Política e Administração Pública

Relator das medidas anticorrupção descarta anistia para caixa 2

10/10/2016 - 21:00  

Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Audiência pública extraordinária sobre a criminalização do Caixa 2
Comissão especial da Câmara dos Deputados analisa as medidas sugeridas pelo Ministério Público para combater a corrupção

O relator do projeto de lei das medidas anticorrupção, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), descartou risco de anistia para caixa 2 na proposta. O tema foi debatido, nesta segunda-feira (10), em audiência pública da comissão especial da Câmara que analisa as medidas sugeridas pelo Ministério Público e tramitam na Câmara em forma de projeto de lei (PL 4850/16).

Atualmente, a contabilidade paralela nas campanhas eleitorais já é considerada crime com base no Código Eleitoral (Lei 4.737/65). Para endurecer a legislação e torná-la mais efetiva, o Ministério Público propôs a responsabilização dos partidos políticos por condutas de caixa 2, lavagem de capitais e utilização de doações de fontes vedadas, além de tipificar a prática como crime na Lei das Eleições (Lei 9.504/97), com pena prevista de dois a cinco anos de reclusão.

Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Audiência pública extraordinária sobre a criminalização do Caixa 2. Dep. Onyx Lorenzoni (DEM-RS)
O relator, Onyx Lorenzoni: qualquer tentativa de anistia ao caixa 2 seria uma 'gambiarra legislativa'; nova tipificação criminal será acatada

A audiência pública exclusiva para tratar de caixa 2 teve convidados definidos em requerimentos dos deputados Onyx Lorenzoni (DEM-RS), Félix Mendonça Júnior (PDT-BA) e Paulo Teixeira (PT-SP).

Polêmica
A polêmica sobre o risco de anistia surgiu em 19 de setembro, quando um outro projeto de lei sobre legislação eleitoral (PL 1210/07) foi pautado, repentinamente, para análise do Plenário da Câmara.

Imediatamente, Rede e Psol denunciaram articulações em torno de uma emenda aglutinativa que poderia anistiar políticos que receberam doações não declaradas à Justiça Eleitoral. Posteriormente, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, determinou que a discussão e a votação do tema seriam feitas apenas no âmbito das 10 medidas anticorrupção, na comissão especial da Câmara.

Gambiarra legislativa
Para o deputado Onyx Lorenzoni, qualquer tentativa de anistia seria o que chamou de "gambiarra legislativa". Ele garantiu que a nova tipificação criminal será acatada. "Caixa 2, no relatório, estará criminalizado com clareza e objetividade. E aí fica claro: aquele dinheiro que veio de um ato criminoso e aquele dinheiro que apenas não foi contabilizado. Ambos serão crimes com penas diferentes porque têm potencial ofensivo para a sociedade."

"O caixa 2 é um dos grandes fantasmas da vida pública brasileira e precisa ser colocado às claras na tipificação penal", reafirmou Onyx. "Essa audiência é para repor as coisas no devido lugar. Esse é um tema complexo e problemático, que vai ser tratado com a luz acesa, com objetividade e com direito ao contraditório".

O deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP) também defendeu a nova tipificação com o argumento de que a lei atualmente em vigor praticamente não levou a nenhuma condenação efetiva por caixa 2, na Justiça Eleitoral.

Código eleitoral
O vice-procurador geral eleitoral Nicolao Dino explicou que é exatamente essa lei atual que impede qualquer risco de anistia ao caixa 2. "Não há que se falar rigorosamente em anistia. Quaisquer situações anteriores à nova norma não poderão ser apenadas à luz da norma nova. Essa é uma regra geral do direito penal. Em relação aos fatos anteriores, não haverá anistia. Em se tratando de caixa 2, os fatos anteriores continuarão a ser punidos, com todas as deficiências previstas no artigo 350 do Código Eleitoral".

Em vez de "criminalização", Dino prefere chamar as medidas contra o caixa 2 de "incremento dos mecanismos de responsabilização da contabilidade paralela no processo eleitoral". Ele concorda com a necessidade de aperfeiçoamento da atual legislação para coibir a pratica tanto no plano da responsabilização pessoal quanto da responsabilização partidária.

"Hoje os instrumentos são frágeis. O Código Eleitoral, por exemplo, prevê a criminalização apenas no âmbito da prestação de conta do candidato. O objetivo das medidas é trazer para o esquema jurídico meios de mitigar os efeitos deletérios do poder econômico no processo eleitoral" disse.

Dino ressaltou que as sanções previstas vão desde multas até a possibilidade de cancelamento de registro do partido político, caso as irregularidades sejam de responsabilidade do diretório nacional.

Melhorar fiscalização
Já o jurista e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Cristiano Maronna, avalia que o foco das medidas anticorrupção deveria ser a melhoria da fiscalização tributária das empresas e a transparência na prestação de contas eleitorais.

Maronna vê risco de impunidade em caso de nova tipificação para o caixa 2: "Por que criar uma nova lei se a lei atual já é adequada para punir essas situações? O problema da obtenção da prova não vai ser resolvido com a criação de um novo crime. Nós vamos ter mais um problema que vai eventualmente abrir uma janela para a impunidade, que é a discussão sobre a competência: da justiça eleitoral ou da justiça comum. E questões relacionadas à competência geram impunidade e prescrição".

Maronna destacou que o combate à corrupção é importante, mas não pode ultrapassar os limites previstos na Constituição. Para ele, a contabilidade paralela já está tipificada como crime na legislação brasileira, sobretudo no Código Eleitoral.

Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Audiência pública extraordinária sobre a criminalização do Caixa 2. Dep. Paulo Teixeira (PT-SP)
Paulo Teixeira manifestou a preocupação de que uma nova tipificação do caixa 2 venha a aumentar o 'já alto grau de judicialização' do processo eleitoral

Se a criminalização do caixa 2 for aprovada, como quer o Ministério Público, Maronna prevê que "vamos ter mais um crime na praça, mas a dificuldade de busca de prova vai continuar a mesma". "Criar mais um crime é bom para agradar a torcida e agradar a mídia", disse.

Concordando com Maronna, o deputado Paulo Teixeira ainda manifestou a preocupação de que uma nova tipificação venha a aumentar o "já alto grau de judicialização" do processo eleitoral.

Aperfeiçoamentos
Também presentes na audiência pública da Câmara, o jurista e ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral José Eduardo Rangel de Alckmin e o mestre em direito Fabrício Juliano Mendes Medeiros defenderam a proposta do Ministério Público, mas fizeram sugestões de aperfeiçoamentos.

Para evitar dúvidas quanto à competência jurisdicional (justiça eleitoral ou justiça comum) na responsabilização do caixa 2, Alckmin defendeu que se coloque um dispositivo no PL 4850/16, deixando claro que, a partir da nova tipificação, não se aplicará mais, para casos futuros, a regra hoje prevista no Código Eleitoral.

Já Medeiros sugeriu uma melhor definição de quem são os agentes públicos e políticos puníveis. Também recomendou que a redação do texto deixe claro que o caixa 2 praticado por meio de prestação de serviços também será alvo de punição.

Reportagem – José Carlos Oliveira
Edição – Newton Araújo

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