Direitos Humanos

Debatedores: aumento do tempo de cumprimento de medidas socioeducativas prejudica adolescentes

Levantamento aponta que 18.107 adolescentes estavam internados no fim de 2010 no País, cumprindo pena de restrição de liberdade por terem praticado algum ato infracional

27/06/2017 - 20:32  

Alex Ferreira/Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre a revisão das medidas socioeducativas do ECA
Comissão especial da Câmara dos Deputados analisa proposta que estende o período máximo das medidas socioeducativas dos atuais três anos para até dez anos de internação

Psicólogos, advogados e representantes de entidades de defesa dos direitos de crianças e adolescentes concordaram, em debate na Câmara dos Deputados, que o aumento no tempo de cumprimento das medidas socioeducativas prejudica o desenvolvimento dos adolescentes e sua reinserção na sociedade.

O assunto foi tema de audiência pública na comissão especial que analisa proposta (PL 7197/02 e apensados) que altera o Estatuto da Criança e do Adolescentes (ECA – Lei 8.069/90) para estender o período máximo das medidas socioeducativas, dos atuais três anos para até dez anos de internação.

Para o psicólogo Fábio Silvestre, aumentar o tempo de permanência dos adolescentes "é tratar de forma simplista um problema complexo", que é resultado da falta da implementação efetiva do ECA e das políticas públicas de proteção à crianças e adolescentes. "Não podemos falar que vai resolver a violência no Brasil, encarcerando mais adolescentes e por um período maior de tempo."

Privação de liberdade
A representante do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, Maria Mercedes, destacou estudos que mostram que a privação de liberdade por um período prolongado na adolescência, além de causar extremo sofrimento, ainda prejudica o desenvolvimento dos jovens.

Alex Ferreira/Câmara dos Deputados
Audiência pública sobre a revisão das medidas socioeducativas do ECA. Dep. Érika Kokay (PT-DF)
Erika Kokay: aumento da internação de adolescentes entra em confronto com todas as avaliações científicas

"Aumentar o tempo de internação significará muito tempo sem o contato com estímulos, relações, afetos que são muito importantes para o desenvolvimento desses adolescentes e desses jovens", disse Mercedes.

Tortura institucionalizada
O representante do Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (Gajop), Rodrigo Deodato, alertou para o fato de que a tortura é institucionalizada dentro das instituições que atendem os adolescentes e que teriam como função principal a educação e a ressocialização. Ele citou o exemplo de Pernambuco onde, em seis anos, 48 adolescentes internados foram assassinados.

"Submeter adolescentes a até uma década em regime de internação contraria tratados internacionais, em especial a Convenção dos Direitos da Criança”, disse Deodato. “Se levada à frente tal proposta, isso permitirá que um ser humano possa ficar todos os anos de sua adolescência privado de liberdade, descumprindo assim até mesmo o princípio da proporcionalidade que deve reger a administração pública."

Punição
A autora do requerimento para a realização da audiência pública, deputada Érika Kokay (PT-DF), afirmou que é preciso implementar o que define o ECA “para que tantos adolescentes não sejam punidos com restrição de liberdade como primeira opção da Justiça”.

"O aumento da internação entra em confronto com todas as avaliações científicas que indicam que o prazo de três anos não é um prazo aleatório. O prazo de três anos é o prazo necessário para que, com uma abordagem multissetorial para com o adolescente, ele possa ressignificar a sua vida e interromper a trajetória infracional", afirmou a parlamentar.

18 mil internados
Levantamento da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos aponta que 18.107 adolescentes estavam internados no fim de 2010 no País, cumprindo pena de restrição de liberdade por terem praticado algum ato infracional.

Reportagem - Karla Alessandra
Edição - Newton Araújo

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