18/09/2018 19:03 - Direito e Justiça
Radioagência
Trinta anos depois especialistas analisam Constituição de 1988
164 anos separam nossa primeira e nossa última Constituição. A de 1988 está completando três décadas no próximo dia 5 de outubro. A de 1824 foi a primeira do Brasil independente. Entre elas, outras cinco cartas magnas. Em comum entre a primeira e a última, dois períodos democráticos, mas com democracias bem diferentes. E a formação de Assembleias Nacionais Constituintes, mas com destinos também bastante diferentes.
A Constituição de 1824 instituiu uma espécie de "democracia indireta": o Imperador teve que conviver com um Poder Legislativo. Segundo o historiador Newton Tavares Filho, ela foi inspirada pela Declaração do Direito do Homem da Revolução Francesa e acabava com o estilo absolutista das monarquias europeias, nas quais o poder estava concentrado nas mãos do rei.
"Você tem nitidamente uma preocupação muito grande do texto em dizer quais são os poderes, quais são as competências de cada poder e depois de elencar quais são os direitos do cidadão. Nesse ponto ela é considerada uma Constituição avançada para o tempo dela. E ela instaura no Brasil o que a gente chama de monarquia constitucional, ou seja, Dom Pedro tinha limites para os seus poderes".
Para o historiador, a primeira Constituição do país ajudou, inclusive, na unificação linguística, instituindo o português como idioma oficial. O especialista em Direito Constitucional Cristiano Paixão acrescenta: a Carta Magna de 1824 também assegurou a unificação territorial, ao contrário da América Espanhola, fragmentada em vários países que se tornaram repúblicas. O Brasil preservou uma monarquia duradoura. De acordo com Cristiano Paixão, pela vontade da elite, que se organizou para manter a escravidão e o Estado unitário.
"A Constituição de 1824 representa este meio termo entre o novo e o antigo. É um novo país, que precisa de direitos individuais, de divisão de poderes, mas muito do antigo está ali, porque nós temos um Poder Moderador, nós temos uma religião oficial e nós temos um imperador perpétuo."
Para elaborar a primeira Constituição, foi criada a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, em 1823. Formada por 100 deputados das províncias, atuais Estados, ela durou apenas sete meses. Foi dissolvida pelo Imperador, que criou um Conselho de Estado, redigiu um novo texto e outorgou a Constituição em março de 1824. Bem diferente da Assembleia Nacional Constituinte criada em primeiro de fevereiro de 1987 com 559 membros, que eram os integrantes da Câmara e do Senado. Eles passaram o primeiro ano discutindo a nova Constituição por temas e o segundo ano votando quatro versões até chegar ao texto definitivo. O especialista em Direito Constitucional Cristiano Paixão destaca, na Constituição de 88, o diálogo com a sociedade.
"Nós tínhamos 24 subcomissões em atividade, recebendo sugestões da população, fazendo audiências públicas, dialogando, ouvindo a cobertura da imprensa. E esse fator foi um fator transformador porque possibilitou um índice inédito de participação popular na Constituinte."
Para o historiador Newton Tavares Filho, essa característica fez a Carta Magna ganhar em legitimidade. Ao mesmo tempo, ele lamenta que foram incluídas no texto muitas promessas difíceis de cumprir.
"Se você abre a Constituição e lê os artigos sexto e sétimo, são os Direitos Sociais, você vai ver o quão longe nós estamos da realidade. Por exemplo, quem lê o inciso que diz que o salário mínimo deve corresponder às necessidades de uma família, com todas as necessidades até de diversão, só alguém muito distante da realidade vai dizer que aquilo é realidade hoje."
O historiador Newton Tavares Filho acrescenta que a Constituição de 88 é muito minuciosa e tem itens que não deveriam estar no texto constitucional. Outra característica dela é ser muito modificada por emendas, pois muitas vezes existe a sensação de que a legislação vai estar mais protegida se for incluída na Constituição. Já o especialista em Direito Constitucional Cristiano Paixão lembra que, pela primeira vez, há vários setores da sociedade dizendo que é preciso rever o texto constitucional, que não é mais unanimidade na classe política.