Direito e Justiça

Entenda o projeto anticorrupção aprovado pela Câmara

Deputados aprovaram proposta que tipifica o crime eleitoral de caixa dois sem qualquer anistia e transforma alguns casos de corrupção em crime hediondo. Ficaram de fora a redução do habeas corpus e o aproveitamento de provas ilícitas

06/12/2016 - 15:24  

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou, no último dia 30, o PL 4850/16, projeto de lei que reúne várias medidas de combate à corrupção. O texto, aprovado por 450 votos a 1, será analisado agora pelo Senado. Conhecida como "As Dez Medidas de Combate à Corrupção", originalmente proposta pelo Ministério Público, a matéria era, na verdade, um conjunto de mais de 100 propostas de modificação em várias leis.

De acordo com o texto aprovado, o caixa dois eleitoral é caracterizado como o ato de arrecadar, receber ou gastar recursos de forma paralela à contabilidade exigida pela lei eleitoral. A pena será de reclusão de 2 a 5 anos e multa. Se os recursos forem provenientes de fontes vedadas pela legislação eleitoral ou partidária, a pena é aumentada em um terço.

Entre os pontos aprovados está o enquadramento em crime hediondo se a vantagem do criminoso ou o prejuízo para a administração pública for igual ou superior a 10 mil salários mínimos vigentes à época do fato. O eleitor que negociar seu voto ou propuser a negociação com candidato ou seu representante em troca de dinheiro ou qualquer outra vantagem será sujeito a pena de reclusão de 1 a 4 anos e multa.

O texto prevê casos de responsabilização de juízes e de membros do Ministério Público por crimes de abuso de autoridade. Entre os motivos listados está a atuação com motivação político-partidária. No caso dos magistrados, também constituirão crimes de responsabilidade proferir julgamento quando, por lei, deva se considerar impedido; e expressar por meios de comunicação opinião sobre processo em julgamento.

Qualquer cidadão poderá representar contra magistrado perante o tribunal ao qual está subordinado. Se o Ministério Público não apresentar a ação pública no prazo legal, o lesado pelo ato poderá oferecer queixa subsidiária, assim como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e organizações da sociedade civil constituídas há mais de um ano para defender os direitos humanos ou liberdades civis.

Entre os outros atos que poderão ensejar ação por crime de responsabilidade contra membros do Ministério Público destacam-se a instauração de procedimento “sem indícios mínimos da prática de algum delito” e a manifestação de opinião, por qualquer meio de comunicação, sobre processo pendente de atuação do Ministério Público ou juízo depreciativo sobre manifestações funcionais.

A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) também é modificada para prever como crime a proposição de ação contra agente público ou terceiro beneficiário com ato classificado como “temerário”. A pena também é aumentada.

Nas ações civis públicas “propostas temerariamente por comprovada má-fé, com finalidade de promoção pessoal ou por perseguição política”, a associação autora da ação ou o membro do Ministério Público será condenado ao pagamento de custas, emolumentos, despesas processuais, honorários periciais e advocatícios.

Entenda o que não foi incluído no texto final

Provas ilícitas de boa-fé – A comissão que aprovou as "Dez Medidas" recusou a proposta de aproveitar em processos criminais provas colhidas ilegalmente. Considerou que seria muito difícil definir o que é boa-fé. A Constituição Federal não permite esse tipo de prova para proteger os cidadãos de abusos de policiais e de outras autoridades.

Habeas corpus – A comissão também recusou a proposta de reduzir o alcance do habeas corpus, que é a ferramenta para pedir à Justiça liberdade de um preso. A grande maioria dos especialistas ouvidos considerou que essa medida tiraria dos cidadãos uma proteção que é garantia importante da Constituição.

Confisco de bens – O patrimônio de uma pessoa só pode ser confiscado depois da condenação. Não enquanto ela está sendo acusada e ainda não foi condenada, como previa o projeto.

Enriquecimento ilícito – Para uma pessoa ser condenada, continua a ser necessário provar que o dinheiro veio de corrupção. A proposta era condenar se ela tivesse patrimônio que fosse considerado incompatível com a renda, sem necessidade de prova da origem ilegal.

Prêmio por delação – A proposta de oferecer um prêmio em dinheiro para qualquer pessoa que denunciasse um caso de corrupção foi recusada. O prêmio seria parte do dinheiro obtido com o crime.

Teste de integridade – Um servidor público poderia receber uma oferta falsa de propina. Se aceitasse, o teste poderia ser usado como prova contra ele. Essa “pegadinha” foi recusada.

Dirigentes de partidos – Serão responsabilizados somente em caso de irregularidade grave nas contas partidárias ou enriquecimento ilícito – não no caso de erros simples em formalidades.

Defesa prévia – Uma pessoa acusada de improbidade administrativa continua tendo direito de fazer todas as etapas de defesa previstas hoje na lei.

Acordo de leniência – As regras que permitem a uma empresa continuar trabalhando para o governo depois de admitir que cometeu crimes e pagar compensações, aprovadas recentemente, continuam valendo.

Acordo penal – A proposta que permite ao acusado de um crime fazer um acordo com a acusação e terminar o processo mais rapidamente vai ser analisada junto com o projeto de reforma da legislação penal que está em estudo na Câmara dos Deputados. O mesmo vai acontecer com outras propostas.

Partidos políticos – Os partidos podem ser punidos por irregularidades, por exemplo, deixando de receber os recursos do Fundo Partidário. Mas não podem ter o funcionamento suspenso, o que seria perigoso para a democracia.

Progressão de pena – A mudança de regime de pena ou a liberdade não será condicionada ao pagamento dos danos, porque existem casos em que a pessoa não ficou com o produto do crime.

Prisão preventiva – Uma pessoa pode ser presa antes de ser condenada caso tenha risco de fugir, ou de prejudicar as investigações, por exemplo. Essa é a regra atual. Foi recusada a possibilidade de prender uma pessoa que ainda não foi condenada para garantir a recuperação dos bens.

O que ainda será analisado pela Câmara

Processo Penal – Uma comissão especial da Câmara, que analisa mudanças no Código de Processo Penal, ainda vai examinar sugestões feitas às “dez medidas contra a corrupção”, entre elas alterações relativas aos recursos protelatórios, ao uso de provas ilícitas obtidas de boa-fé e à prisão preventiva para suspeito acusado de dissipar bens adquiridos por meio de corrupção.

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Da Redação

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