Rádio Câmara

Reportagem Especial

Desafios na segurança: o Mapa da Violência e a experiência das UPPs

13/04/2015 - 00h01

  • Desafios na segurança: o Mapa da Violência e a experiência das UPPs (bloco 1)

  • Desafios na segurança: programa Brasil Mais Seguro começa em Alagoas, um dos estados mais violentos do País (bloco 2)

  • Desafios na segurança: propostas em tramitação na Câmara (bloco 3)

Mais de meio milhão de pessoas foram assassinadas no Brasil na última década. O número é o mesmo do Iraque, país que está em guerra. Em dez anos, a violência mudou de endereço: diminuiu nas grandes cidades, mas foi para o interior. Os desafios na segurança são o assunto da Reportagem Especial desta semana. O tema é prioridade na Câmara. O repórter Marcello Larcher foi ao Rio de Janeiro para conhecer de perto a experiência das UPPs, Unidades de Polícia Pacificadora, e a Maceió, que tem os piores índices do país. Ouça, agora, o primeiro capítulo.

Nos últimos 10 anos a cara da violência no Brasil mudou. As grandes cidades investiram em segurança e conseguiram reduzir casos de mortes violentas. Mas, no interior, os crimes aumentaram. Juntando dados dos grandes e pequenos centros urbanos, a soma ficou inalterada nessa última década.

Esta é uma das conclusões do Mapa da Violência, do Instituto Avante Brasil, que usa o índice de número de mortes violentas por grupo de cem mil habitantes com base no Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde.

Estivemos no Rio de Janeiro e em Maceió para acompanhar as ações e conhecer de perto os problemas.

Há uma década o Mapa da Violência faz um retrato do país. E a quantidade de homicídios dá uma ideia do tamanho do problema.

Em 2002, o índice era de 28,5 mortes por cem mil habitantes. Teve a maior queda em 2007, chegou a 25,2, mas bateu em 29 em 2012. Um triste recorde.

Em 2012, 154 pessoas morreram, em média, por dia no Brasil. No total, foram 56.337 assassinatos no ano — 7% a mais que em 2011.

Para se ter uma ideia, na última década, mais de 550 mil (555.884) pessoas foram assassinadas aqui no Brasil. O mesmo número de mortes ocorreu, neste período, no Iraque, país que está em guerra.

Muita coisa mudou em relação ao começo da década. Grandes cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro e Recife conseguiram reduzir os índices de homicídios. Mas, no interior, a violência, que os especialistas comparam a uma epidemia, se alastrou. Como explica o professor Júlio Jacobo, autor do Mapa da Violência:

“Começaram a aparecer novos polos de violência que não existiam antigamente. Foram um novo polo de crescimento econômico, com sérios investimentos em segurança pública e nesses estados mais violentos, então, a criminalidade e a violência migraram junto com a população.”

Ao tratar a segurança pública como área especializada, alguns estados conseguiram enfrentar o problema e tiveram reduções nas taxas de violência. Uma organização típica dessa nova fase são as Unidades de Polícia Pacificadora.

No Rio de Janeiro, a implantação das UPPs serve muito mais para desarmar as facções criminosas do que para combater crimes como o tráfico de drogas. Primeiro, as forças armadas e polícia ocupam as favelas. E, depois, implantam um pequeno regimento de policiais permanente, como conta o Capitão Márcio Rocha, ex-comandante da UPP Santa Marta, próxima ao bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro:

“Há um decréscimo no número de homicídios, de mortes violentas, dentro da cidade do Rio, do estado do Rio como um todo. Especificamente falando aqui do Santa Marta, já vamos para seis anos de UPP. A primeira UPP inaugurada aqui foi em dezembro de 2008 e, depois da UPP inaugurada, nós não tivemos mais homicídios, ninguém mais matou ninguém. Nem morte direcionada ao tráfico, nem crime passional, zero mortes no Santa Marta desde a sua implantação. Em todas as comunidades que hoje tem a UPP está acontecendo esse decréscimo no número de homicídios, que é explicável justamente por esse modelo de policiamento em que o policial fica na comunidade.”

Com isso, a população se sente segura e volta a ocupar as ruas. O problema é que essa segurança tem um preço, como explica Jaílson de Sousa e Silva, geógrafo e um dos coordenadores do Observatório de Favelas, ONG que estuda e atua em áreas carentes do Rio:

“Uma forma de abordagem, principalmente de jovens, jovens negros nas favelas, que é profundamente respeitosa. O uso do carro blindado tem que ser feito com muita parcimônia, só em situações extremas para proteger o policial, para buscar um policial. Não tem cabimento porque o “caveirão”, como é chamado aqui no Rio de Janeiro, ele tem doze homens que não são identificados, que estão com fuzis ali e atiram de forma discriminada muitas vezes.”

Os garotos pobres da periferia das grandes cidades não querem mais ser confundidos com bandidos, mas nossas políticas de segurança enxergam neles potenciais criminosos.
Para Júlio, morador da favela Dona Marta, no Rio, há um preconceito com os moradores de sua comunidade:

“Se a gente está andando aqui de madrugada, chegando de algum baile, já falam que nós estamos fazendo besteira, que estamos indo fazer assalto. Estamos fazendo isso, fazendo aquilo. A gente, para eles, nós somos marginais.”

Para a Professora Ruth Vasconcelos, socióloga da Universidade Federal de Alagoas e especialista em violência, o pior é que esses jovens são exatamente as vítimas que deveriam ser protegidas pelo Estado.

“Há uma naturalização de uma sociabilidade violenta onde, ainda que eu afirme que todos nós somos potenciais vítimas dessa violência, mas efetivamente, quem está hoje sendo alvo prioritário, quem está na cena em que ocorre uma morte violenta são os jovens que moram nas periferias. Portanto, que vivem situações de exclusão gravíssima. As famílias, na periferia, vivem situações de desamparo e abandono que geram uma desagregação social.”

Esse preço é cobrado em vidas, como conta Helena Edir Vicente, educadora que mora no complexo de favelas da Maré, na periferia do Rio de Janeiro.

“Eu perdi um filho, com 21 anos, num domingo, sete horas da noite, nessa rua aqui, com um tiro que até hoje ninguém sabe de onde veio.”

Nas próximas pesquisas, o Mapa da Violência vai avaliar se as políticas de segurança dos últimos anos conseguiram conter a violência, que chegou às nossas vidas cotidianas.

O índice de solução de homicídios é de apenas 8% no Brasil – contra 80% na França e 90% na Inglaterra. Confira, no segundo capítulo da Reportagem Especial.

Reportagem – Marcello Larcher
Edição – Mauro Ceccherini
Produção – Lucas Ludgero
Trabalhos técnicos - Milton Santos

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h