Direitos Humanos

Debate sobre projeto que tipifica ‘crime de ódio’ gera polêmica em comissão

Parlamentar disse não ser possível misturar discordância com crime de ódio. Advogado rebateu dizendo que a população LGBTI sofre discriminação sistemática

14/05/2019 - 15:53  

Vinicius Loures/Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre os crimes de ódio e intolerância - PL nº 7582/14
Representantes do Ministério Público e da sociedade debateram sobre o projeto que pune o crime de ódio

O deputado Carlos Veras (PT-PE) anunciou, nesta terça-feira (14), que buscará o consenso em seu relatório sobre o projeto de lei (PL 7582/14) que define crimes de ódio e intolerância. O objetivo da proposta é punir a discriminação baseada em classe e origem social, orientação sexual, identidade de gênero, idade, religião, situação de rua, deficiência, condição de migrante, refugiado ou pessoas deslocadas de sua região por catástrofes e conflitos.

O assunto foi discutido em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, onde a proposta está em análise. Houve polêmicas, relacionadas principalmente a aspectos técnicos do projeto e aos direitos da população LGBTI.

“Hoje há um consenso na sociedade e na Casa de que ódio e intolerância não são aceitáveis por ninguém. Vamos construir algo que possa atender e coibir de vez manifestações de ódio e intolerância que este país não comporta mais”, afirmou Veras.

Em um de seus itens, a proposta determina que quem agredir, matar ou violar a integridade de uma pessoa baseado nos preconceitos elencados será condenado por crime de ódio, como agravante do crime principal, e terá a pena aumentada de 1/6 até a metade.

Críticas
As críticas técnicas à proposta foram feitas pelo promotor de Justiça de São Paulo Christiano Jorge Santos. Entre outros pontos, ele criticou o fato de que, ao especificar crime de ódio, a proposta o trata como agravante, sem especificar uma pena para ele. “Não pode haver um crime que, na verdade, tenha como pena ser considerado agravante”, criticou. “Não é possível misturar crime com agravante.”

Autora da proposta, a deputada Maria do Rosário (PT-RS) explicou que o objetivo da matéria é mais educativo que punitivo, tratando o crime de ódio como agravante mesmo. “Na nossa legislação, não existe a expressão ‘crimes de ódio e intolerância’. O crime de ódio é movido pela incapacidade de respeitar o outro, tomado por preconceitos contra a existência da outra pessoa como é”, justificou.

Maria do Rosário deu um exemplo. Homicídio, acrescentou a parlamentar, já existe, mas receberá agravante quando motivado por ódio.

Homofobia
Um dos debates mais intensos da audiência se deu entre o advogado militante pelos direitos LGBTI Paulo Iotti e o deputado evangélico Eli Borges (Solidariedade-TO). O parlamentar disse não ser possível misturar discordância com crime de ódio. Segundo ele, em sua igreja negros, brancos e pessoas que vieram da prostituição convivem harmonicamente e disse que, no Brasil, existiria mais “cristofobia” do que homofobia.

“Eu não aceito qualquer pessoa nas ruas discriminando ou jogando pedras em pessoas homoafetivas. Agora, não vou defender uma legislação onde pregar a prática da Bíblia seja vista como discurso de ódio”, declarou.

O advogado rebateu dizendo que a população LGBTI sofre discriminação sistemática e que, entre as pessoas representadas no projeto, são as únicas que não têm uma lei penal que lhes proteja. “Ninguém quer prender padre e pastor por falar que a homossexualidade é pecado. O problema é quando se quer disfarçar discurso de ódio em nome de liberdade religiosa. Muitos padres e pastores fundamentalistas querem impor a sua fé religiosa a todos e todas”, disse Iotti.

Outros representantes
Representantes de outras minorias presentes na audiência defenderem o projeto de lei de Maria do Rosário. O conselheiro dos Direitos da População em Situação de Rua do Conselho Nacional de Direitos Humanos Leonildo José Monteiro Filho, pediu acesso a direitos para moradores de rua. “Você tem um grupo que hoje não consegue acessar uma delegacia. A gente tem que colocar aí algo que nos permita acesso às delegacias para fazer denúncias. Tem defensoria pública neste país que não deixa a população de rua entrar”, reclamou.

Já o representante do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Francisco Djalma de Oliveira, disse que mesmo existindo leis em benefício das pessoas com deficiência, elas não tocam na questão do ódio e intolerância. “Se deixarmos deficiência de fora, a gente retira um segmento que é extremamente discriminado na sociedade.”

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Reportagem – Noéli Nobre
Edição – Roberto Seabra

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