Legislação Informatizada - Lei nº 7.646, de 18 de Dezembro de 1987 - Veto

Lei nº 7.646, de 18 de Dezembro de 1987

MENSAGEM DE VETO Nº 734 DE 18 DE DEZEMBRO DE 1987.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO SENADO FEDERAL:

     Tenho a honra de comunicar a Vossa Excelência que, nos termos dos artigos 59, parágrafo 1º e 81, item IV, da Constituição Federal, resolvi vetar, parcialmente, por entender contrárias, as partes vetadas, ao interesse público, o Projeto de Lei nº 8.551, de 1986 ( nº 24, de 1987, no Senado Federal) que "dispõe quanto à proteção da propriedade intelectual sobre programas de computador e sua comercialização no País e dá outras providências".

     Incide o veto sobre as seguintes disposições ou expressões:

     Letra "c" do artigo 10

     Embora seja razoável considerar-se a diferença entre o preço de um programa de origem externa e o preço de um programa nacional, para fins de exame de similaridade, a condição indicada na letra "c" do artigo 10, tal como formulada, não pode prosperar.

     Com efeito, o exame de similaridade é providência de instrução do cadastramento de programa, independentemente do negócio jurídico (locação ou venda ou cessão de direito de exploração) que venha a tê-lo como objeto. Importa, para tanto, apenas o programa em si mesmo considerado.

     Ora, a alínea "c", sob análise, reporta-se à "base de cálculo da quota de contribuição de que trata o artigo 18", que, em verdade, assenta duas bases de cálculo conforme deva o software ser locado ou vendido.

     Em sendo assim, qual dessas bases de cálculo servirá de parâmetro para aferição de similaridade?

     Demais disso, ambas as bases reportam-se ao preço de venda ou locação a usuário final, no país de origem, preço esse que varai não apenas em razão da quantidade de cópias que o usurário adquira ou tome em locação, senão também em face da conversão cambial.

     Evidentemente, não pode a autoridade administrativa, ao seu alvedrio, optar entre a menor ou a maior base de cálculo, porque dessa opção resultarão consequências prejudiciais à comercialização do software nacional ou do software de origem externa.

     Assim, em face de sua inadequada formulação, impõe-se o veto à alínea "c" do artigo 10.

     A expressão "de que trata este artigo", constante do artigo 11

     Com esses dispositivos, o legislador instituiu contribuição especial, de caráter econômico, tendo em vista a intervenção do Estado no domínio econômico no segmento específico de software.

     Não há dúvida de que essa contribuição constitui espécie tributária, que se distingue da taxa, essencialmente, por que nesta espécie " há uma reciprocidade direta entre a exação e a atuação estatal", segundo o entendimento dominante na doutrina.

     O Código Tributário Nacional dispõe no sentido de que " a natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação..." (artigo 4º).

     Ora, o que se vê do artigo 16 é que a "quota de contribuição" vincula-se a atuação estatal específica ("emissão de títulos de Uso") diretamente referida ao titular de direitos de comercialização de programas de origem externa, que o habilita a comerciá-los. Em face do que dispõe os artigos 77 e 78 do Código Tributário Nacional, tal "quota de contribuição" seria uma verdadeira "taxa", com denominação incorreta.

     O projeto é tecnicamente impreciso nos artigos citados, visto como a figura do sujeito passivo da obrigação tributária não é claramente estabelecida, inexistindo também quaisquer sanções para o não-recolhimento da "quota".

     A matéria é relevante, porque se a "quota" constituir-se em verdadeira taxa, não será possível ao Executivo alterar-lhe as alíquotas e bases de cálculo, nem vincular a correspondente receita a fundo especial.

     De outro lado, ainda que se trate de contribuição especial, o projeto confunde a hipótese de incidência - que, aliás, não está nele definida - , com o fato imponível, que é a emissão de Títulos de Uso, providência exclusiva da autoridade.

     Essas razões justificam o veto aos artigos 16 a 19, bem assim às partes indicadas do artigo 14.

Artigos 20, 21 e 22 e a expressão

"o número do Título de Uso" constante do artigo 23

e a parte final do artigo 30

     A cessão a terceiros dos direitos de utilização de um programa é ato que só cabe ao titular desses direitos, nos precisos termos dos artigos 153, § 25, da Constituição, e 29 da Lei nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973. A autoridade administrativa não pode substituir, para a cessão dos direitos de autor, o titular destes, nem mesmo em relação às obras caídas em domínio pública, em face da revogação expressa do artigo 93 da Lei de Direitos Autorais pela Lei nº 7.123, de 12.09.83.

     Veja-se que, no caso, não se aperfeiçoa a hipótese da licença compulsória para edição de obra intelectual, a que se refere o artigo V quarter da Convenção Universal sobre o Direito de Autor, revisto em Paris, a 24 de julho de 1971.

     De outro lado, o próprio projeto estabelece, em seu artigo 27, que a "exploração econômica de programas de computador, no País, será objeto de contratos de licença ou de cessão, livremente pactuados entre as partes", dizendo mais, quanto a software estrangeiro, no §2º do artigo 29, que " a nota fiscal emitida pelo titular dos correspondentes direitos ou seus representantes legais, que comprove a comercialização de programas de computador de origem externa, será o suficiente para possibilitar os pagamentos...".

     Na verdade, talvez, o que se pretenda dizer era que o Título de Uso seria uma espécie de "selo" de controle, a exemplo do que ocorre com as fitas gravadas de vídeo-cassete.

     De outro lado, se o programa de computador cairem domínio público, não só não haverá titular de direitos, como não poderá o Estado opor-se à sua livre utilização por terceiros, porque é essa livre utilização que caracteriza o ingresso em domínio público.

     Note-se, ainda, que enquanto o valor tributável é declarado no ato de cadastramento (artigo 18), a exigibilidade decorre da emissão do Título de Uso (artigo 16). Assim, havendo variação, para mais ou para menos, na base de cálculo, após o cadastramento, cujo prazo mínimo de validade é de 3 anos, o valor tributável continuaria imutável.

     Impõe-se, portanto, o veto ao artigo 20 e, por via de consequência, aos artigos 21, 22, 23 (parcial), e 30 ( parcial), conforme acima indicado, além do veto aos artigos 16 a 19, visto como a emissão de Título de Uso torna exigível o pagamento da "quota de contribuição", rejeitada pelas razões anteriormente anunciadas.

Artigo 36 e a expressão "36 e 37"

constante do artigo 38

     A figura penal estabelecida no artigo 35 já é suficiente para coibir a prática irregular contra os direitos do autor. De outro lado, o não-cadastramento não justifica o rigor da capitulação penal, até porque casos há, como a importação direta pelo usuário final, que, nos termos do projeto, dispensam o prévio cadastramento do software. Cabe, portanto, o veto ao artigo 36.

     Por outro lado, o delito previsto no artigo 3/ é por ofensa a interesse do Estado, já que se intenta proibir prática semelhante ao "contrabando", ou, na linguagem dos técnicos do setor de informática, à "pirataria". Consequentemente, há que ser vetada a expressão "36 e 37", visto como a ação será pública.

     São estas as razões que me levaram a vetar, parcialmente, o Projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.

Brasília, em 18 de dezembro de 1987.

JOSÉ SARNEY


Este texto não substitui o original publicado no Diário Oficial da União - Seção 1 de 22/12/1987


Publicação:
  • Diário Oficial da União - Seção 1 - 22/12/1987, Página 22244 (Veto)
  • Diário do Congresso Nacional - Seção 2 - 11/5/1988, Página 1319 (Apreciação de Veto)