Direito e Justiça

Convidados de audiência defendem mais garantias a acusado em processo penal

14/03/2017 - 17:55  

Billy Boss/Câmara dos Deputados
Audiência Pública e Reunião Ordinária
Para os convidados da audiência, as novas garantias ao acusado podem evitar injustiças, como a condenação antecipada

Participantes da audiência pública da comissão especial que analisa mudanças no Código de Processo Penal (PL 8045/10) defenderam, nesta terça-feira (14), mais garantias para o acusado na decretação das chamadas medidas cautelares reais – indisponibilidade, sequestro, arresto e hipoteca de bens de suspeitos que ainda não tenham sido condenados pela Justiça.

Essas medidas são adotadas, no processo criminal, como maneira de garantir futura indenização ou reparação à vítima da infração penal, pagamento das despesas processuais ao Estado ou mesmo evitar que o acusado obtenha lucro com a prática criminosa.

As medidas têm causado polêmica nas audiências públicas da comissão. Para muitos especialistas, quando o juiz adota essa decisão, está antecipando a sentença condenatória.

O advogado Gustavo Badaró, professor da Universidade de São Paulo (USP), fez críticas pontuais à proposta. Ele defendeu que a indisponibilidade, uma das cautelares, só pode atingir bens sobre os quais há suspeitas de terem sido adquiridos ilicitamente. “Também é preciso [definir] prazo máximo para as cautelares”, disse.

Já o juiz Rubens Casara, do Rio de Janeiro, afirmou que o projeto contém dispositivos que contrariam o princípio de que o réu é inocente até ser condenado. Segundo ele, a proposta não estabelece condições objetivas para a decretação das chamadas cautelares reais. “Há sérios riscos de o Congresso aprovar dispositivo mais autoritário que o atual código, de 1941, de origem fascista”, afirmou.

O defensor público Álvaro Roberto Fernandes, do Rio Grande do Sul, defendeu a separação entre quem acusa, quem defende e quem julga – princípio que justifica a criação do juiz de garantias.

Fernandes criticou a possibilidade de um juiz decretar medidas cautelares – como prisões temporárias – de ofício, ou seja, sem que a polícia ou o Ministério Público tenham pedido. “O juiz não pode ter o mesmo papel do promotor de Justiça ou da autoridade policial”, disse.

Os convidados defenderam que o código garanta o princípio da presunção da inocência para os réus, como prazo máximo para que as medidas vigorem, e critérios objetivos para a decretação de bens sobre os quais não há certeza de que foram objeto de crime.

Mas o delegado da Polícia Federal João Conrado Ponte de Almeida, de Fortaleza (CE), considerou a proposta um avanço. “O projeto é bom porque regulamenta o que o juiz pode fazer. Cria a indisponibilidade de bens, não prevista de forma explícita no código atual, e o arresto”, disse.

Juiz de garantias
Participantes da audiência pública defenderam a separação das atribuições de cada uma das partes do processo, como a criação do juiz de garantias, para atuar apenas na fase processual.

De acordo com a proposta, já aprovada no Senado, o juiz de garantias atua durante o período de investigação criminal e é impedido de analisar o mérito da causa. Sua função é controlar a legalidade da investigação criminal e a salvaguarda dos direitos fundamentais do acusado, sem entrar no mérito da acusação.

Para o juiz federal Ali Mazloum, de São Paulo, o juiz de garantias é um avanço. “Causa espanto, quando a gente fala para juristas de outros países, que no Brasil o mesmo juiz que decreta a prisão e autoriza uma interceptação telefônica é quem vai julgar o acusado. Isso é um barbarismo”, disse.

O deputado Delegado Edson Moreira (PR-MG) criticou a criação da figura do juiz de garantias. “Um juiz para o processo e um juiz para a sentença, é juiz demais. É muito caro”, disse o deputado. “Este código tem garantia demais para o acusado e desconfiança demais sobre as autoridades”, completou.

O juiz Rubens Casara discordou da afirmação. “Se o nosso código tivesse tantas garantias, não teríamos uma das maiores populações carcerárias do mundo”, disse.

Já o relator da comissão especial, deputado João Campos (PRB-GO), considera o juiz de garantias um avanço, mas não fundamental no processo. “Isso parte do pressuposto de que o juiz que vai dar a sentença não estará contaminado pela fase processual, o que não é verdade absoluta, já que nas pequenas comarcas ele conhece a família da vítima e nos grandes centros crimes graves ganham destaque no noticiário”, disse.

Modelo chileno
Os integrantes da comissão especial irão ao Chile, na primeira quinzena de maio, participar de um seminário a respeito das mudanças radicais adotadas no código processual chileno.

“O seminário será realizado na Universidade do Chile, em Santiago, antes da conclusão dos relatórios setoriais da comissão”, informou o presidente do colegiado, deputado Danilo Forte (PSB-CE).

A reforma do Código de Processo Penal do Chile é apontada por especialistas como um modelo para o Brasil. O Chile eliminou a burocracia e o formalismo das várias fases do processo e separou de maneira clara o papel de quem investiga, quem denuncia, quem defende e quem julga, o que reduziu a duração dos processos judiciais.

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Reportagem - Antonio Vital
Edição - Sandra Crespo

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