Economia

Plenário ficou dividido sobre alcance da legalização de dinheiro no exterior

12/11/2015 - 00:29  

Mesmo depois de semanas de negociação de mudanças no texto, os deputados continuaram divididos sobre quem será beneficiado pelo projeto que permite a regularização de dinheiro e bens enviados ao exterior sem declaração à Receita Federal. A votação foi apertada: 230 favoráveis e 213 contrários.

Os contrários ao texto alertaram que a proposta vai abrir brechas para a legalização de dinheiro ilegal, vinculado ao crime. Os governistas, no entanto, ressaltaram que o texto é claro e só vai legalizar dinheiro lícito. A regularização depende de pagamento de multa e de imposto de renda, mas haverá anistia de crimes como sonegação fiscal.

Os principais dispositivos criticados pelos oposicionistas são a anistia para crimes e a legalização baseada na declaração do contribuinte. “Esse projeto prevê punibilidade extinta para crimes de sonegação fiscal, falsificação de documento, evasão de divisas, lavagem de dinheiro, descaminho e uso de documento falso”, disse o deputado Pauderney Avelino (DEM-AM).

O líder do Psol, deputado Chico Alencar (RJ), também criticou a anistia a crimes. “Isso não é irrelevante, configura de fato uma anistia ampla em demasia que pode beneficiar gente que está muito enrolada, contra os interesses do País”, disse.

Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
Sessão extraordinária para discussão e votação de diversos projetos. Dep. Rubens Bueno (PPS-PR)
Rubens Bueno: "Se o dinheiro é lícito, que problema tem o contribuinte de comprovar a origem?"

Lavagem de dinheiro
O líder do PPS, deputado Rubens Bueno (PR), leu nota do Ministério Público que avalia que a proposta vai facilitar a lavagem de dinheiro. “Se o dinheiro é lícito, que problema tem o contribuinte de comprovar a origem? Não há como saber a origem deste dinheiro pelo projeto, ou seja, pode ser do narcotráfico”, afirmou.

O deputado Raul Jungmann (PPS-PE) disse que a proposta vai inviabilizar as operações Lava Jato e Zelotes. “A proposta se baseia na presunção da declaração de um criminoso que sonegou, fraudou e mandou ao exterior recursos que o Estado brasileiro não conseguiu alcançar”, condenou.

A deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ) apresentou requerimento para impedir a votação. “O texto diz que restringe a legalização a recursos de origem lícita, mas não exige comprovação de licitude”, afirmou. “O problema não é a repatriação, mas as espertezas incluídas no projeto.”

O líder da Rede, deputado Alessandro Molon (RJ), disse que a proposta vai ter repercussões negativas. “É verdade que a proposta pode servir para arrecadar recursos sonegados e contribuir para avanços no Brasil. No entanto, é preciso deixar claro que o substitutivo piorou e há brechas para que dinheiro ilícito seja lavado”, disse.

Ele lembrou que o dono dos recursos não será obrigado a provar a origem lícita do dinheiro e só será punido se apresentar documentos falsos. “Se deixar de apresentar documentos, não será punido”, afirmou Molon.

Defesa da proposta
A líder do PCdoB, deputada Jandira Feghali (RJ), defendeu a medida e desafiou os oposicionistas a apontar qual ponto da proposta prevê legalização de dinheiro vinculado ao crime. “Entendo a luta política, não há nenhum dispositivo que acoberte corruptos na proposta. Este projeto acompanha iniciativas internacionais e não é inovação no País”, declarou.

A deputada disse que tributaristas e juristas foram consultados e criticou a tentativa de desqualificação do processo de votação da proposta.

Já o relator do projeto, deputado Manoel Junior (PMDB-PB), disse que o imposto e a multa cobrados da legalização serão investidos no Brasil.

Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
Sessão extraordinária para discussão e votação de diversos projetos. Líder do PCdoB, dep. Jandira Feghali (RJ)
Jandira Feghali: "Não há nenhum dispositivo que acoberte corruptos na proposta"

“Aquele recurso que está lá no exterior, que foi levado para defender o patrimônio daqueles profissionais liberais ou empresas à margem da Receita Federal, poderá ser regularizado e pagar um imposto que o Brasil nunca viu e vai servir a você que está esperando dinheiro da farmácia popular, que não tem infraestrutura, que se vê na insegurança. Esse dinheiro só está servindo àqueles lá fora”, avaliou.

Manoel Junior disse ainda que a anistia a crimes está ligada exclusivamente à sonegação fiscal e à evasão de divisas. “Em nenhum momento iríamos permitir legalização de dinheiro da Lava Jato, da corrupção, do tráfico de drogas e de armas”, declarou.

O deputado Mauro Pereira (PMDB-RS) também disse que a arrecadação vai ajudar o brasileiro. “Nosso governo em situação dificílima, sabendo que temos mais de R$ 500 bilhões, que podem ajudar a ter investimento”, disse.

Embate político
O líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), acusou a oposição de ser contra a proposta por motivos políticos. “A oposição é contra por uma razão básica: inviabilizar o governo. Não quer que o governo arrecade.”

Guimarães negou qualquer janela para legalização de dinheiro ilegal. “Vai chegar dinheiro no Brasil e não vamos comprometer a ética”, afirmou. Segundo ele, toda a anistia penal do projeto está vinculada apenas à sonegação fiscal e evasão de divisas.

O líder do PMDB, deputado Leonardo Picciani (RJ), disse que o Brasil não pode esquecer o passado de crise econômica e que chegou a hora de legalizar esse cenário. “Negar que recursos existam no exterior é negar a nossa história de um País que viveu mais de uma década com inflação na casa das centenas e, por isso, muitas pessoas amedrontadas com esse cenário mandaram seu recurso para fora”, disse.

Picciani afirmou ainda que o projeto não deixa porta aberta para legalização de dinheiro vinculado ao crime, mas fecha a porta para isso. “Quem tentar acobertar crimes vai ser pego e vai ser condenado como deve ser.”

Reportagem – Carol Siqueira
Edição – Pierre Triboli

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