Legislação Informatizada - LEI Nº 8.629, DE 25 DE FEVEREIRO DE 1993 - Publicação Original

LEI Nº 8.629, DE 25 DE FEVEREIRO DE 1993

Dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal.

     O PRESIDENTE DA REPÚBLICA
     Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

     Art. 1º Esta Lei regulamenta e disciplina disposições relativas à reforma agrária, previstas no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal.

     Art. 2º A propriedade rural que não cumprir a função social prevista no art. 9º é passível de desapropriação, nos termos desta Lei, respeitados os dispositivos constitucionais.

     § 1º Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social.

     § 2º Para fins deste artigo, fica a União, através do órgão federal competente, autorizada a ingressar no imóvel de propriedade particular, para levantamento de dados e informações, com prévia notificação.

     Art. 3º (VETADO)

     § 1º (VETADO)

     § 2º (VETADO)

     Art. 4º Para os efeitos desta lei, conceituam-se:

     I - Imóvel Rural - o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial;

     II - Pequena Propriedade - o imóvel rural:

a) de área compreendida entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais;
b) (VETADO)
c) (VETADO)
     III - Média Propriedade - o imóvel rural:

a) de área superior a 4 (quatro) e até 15 (quinze) módulos fiscais;
b) (VETADO)
     Parágrafo único. São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária a pequena e a média propriedade rural, desde que o seu proprietário não possua outra propriedade rural.

     Art. 5º A desapropriação por interesse social, aplicável ao imóvel rural que não cumpra sua função social, importa prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária.

     § 1º As benfeitorias úteis e necessárias serão indenizadas em dinheiro.

     § 2º O decreto que declarar o imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária, autoriza a União a propor ação de desapropriação.

     § 3º Os títulos da dívida agrária, que conterão cláusula assecuratória de preservação de seu valor real, serão resgatáveis a partir do segundo ano de sua emissão, em percentual proporcional ao prazo, observados os seguintes critérios:

     I - do segundo ao quinto ano, quando emitidos para indenização de imóveis com área inferior a 40 (quarenta) módulos fiscais;

     II - do segundo ao décimo ano, quando emitidos para indenização de imóvel com área acima de 40 (quarenta) até 70 (setenta) módulos fiscais;

     III - do segundo ao décimo quinto ano, quando emitidos para indenização de imóvel com área acima de 70 (setenta) até 150 (cento e cinqüenta) módulos fiscais;

     IV - do segundo ao vigésimo ano, quando emitidos para indenização de imóvel com área superior a 150 (cento e cinqüenta) módulos fiscais.

     Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

     § 1º O grau de utilização da terra, para efeito do caput deste artigo, deverá ser igual ou superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel.

     § 2º O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100% (cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática:

     I - para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

     II - para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

     III - a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na exploração.

     § 3º Considera-se efetivamente utilizadas:

     I - as áreas plantadas com produtos vegetais;

     II - as áreas de pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo;

     III - as áreas de exploração extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a legislação ambiental;

     IV - as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente;

     V - as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes.

     § 4º No caso de consórcio ou intercalação de culturas, considera-se efetivamente utilizada a área total do consórcio ou intercalação.

     § 5º No caso de mais de um cultivo no ano, com um ou mais produtos, no mesmo espaço, considera-se efetivamente utilizada a maior área usada no ano considerado.

     § 6º Para os produtos que não tenham índices de rendimentos fixados, adotar-se-á a área utilizada com esses produtos, com resultado do cálculo previsto no inciso I do § 2º deste artigo.

     § 7º Não perderá a qualificação de propriedade produtiva o imóvel que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie.

     § 8º São garantidos os incentivos fiscais referentes ao Imposto Territorial Rural relacionados com os graus de utilização e de eficiência na exploração, conforme o disposto no art. 49 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964.

     Art. 7º Não será passível de desapropriação, para fins de reforma agrária, o imóvel que comprove estar sendo objeto de implantação de projeto técnico que atenda aos seguintes requisitos:

     I - seja elaborado por profissional legalmente habilitado e identificado;

     II - esteja cumprindo o cronograma físico-financeiro originalmente previsto, não admitidas prorrogações dos prazos;

     III - preveja que, no mínimo, 80% (oitenta por cento) da área total aproveitável do imóvel seja efetivamente utilizada em, no máximo, 3 (três) anos para as culturas anuais e 5 (cinco) anos para as culturas permanentes;

     IV - haja sido registrado no órgão competente no mínimo 6 (seis) meses antes do decreto declaratório de interesse social.

     Parágrafo único. Os prazos previstos no inciso III deste artigo poderão ser prorrogados em até 50% (cinqüenta por cento), desde que o projeto receba, anualmente, a aprovação do órgão competente para fiscalização e tenha sua implantação iniciada no prazo de 6 (seis) meses, contado de sua aprovação.

     Art. 8º Ter-se-á como racional e adequado o aproveitamento de imóvel rural, quando esteja oficialmente destinado à execução de atividades de pesquisa e experimentação que objetivem o avanço tecnológico da agricultura.

     Parágrafo único. Para os fins deste artigo só serão consideradas as propriedades que tenham destinados às atividades de pesquisa, no mínimo, 80% (oitenta por cento) da área total aproveitável do imóvel, sendo consubstanciadas tais atividades em projeto:

     I - adotado pelo Poder Público, se pertencente a entidade de administração direta ou indireta, ou a empresa sob seu controle;

     II - aprovado pelo Poder Público, se particular o imóvel.

     Art. 9º A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta lei, os seguintes requisitos:

     I - aproveitamento racional e adequado;

     II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

     III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

     IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

     § 1º Considera-se racional e adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do art. 6º desta Lei.

     § 2º Considera-se adequada a utilização dos recursos naturais disponíveis quando a exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade.

     § 3º Considera-se preservação do meio ambiente a manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas.

     § 4º A observância das disposições que regulam as relações de trabalho implica tanto o respeito às leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, como às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais.

     § 5º A exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais é a que objetiva o atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não provoca conflitos e tensões sociais no imóvel.

     § 6º (VETADO).

     Art. 10. Para efeito do que dispõe esta lei, consideram-se não aproveitáveis:

     I - as áreas ocupadas por construções e instalações, excetuadas aquelas destinadas a fins produtivos, como estufas, viveiros, sementeiros, tanques de reprodução e criação de peixes e outros semelhantes;

     II - as áreas comprovadamente imprestáveis para qualquer tipo de exploração agrícola, pecuária, florestal ou extrativa vegetal;

     III - as áreas sob efetiva exploração mineral;

     IV - as áreas de efetiva preservação permanente e demais áreas protegidas por legislação relativa à conservação dos recursos naturais e à preservação do meio ambiente.

     Art. 11. Os parâmetros, índices e indicadores que informam o conceito de produtividade serão ajustados, periodicamente, de modo a levar em conta o progresso científico e tecnológico da agricultura e o desenvolvimento regional, pelo Ministério da Agricultura e Reforma Agrária, ouvido o Conselho Nacional de Política Agrícola.

     Art. 12. Considera-se justa a indenização que permita ao desapropriado a reposição, em seu patrimônio, do valor do bem que perdeu por interesse social.

     § 1º A identificação do valor do bem a ser indenizado será feita, preferencialmente, com base nos seguintes referenciais técnicos e mercadológicos, entre outros usualmente empregados:

     I - valor das benfeitorias úteis e necessárias, descontada a depreciação conforme o estado de conservação;

     II - valor da terra nua, observados os seguintes aspectos:

a) localização do imóvel;
b) capacidade potencial da terra;
c) dimensão do imóvel.
     § 2º Os dados referentes ao preço das benfeitorias e do hectare da terra nua a serem indenizados serão levantados junto às Prefeituras Municipais, órgãos estaduais encarregados de avaliação imobiliária, quando houver, Tabelionatos e Cartórios de Registro de Imóveis, e através de pesquisa de mercado.

     Art. 13. As terras rurais de domínio da União, dos Estados e dos Municípios ficam destinadas, preferencialmente, à execução de planos de reforma agrária.

     Parágrafo único. Excetuando-se as reservas indígenas e os parques, somente se admitirá a existência de imóveis rurais de propriedade pública, com objetivos diversos dos previstos neste artigo, se o poder público os explorar direta ou indiretamente para pesquisa, experimentação, demonstração e fomento de atividades relativas ao desenvolvimento da agricultura, pecuária, preservação ecológica, áreas de segurança, treinamento militar, educação de todo tipo, readequação social e defesa nacional.

     Art. 14. (VETADO).

     Art. 15. (VETADO).

     Art. 16. Efetuada a desapropriação, o órgão expropriante, dentro do prazo de 3 (três) anos, contados da data de registro do título translativo de domínio, destinará a respectiva área aos beneficiários da reforma agrária, admitindo-se, para tanto, formas de exploração individual, condominial, cooperativa, associativa ou mista.

     Art. 17. O assentamento de trabalhadores rurais deverá ser efetuado em terras economicamente úteis, de preferência na região por eles habitada.

     Parágrafo único. (VETADO).

     Art. 18. A distribuição de imóveis rurais pela reforma agrária far-se-á através de títulos de domínio ou de concessão de uso, inegociáveis pelo prazo de 10 (dez) anos.

     Parágrafo único. O órgão federal competente manterá atualizado cadastro de áreas desapropriadas e de beneficiários da reforma agrária.

     Art. 19. O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente de estado civil, observada a seguinte ordem preferencial:

     I - ao desapropriado, ficando-lhe assegurada a preferência para a parcela na qual se situe a sede do imóvel;

     II - aos que trabalham no imóvel desapropriado como posseiros, assalariados, parceiros ou arrendatários;

     III - aos que trabalham como posseiros, assalariados, parceiros ou arrendatários, em outros imóveis;

     IV - aos agricultores cujas propriedades não alcancem a dimensão da propriedade familiar;

     V - aos agricultores cujas propriedades sejam, comprovadamente, insuficientes para o sustento próprio e o de sua família.

     Parágrafo único. Na ordem de preferência de que trata este artigo, terão prioridade os chefes de família numerosa, cujos membros se proponham a exercer a atividade agrícola na área a ser distribuída.

     Art. 20. Não poderá ser beneficiário da distribuição de terras, a que se refere esta Lei, o proprietário rural, salvo nos casos dos incisos I, IV e V do artigo anterior, nem o que exercer função pública, autárquica ou em órgão paraestatal, ou o que se ache investido de atribuição parafiscal, ou quem já tenha sido contemplado anteriormente com parcelas em programa de reforma agrária.

     Art. 21. Nos instrumentos que conferem o título de domínio ou concessão de uso, os beneficiários da reforma agrária assumirão, obrigatoriamente, o compromisso de cultivar o imóvel direta e pessoalmente, ou através de seu núcleo familiar, mesmo que através de cooperativas, e o de não ceder o seu uso a terceiros, a qualquer título, pelo prazo de 10 (dez) anos.

     Art. 22. Constará, obrigatoriamente, dos instrumentos translativos de domínio ou de concessão de uso cláusula resolutória que preveja a rescisão do contrato e o retorno do imóvel ao órgão alienante ou concedente, no caso de descumprimento de quaisquer das obrigações assumidas pelo adquirente ou concessionário.

     Art. 23. O estrangeiro residente no País e a pessoa jurídica autorizada a funcionar no Brasil só poderão arrendar imóvel rural na forma da Lei nº 5.709, de 7 de outubro de 1971.

     § 1º Aplicam-se ao arrendamento todos os limites, restrições e condições aplicáveis à aquisição de imóveis rurais por estrangeiro, constantes da lei referida no caput deste artigo.

     § 2º Compete ao Congresso Nacional autorizar tanto a aquisição ou o arrendamento além dos limites de área e percentual fixados na Lei nº 5.709, de 7 de outubro de 1971, como a aquisição ou arrendamento, por pessoa jurídica estrangeira, de área superior a 100 (cem) módulos de exploração indefinida.

     Art. 24. As ações de reforma agrária devem ser compatíveis com as ações de política agrícola, e constantes no Plano Plurianual.

     Art. 25. O orçamento da União fixará, anualmente, o volume de títulos da dívida agrária e dos recursos destinados, no exercício, ao atendimento do Programa de Reforma Agrária.

     § 1º Os recursos destinados à execução do Plano Nacional de Reforma Agrária deverão constar do orçamento do ministério responsável por sua implementação e do órgão executor da política de colonização e reforma agrária, salvo aqueles que, por sua natureza, exijam instituições especializadas para a sua aplicação.

     § 2º Objetivando a compatibilização dos programas de trabalho e propostas orçamentárias, o órgão executor da reforma agrária encaminhará, anualmente e em tempo hábil, aos órgãos da administração pública responsáveis por ações complementares, o programa a ser implantado no ano subseqüente.

     Art. 26. São isentas de impostos federais, estaduais e municipais, inclusive do Distrito Federal, as operações de transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária, bem como a transferência ao beneficiário do programa.

     Art. 27. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

     Art. 28. Revogam-se as disposições em contrário.

     Brasília, 25 de fevereiro de 1993, 172º da Independência e 105º da República.

ITAMAR FRANCO
Lázaro Ferreira Barbosa


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 26/02/1993


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 26/2/1993, Página 2349 (Publicação Original)
  • Coleção de Leis do Brasil - 1993, Página 352 Vol. 2 (Publicação Original)