23.03.2009
Jornal Folha de S. Paulo
Caderno: Dinheiro
Proposta brasileira ao G20
LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
Está na hora de o Brasil fazer uma proposta inovadora: o estabelecimento de limites para déficits em conta corrente
ESTAMOS na véspera da reunião de cúpula do G20. Qual deve ser o papel do Brasil nela? Deveremos desempenhar um papel que nunca teve real êxito -o de intermediário entre os países ricos e os demais países de renda média que adotam políticas econômicas mais nacionalistas, como a China e a Índia? Deveremos nos aliar a esses países? Apoiar as medidas visando maior regulação dos mercados financeiros -algo sobre o qual já existe um razoável consenso mundial? Concentrarmo-nos em pedir maior participação do Brasil nos fóruns internacionais? Ou existe alternativa mais criativa, que reflita experiência e implique contribuição brasileira para a crise?
Se optarmos pela última alternativa, a proposta fundamental deve ser a da limitação dos déficits em conta corrente. Se existe uma recomendação universal de prudência em relação ao déficit do setor público, se o Tratado de Maastricht estabelece para os países da União Europeia um limite de 3%, por que não estabelecer limites acordados internacionalmente também para os déficits em conta corrente -ou seja, para os déficits dos países?
Em vez de caminharem nessa direção, os países ricos estão dando grande ênfase ao aumento do capital do FMI (Fundo Monetário Internacional). Repetem, assim, sua política de incentivar os países em desenvolvimento a se endividarem -a incorrem em déficits em conta corrente e, assim, "crescerem com poupança externa". Depois das crises de balanço de pagamentos dos anos 1990, muitos países em desenvolvimento aprenderam que essa política era absurda, que grande parte dos recursos externos acaba indo para o consumo devido à apreciação do câmbio e ao aumento artificial dos salários. Verificaram que mesmo os investimentos diretos provocavam uma elevada taxa de substituição da poupança interna pela externa na medida em que causavam valorização cambial. Por isso, principalmente os países asiáticos dinâmicos desvalorizaram suas taxas de câmbio, passaram a ter superávits em conta corrente e deixaram o FMI sem clientes. Mas apenas por algum tempo, porque, de um lado, a pressão dos países ricos para que os países em desenvolvimento recorram a seu capital é forte, e, de outro, porque a tentação dos políticos e dos empresários de usar recursos externos "baratos" é grande. Por isso, alguns países desavisados situados principalmente no leste da Europa incorreram em elevados déficits em conta corrente e agora estão obrigados a recorrer ao FMI.
Jornal Gazeta Mercantil
Caderno: Brasil
Brasil e Argentina afinam discurso para reunião do G20
Os governos brasileiro e argentino tentaram, sem sucesso, evitar o tema do protecionismo no encontro realizado entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, em São Paulo, na última sexta-feira. O objetivo era afinar o discurso para a próxima reunião, em Londres, do G-20, marcada para o dia 2 de abril e deixar as discussões sobre diferenças comerciais para a próxima quarta-feira, dia 25, quando será realizada em Buenos Aires uma nova reunião dos representantes de empresas brasileiras e argentinas. Entretanto, o tema das barreiras comercias não pôde ser evitado pelos mandatários.
Lula e Kirchner foram questionados se não seria anacrônico atacar o protecionismo dos países desenvolvidos, e ao mesmo tempo acatar medidas como as licenças não-automáticas impostas pela Argentina a alguns produtos brasileiros como têxteis, eletrodomésticos e máquinas agrícolas, procedimento que torna mais lento o desembarque destas mercadorias. "Uma licença não-automática pode parecer uma medida protecionista, mas, por exemplo, posso dizer que desvalorizar uma moeda ante ao dólar é uma medida protecionista, ou mesmo benefícios fiscais que vários estados brasileiros concedem às empresas", respondeu a presidenta argentina, durante discurso de encerramento de seminário empresarial realizado na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
O déficit comercial que a Argentina tem com o Brasil, na casa dos US$ 4,3 bilhões em 2008, reflete um problema estrutural do país platino, "e é natural que as economias menores tomem algumas medidas para não aprofundar esse déficit", disse Kirchner. Ela pediu ainda compreensão para sua "missão de reindustrializar a Argentina", cujo setor industrial não foi tratado como uma questão econômica estratégica, algo que acontece no Brasil "desde a época da ditadura militar". Para a presidenta argentina, é normal "proteger as empresas e setores menos pujantes", e ao decidir a respeito de interesses comerciais "devemos ver o tamanho das economias".
Jornal do Senado
Caderno: Relações Exteriores
Parlasul define representação em 30 dias
Grupo de trabalho vai estabelecer critérios para fixar o número de cadeiras reservadas a cada país a partir de 2011
O critério de proporcionalidade que determinará o número de cadeiras reservadas a cada país no Parlamento do Mercosul (Parlasul), a partir de 2011, deverá ser estabelecido dentro de um mês. Esse foi o prazo concedido pela Mesa diretora do parlamento a um grupo de trabalho criado para essa finalidade e composto por parlamentares e assessores da Venezuela e dos quatro países fundadores do bloco – Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.
Até o momento, cada um dos países fundadores conta com 18 parlamentares, independentemente da população. A Venezuela, em fase de adesão, é representada hoje por nove parlamentares, com direito a voz, mas não a voto. A definição do critério de representatividade esbarrava até o momento na resistência das bancadas dos países menores, especialmente a do Paraguai, em negociar o tema.
O número máximo ainda está longe do previsto em uma proposta apresentada em 2007 pelo deputado, segundo a qual o Brasil teria 75 parlamentares; a Argentina, 33; e a Venezuela, 27. Paraguai e Uruguai manteriam seus 18 parlamentares. Uma proposta apresentada no ano passado pela Argentina também indicava o teto de 75 parlamentares, mas ampliava as bancadas argentina e venezuelana para 43 e 31.
O grupo de trabalho será responsável por uma solução negociada com base nas três propostas oferecidas. Mas a própria criação do grupo só ocorreu a partir de compromisso firmado com a representação paraguaia, destinado a ampliar o grau da chamada supranacionalidade do Mercosul. Duas propostas nesse sentido constam do acordo político: uma agenda de trabalho destinada à criação de um tribunal de justiça do Mercosul e a modificação do Protocolo de Olivos, para dotar o Tribunal Permanente de Revisão de novas atribuições.
Jornal Valor Econômico
Caderno: Brasil
Argentina vai propor mudança em regras do acordo automotivo
Raquel Landim
A Argentina está pressionando o Brasil por mudanças no acordo automotivo, que permitam atrair investimentos e incentivar a produção de partes e peças. O vizinho quer alterar as regras de nacionalização de veículos do Mercosul e garantir um percentual fixo de fornecimento para fábricas locais.
Pelo acordo atual, 60% das peças dos carros que circulam nos países do Mercosul sem pagar tarifa de importação devem ser produzidas no bloco, mas não há exigências em relação ao país. O assunto está em discussão no governo argentino, mas a tendência é um pleito de que 30% a 40% das peças "nacionais" sejam feitas naquele país.
A Argentina colocará o assunto em discussão na quarta-feira, quando empresários dos dois países se reúnem em Buenos Aires para discutir acordos de limitação das exportações brasileiras de alguns produtos, informou uma fonte do governo argentino. Entre os setores envolvidos, estão as autopeças. Fontes do setor privado e do governo do Brasil confirmaram o pleito dos argentinos. O governo argentino argumenta que possui um déficit estrutural com o Brasil no setor automotivo, que chegou a US$ 2,7 bilhões em 2008, por conta do comércio de autopeças, responsável por 62% do total (US$ 1,7 bilhão). Em veículos, o resultado foi mais equilibrado com déficit de US$ 300 milhões. Embora a Argentina venda menos carros ao Brasil que o contrário, os modelos são mais caros.
As montadoras e as fabricantes de autopeças, com o apoio do governo brasileiro, são contra qualquer modificação nas regras do acordo automotivo, que foi renegociado em junho de 2008 e vigora até 2013. O argumento das empresas é que as vendas no mercado argentino não garantem escala suficiente para maior produção local de peças com os custos atuais.
Jornal Valor Econômico
Caderno: Brasil
Presidentes divergem sobre adoção de medidas protecionistas
De São Paulo
O clima era de camaradagem e celebração no encontro dos presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e da Argentina, Cristina Fernandez de Kirchner, na sexta-feira, em São Paulo. Ainda assim, ficaram evidentes as divergências entre os dois sobre a adoção de medidas protecionistas para combater os efeitos da crise global.
Ao ser questionada pela imprensa sobre o tema, Cristina argumentou que medidas de proteção estão "de um lado e de outro", que o Brasil desvalorizou a moeda e que os Estados concedem benefícios tributários. "Pretender que uma licença não-automática para não aprofundar esse déficit comercial monstruoso se trata de uma medida protecionista é um exercício de reducionismo", disse.
Lula respondeu que não vê contradição entre sua campanha global contra o protecionismo e a paciência com a Argentina, e escolheu como o exemplo o conturbado episódio da adoção licenças de importação (o mesmo artifício da Argentina), o que acabou ressaltando as diferenças com Cristina. "Quando a Argentina tomou a decisão de prolongar a liberação das exportações (brasileiras), o Miguel Jorge (ministro do Desenvolvimento) e o Guido Mantega (Fazenda) tomaram a mesma medida, mas determinei que voltassem atrás, porque não era essa a lógica", disse Lula. "A lógica é fazer exatamente o que acontece aqui hoje. Ou seja, os empresários conversaram", completou.
Jornal Valor Econômico
Caderno: Brasil
Pontes fronteiriças começam a sair do papel
Daniel Rittner
Anunciados com pompa nas reuniões entre chefes de Estado, mas depois colocados em hibernação por causa da falta de recursos ou do excesso de trâmites burocráticos, os projetos de pontes fronteiriças que ligam o Brasil a países vizinhos dão sinais de finalmente estar saindo do papel.
Em abril, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá inaugurar a ponte sobre o rio Itacutu, entre o Brasil e a Guiana, com atraso de anos. O projeto já fazia parte da IIRSA, conjunto de obras de infraestrutura para integrar fisicamente a América do Sul, lançado na primeira cúpula de presidentes da região, em 2000. A construção da ponte começou em 2001, mas foi interrompida no ano seguinte, por determinação do Tribunal de Contas da União. As obras só foram retomadas em 2007, pelo Batalhão de Engenharia e Construção do Exército. O investimento alcançou R$ 13,9 milhões. Nos próximos dias, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) dá partida nas obras ou no desenho definitivo de outros três empreendimentos: Brasil-Guiana Francesa, Brasil-Bolívia e a segunda ponte de Foz do Iguaçu (Brasil-Paraguai). "Os projetos estavam andando lentamente", reconhece o diretor-geral do DNIT, Luiz Antônio Pagot. Ele diz que nos últimos meses, porém, entendimentos com o Itamaraty e Casa Civil possibilitaram tirá-los do marasmo.
Dos três, o projeto mais avançado é o da ponte sobre o rio Oiapoque, que pavimentará o caminho entre o Amapá e a Guiana Francesa. Tudo indica que as obras vão começar, mas só depois de muitos vaivéms e inúmeras promessas. Ali, no município de Saint Georges (do lado francês), os presidentes Fernando Henrique Cardoso e Jacques Chirac se encontraram em 1997, em um evento classificado por eles como "histórico". A ponte até entrou no programa Avança Brasil, que listava projetos prioritários de infraestrutura no governo anterior, mas não passou disso.