Cidades e transportes

Projeto que incentiva atuação da PM no trânsito gera divergência em debate

09/03/2016 - 19:16  

Debatedores divergiram, nesta quarta-feira (9), sobre o Projeto de Lei 1178/15, em análise na Câmara dos Deputados, que retira a necessidade de concordância de estados e municípios para a interferência da Polícia Militar (PM) na fiscalização do trânsito. O assunto foi discutido em audiência pública na Comissão Especial sobre a Alteração do Código de Trânsito (PL 8085/14 e 139 apensados).

Atualmente, o Código de Trânsito Brasileiro (CTB – Lei 9.503/97) condiciona a atuação dos militares na fiscalização do cumprimento de normas do trânsito à assinatura de convênios entre a corporação e esses entes federados. A lei também atribui aos conselhos estaduais de Trânsito, os Cetrans, a coordenação do policiamento ostensivo em conjunto com a PM.

O projeto, do deputado Capitão Augusto (PR-SP), pretende reverter essa lógica de desmilitarização do trânsito, iniciada com a edição do código.

Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre as atribuições das Polícias Militares no Sistema Nacional de Trânsito. Diretor de Assuntos Parlamentares da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais, Coronel Elias Miler da Silva
Antônio Coelho, presidente da Associação dos Agentes de Trânsito do Brasil, é contrário ao projeto e classificou o texto como retrocesso

A favor da proposta, o diretor de assuntos parlamentares da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais, Coronel Elias Miler da Silva, entende ser preciso restabelecer as competências da Polícia Militar. Ele fez a distinção entre poder de polícia administrativa especial (vigilância sanitária e agentes de trânsito), restrito à fiscalização, e poder de polícia geral (polícias civis e militar), pelo qual é possível conter indivíduos em atos ilícitos. Segundo Silva, o CTB erra ao prever a fiscalização por agentes civis, “quando o poder de fiscalizar faz parte do poder de polícia geral”, afirmou.

Na mesma linha de argumentação, o Capitão Julyver Modesto, da Polícia Militar do Estado de São Paulo, criticou a necessidade de convênio. Conforme ele, a ausência do acordo entre a instituição e um município, por exemplo, pode impedir que um policial intervenha diante de ilícitos no trânsito. Julyver informou que hoje a PM não tem aval para cumprir suas competências no trânsito em 74% dos municípios.

Nesse ponto, o coordenador Jurídico do Denatran, Fernando Nardes, lembrou que, apesar de a lei prever a municipalização do trânsito, muitas prefeituras não têm interesse na integração do sistema.

Nardes observou ainda que a ausência de convênios pode causar efeito inverso, com o desinteresse de municípios em investir no trânsito, à medida que a fiscalização seja atribuída à PM. Ele disse que os advogados do Denatran ainda não entraram em consenso sobre a proposta discutida na Câmara.

Críticas ao projeto
Por sua vez, o relator na Comissão de Viação e Transportes, deputado João Paulo Papa (PSDB-SP), que recomendou a rejeição do texto, acredita não fazer sentido aumentar as responsabilidades da Polícia Militar. “É um risco, pois a população espera a ampliação de efetivo, de recursos, para que a policia atue no combate ao crime”, sustentou.

Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre as atribuições das Polícias Militares no Sistema Nacional de Trânsito. Dep. João Paulo Papa (PSDB-SP)
Já o deputado João Paulo Papa é contra o texto: a PM deve se concentrar no combate ao crime

O parlamentar também defendeu a continuidade dos convênios entre policias militares e municípios, “com atribuições definidas conforme as circunstâncias e necessidades dos locais”. “É preciso evitar conflitos de competências, uma vez que a realidade da polícia da Bahia não é a mesma da de São Paulo”, completou.

O deputado Delegado Waldir (PSDB-GO) foi outro a criticar o PL 1178/15 que, em sua opinião, pode “escravizar” a PM. Para estimular a integração de municípios ao sistema nacional de trânsito, o parlamentar propôs a repartição da receita de impostos, como o IPVA, apenas para municípios que criem agências de trânsito.

Também contrário à proposta de Capitão Augusto, o presidente da Associação dos Agentes de Trânsito do Brasil (AGT-Brasil), Antônio Coelho, classificou o texto como retrocesso. Ele explicou que o Código de Trânsito veio para ratificar o pensamento de que a fiscalização deve ser feita por agentes concursados, que não são apenas “anotadores de placas”.

Para Coelho, a PM deve continuar a intervir de forma pontual, a fim de auxiliar os agentes civis nos casos de crimes cometidos no trânsito. “Não pode uma categoria acumular mais atribuições se já não cumpre aquela para a qual foi criada [segurança pública]”, sustentou, ao reforçar que os agentes não têm intenção de interferir no trabalho dos policiais militares.

Reportagem - Emanuelle Brasil
Edição - Marcelo Oliveira

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