Rádio Câmara

Reportagem Especial

Violência contra a mulher: balanço da situação

16/03/2015 - 15h36

  • Violência contra a mulher: balanço da situação (bloco 1)

  • Violência contra a mulher: mudanças legislativas (bloco 2)

  • Violência contra a mulher: providências do Executivo (bloco 3)

A cada hora e meia morre uma mulher no Brasil na mão de seu parceiro. Na última década, 43 mil mulheres foram assassinadas. O Brasil ainda figura entre os dez países onde mais a mulher é morta simplesmente pelo fato de ser mulher. A boa notícia é que esse tipo de crime vem sendo freado desde que a Lei Maria da Penha entrou em vigor. Além disso, as pessoas estão perdendo o medo e denunciando mais. Para especialistas, muito ainda precisa ser feito, mudando leis e, principalmente, costumes. A violência contra a mulher é o tema da Reportagem Especial desta semana.

Ouça agora o primeiro capítulo:

Esta mulher viveu 13 anos de pesadelo: era agredida praticamente todos os dias. E por um homem que ninguém suspeitava que poderia ser tão violento porque era um líder religioso.

Ele vivia me ameaçando. Começou a quebrar as coisas dentro de casa, gritava comigo, mandava eu calar a boca. Quando estava no meio das pessoas, ele me tratava muito bem. Quando chegava no portão da minha casa, ele se transformava num monstro”.

Era assim todos os dias. E quando ela dizia que iria denunciar a violência...

Ele até ria. (Dizia) que não acreditava na Lei Maria da Penha. Ria tanto lá em casa, debochava! (Dizia) que não funciona, que as mulheres, quando chegam em casa, apanham dobrado”.

Ela foi suportando essa situação por medo e por ter esperança que ele poderia mudar. Mas...

Eu não estava mais aguentando viver. E quanto mais passavam os dias, mais difícil ficava, o problema crescia. Na última discussão, ele veio para cima de mim para querer me chutar. Será que ia querer ficar só no chute?

Nesta madrugada, ela fugiu de casa com a filha.

Infelizmente, não são poucos os casos de violência como esse que a gente acabou de ouvir. Para você ter uma ideia, a cada hora, 6 casos são denunciados à Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180. Ou seja, quase 53 mil só no ano passado. Metade desses relatos eram de violência física (51,68%) e quase 4 em cada 10 envolviam violência psicológica (31,81%) ou moral (9,68%). Também foram denunciados casos de violência patrimonial (1,94%), sexual (2,86%), cárcere privado (1,76%) e tráfico de pessoas (0,26%).

Se há uma boa notícia nesse cenário, é que as pessoas estão perdendo o medo e denunciando mais. Só de violência sexual, ou seja, estupro, assédio e exploração, o aumento de relatos foi de 20% entre 2013 e 2014. 7 em cada 10 denunciantes são as próprias vítimas. E elas dizem que, na grande maioria dos casos (80%), a violência ocorre pelo menos uma vez por semana e é cometida por pessoas com quem elas têm ou tiveram algum vínculo afetivo, como marido ou companheiro.

Tudo isso só num serviço de disque-denúncia. Imagina o que nem chega ao conhecimento das autoridades... A promotora de Justiça Valéria Scarance destaca que a estimativa é que ocorram mais de 4 mil assassinatos de mulheres por ano.

“Na última década, morreram 43 mil mulheres. A cada hora e meia morre uma mulher no Brasil na mão de seu parceiro, então o feminicídio é um problema grave porque as mulheres morrem dentro de casa e nas mãos de seus parceiros”.

Os números são alarmantes, e o Brasil ainda figura entre os dez países onde mais a mulher é assassinada simplesmente pelo fato de ser mulher. Mas um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) concluiu que esse tipo de crime vem sendo freado desde que entrou em vigor a Lei Maria da Penha de combate à violência contra a mulher. A redução de 2006 para cá seria de 10%. Um dos autores do levantamento, Daniel Cerqueira, justifica essa diminuição pela consciência que os agressores estão tendo de que podem realmente ser condenados.

“Ao contrário do que acontecia antes de 2006 — que ele era enquadrado na justiça na Lei de Crimes de Baixo Potencial Ofensivo, pagava uma cesta básica e ia embora —, agora, ele pode ficar até 3 anos na cadeia”.

Mas ainda há muitos desafios a serem vencidos para acabar com essa realidade. Uma das frentes de combate à violência contra a mulher é o endurecimento das leis. Nesse sentido, existem várias propostas em discussão no Congresso Nacional. Outra frente é trabalhar para mudar os costumes de homens e das próprias mulheres. O juiz Ben Hur Viza explica por quê.

“Muitas vezes a mulher não tem noção de que quando o homem está xingando ela dentro de casa, na rua, onde for, ele está praticando um crime contra ela. Que quando esse homem deu um tapa no rosto dela, que não saiu sangue, ou que deu um empurrão, ou que jogou-a sobre a cama, ou que a obrigou a ter uma relação sexual, mesmo sendo casada, isso é um crime. Interrompa a violência assim que ela começar. Xingou, vai na delegacia registrar ocorrência”.

Indo a uma delegacia, a vítima pode ser encaminhada para uma casa abrigo ou ter outras medidas de proteção contra o agressor. Foi o que aconteceu com aquela mulher que falou lá no começo da matéria. Ela avalia tudo o que passou:

“Valeu a pena eu denunciar. Vale a pena ir para a casa abrigo. Já estou dando entrada no divórcio e a qualquer hora eu vou me desligar dele totalmente. Eu estou feliz. É um alívio para mim, um alívio”.

Outra forma de denunciar é discar 180. No ano passado, cerca de 20 mil denúncias feitas a essa Central de Atendimento à Mulher foram encaminhadas à Polícia e à Justiça.

Confira a segunda parte da reportagem especial: Apenas 3 das 14 mudanças legislativas propostas pela CPI que investigou a violência contra a mulher saíram do papel.
 

Reportagem — Ginny Morais

A abordagem em profundidade de temas relacionados ao dia a dia da sociedade e do Congresso Nacional.

De segunda a sexta, às 3h, 7h20 e 23h

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