Economia

20 anos do Real: plano controlou inflação, mas falta crescimento

27/06/2014 - 14:50  

No dia 1º de julho, a moeda brasileira, o real, faz 20 anos. Ela foi criada, em substituição ao cruzeiro, no governo Itamar Franco, em 1994, com o intuito de resolver a crise inflacionária brasileira, herdada do regime militar. Nessa época, os preços subiam cerca de 3.000% ao ano. Hoje sobem 6% ao ano. O Plano Real de fato baixou a inflação, mas a estabilização não foi o suficiente para deslanchar o crescimento econômico.

Fernando Henrique Cardoso e Itamar Franco, os pais do Plano Real

Os governos de José Sarney e Fernando Collor tentaram, sem sucesso, acabar com a inflação. Ao assumir a presidência, após a queda de Collor, Itamar Franco convidou Fernando Henrique Cardoso para ser ministro da Fazenda com a missão de reorganizar a economia. Ele reuniu um grupo de economistas – coordenado pelo professor de economia Pedro Malan, à época presidente do Banco Central –, que elaborou um plano de ação econômica, publicado no final de 1993.

Malan, que depois foi ministro da Fazenda no governo FHC, explica que a inflação prejudicava especialmente os mais pobres. “A inflação é um imposto que incide sobre o salário, que prejudica fundamentalmente aqueles menos capazes de se defender, que são as pessoas que não tem acesso à indexação [sistema de reajuste de preços com base nos índices oficiais de inflação] e carregam no bolso a sua moeda, que vai sendo comida numa base diária pela inflação”, afirma. “Essa é a razão por que a maioria da população brasileira hoje exige e exigirá de qualquer governo que ele não tenha uma atitude complacente com a inflação”, complementa.

Criação da nova moeda
No início de 1994, a inflação estava em cerca de 40% ao mês. Os preços subiam sem parar – gasolina, alimentos, prestações –, e o cruzeiro valia muito pouco em relação ao dólar. O plano dos economistas foi criar em fevereiro uma espécie de dólar virtual, a URV (Unidade Real de Valor). A roda-viva dos preços continuava corroendo o cruzeiro, mas não atingia a URV. Em julho, a URV foi transformada em real. A nova moeda nascia sem a doença da hiperinflação, valendo o mesmo que o dólar.

O deputado Rubens Bueno (PPS-PR) lembra que, no primeiro mês após a criação do real, a inflação já caiu a 9%. “O Plano Real trouxe organização econômica para o País, com ganhos para o Poder Público e para a população mais pobre, que não tinha como segurar o dinheiro aplicado em uma conta”, diz. “O plano tirou milhões de brasileiros da pobreza e da miséria”, completou. Ele ressalta que uma das diferenças desse plano em relação a planos anteriores, baseados no congelamento dos preços e do dólar, é que nada foi feito de surpresa, tudo foi feito com aviso para a população.

Baixo crescimento
Aos poucos, o Brasil chegou à inflação de país desenvolvido: apenas 1,5% em 1998. Mas os juros continuavam de terceiro mundo: o Banco Central jogou a taxa básica nas alturas, desestimulando o consumo e atraindo investidores para equilibrar as contas externas. Inflação baixa e juro alto resultaram em pouco crescimento econômico, sustentado em boa parte pelas exportações.

O ex-deputado Antonio Palocci, ministro da Fazenda nos governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, avalia o real: “O Plano Real foi o mais talentoso plano de estabilização. Ao invés de controlar todos os preços, controlou um só preço, que foi o preço do câmbio. Mas ele foi estendido além do tempo: a paridade cambial não deveria ter sido estendida por tempo tão prolongado.”

O Produto Interno Bruto (PIB), que mede a riqueza produzida no País, crescia quase 6% no lançamento do real. Quatro anos depois, em 1998, a economia brasileira praticamente parou de crescer. A estagnação coincidiu com as crises externas da Ásia e da Rússia, entre 1997 e 1998. “Durante a década de 90, nós tivemos os problemas de balanço de pagamentos advindo da paridade com o dólar; esse tipo de paridade é destruidor para a economia brasileira porque nossa produtividade é muito distinta”, destaca o deputado Cláudio Puty (PT-PA). “Isso levou em 1999 à quebra do Brasil.”

Com a queda nas exportações e o fantasma da recessão, o governo desvalorizou fortemente real no início de 1999. O dólar, que custava R$ 1, passou a custar mais de R$ 2, voltando depois para R$ 1,75. O Banco Central adotou o câmbio flutuante e o sistema de metas para a inflação. “Esse modelo foi uma posterior evolução do real, que deve ser sempre revistado”, conclui Puty. “Houve avanços no passado, mas precisamos pensar no futuro, por exemplo, em aumentar a produtividade da nossa indústria.”

Partidos se dividiram na época do lançamento do Plano Real

Economistas pedem avanços
Após 20 anos da implementação do Plano Real pelo governo Itamar Franco, em 1994, economistas defendem avanços, já que o plano resolveu a crise inflacionária brasileira, mas não gerou crescimento econômico no País.

O economista Marcelo Neri, ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), acredita que o Brasil aprendeu, com o Plano Real, o valor da estabilidade, mas defende que é preciso avançar em termos de políticas públicas. “A estabilidade é uma condição necessária para o objetivo final, que é a melhoria das condições de vida da população, especialmente dos mais pobres. O Plano Real permite pensar o País à frente, mas é preciso desenhar e implementar políticas para que essa condição seja melhor aproveitada.”

A professora da Universidade de Brasília (UnB) Maria de Lourdes Mollo, doutora em economia, também diz que é preciso avançar: "Temos hoje uma moeda estável e, não temos, nem de perto, nada parecido com a inflação daquela época. É preciso centrar em aumentar o investimento de maneira a garantir um crescimento elevado. Para isso, a taxa de juro alta não é boa.”

Da Redação - ND

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