Política e Administração Pública

Sistema político-eleitoral é falho e tem de mudar, dizem analistas

Câmara discute reforma política de 95, sem acordo; discussão ganha fôlego com a pressão das ruas.

27/09/2013 - 21:17  

Arquivo/ Beto Oliveira
Cândido Vaccarezza
Vaccarezza: “A reforma política não vai resolver totalmente o problema da corrupção eleitoral. Temos que mudar essa cultura da corrupção.”

A Constituição precisa de mudanças nos dispositivos relativos ao sistema político-eleitoral. Isso é consensual entre especialistas e no meio político. O problema é encontrar um acordo sobre novas regras.“Esta é uma das partes em que a Constituição foi falha”, afirma o consultor legislativo Antonio Octávio Cintra.

“A prova de que há aspectos do sistema político-eleitoral ainda não resolvidos é o fato de se falar o tempo todo de reforma política”, complementa o deputado Alessandro Molon (PT-RJ). "A dificuldade está no fato de que quem está no poder quer se manter no poder", opina o líder da Minoria, deputado Nilson Leitão (PSDB-MT).

Desde 1995, o Congresso discute uma reforma política. Funciona atualmente na Câmara um grupo de trabalho (GT) sobre a reforma, coordenado pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), que vai apresentar até o fim de setembro uma proposta com alterações no sistema político-eleitoral.

Esta é o segundo colegiado sobre esse tema apenas nesta legislatura. O deputado Henrique Fontana (PT-RS) trabalhou por dois anos em um texto, no âmbito da Comissão Especial sobre Reforma Política, mas a proposta apresentada, em 2011, não chegou a ser votada em Plenário por falta de consenso.

O cientista político João Paulo Peixoto acredita que, agora, a pressão popular pode contribuir para que a reforma seja concluída.

Financiamento de campanha
Para o professor de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP) José Álvaro Moisés, há pelo menos dois pontos que estão funcionando mal no sistema político-eleitoral brasileiro. O primeiro é o financiamento das campanhas eleitorais. “O Brasil é um dos países que tem as campanhas eleitorais mais caras do mundo”, destacou. Segundo Moisés, o esquema atual abre a possibilidade de corrupção e de formação de caixa dois. “Nós precisamos enfrentar esse problema. Na Constituição, é preciso rever os mecanismos que favorecem essa modalidade de financiamento.”

Antonio Augusto
Alfredo Sirkis
Sirkis: "Temos de diminuir a influência do poder econômico nas eleições, mas proibir as empresas de doar pode promover uma explosão do caixa 2."

Hoje, de acordo com o texto constitucional, as campanhas eleitorais são financiadas pelo fundo partidário, financiado pelo Orçamento da União e multas eleitorais. Além disso, os candidatos podem receber contribuições de eleitores e de empresas.

O deputado Alfredo Sirkis (PV-RJ), relator do GT da Reforma Política, apresentou proposta que limita as doações privadas a campanhas eleitorais. “Temos de diminuir a influência do poder econômico nas eleições”, disse. “O financiamento público exclusivo é uma boa proposta, mas enfrenta grande resistência da sociedade.”

O deputado Henrique Fontana acredita que as empresas devem ser proibidas de fazer doações em campanhas e deve haver limites para os valores totais das campanhas. Esses pontos também estão propostos na proposta de iniciativa popular de reforma política. As assinaturas de apoio ao projeto estão sendo colhidas pelo movimento Eleições Limpas.

Sistema proporcional
De acordo com o professor Álvaro Moisés, o segundo aspecto necessário de uma reforma político-eleitoral é a mudança do atual sistema proporcional, previsto na Constituição para as eleições a deputado. “Apareceu com grande força nas manifestações nas ruas a ideia de que as pessoas querem se sentir representadas, querem algum grau de controle sobre o desempenho de seu representante. Isso exige mudança no sistema eleitoral”, disse o professor.

No sistema proporcional, válido também para vereadores e deputados estaduais, são eleitos os candidatos que atingem determinado número de votos. Este número é calculado pela soma de todos os votos dividido pelo número de cadeiras disponíveis. Assim, não ganha necessariamente quem tem mais voto, mas sim a legenda, o partido que consegue mais votos. Já no sistema majoritário, previsto hoje na Constituição para as eleições para senadores, prefeitos, governadores e presidente da República, ganha quem tem mais votos.

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Sirkis explica a proposta de sistema misto.

Na proposta apresentada ao GT da Reforma Política, Alfredo Sirkis sugere a instituição de um sistema eleitoral misto para deputados. Pela proposta, metade dos deputados seria eleita pelo sistema proporcional e a outra metade seria escolhida pelo sistema majoritário em distritos eleitorais definidos pelo Tribunal Superior Eleitoral.

“Por um lado, isso fortalece os partidos e, por outro, consagra quem tem voto. Seria prejudicado por isso os sem voto: aqueles que se elegem na rabeira dos outros”, disse o deputado.

Leonardo Prado
Henrique Fontana
Fontana apresentou um parecer sobre a reforma política, em 2011, que não foi votado até hoje por falta de acordo.

Fim das coligações
A proposta de Fontana prevê a substituição das coligações eleitorais por federações partidárias, que durariam por toda a legislatura.

Hoje, a Constituição assegura aos partidos políticos autonomia para definir suas coligações eleitorais, sem obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal.

Reportagem - Lara Haje
Edição - Natalia Doederlein

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