04/10/2016 17:32 - Política
Radioagência
Anticorrupção: teste de integridade e uso de provas ilícitas geram divergências
Mais uma vez, o teste de integridade para servidores públicos e o uso de provas ilícitas obtidas de boa-fé em processos criminais foram os principais pontos de divergência em audiência pública da comissão especial que analisa o projeto mais conhecido como "Dez medidas contra a corrupção" (PL 4850/16).
O projeto, apresentado pelo Ministério Público ao Congresso com o apoio de mais de 2 milhões de assinaturas, também limita a concessão de habeas corpus, criminaliza o uso de caixa-dois em campanhas eleitorais, restringe recursos judiciais e aumenta as penas de vários crimes ligados à corrupção.
O teste de integridade e o uso de provas ilícitas foram criticados pelo ex-ministro-chefe da Controladoria-Geral da União Valdir Moysés Simão.
O projeto prevê que provas obtidas ilegalmente, mas de boa-fé, podem ser usadas nos processos.
Já o teste consiste em simular a oferta de propina para verificar se o servidor público é honesto ou não. De acordo com o projeto, é obrigatório para policiais e facultativo para os demais funcionários.
Para Simão, que também foi ministro do Planejamento, o teste vai criar um clima policial no serviço público.
"Essa proposta, do jeito que está, vai transformar a administração pública em algo tão policialesco que eu, sinceramente, acho que nós vamos desencantar aquelas pessoas que ainda sonham em ser servidores públicos, por vocação. Nós precisamos privilegiar a cultura da integridade, tendo os instrumentos de controle, mas não só isso: trabalhando com a confiança e a transformação da cultura organizacional.”
Já o representante do Tribunal de Contas da União, Rafael Jardim Cavalcante, da Secretaria Extraordinária de Operações Especiais do órgão, elogiou as medidas contidas no projeto.
Para ele, a proposta previne a corrupção ao garantir a punição do culpado. Ele mencionou, por exemplo, o incentivo à delação, por meio de recompensa em dinheiro; a responsabilização de partidos políticos em caso de caixa-dois, e a agilização dos processos judiciais, com restrição a recursos.
Rafael Cavalcante discordou da afirmação de Valdir Moysés Simão de que a administração pública não está preparada para aplicar os testes de integridade.
"O país não está ainda capacitado para ter um teste de integridade. Quando vai estar? De repente, um bom caminho talvez seja autorizar este instrumento de acordo com autorização judicial. Talvez seja um primeiro passo necessário a conferir um senso de consequência que todo administrador público tem que ter."
O relator da proposta na comissão especial, deputado Onyx Lorenzoni, do Democratas do Rio Grande do Sul, antecipou que vai modificar o projeto em relação ao teste de integridade, que será feito apenas como instrumento de investigação, quando houver suspeitas sobre o funcionário público.
"Ele, em vez de ser um mecanismo de monitoramento da administração, ele entra como instrumento no investigatório. E aí, dependendo de como ele avançasse no Brasil, depois ele podia ser ampliado com uma outra formatação. Mas seria isso: um instrumento, quando houvesse fundada suspeita, com autorização judicial.”
Também participou da audiência o presidente da Federação Nacional das Entidades dos Servidores dos Tribunais de Contas do Brasil, Amauri Perusso. Ele manifestou apoio às propostas, desde que não firam direitos constitucionais.
Perusso defendeu medidas que não constam do projeto, mas que, segundo ele, são fundamentais para o combate à corrupção, como mudanças na forma de escolha de ministros e conselheiros dos tribunais de contas e autonomia para os auditores.
A comissão especial que analisa o projeto já ouviu 65 pessoas e o relatório deve ser apresentado até o fim de outubro. Se aprovado na comissão, vai direto para o Plenário da Câmara.