22/06/2017 10:12 - Segurança
Radioagência
Comissão vai acompanhar casos de violência policial em manifestações populares
Comissão de Direitos Humanos da Câmara poderá ter subcomissão para acompanhar e denunciar os casos de criminalização dos movimentos e manifestações populares. A proposta surgiu em audiência pública que debateu a violência policial contra manifestantes, sobretudo em protestos recentes contra o governo federal e as Reformas Trabalhista e da Previdência, como a greve geral de 28 de abril e o ato "Ocupa Brasília", em 24 de maio. A pedido dos debatedores, o colegiado também poderá intermediar a elaboração dos protocolos de controle em manifestações, juntamente com os órgãos de segurança pública dos estados; manter parcerias com os meios alternativos de comunicação; além de criar uma espécie de observatório de direitos humanos para apoiar as vítimas e conter a tramitação de projetos de lei que, segundo eles, "engessam" as manifestações populares.
Parlamentares e representantes de movimentos sociais, da Defensoria Pública e do Conselho Nacional de Direitos Humanos citaram vários casos de "truculência" policial, desrespeito ao direito de expressão, criminalização e constrangimento dos manifestantes. Para a deputada Maria do Rosário, do PT gaúcho, a PM tem banalizado o uso de balas de borracha, gases e prisões, como ocorreu no "Ocupa Brasília".
"A manifestação era totalmente pacífica. Nós vimos que, debaixo dos ministérios, brotaram do chão da Esplanada forças policiais que estavam preparadas para algo que não havia. Aquilo não foi um confronto. Foi o prenúncio de uma repressão absurda que poderia chegar a uma chacina. Não ao acaso nós levamos às Nações Unidas e à OEA a denúncia daqueles fatos."
Cego de um olho após ser atingido por bala de borracha em 24 de maio, Clementino Pereira também relatou repressão indiscriminada em uma manifestação legítima:
"Perdi a vista do lado esquerdo. Vim me manifestar, no dia 24, e o policial atirou em mim. Eu não representava ameaça nenhuma para ele, no momento em que ele atirou. Na hora, eu levei a mão ao rosto e continuaram jogando gás de pimenta na gente. Eu sou pai de família com dois filhos para criar e estou desempregado agora. Mas continuo com a luta. Se houver outra manifestação, eu estou junto de novo."
O médico Daniel dos Santos, que atendeu Clementino na manifestação, lembrou que mesmo as armas não letais podem causar danos irreversíveis. O Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal apresentou dossiê sobre nove profissionais de imprensa agredidos na mesma manifestação e um vídeo que mostra um policial atirando com arma de fogo em direção aos manifestantes. Um fotógrafo levou um tiro no pé. Os meios de comunicação tradicionais também foram criticados por focarem nos distúrbios patrimoniais para justificar o uso da força, como afirma o professor de serviço social da UnB, Leonardo Ortegal:
"A mídia brasileira enfatiza os patrimônios que foram prejudicados, enfatiza os grupos responsáveis pelos danos materiais, deslegitimam tacitamente a manifestação como um todo, sem deixar claro que o grupo mais inflamado correspondia, muitas vezes, a 1% do protesto. Com isso, induz o olhar do espectador a se inconformar com o prejuízo aos cofres públicos e induz também a entender a reação policial a esse ataque como algo totalmente legítimo e a entender os feridos e mortos pela polícia como uma consequência direta das atitudes dos manifestantes."
Para o defensor público Geraldo Correia, esse tensionamento também é resultado do aumento do que chamou de "intolerância em relação à posição e à opinião política do outro":
"A divergência é algo natural, inerente e salutar à convivência humana. Nos tempos mais recentes, parece que isso vem sendo esquecido, sempre a partir de uma negação da posição do outro, o que vem permitindo aflorar um debate em que ninguém se escuta."
A pedido dos debatedores, a Comissão de Direitos Humanos deverá divulgar uma nota de repúdio aos secretários de segurança pública do Distrito Federal, de Goiás e de São Paulo, que foram convidados para a audiência pública, mas não compareceram nem enviaram representantes. Em nota enviada ao Conselho Nacional de Direitos Humanos em maio, o Governo do Distrito Federal afirmou que a PM segue protocolos similares aos das forças públicas de primeiro mundo, com respeito aos direitos e garantias dos cidadãos. No fim da audiência pública, um grupo de pessoas da plateia protestou contra a reunião na Câmara, com gritos de "circo da esquerda".