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Artistas criticam política cultural de Temer em audiência na Câmara

Representantes da classe artística anunciaram que prédios públicos continuarão ocupados em defesa do Ministério da Cultura. Debate foi marcado por bate-boca entre deputados e manifestantes

24/05/2016 - 22:17  

Antonio Augusto / Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre a proposta de extinção do Ministério da Cultura
Movimentos de artistas populares, presentes na audiência, se negam a negociar com novo ministro da Cultura, Marcelo Calero

A Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados debateu, nesta terça-feira (24), a extinção e posterior recriação do Ministério da Cultura no governo interino de Michel Temer. A extinção fazia parte da reforma ministerial, mas os protestos de artistas e as ocupações de órgãos culturais levaram Temer a rever a ideia inicial.

No entanto, movimentos de artistas populares e de trabalhadores da cultura classificam o governo interino de "golpista" e se negam a negociar com o novo ministro, Marcelo Calero, que tomou posse nesta terça.

Representante da Frente Nacional de Teatro, Fernando Yamamoto anunciou que as ocupações ocorrem em prédios da Funarte ou do IPHAN em todo o País e serão mantidas."São ocupações pacíficas, poéticas e afetivas, com uma clara posição de contraponto ao caráter policialesco, intolerante e violento do discurso e dos atos desse governo interino", afirmou.

Os músicos Tico Santa Cruz e Silvério Pontes e a líder indígena Sônia Guajajara também participaram da audiência pública. Silvério Pontes tocou, no trompete, a música "Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré. A música foi seguida de gritos de "Ocupa e resiste!" e "Fora Temer".

IPHAN
Artistas manifestaram preocupação com o destino do IPHAN diante da criação da Secretaria Especial do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, prevista na Medida Provisória (MP) 728/16. Eles temem que o novo órgão seja uma brecha para flexibilizar os critérios de avaliação de patrimônio cultural e, assim, beneficiar a especulação imobiliária.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) admite que a recriação do Ministério da Cultura dividiu a classe artística, mas ressaltou que as conquistas do setor só serão mantidas por meio de resistência.

"Neste momento, o diálogo é por aqui: pela luta, resistência e ocupações; e não legitimar junto ao ministro da Cultura desse governo ilegítimo. A volta do MinC não é a volta das políticas que lutamos anos para conquistar, e ainda faltavam muitos avanços, que foram interceptados no meio do caminho", enfatizou.

Ex-secretáro-executivo do MinC, João Brant teme que a Sephan seja uma forma de flexibilizar os critérios de avaliação do patrimônio artístico para beneficiar a especulação imobiliária e não atrapalhar empreendimentos.

A deputada Erika Kokay (PT-DF) sugeriu a realização de uma audiência pública específica, na Comissão da Cultura, para discutir o destino do IPHAN, com a possível convocação dos comandantes do agora recriado Ministério da Cultura.

Clima tenso
A reunião ficou tumultuada e tensa quando os deputados Pr. Marco Feliciano (PSC-SP), Jair Bolsonaro (PSC-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PSC-SP) entraram no plenário lotado de artistas e trabalhadores culturais. Os três foram chamados de "golpistas e fascistas". Houve provocações mútuas e policiais legislativos foram mobilizados para proteger os deputados.

Feliciano criticou os manifestantes e disse que vai pedir uma CPI para investigar o ministério: "A CPI da Lei Rouanet está incompleta. Apresentei uma nova CPI para que seja aditada a essa e vai ver os convênios do Ministério da Cultura com algumas ONGs, porque artistas de verdade, que precisam de dinheiro, não conseguem e não têm acesso fácil aos convênios da Lei Rouanet. Eu sou artista: sou cantor, tenho três CDs gravados e 20 livros escritos. Eu sei como funciona a cultura. Isso aqui não é cultura, isso é baderna".

Os artistas e trabalhadores da cultura, presentes na plateia, ouviram de costas o depoimento do deputado.

Já a representante do Movimento Ocupa MinC Brasil, Marina Brito, contou com a ajuda da plateia para, em forma de jogral, dar a resposta dos artistas: "Antes de tudo, não aceitamos governo golpista, comandado por homens, brancos, elitistas, fascistas, empresários e agitadores religiosos intolerantes. Cultura não combina com conservadorismo. Nenhum direito a menos".

O presidente da Comissão de Cultura da Câmara, deputado Chico D'Angelo (PT-RJ), manifestou apoio do colegiado aos artistas. "Nós estamos há duas semanas à frente desta comissão. E esta comissão certamente será uma trincheira de resistência da cultura brasileira", prometeu aos artistas.

A audiência foi solicitada pelos deputados Chico D'Angelo, Waldenor Pereira (PT-BA), Jean Wyllys (Psol-RJ), Luizianne Lins (PT-CE), Alice Portugal (PCdoB-BA) e Jandira Feghali.

Ministério da Cultura
Na reforma ministerial, o presidente interino Michel Temer extinguiu o Ministério da Cultura por meio da MP 726/16. Suas atividades foram incorporadas ao Ministério da Educação, comandado pelo deputado licenciado Mendonça Filho (DEM-PE).

No entanto, protestos veementes da classe artística e ocupações de prédios de órgãos culturais – como a Funarte, em vários estados, e o Palácio Gustavo Capanema, no Rio de Janeiro, onde funciona o IPHAN – levaram Temer a recriar a pasta da cultura.

Na segunda-feira (23), o governo editou a MP 728/16, que recria o Ministério da Cultura e nomeia, como ministro, o ex-secretário municipal de Cultura do Rio de Janeiro, Marcelo Calero. Em sua posse, nesta terça, o novo ministro disse que pretende trabalhar de forma transparente e com diálogo, preservando conquistas.

Reportagem - José Carlos Oliveira
Edição - Luciana Cesar

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