Direitos Humanos

Deputados e senadores criticam "situação precária" de índios kaiowás no MS

Grupo tenta encontrar solução para a comunidade, que reivindica a posse de terras ocupadas tradicionalmente pelos índios. Uma possibilidade é a reserva de recursos para indenização aos proprietários rurais já em 2013.

11/12/2012 - 20:37  

Índios Kaiowás que vivem na Fazenda Cambará, nas margens do Rio Hovy (MS).
Cerca de 150 índios que vivem na Fazenda Cambará não têm atendimento de saúde e não frequentam nenhuma escola.

Em visita ao município de Iguatemi (MS), a 460 quilômetros de Campo Grande, os parlamentares da comissão externa que acompanha as denúncias de violência contra os indígenas Guarani-Kaiowá, criticaram as condições de vida da comunidade.

Os índios kaiowás vivem em uma área de dois hectares da Fazenda Cambará, conhecida como Pyelito, nas margens do Rio Hovy. Os cerca de 150 índios que vivem por lá não têm atendimento de saúde e não frequentam nenhuma escola. O grupo ainda tem dificuldade em receber os alimentos enviados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em razão das limitações de acesso à área impostas pelo proprietário da região.

“Em pleno século XXI, seres humanos sendo tratados como bichos, animais”, alertou o presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, deputado Sarney Filho (PV-MA). O senador João Capiberibe (PSB-AP) qualificou como “chocante” a situação dos índios: “Fico constrangidíssimo com essa situação. Os índios, que um dia foram donos desta terra, vivem hoje em situação precária”.

Para tentar ajudar a resolver o problema, os deputados pediram melhorias imediatas ao grupo, como o acesso da Funai à área, além da instalação de um veículo para transporte dos índios. Mas a solução definitiva para o caso, segundo o grupo que visitou a comunidade, envolve a demarcação definitiva da área e a indenização do proprietário. Deputados e senadores tentam aprovar uma emenda ao Orçamento de 2013 com esse objetivo.

Índios Kaiowás - Fazenda Cambará - Mato Grosso do Sul
Além dos conflitos fundiários com proprietários, indígenas não têm acesso a políticas públicas.

Políticas públicas
A situação dos índios de Pyelito e de toda a região é complexa e soma os conflitos fundiários com proprietários à falta de acesso a políticas públicas básicas de educação, saúde e saneamento, por exemplo.

O início do drama dos índios na região sul do Mato Grosso do Sul data dos anos de 1930, quando algumas terras originalmente dos índios foram vendidas ou doadas pela União e pelo estado a proprietários rurais. Boa parte da ocupação aconteceu nos anos de 1970 e os índios e os antropólogos que trabalham na área alegam que os setores menos produtivos foram destinados a reservas indígenas.

Um estudo antropológico da Funai específico sobre o caso dos Pyelito deve ser finalizado ainda este ano, segundo a autarquia. Estudos preliminares, porém, já mostram que os índios que hoje ocupam parte da Fazenda Cambará, que tem 760 hectares no total, viviam na região e foram deslocados para reservas do estado, muitas com péssimas condições de vida. “O que houve historicamente foi um verdadeiro etnocídio, já que arrancaram os índios de suas terras, que são fundamentais para sua identidade”, disse a deputada Érika Kokay (PT-DF).

O movimento de retorno às terras originais começou por volta de 2006 entre a comunidade de Pyelito e outras da região. Os 150 índios estão na Fazenda Cambará desde agosto de 2011. Do outro lado do rio está a Reserva Sassoró, no município de Tacuru, que oferece alguns serviços básicos de educação e saúde aos índios.

Posição dos fazendeiros
Os fazendeiros da região alegam que as dificuldades por que passam os indígenas hoje se deve à decisão de invadir terras privadas. “Os indígenas vivem nessa situação porque saíram de uma área demarcada e vão para a invasão sofrer essa falta de estrutura”, disse a produtora rural Luana Ruiz aos parlamentares que visitaram Iguatemi.

O argumento, porém, não é válido, de acordo com Érika Kokay: “Muitos fazendeiros realmente encontram-se no local de boa fé. No entanto, nada justifica a situação de confinamento em que se encontram os índios hoje. Eles têm de permitir o acesso das políticas públicas às comunidades”.

Repercussão
O caso dos kaiowás ganhou repercussão nacional e internacional recentemente em razão da divulgação de uma carta em que denunciam as péssimas condições em que vivem e o risco de expulsão de Pyelito. Em setembro deste ano, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região havia determinado a saída dos índios do local, mas uma decisão do mesmo tribunal de outubro deste ano manteve a comunidade na Fazenda Cambará.

Os índios que vivem no local reclamam que são intimidados e coagidos por seguranças armados na região. “Nós, povo guarani-kaiowá, mesmo com ameaça a tudo, a gente não vai desistir. Já estamos aqui, sem acesso, não podemos plantar ainda neste pedacinho, mas sempre estamos lutando e vamos sempre lutar”, garantiu o líder indígena Ademir Lopes.

Eles também relataram aos deputados e senadores alguns ataques contra líderes indígenas da região que ocorreram até o ano passado. Segundo o procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida, a média de assassinatos nas regiões indígenas é de 14 vezes o índice de alerta da Organização Mundial da Saúde.

O dono da propriedade, Osmar Bonamigo, nega qualquer ameaça aos índios. O assessor jurídico da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul Carlo Daniel Coldibelli Francisco também negou que haja conflito armado entre proprietários e indígenas da região: “O que há é um problema social cujas informações são manipuladas para que se pense que há um conflito armado que não existe”.

Além de Sarney Filho, João Capiberibe e Érika Kokay, participaram da visita os deputados Geraldo Resende (PMDB-MS), Janete Capiberibe (PSB-AP), Penna (PV-SP) e Ricardo Tripoli (PSDB-SP), além do senador Randolfe Rodrigues (Psol-AP).

Índios no Congresso
Nesta quarta-feira (12), a partir das 9h30, uma comitiva com 90 lideranças indígenas de todas as regiões do País estará no Congresso Nacional para pedir a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista e presenciar a entrega do relatório da visita de parlamentares à comunidade Guarani Kaiowá de PyelitoKue. A entrega ocorrerá no Hall da Taquigrafia da Câmara.

Às 14 horas, a comissão externa vai promover reunião no auditório Freitas Nobre, com a presença de lideranças do povo Guarani Kaiowá.

Reportagem – Carolina Pompeu
Edição – Regina Céli Assumpção

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