Direitos Humanos

Ex-diretor da Comissão de Anistia critica interpretações legais feitas por órgãos públicos

30/08/2017 - 19:38  

O advogado Virginius José Lianza da Franca, ex-conselheiro e ex-diretor da Comissão de Anistia, criticou a criação de uma nova instância para análise das decisões sobre reparações a anistiados políticos, a Consultoria Jurídica do Ministério da Justiça e Segurança Pública.

“Pareceres da comissão estão sendo encaminhados para uma espécie de crivo, com conclusões pelo indeferimento, sem a participação de qualquer dos envolvidos e sem contraditório. A nova interpretação da assessoria jurídica do Ministério da Justiça retira da Comissão de Anistia seu fundamento legal”, disse Franca.

Ele participu de audiência da Comissão de Direitos Humanos, da Câmara dos Deputados, nesta quarta-feira (30), que debateu os 38 anos da Lei da Anistia (Lei 6.683/79)

Direito sucessório
Virginius Franca também criticou interpretações legais feitas por outros órgãos. Segundo ele, o Ministério do Planejamento, a partir de 2011, passou a entender que indenizações relativas a militantes já falecidos só poderiam ser pagas a dependentes – e não a sucessores, como vinha sendo feito.

“Sempre tivemos o entendimento de que reparações econômicas passavam a fazer parte do patrimônio, o que faz com que sejam incorporadas ao direito sucessório. Mas a interpretação mudou e foi seguida depois pela Controladoria Geral da União (CGU), o que é um grave prejuízo às famílias dos mortos, quase todos com mais de 70 anos e, portanto, sem dependentes diretos”, disse.

Pagamento de contribuições
O advogado criticou ainda interpretações feitas pelas procuradorias jurídicas do INSS no Paraná e no Rio Grande do Sul, que exigem que os anistiados paguem as contribuições relativas ao período em que ficaram afastados de suas funções em razão de perseguição política para ter direito à aposentadoria – o que também contraria decisões da comissão.

“A lei determina que a contagem do tempo de serviço tem que ser feita independentemente de contribuições, e o próprio TCU, desde 2007, entendeu que essa exigência não pode ser feita e que nenhum órgão pode deixar de contabilizar esse tempo de serviço”, disse.

Reformulação
Franca foi exonerado do cargo de conselheiro em setembro do ano passado, quando o então ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, reformulou a composição da comissão. Também foram substituídos representantes do grupo Tortura Nunca Mais e outras entidades ligadas a direitos humanos.

Embates
Um dos conselheiros que permaneceu no cargo foi Mário Miranda de Albuquerque, que também foi preso político. Ele disse que as reuniões têm sido marcadas por embates, mas que os novos integrantes do conselho tendem a se alinhar com as posições anteriores do colegiado.

“Temos vivido embates internos na comissão, mas a maioria dos conselheiros tem aderido às nossas posições. Vários conselheiros novos, quando se deparam com os casos concretos, se alinham com as posições construídas ao longo do tempo, que não são posições exageradas e estão dentro da lei”, disse

Reparações
O advogado Aderson Bussinger Carvalho, diretor do Centro de Documentação e Pesquisa da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio de Janeiro, também criticou as divergências na interpretação da lei (10.559/02) que regulamenta as reparações a perseguidos políticos.

“Se for para darem pareceres contrários às decisões da Comissão de Anistia, que façam antes do julgamento. O problema é que está sendo feita uma revisão interpretativa que, por exemplo, considera as greves políticas de metalúrgicos nos anos 80 meros conflitos trabalhistas”, disse.

Carvalho também apontou redução no ritmo dos trabalhos da Comissão de Anistia. “Estamos verificando a falta de priorização do funcionamento da comissão: menos julgamentos, caravanas reduzidas e paralisação do Projeto Memória”, disse.

Reportagem – Antonio Vital
Edição – Newton Araújo

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