem ser resolvidas na aposentadoria

08/03/2017 - 22:45  

Leonardo Prado/Câmara dos Deputados
Audiência Pública
Comissão Especial da Reforma da Previdência discutiu aposentadoria de professores e de profissionais em atividades prejudiciais à saúde

Assim como na terça-feira (7) os deputados discutiram a noção de trabalho de risco, nesta quarta-feira (8) a Comissão Especial da Reforma da Previdência debateu as atividades nocivas à saúde, que também daria direito a uma aposentadoria especial. Nos dois casos, o governo argumenta que más condições de trabalho não podem ser resolvidas na aposentadoria, porque não há recursos na Previdência.

Para o assessor jurídico da Casa Civil, Gustavo Augusto Freitas de Lima, enviado pelo governo para explicar as mudanças da reforma em relação aos agentes nocivos no local de trabalho, o fundamental é separar a parte de regulação e compensação trabalhista de uma compensação na Previdência.

“Fazer isso é passar para a sociedade o custo do trabalhador que é exposto ao trabalho nocivo. Ele tem de ter proteção, revezamento, fiscalização, adicionais pelo trabalho, mas não deixar que ele seja exposto ao trabalho nocivo para depois ter direito à aposentadoria especial”, disse.

A comissão especial discute a proposta de emenda à Constituição (PEC) 287/16, que altera regras em relação à idade mínima e ao tempo de contribuição para se aposentar, à acumulação de aposentadorias e pensões, à forma de cálculo dos benefícios, entre outros pontos.

Ações judiciais
Ainda assim, o governo admite que há casos em que isso é inevitável, mas a reforma coloca uma idade mínima de aposentadoria de 55 anos mesmo nesses casos. Segundo Lima, o Brasil já teve uma idade mínima para a aposentadoria especial, entre 1960 e 1968, e ela era de 50 anos.

Como, nesse caso, as empresas precisam recolher uma alíquota maior de Previdência e, quando isso não é feito, é difícil ao trabalhador comprovar que foi exposto a agente nocivo, atualmente 82% das aposentadorias especiais por esse motivo são concedidas após ações judiciais, pelos dados do Ministério da Fazenda.

O secretário de Políticas de Previdência Social, Benedito Adalberto Brunca, também defendeu que a Previdência cumpre um papel que não deveria ser o seu, ao dar aposentadoria especial após um trabalho nocivo que deveria ter sido evitado. “Não é possível equacionar todos os problemas de trabalho na Previdência”, disse.

O representante do Ministério da Previdência Social frisou que não se trata de casos de doença profissional que afasta o profissional, porque esse tipo de aposentadoria não está sendo mudado pela reforma.

Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados
Audiência Pública. Representante da CONTEE, Rodrigo Pereira de Paula
Representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino, Rodrigo de Paula apelou para que professores sejam tratados de forma diferenciada na reforma da Previdência

Porém, para o médico do Trabalho do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Zuher Handar, o princípio está correto e deveria ser no trabalho o foco da compensação pelo trabalho nocivo, mas com tantos ambientes precários na realidade do trabalhador atualmente, ele não acha que seja possível mudar as regras. “Após a melhora dos ambientes de trabalho podemos voltar a discutir essa hipótese”, disse.

Apelo dos professores
O professor Rodrigo Pereira de Paula, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), fez um apelo aos deputados para que os professores sejam tratados de forma diferenciada na reforma da Previdência.

Para a categoria, a atual redução de cinco anos no tempo de contribuição para a aposentadoria deveria continuar. “Uma regra que vem desde 1823, quando Dom Pedro reconheceu a importância dos professores, não pode ser extinta dessa maneira”, disse Rodrigo.

Uma pesquisa feita pela Contee em conjunto com a Unisinos, no Rio Grande do Sul, avaliou que 47% dos professores tinham problemas de estresse, além da alta incidência de problemas de coluna e no uso da voz. Além disso, Rodrigo de Paula fez um resumo da situação dos professores, que, destacou ele, estão sujeitos a duplas e triplas jornadas de trabalho, com alta rotatividade na iniciativa privada, em mais de 20% anualmente.

Na educação infantil, além disso, ainda há um limite de idade de 47 anos para a contratação. “O que as professoras, que em sua maioria são mulheres, vão fazer após essa idade e até os 65 anos, porque o mercado não as contrata?”, observou.

Sobre os professores, Brunca explicou que o problema é o impacto da medida na gestão de recursos nos estados e municípios, que pagam as aposentadorias do ensino fundamental e médio. Eles representam de 20% a 40% dos servidores nos estados, 26% dos servidores aposentados, e 90% são mulheres. Nesse universo, 22% dos aposentados recebem acima do teto do regime geral. “Além disso, professores continuam trabalhando na mesma atividade após a aposentadoria”, disse.

Crise fiscal
O deputado Julio Lopes (PP-RJ) disse que atualmente no Rio de Janeiro 66% dos servidores teriam aposentadoria especial, e isso tem um custo importante, que seria um dos fatores para a crise fiscal por que passa o estado.

“Tem roubo, tem sacanagem. Mas, mesmo que isso seja corrigido, o deficit do sistema no Rio é de R$ 14 bilhões por ano, e só vamos resolver isso dando racionalidade”, disse o deputado. “É claro que nós gostaríamos de dar aposentadorias especiais para todos os professores, mas como isso é possível se, para cada professor que entra no sistema, 26 se aposentam? São 200 mil servidores para pagar a Previdência de 400 mil aposentados”, acrescentou.

Para o deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), esse não pode ser o argumento. “Além de tudo, esses trabalhadores vão precisar de 20 anos de contribuição, que não é a realidade do mercado”, disse.

O deputado Bebeto (PSB-BA) lembrou que quando os professores universitários foram retirados da aposentadoria especial, a discussão foi sobre a diferença de condições de trabalho nas faculdades e na educação infantil e de jovens. “Os professores vão a áreas de risco, sobem morro, vivem ameaças e condições precárias”, disse.

Reportagem - Marcello Larcher
Edição - Newton Araújo

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