Política e Administração Pública

Câmara inagura exposição sobre interferência da ditadura nos trabalhos legislativos

Segundo consultor, 173 deputados tiveram seus mandatos cassados de 1964 a 1977. Painéis também mostram movimentos populares que lutaram contra o regime.

01/04/2014 - 08:35  

A Câmara dos Deputados inaugura hoje a exposição "Instituições Mutiladas, Resistência e Reconstrução Democrática (1964-2014)", que apresenta, por meio de fotos e imagens, um panorama de como as instituições democráticas foram atingidas pelo regime militar que teve início com o golpe de 1964.

Os painéis, que ficarão expostos no corredor de acesso ao Plenário Ulysses Guimarães até o dia 30 de abril, vão mostrar também as diversas formas de resistência utilizadas à época contra a ditadura, com destaque para os movimentos populares, como os que defendiam a anistia e eleições diretas, e para os órgãos de imprensa que lutaram diariamente para furar o bloqueio à liberdade de informação.

A mostra é baseada em um levantamento feito pelo consultor da Câmara Márcio Rabat para o livro "Parlamento Mutilado - deputados federais cassados pela ditadura de 1964", escrito em parceria com a também consultora Débora Bithiah. O tema central são os meios utilizados pela ditadura militar para intervir nos trabalhos da Câmara, com destaque para os três fechamentos do Congresso (1966, 1968 e 1977) e para cassações de deputados.

“Fizemos uma longa pesquisa para chegar ao número de 173 mandatos cassados, de 1964 a 1977, sempre com atos sumários e autoritários”, diz Rabat.

“Ameaça comunista”
A exposição destaca, por exemplo, o Ato do Comando Supremo da Revolução nº2, que autorizou a cassação de 36 deputados apenas nove dias após os militares chegarem ao poder. Segundo o consultor, uma análise mais detalhada sobre as filiações partidárias de parlamentares cassados deixa claro que o interesse maior era eliminar a “ameaça comunista”.

“Fica claro que havia uma divisão política e o interesse das cassações era eliminar ou diminuir fortemente a presença dos setores da sociedade representados por partidos como PTB (quando vigia o pluripartidarismo) e o MDB (depois da implantação do bipartidarismo) das discussões nacionais”, explica.

Apesar de as bancadas mais afetadas terem sido as do PTB e do MDB, Rabat acrescenta que oito partidos tiveram deputados cassados, em um total de 13 legendas registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 1964. Ele avalia que as cassações não apenas desequilibraram a representação política no Congresso, fazendo com que setores sociais significativos ficassem sub-representados, mas também serviram para pressionar parlamentares não cassados com o risco de perda dos mandatos.

O consultor ressalta que o regime de 1964 conduziu uma série de intervenções no Parlamento. “Em 1969, por exemplo, uma emenda constitucional, que foi promulgada sem qualquer interferência do Legislativo, era praticamente uma nova Constituição”, diz ele, ressaltando ainda a cassação de três membros do Supremo Tribunal Federal (STF) no início de 1969.

Reabertura política
Rabat destaca, por fim, que com a reabertura política, em 1985, muitos deputados cassados recuperaram suas carreiras. “Essa volta se deve principalmente ao fato de que esses parlamentares representavam setores sociais ditos relevantes. Quando houve a reabertura, esses políticos voltaram a ser escolhidos”, explica o consultor.

Ele cita o exemplo do ex-deputado Leonel Brizola, que havia conseguido a maior votação da história da Câmara e, na primeira eleição de que participou após o exílio, em 1982, foi eleito governador do Rio de Janeiro.

Reportagem – Murilo Souza
Edição – Marcelo Oliveira

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