Rádio Câmara

Reportagem Especial

Alimentos Industrializados: Guia Alimentar para a População Brasileira

19/12/2016 - 08h01

  • Alimentos Industrializados: Guia Alimentar para a População Brasileira (bloco 1)

  • Alimentos Industrializados: antibióticos e transgênicos (bloco 2)

  • Alimentos Industrializados: a volta à cozinha (bloco 3)

  • Alimentos Industrializados: o valor da ciência (bloco 4)

  • Alimentos Industrializados: alegações de saúde (bloco 5)

Todo mundo quer se alimentar bem, mas vamos confessar: é difícil demais ficar contando a quantidade de açúcar, gordura, carboidrato e proteína que a gente come por dia e mais difícil ainda saber se o prato está mesmo equilibrado como mandam os nutricionistas. O último Guia Alimentar para a População Brasileira busca mudar isso com uma nova proposta para a composição da tão sonhada alimentação saudável: ao invés de contar calorias, a ideia é focar no nível de processamento industrial que o alimento sofreu. O Guia, elaborado pelo Núcleo de pesquisas epidemiológicas em nutrição e saúde da USP, sob a coordenação do Ministério da Saúde, e divulgado em 2014, organiza os alimentos em quatro categorias: in natura ou minimamente processados; ingredientes culinários; processados e ultraprocessados.

In natura são os que chegam à nossa casa da maneira como são encontrados na natureza, com pouca ou nenhuma interferência, como frutas, legumes e verduras. Os minimamente processados são os produtos naturais que passaram por processos industriais simples, como embalagem, moagem, retirada de partes não comestíveis, mas sem adição de novas substâncias. Os exemplos são o arroz, feijão, carnes, leites, ovos, frutas e seus derivados minimamente processados: fubá, tapioca, farinha de mandioca. A pesquisadora Maria Laura Louzada, da USP, explica o grupo dos ingredientes culinários, que são o óleo, o açúcar e o sal.

Maria Laura Louzada: "Ele é o grupo mais inovador dessa classificação, porque geralmente a recomendação desse grupo é evite sal, óleo e açúcar. Mas, nesse caso, a gente lê os ingredientes culinários como parceiros dos alimentos in natura ou minimamente processados, ou seja, quando eles são usados na quantidade correta, eles, na verdade, favorecem o consumo de alimentos in natura e minimamente processados agregando sabor, diversidade, e assim por diante".

O terceiro grupo é o dos processados, que são as preparações mais simples e antigas que a gente conhece: pães, queijos, conservas. São geralmente feitos de um alimento com adição de açúcar e sal. Segundo a pesquisadora Maria Laura Louzada, em quantidade limitada, esses alimentos vão complementar a alimentação saudável. Resumo da ópera: os alimentos in natura e os minimamente processados preparados com ajuda dos ingredientes culinários e acompanhados dos alimentos processados são a base de uma alimentação saudável. É o que diz a pesquisadora Maria Laura, que agora explica o último grupo, dos alimentos ultraprocessados.

Maria Laura Louzada: "São formulações industriais feitas com inúmeros ingredientes, inúmeras etapas de processamento. Eles, na verdade, têm muito pouca quantidade de alimento inteiro na formulação, eles têm aqueles nomes estranhos quando a gente lê no rótulo que a gente não costuma usar de forma alguma na nossa cozinha e muitas vezes eles têm vários aditivos que modificam as características sensoriais, os odores, os sabores dos alimentos. Esse grupo a recomendação é evite."

O pulo do gato dessa nova abordagem é preocupar menos com a tabela nutricional, aquela que traz as quantidades de proteína, gordura, vitaminas e minerais, e mais com a lista de ingredientes, observando se ela é grande demais ou se tem nomes muito desconhecidos. Os exemplos mais comuns são: refrigerantes, embutidos e biscoitos recheados.

 As funções desses ingredientes a mais são várias: conservar o produto, realçar a cor e o sabor, melhorar a consistência. E o excesso, comum nos alimentos ultraprocessados, de alguns desses ingredientes, como açúcar e sal, precisa ser evitado, segundo a nutricionista da Câmara dos Deputados, Aline Brandão, por estar relacionado à ocorrência de obesidade e de doenças crônicas como diabetes e hipertensão.

Aline Brandão: "Às vezes, a pessoa toma um cafezinho por dia, mas ela substitui o açúcar pelo adoçante. Normalmente, uma pessoa que toma um cafezinho por dia, se ela não tem uma condição de saúde que obrigue a utilizar o adoçante dietético, não há razão para ela fazer a troca do açúcar pelo adoçante."

Outra informação importante sobre a lista de ingredientes é que ela é organizada por ordem de quantidade, do ingrediente que está mais presente na fórmula para o que está menos presente. E, por fim, vale prestar atenção à recomendação do engenheiro de alimentos Luiz Eduardo de Carvalho: o mesmo ingrediente pode receber nomes diferentes. O açúcar, por exemplo, pode aparecer na lista como glicose, glucose, dextrose, açúcar, xarope de glicose, sacarose. Ainda que possa haver uma pequena diferença entre alguns deles, em muitos casos, são iguais.

A Associação Brasileira das Indústrias da Alimentação não nos concedeu entrevista. Mas a Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição, a Sban, que tem entre seus associados grandes empresas do ramo alimentício, como Unilever, Nestlé, Coca-Cola e Danone, publicou um vídeo na internet defendendo que não existem alimentos bons ou ruins e que todos podem fazer parte da nossa dieta, desde que sigam padrões de higiene e processamento corretos. Eu conversei com a Márcia Terra, da diretoria da Sban, e ela rebateu as críticas em relação aos excessos dos alimentos industrializados.

Márcia Terra: "Por exemplo, os sucos industrializados, se eles colocam açúcar nas suas formulações, eles não vão colocar muito açúcar, eles vão colocar a quantidade de açúcar que se adeque ao paladar do brasileiro. Então, não é que ele tem mais, ninguém toma ou refrigerante ou suco de frutas industrializado e diz assim: 'ai, que doce, preciso de um copo d'água'. Não."

O presidente da Associação Brasileira de Nutrologia, Durval Ribas Filho, defende o equilíbrio, sem eliminar nenhum tipo de produto da nossa dieta.

Durval Ribas Filho: "O que mostram os trabalhos é que, se concomitante, você ingere uma substância que tenha algum efeito nocivo pro seu organismo, liberando carcinógenos, mas, se concomitante, você ingere frutas, verduras, legumes, que têm uma alta concentração de antioxidantes, você neutraliza aquele efeito deletério, nocivo para o seu organismo daquele carcinógeno. Então, isso significa que eu posso e devo ingerir embutidos, mas concomitante eu devo, posso e devo muito mais ingerir vegetais, frutas, verduras e legumes. O que não pode é só ficar restrito a um produto industrializado e sem a utilização dos vegetais."

A pesquisadora da USP, Maria Laura Louzada, esclarece que não se trata de demonizar todos os produtos industrializados. Pelo contrário, a indústria é parceira da alimentação saudável ao fornecer alimentos dos três primeiros grupos. Apenas o ramo dos ultraprocessados é que pode prejudicar a alimentação e que, por isso, deve ser evitado.

No segundo capítulo da Reportagem Especial, saiba mais sobre antibióticos e transgênicos, temas muito polêmicos da produção de alimentos.

Reportagem – Verônica Lima
Edição – Mauro Ceccherini
Produção – Lucélia Cristina e Cristiane Baker
Trabalhos Técnicos – João Vicente

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h