Segurança

Revogação do Estatuto do Desarmamento divide opiniões em audiência pública

Deputados definem série de debates nos estados. O relatório final deve ser apresentado em agosto.

18/06/2015 - 20:19  

A revogação do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03) prevista em projeto de lei (PL 3722/12) em tramitação na Câmara dos Deputados dividiu opiniões em audiência pública promovida nesta quinta-feira pela comissão especial que analisa a proposta. Entre outras medidas, o projeto também facilita o porte de armas para o cidadão comum e reduz a idade mínima para comprar arma de 25 para 21 anos.

Alex Ferreira / Câmara dos Deputados
Audiência Pública e Reunião Ordinária. Representante do Comitê Nacional de Vítimas de Violência, Valéria Velasco
Valéria: reduzir para 21 anos a idade mínima para comprar arma é fator de alto risco. Os jovens são as maiores vítimas da violência no País e não têm maturidade para usar instrumentos letais.

Defensor do estatuto, o vice-presidente do Conselho Federal de Psicologia, Rogério de Oliveira Silva, admitiu ter levado alguns "sustos" com o projeto de revogação, sobretudo diante da descentralização dos procedimentos de concessão de porte de arma, que hoje é atribuição da Polícia Federal, e passaria também para as polícias civis estaduais.

Aptidão psicológica
Para Rogério Silva, há riscos de concessão de porte de arma a pessoas com aptidão psicológica duvidosa. "Na experiência que temos no sistema Conselho de Psicologia, quando se descentraliza as metodologias e os credenciamentos para diversos órgãos estaduais, perde-se o rigor desse controle e a prova está nos processos éticos que nos chegam o tempo todo porque as pessoas ficam à mercê de determinados assédios, nos estados e nas cidades, e isso diminui o rigor das avaliações".

Parlamentares contra o estatuto garantem que a comprovação de aptidão psicológica será mantida no projeto em análise na Câmara.

Rogério Silva criticou ainda os pontos do projeto de lei que aumentam os limites de número de armas (de 6 para 9) e de compra de munições (de 50 para 600) por parte de civis.

Já a representante do Comitê Nacional de Vítimas de Violência, Valéria Velasco, avalia que eventual revogação do estatuto seria um "retrocesso", com o argumento de que "arma não protege, mata". Valéria citou números do Mapa da Violência para ressaltar queda no número de homicídios no Brasil depois que o estatuto entrou em vigor, em 2003.

Alex Ferreira / Câmara dos Deputados
Audiência Pública e Reunião Ordinária. Pesquisador em Segurança Pública, Fabrício Rebelo
Rebelo: o desarmamento só serve para reduzir crimes passionais e impulsivos. O problema é que esses crimes não são a base da criminalidade e sim os praticados por criminosos habituais.

Ela avaliou que reduzir a idade mínima para 21 anos para a compra de arma é fator de alto risco para a sociedade, já que os jovens são as maiores vítimas da violência no País e não têm maturidade suficiente para uso de instrumentos letais. Segundo ela, nem os policiais, que deveriam ser bem treinados, manejam bem as armas, como mostram os casos de bala perdida registrados no País.

Estelionato estatístico
Por sua vez, o ex-governador de Goiás Irapuan Costa Junior saiu em defesa do projeto sobretudo porque, segundo ele, garante o direito de o cidadão se autodefender.

Na mesma linha, o pesquisador de segurança pública Fabrício Rebelo disse que os números que mostram redução dos homicídios e cerca de 120 mil vidas poupadas após o estatuto equivalem a um "estelionato estatístico".

Ele ainda apresentou números baseados em nove anos antes e depois do estatuto para rebater as estatísticas favoráveis ao desarmamento. "Há verdadeiros malabarismos com números tentando mostrar que o estatuto reduziu o número de homicídios e salvou vidas, mas os dados concretos mostram o contrário".

Segundo ele, a taxa de homicídio (por 100 mil habitantes) entre 1995/2003 foi de 26,44%; já no período 2004/2012, ficou em 26,80%, portanto, com elevação de 1,36%. Disse ainda que "o estatuto não produziu sequer a redução do número de armas de fogo na prática de homicídios": 64,95%, entre 1995/2003) e 70,81%, entre 2004/2012, com aumento de 5,86%.

Para Rebelo, "política desarmamentista é o mesmo que tratar dengue com quimioterapia: não cura a dengue e causa efeito colateral devastador no paciente".

O pesquisador acrescentou que o efeito colateral dessa política de desarmamento em um quadro de violência criminal é muito mais nefasto do que o suposto benefício que ela pode trazer. “Quando tiramos a arma de fogo de circulação na sociedade, o efeito imediato é a fragilização social: tiramos a força da sociedade no confronto com o ataque criminoso".

Alex Ferreira / Câmara dos Deputados
Audiência Pública e Reunião Ordinária. Ex-Secretário de Estado de Ações Estratégicas do Espirito Santo, Álvaro Farjado
Álvaro Fajardo, delegado da Polícia Federal, mostrou experiência bem sucedida no Espírito Santo na prevenção e redução da criminalidade, com o programa "Estado Presente".

Fabrício Rebelo assinalou que o desarmamento só serve para reduzir os crimes passionais e impulsivos. "O problema é que esses crimes não são a base da criminalidade brasileira e sim os crimes praticados por criminosos habituais. Desarmamento é um erro grotesco".

Experiência bem sucedida
Já o delegado de Polícia Federal e ex-secretário extraordinário de ações estratégicas do Espírito Santo (2011 a 2014), Álvaro Fajardo, mostrou a experiência "bem sucedida" do estado na prevenção e redução da criminalidade por meio do programa "Estado Presente".

O programa é baseado em dois eixos estratégicos: proteção policial (modernização do sistema de segurança pública) e proteção social (inclusão, oportunidades e garantias principalmente para a juventude). Ao final de 2014, houve redução de 25% na taxa de homicídio do estado em relação ao início da década de 1990. De 2011 a 2014, mais de 15 mil armas foram apreendidas (57% revólver e 14% pistolas), a maior parte (68%) fabricada no Brasil.

Votação
Apesar de posições tão divergentes, o relator do projeto de lei, deputado Laudívio Carvalho (PMDB-MG), prometeu isenção no parecer final que pretende apresentar em 27 de agosto para votação da comissão já na primeira semana de setembro. "Tudo o que foi dito servirá para o nosso relatório. Não temos preferência por A ou B. Temos que ser isentos no nosso relatório final: esse é o nosso objetivo".

Reportagem - José Carlos Oliveira
Edição – Regina Céli Assumpção

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